MARGINALIDADE CONTEMPORÂNEA BRASILEIRA: UMA ANÁLISE DO DESLOCAMENTO DISCURSIVO E SUAS TENSÕES

MARGINALIDADE CONTEMPORÂNEA BRASILEIRA: UMA ANÁLISE DO DESLOCAMENTO DISCURSIVO E SUAS TENSÕES

Cleber José De Oliveira (CV)
Rogério Silva Pereira
(CV)
Universidade Federal da Grande Dourados

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INTRODUÇÃO

As origens desse livro se encontram em pesquisas e reflexões iniciadas ainda em 2006, por conta de um trabalho de iniciação científica. Surge com o intuito de melhor compreender como se manifestam as relações socioculturais brasileiras na contemporaneidade, com ênfase no fenômeno do deslocamento discursivo – margem /centro. Observa e registra possíveis características de rupturas e continuidades entre uma a chamada cultura modernista (1920-1979) e a atual cultura contemporânea que se inicia por volta dos anos de 1980, no Brasil. Faz um recorte, dentro da esfera cultural, para refletir sobre os discursos de resistência e revide que inevitavelmente surgem da tensão do deslocamento discursivo que historicamente se deu na ordem: centro/margem; elite/povo; Estado/nação. Esse deslocamento, a nosso ver, é uma das principais características da cultura contemporânea brasileira, pois surge num momento de fortes mudanças sociopolíticas que faz surgir uma crença (pós-ditadura militar) na democracia, tão almejada, considerada uma possível forma de amenização das diferenças socioeconômicas em nosso país. Contudo, ao mesmo tempo surge também uma descrença na ideologia de representação utilizada pelas elites (culturais, econômicas, étnicas)  para com o povo.  Dessa descrença surge um rechaço aos representantes que não sejam oriundos das próprias comunidades. É em meio a este conturbado cenário sociocultural que germina nosso objeto de estudo, a saber – o discurso marginal. Tomamos como sendo um exemplo emblemático desse tipo de discurso à produção literária-musical de uma parcela da sociedade brasileira que historicamente foi impedida de ter amplo acesso à cidadania, o rap é esse discurso e nosso objeto de reflexão nesse livro.
Durante anos, tivemos a chance de nos defrontarmos com aspecto decisivo para pensarmos a literatura contemporânea brasileira, a saber, certa ideologia do Modernismo brasileiro que é produto do engajamento no projeto de nação brasileira de seus principais produtores culturais, ao longo, sobretudo, da primeira metade do século XX. Esta ideologia pode ser expressa por um esforço estético-político de inclusão social, isto é, um esforço de problematizar a ausência dos homens e das mulheres das classes marginalizadas brasileiras na esfera dos direitos da Nação. Artistas como Mário de Andrade, Cândido Portinari, Graciliano Ramos, Rubem Braga, dentre tantos outros, são exemplos de intelectuais engajados no referido projeto; alguns mais críticos em relação aos limites desta inclusão, outros menos. Esses são, a seu modo, intelectuais a serviço daquela ideologia que se colocaram como “mediadores” entre as classes excluídas e a sociedade brasileira “justa”, idealizada em sua utopia, diga-se, paternalista. Um dos impasses dessa ideologia dizia respeito exatamente a isso: a existência de certo paternalismo em que, fosse o Estado Brasileiro, fossem esses intelectuais, pretendiam ser os representantes das classes excluídas – o que, claro, cassava o direito dessas classes de terem seus próprios representantes, sua própria voz.
A contemporaneidade, dentre outros, deriva-se dos impasses daquele projeto de nação que se revelou plenamente como ideologia, já na segunda metade do século XX. Nas últimas décadas, rappers e/ou escritores como Ferréz, Mano Brown, Gog, Sergio Vaz, dentre outros, aparecem como críticos da ideologia de inclusão social. Nesse sentido, essas reflexões nos levaram a pensar no ‘sair de cena’ dos intelectuais do Modernismo e na possibilidade de surgimento de novos perfis de intelectuais. Isso também nos levou a olhar para novas formas de produção artísticas que estão atentas à pauta da inclusão social, neste caso entendemos que o rap é, na contemporaneidade, o principal gênero.