PROCESSOS DE MUDANÇA, TURISMO E DESENVOLVIMENTO RURAL: AS ALDEIAS DO XISTO DO CONCELHO DE GÓIS E O PAPEL DA LOUSITÂNEA

PROCESSOS DE MUDANÇA, TURISMO E DESENVOLVIMENTO RURAL: AS ALDEIAS DO XISTO DO CONCELHO DE GÓIS E O PAPEL DA LOUSITÂNEA

Luiz Rodolfo Simões Alves (CV)
Universidade de Coimbra

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Políticas e programas de desenvolvimento para o espaço rural

“ A gestão dos territórios rurais deve considerar as relações estruturais e funcionais entre agricultura, desenvolvimento rural, política urbana, desenvolvimento local e política regional” (Covas; 2004:48).
O reconhecimento das fragilidades, mas também a perceção das mais-valias e das forças dos espaços rurais, deram origem à elaboração de políticas de desenvolvimento rural e local, mas também regional, uma vez que, “as cidades são os motores dos processos de desenvolvimento, os pólos de dinamização da economia e de fixação e atração das populações” (Cavaco, 2004:99). Segundo a autora, “as cidades são os nós de uma rede que gera e atrai os fluxos que irradiam por toda a região que as rodeia tanto melhor quanto a rede de acessibilidades. A chave do desenvolvimento pode residir na dinamização das cidades e da sua relação com o espaço envolvente” (Cavaco, 2004:99, citando dgotdu, 2004).
Nesse sentido, o desenvolvimento deve assegurar a melhoria das condições de vida e de bem-estar das populações bem como fornecer-lhes “ferramentas” com as quais, numa fase posterior, se possam tornar autónomas permitindo assim traçar o seu próprio futuro, como o aumento do rendimento per capita, mas também aptidões pessoais e modos de produção. O desenvolvimento destas áreas tem ainda como principal objetivo, além dos referidos anteriormente, “contrariar a perda de vitalidade demográfica e económica, de capacidade de fixação e atração de populações, de iniciativas económicas, e não apenas a regressão das atividades primárias, em especial dos cultivos, no quadro das modificações das políticas agrícolas da União Europeia” (Cavaco, 2004:99), combatendo assim, os efeitos nefastos da desruralização dos espaços rurais, procurando introduzir o desenvolvimento sustentável destas áreas e estimular a diversificação das atividades económicas de quem nelas reside, a partir do aproveitamento dos seus recursos endógenos. Não esquecendo nunca que, o desenvolvimento, deve ser sustentável e integrado, nas suas dimensões ecológica, económica, social e cultural, correspondendo a um processo dinâmico de adaptação e mudança estritamente ligado à satisfação das necessidades do presente.
Os problemas e as carências que têm “acompanhado” os espaços rurais são de tal forma contundentes, que urge uma necessidade inequívoca de encontrar soluções para tais fragilidades. Problemas esse que, nas palavras de Ribeiro (2010:21), estão relacionados com “três ciclos viciosos fundamentais (perificidade, demografia e educação/conhecimento) que, estando na base do seu declínio económico e social, só podem ser rompidos através de respostas concebidas e veiculadas através de instrumentos específicos de política”.
Com efeito, “a importância atual em se interpretar/compreender o rural surge da necessidade de se (re)pensar as políticas públicas de desenvolvimento rural que contemplem as peculiaridades e singularidades territoriais” (Gonçalves, 2007:113).
Para compreender melhor a importância dos espaços rurais, importa referir que, as regiões rurais, segundo dados de 2006, representam 92% do território da União Europeia, 19% da população europeia habita em zonas predominantemente rurais e 37% em zonas com uma componente rural significativa. Estas regiões produzem 45% do valor acrescentado da União Europeia e 53% do emprego. Apesar da grande diversidade de situações, apresentam em geral rendimentos per capita inferiores, em cerca de um terço, à média europeia, baixas taxas de atividade das mulheres e o setor dos serviços menos desenvolvido. Face a esta realidade, e tendo em conta outras componentes já apresentadas neste ponto, é inquestionável a estrema importância de políticas e de programas que visem o desenvolvimento sustentável e a coesão das áreas rurais.
“De um modo geral, percorrendo alguns documentos de enquadramento estratégico elaborados pela Comissão Europeia, ou pelo Conselho da Europa, ou ainda pela OCDE, deparamos com a ideia comum de que o desenvolvimento rural deve ser encarado como uma necessidade social e política” (Carvalho e Fernandes, 2006:106). Assim sendo, “desde a Nova Política Agrícola Comum, a União Europeia tem desenvolvido uma série de iniciativas que atendem às diversas funções do meio rural, sendo hoje uma prioridade encontrar meios de estimular e ativar essa multifuncionalidade” (Luís, 2002:66).  
No contexto da União Europeia, entre 7 e 9 de Novembro de 1996, realizou-se em Cork a “Conferência Europeia sobre Desenvolvimento Rural”, com o título “A Europa rural – perspetivas futuras”. Desse encontro, ficou clara a necessidade estratégica de preservação da identidade do espaço rural europeu, sem que a esse princípio geral se deixem ajustar também outras metas, tais como a aposta nas novas tecnologias de informação e no desenvolvimento de uma rede consolidada de atores locais de desenvolvimento. De acordo com estas ideias, a Declaração de Cork define como objetivo prioritário a construção de uma imagem atrativa do mundo rural, reforçando a ideia de que é também em cada lugar que se encontram as soluções para o desenvolvimento das comunidades locais (Carvalho, 2009).
No final da década de 80 (1987-1988), o Conselho da Europa refletiu também sobre o espaço rural europeu, através da “Campanha Europeia para o Mundo Rural”, assumindo que diversificar as ações de desenvolvimento, integrando a valorização dos patrimónios culturais locais, são também as linhas mestras desta tomada de posição.
Em Agosto de 1988, num documento dirigido ao Parlamento Europeu (O Futuro do Mundo Rural), a Comissão Europeia refere-se à ruralidade de alguns territórios europeus como importante fator de equilíbrio ecológico, atribuindo aos espaços rurais algumas outras funções vitais, como sejam as relacionadas com o lazer e o recreio. O desenvolvimento rural foi, por isso, completamente assumido aquando da reforma dos fundos estruturais em 1988 e consagrado também em Maastricht, com o alargamento dos princípios da coesão económica e social às áreas rurais, precisamente as mais carenciadas em diversos aspetos.
Nesta mesma linha é divulgado, em 1993, um documento da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, com o título “Quel Avenir pour les Campagnes? Une Politique de Développement Rural”.
De igual modo assim aconteceu no âmbito da Agenda 2000 (Cimeira de Berlim, 1999) quando a União Europeia assumiu em definitivo um conjunto de reformas (como a modernização do modelo agrícola e promoção do desenvolvimento económico e ambiental), de modo a preservar os modos de vida rurais e as paisagens agrícolas (Carvalho, 2009). O desenvolvimento rural foi assim assumido como o segundo pilar da PAC, com o objetivo de estabelecer um quadro coerente e sustentável para o futuro das áreas rurais, complementando as reformas dos mercados com outras ações que promovam uma atividade agrícola mais competitiva e multifuncional (idem).
A 2ª. Conferência Europeia sobre o Desenvolvimento Rural, realizada em Salzburgo (12 a 14 de Novembro de 2003), para avaliar a execução da política de desenvolvimento rural da União Europeia, desde a Agenda 2000, e analisar as necessidades futuras, reconheceu que o “desenvolvimento das áreas rurais já não pode assentar exclusivamente na agricultura, e que a diversificação, que dentro do setor agrícola, que para além dele, é indispensável para a promoção de comunidades rurais viáveis e sustentáveis” (ue, 2004, citada por Carvalho, 2009:145), tendo definido diversos objetivos e as principais linhas de orientação para os espaços rurais.
No caso particular de Portugal, importa destacar o Programa de Desenvolvimento Regional 2000-2006, que sugere, igualmente, um caminho alternativo para o desenvolvimento. Este programa foi orientado para um desenvolvimento sustentável a nível económico e ambiental de forma a enfrentar de forma coesa a competitividade internacional. Assim, o desenvolvimento rural, assume-se como um dos eixos fundamentais e prioritários do desenvolvimento global e da coesão do território nacional, referindo-se a aposta na Rede Natura 2000 e nas atividades da fileira florestal; o desenvolvimento dos produtos agrícolas e de serviços agro-rurais; a importância estratégica da agricultura, num sistema geoeconómico multifuncional.
Um outro plano, o Plano Nacional de Desenvolvimento Económico e Social 2000-2006, também preconizou as ideias referidas no documento anterior.  
 Entre as Iniciativas Comunitárias destaca-se o LEADER (Ligação entre Acções de Desenvolvimento da Economia Rural). Num encontro organizado pelo World Travel and Tourism Council, em 1998, o LEADER foi descrito como um excelente exemplo da abordagem bottom up (ascendente), apoiando projetos de turismo, entre outros (Edmunds, 1999; Luís, 2002). De facto, a nível de desenvolvimento rural e local, o LEADER tem trazido, desde a sua criação, inúmeros projetos e iniciativas de apoio ao desenvolvimento local, com apoios para diversos setores, e com especial incidência, em termos financeiros, sobre o Turismo em Espaço Rural.
Como afirma Moreno (2005:93) “só com a criação e implementação do PIC LEADER em 1991 se iniciou, de forma consistente, um processo de promoção da inovação e de valorização das identidades territoriais e dos recursos endógenos em meio rural”. Em Portugal, até 1993, isso representou o trabalho de 20 grupos de ação local (GAL), com incidência numa área de cerca de 37% do território nacional e 14,3% da população. Na fase do LEADER II registaram-se 48 GAL, abrangendo praticamente o dobro da área e cerca de 33% da população portuguesa, incluindo as ilhas. No período de 2000-2006, o LEADER + apresentou 52 organizações associativas a promover o desenvolvimento local em cerca de 80% do território nacional. O Turismo em Espaço Rural (TER), que passou de cerca de 50% do investimento (de 57%, em termos de execução efetiva) no LEADER I para apenas 26,5% no LEADER II, foi o principal domínio de incidência.
“Trata-se de um Programa que introduziu uma abordagem territorial, integrada e participativa (LEADER I). O LEADER II acrescentou a relevância da inovação (projetos inovadores) e o LEADER + assumiu como elemento fundamental a cooperação e a organização das parcerias a nível local, interterritorial e transnacional” (Moreno, 2005:95, citando Veiga, 2003:6).
“Foram identificadas sete especificidades fundamentais como sendo caraterísticas da abordagem LEADER: 1) a abordagem territorial; 2) a abordagem ascendente; 3) o grupo local; 4) o carácter inovador das ações; 5) a ligação entre as ações (abordagem integrada, multissetorial); 6) a instalação em rede (a nível regional, nacional e europeu) e a cooperação transnacional; 7) as modalidades de gestão e de financiamento. São os resultados produzidos pela combinação destas especificidades que formam aquilo a que chamamos o valor acrescentado da abordagem LEADER” (Moreno, 2005:95, citando Elena Saraceno et al., 1999).
Atualmente, as políticas e os programas orientados para os espaços rurais, são contempladas pelo Programa de Desenvolvimento Rural 2007-2013. Após o acordo sobre o novo Fundo de Desenvolvimento Rural, ocorrido em 2005, todos os países envolvidos tiveram que elaborar Planos Estratégicos Nacionais e Programas Nacionais de Desenvolvimento Rural, que em Portugal ficou a cargo do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas. Nesse sentido, no quadro de apoios preconizados pelo FEADER (Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural), e “distribuídos” pelo território nacional através do QREN (Quadro de Referência Estratégico Nacional), os grandes objetivos a atingir, de 2007 a 2013, são os seguintes: aumentar a competitividade dos setores agrícola e florestal; promover a sustentabilidade dos espaços rurais e dos recursos naturais; revitalizar económica e socialmente as “zonas rurais” (a sua implementação tem como base a metodologia LEADER e as ADL); reforçar a coesão territorial e social; e, promover a eficiência da intervenção das entidades públicas, privadas e associativas na gestão setorial e do território rural.    
            Para uma aplicação dos fundos oriundos do FEADER, e consequentemente do QREN, é fundamental uma estreita relação entre os atores de desenvolvimento local e os municípios; entre os municípios e o Estado; bem como entre o Estado e as Instituições Europeias. Tal relação é também fundamental na gestão dos espaços rurais, pelo que todas as políticas e planos de desenvolvimento têm que ter em conta as especificidades de cada território, tarefa na qual os atores locais devem ter uma palavra a dizer.