PROCESSOS DE MUDANÇA, TURISMO E DESENVOLVIMENTO RURAL: AS ALDEIAS DO XISTO DO CONCELHO DE GÓIS E O PAPEL DA LOUSITÂNEA

PROCESSOS DE MUDANÇA, TURISMO E DESENVOLVIMENTO RURAL: AS ALDEIAS DO XISTO DO CONCELHO DE GÓIS E O PAPEL DA LOUSITÂNEA

Luiz Rodolfo Simões Alves (CV)
Universidade de Coimbra

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Demografia

Neste segundo ponto, destinado a uma análise demográfica do concelho de Góis importa, de certa forma, fazer uma leitura mais ou menos profunda para ser possível compreender as principais caraterísticas, neste domínio, e para poder fazer o histórico da evolução demográfica de Góis e as suas repercussões no espaço.

Evolução e distribuição Demográfica

“ O povoamento inicial consolidou-se a partir do estabelecimento dos aglomerados populacionais ao longo das antigas vias de comunicação fluvial e terrestre, ou em locais estratégicos do ponto de vista defensivo, coincidindo as primeiras com as áreas de maior valia agrícola, do ponto de vista físico” (Carta Educativa do concelho de Góis; 2006:7).
As aglomerações populacionais vieram a ser reforçadas, nalguns casos, pela presença de unidades industriais de dimensão significativa, cuja implantação e desenvolvimento teve, contudo, lugar em períodos distintos ‒ casos de Álvares e Ponte do Sótão ‒ em ambos os casos vinculadas à presença de cursos de água, as unidades industriais em questão encontram-se atualmente desativadas.
A partir da década de 1940 o concelho de Góis vê a sua população residente substancialmente reduzida (Figura 43), no decurso de um processo de êxodo rural e migração. A partir desta Figura, podemos constatar que até aos anos 40 o concelho de Góis (incluindo as suas freguesias) manteve uma tendência evolutiva semelhante à verificada tanto no Distrito de Coimbra, do qual faz parte, como do território de Portugal Continental. A partir de 1940 verifica-se uma rutura com a tendência anterior, sendo que, enquanto o Distrito e o Continente registam uma continuidade da tendência de crescimento (apesar de o primeiro não ser tão intenso quanto o segundo), o concelho de Góis (e as respetivas freguesias) sofre uma inversão dessa mesma situação que se mantém até aos dias de hoje. De referir que, entre 1991 e 2001 o concelho de Góis teve um decréscimo de 511 habitantes o que, para o contexto municipal, é significativo. Por sua vez, no último período intercensitário, verificou-se, mais uma vez, uma redução do efetivo populacional em 601 habitantes, ou seja, decréscimo de 14% entre 2001 e 2011 (de 4861 para 4260 habitantes). Um outro indicador que, efetivamente, vinca essa mesma dinâmica de perda populacional é a densidade populacional, que passou de 37 habitantes/km2 em 1864 para 18 habitantes/km2 em 2001, fixando-se nos 15 habitantes por quilómetro quadrado em 2011.
Como já verificámos, o concelho de Góis, tem vindo a apresentar um decréscimo populacional significativo, como é possível comprovar na Tabela 10, em que, entre 1860 e 1960 se verifica uma variação negativa da população em todas as freguesias do concelho de Góis, com exceção de Vila Nova do Ceira e Álvares que registam uma variação positiva de 8,3% e 10,2%, respetivamente. As restantes freguesias registam decréscimos populacionais entre 24,7%, no Colmeal, e 13,3% em Góis, já o concelho, no total, apresenta uma variação negativa de 5,4% entre 1864 e 1960. Dinâmicas estas que contrastam bastante com as variações registadas no Distrito de Coimbra (com um acréscimo de 53,7%) e ainda mais com os valores registados no Continente (111,2%). Relativamente à variação da população entre 1960 e 2011 a tendência de decréscimo populacional, que já se verificava até meados dos anos 60 do século XX, agravou-se ainda mais neste período, em que nenhuma das freguesias “escapou” a esta dinâmica negativa, com variações negativas entre 30% em Góis e 83% no Colmeal. No contexto geral, o concelho de Góis teve uma variação da população, entre 1960 e 2011, de –56%, o que de facto demonstra bem a dinâmica recessiva que se tem verificado, em termos demográficos, nos espaços rurais portugueses, em geral, e no concelho de Góis, em particular. Por fim, fazendo a “constatação dos factos” para todo o período em análise, entre 1864 e 2011, podemos observar que, neste período de tempo, todas as freguesias tiveram uma variação negativa, em termos populacionais, que varia entre –26% em Vila Nova do Ceira e ‒87% no Colmeal. O concelho de Góis registou uma variação negativa de 59%, tal como a sub-região Pinhal Interior Norte com uma variação de ‒16%, ao contrário da dinâmica registada no total do Distrito de Coimbra (com uma variação positiva de 52%) e no total de Portugal Continental, com uma variação positiva de 156%, entre 1864 e 2001.
Por outro lado, analisando os máximos demográficos de cada unidade geográfica (Figura 44), podemos constatar que as freguesias de Cadafaz, Colmeal e Vila Nova do Ceira atingiram os valores mais elevados de população no ano de 1911, enquanto que a freguesia de Góis teve o seu “apogeu demográfico” em 1920, sendo que, a freguesia de Álvares foi a que atingiu o seu valor máximo de população mais tarde, em 1940. Numa escala de análise mais abrangente verifica-se, ainda, que o concelho de Góis registou o seu máximo demográfico em 1911 (com 12.974 habitantes), sendo que o Pinhal Interior Norte registou tal índice em 1950, o Distrito de Coimbra em 2001 e Portugal Continental no último recenseamento demográfico, em 2011.
Numa análise mais pormenorizada, e comparando os dados do concelho com os dados registados a nível do Distrito e do Continente, podemos constatar que, a partir de 1920 o equilíbrio que se verificava até esta data, entre as três escalas de análise, sofreu uma inversão, registando o concelho de Góis uma queda bastante significativa até 2011 (a um nível semelhante à redução verificada no Pinhal Interior Norte), sobretudo a partir de 1940, ao contrário do que se sucedeu nas outras duas escalas de análise, com destaque para o crescimento bastante significativo do efetivo populacional registado no Continente (Figura 45). 
No que diz respeito à análise por freguesias (de acordo com o índice indicado) (Figura 46), podemos afirmar que, enquanto Álvares (a freguesia até meados do século XX registava o melhor valor) sofreu uma queda bastante significativa, passando Vila Nova do Ceira a registar, a partir daí, o melhor “registo” do concelho. Ainda em trono desta análise, a freguesia do Colmeal corresponde aquela que registou sempre os valores mais baixos, no que diz respeito aos efetivos populacionais. Mas, de facto, no cômputo geral, a grande conclusão que se pode tirar a partir de toda esta análise, de todas as freguesias do concelho de Góis, é a evolução populacional negativa que se verificou sobretudo a partir de 1940, e que até à atualidade ainda não foi possível inverter, como se pode constatar na Figura 46.    

Natalidade e mortalidade

A partir da análise das taxas de natalidade e de mortalidade para o concelho de Góis, referente ao período entre 1960 e 2011 (Figura 47), é possível constatar que a partir da década de 70 (do século XX) se inverte a tendência, que se verificava até então, passando a taxa de mortalidade a registar valores superiores à taxa de natalidade, ou seja, passou a um crescimento natural negativo. Tais dados, vêm confirmar a dinâmica demográfica recessiva que já havíamos identificado anteriormente, coincidindo esse mesmo “cruzamento” a uma quebra acentuada no número de habitantes em Góis, que se verificou na entre 1960 e 1970.  
Migrações
O concelho de Góis, no que diz respeito aos processos migratórios, tem registado maiores índices de saída do que entrada, ou seja, um saldo migratório negativo. Sobretudo, a partir de 1950/60, os processos de saída do concelho intensificaram-se, por vários motivos e que, em conjunto com o crescimento natural negativo que se verificou, também, neste período, levaram a um crescimento efetivo negativo, em que, de década para década as quedas populacionais têm prevalecido, de forma mais ou menos acentuada, no concelho.
A par dos movimentos migratórios há um outro fenómeno que se tem revelado importante ao longo das últimas décadas, a mobilidade intra-concelhia, principalmente com a saída de população das várias aldeias do concelho para a sede do mesmo. Como podemos constatar através da Figura 48, a freguesia de Góis (correspondente à sede de concelho) tem vindo a registar um aumento da sua importância, em termos populacionais, no total do concelho. Sobretudo na transição de 1950 para 1960 essa tendência vincou-se, sendo que, a partir de então e até à atualidade o peso da freguesia sede de concelho tem registado um aumento gradual no total de habitantes de todo o concelho de Góis, passando de cerca de 31% em 1960 para mais de metade do total de população do concelho a concentrar-se na freguesia sede de concelho, com cerca de 51% em 2011.  
Essa tendência é também visível através da análise comparativa da evolução da população absoluta entre o total do concelho e da freguesia sede de concelho (Figura 49). A partir dessa análise constatamos, então, que entre 1950 e 1960, enquanto que o concelho sofre uma queda muito significativa de população, e que se estende até 2011, a freguesia sede de concelho, apesar de sofrer uma queda populacional no mesmo período de tempo, é muito mais ligeira e, até 2011, mantém-se praticamente estável, ao invés do total do concelho, confirmando-se assim a tendência, referida anteriormente, de saída de população das várias freguesias do concelho de Góis para a freguesia sede de concelho.   

Estrutura etária

A análise da estrutura etária do concelho de Góis revela que, ao longo das várias décadas além da dinâmica de despovoamento assiste-se também a uma dinâmica de envelhecimento a dois níveis, um que resulta de um bom sinal, correspondente ao aumento da esperança média de vida das populações (envelhecimento absoluto) e por outro, o envelhecimento que indica uma incapacidade de rejuvenescimento da população, correspondente ao envelhecimento relativo, em que o número de população com mais de 65 anos representa uma grande fatia do total da população do concelho de Góis.
Através da análise das pirâmides etárias (Figura 50) referentes ao concelho de Góis é mais do que evidente a perceção de duas dinâmicas bem marcantes nas áreas rurais em Portugal, no geral, e dos espaços de baixas densidades, em particular (nos quais se encontra o concelho de Góis): em primeiro lugar o progressivo despovoamento e, em segundo lugar, o envelhecimento da população. Em 1900, o concelho de Góis, apresentava uma estrutura etária típica da época em causa, com uma população bastante jovem, em número considerável (principalmente quando comparada com a atual), uma pirâmide com uma base larga e com um topo estreito, algo comparável às pirâmides etárias atuais dos países designados como países emergentes.
Avançando cinquenta anos na análise da estrutura etária do concelho de Góis, em 1950 já apresenta uma forma algo diferente. Apesar de a base da pirâmide ainda ser significativamente mais larga do que o topo, essa dinâmica já não é tão expressiva quanto em 1900, “caminhando” no sentido de apresentar uma forma mais próxima da registada atualmente.
A partir da análise da pirâmide etária referente ao ano de 1991, com uma diferença de cerca de quarenta anos em relação à analisada anteriormente, podemos constatar que as dinâmicas de despovoamento e de envelhecimento da população se intensificaram bastante ao longo deste período de tempo, resultando numa pirâmide praticamente diferente das anteriores, com uma base bastante estreita e um topo significativamente mais largo que a base. É evidente, a partir da análise desta pirâmide etária, que o envelhecimento (que já mostrava essa tendência entre 1900 e 1950) se tornou mais evidente e vincado, sendo claro que o processo de rejuvenescimento da população, a manter-se esta tendência está em causa.   
Para vincar, ainda mais, as tendências já identificadas no concelho de Góis, a evolução entre 2001 e 2011, correspondendo a um período de “apenas” dez anos, demonstra que as evidências já expostas tem vindo a acentuar-se, sucessivamente, de recenseamento em recenseamento sendo que, para o último ano censitário, 2011, a estrutura etária do concelho em análise apresenta uma população fortemente envelhecida e com cada vez menos população jovem e em idade ativa. Se, por curiosidade, fizermos uma observação comparativa entre as pirâmides etárias de 1900 e de 2011, podemos constatar que, em 1900, o número de população entre os 0 e os 14 anos de idade corresponderia, sensivelmente, ao total de população existente em 2011 no concelho de Góis. Por fim, referir ainda que em todas a representações feitas das diversas estruturas demográficas em análise é evidente uma “falha” populacional em algumas camadas da população ativa do concelho o que reflete a característica “repulsiva” deste território (que se traduz em fenómenos migratórios), sobretudo nas idades mais ativas, que foi afetando Góis ao longo das várias décadas do século XX, e que se têm prolongado durante o século XXI.
De facto, a análise da estrutura etária da população revela um coeficiente de dependência excessivo (aproximadamente 49% da população encontra-se em idade não ativa), essencialmente baseado na elevada percentagem da população com idade superior a 65 anos (cerca de 34%), uma das mais altas do Pinhal Interior Norte. Este cenário indica um problema acentuado de rejuvenescimento populacional, evidente na distribuição dos quantitativos populacionais nos diferentes grupos etários. Para além disso, a variação da população por grupo etário no território em análise, reflete um decréscimo em todos os escalões etários, com especial destaque para a população com menos de 14 anos de idade, que diminuiu mais de 30% de 1991 para 2011.