NÚMEROS COMPLEXOS: HISTÓRIA, TEORIA E PRÁTICA

NÚMEROS COMPLEXOS: HISTÓRIA, TEORIA E PRÁTICA

Marcelo Santos Chaves (CV)
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará

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CAPÍTULO I
SURGIMENTO E EVOLUÇÃO

1. O SURGIMENTO E EVOLUÇÃO DOS NÚMEROS COMPLEXOS

Ao longo da história, solucionar equações sempre foi um tema que maravilhoudiversos matemáticos. Na Babilônia, antigos matemáticosobtiveram grandes êxitos em resolver equações do 2º grau fundamentados no que atualmente denominamos de “completamento de quadrado”. Cabe o destaque também dos matemáticos gregos, que exerceramimportantefunçãoprocesso evolutivo da matemática, onde resolviam alguns modelos de equações do 2º grau com o auxilio de régua e compasso. Com o subjugamento da Grécia por Roma praticamente encerrou com o domínio da Matemática Grega.E com a queda do Império Romano em 476 depois de Cristo, e a posterior a ascensão do Cristianismo junto aos povos Bárbaros (francos) no ano 496 D.C, a Europa ingressou na chamada “Idade das Trevas” e o processo evolutivo da Matemática passou a ser protagonizado pelas nações árabes e hindus. Nas pesquisas em Álgebra, os matemáticos hindus evoluíram bastante, sendo Baskara o nome mais marcante no senso comum quando mencionamos equações do 2º grau. Porém a formula de Baskara não foi descoberta por ele, mas sim pelo matemático hindu Sridhara, no século XI (CERRI e MONTEIRO, 2001).

1.1 A PROBLEMÁTICA RAIZ QUADRADA DE -1

Vamos resgatar as conclusões de Baskara no tocante a equação do 2º grau. Dada a equação  com  a formula de Baskara impõem que suas raízes são:

Note que, dependendo de quais valores a, b e c venham a assumir, poderíamos ter como resultado de  um valor negativo. Ante a tal situação, este fato era algo que não preocupava os matemáticos antes do século XVI. Eles simplesmente limitavam-se a afirmar que, sob a ótica do conjunto dos números reais, a equação “não possuía solução”.
Com o advento do regaste neoclássico ocorrido na Europa no século XVI, conhecido na historia como Renascimento, este modo rígido e restrito de pensar uma solução para a equação do 2º com um Delta negativo passou a ser objeto de profundos estudos e debates na Europa renascentista, e nos séculos que se seguiriam.

1.2 ARS MAGNA: UM MARCO HISTÓRICO DO PERÍODO MODERNO

Em 1545, momento áureo da Renascença, o matemático, físico e médico italiano Girolamo Cardano (1501-1576) publicou em 1545 uma obra notável chamada Ars Magna, trazendo grande impacto sobre os algebristas de sua época. Em sua obra, pela primeira vez, foram exibidas as resoluções de equações de 3ª grau (chamadas cúbicas) e de 4º grau (chamada quárticas). Como o próprio Cardano assegurou em sua obra, a sugestão para a solução das equações cubicas foi a ele fornecida pelo matemático italiano Niccolo Tartaglia (1500-1557) e a resolução das equações quárticas tinha sidopreliminarmente descoberta por seu antigo auxiliar Ludivico Ferrari (1522-1565).
A relevância da obra Ars Magna de Cardano foi tão expressiva que o ano de 1545 passou a ser tido como o marco inicial do período moderno da história da Matemática.
A formulaindicada por Cardanopara a resolução das equações cúbicas do tipo ,em Ars Magna, fora:

1.3 AS CONTRIBUIÇÕES DE BOMBELLI

Alguns anos depois, em 1572, um outro matemático italiano, o engenheiro hidráulico Raffaelle Bombelli (1526-1573), publicou uma obra denominada Álgebra, na qual debatia um problema bastante relevante. Ele sabia de antemão, que a equação cúbica do tipo tinha como soluções os seguintes valores:

Entretanto, ao se valer da formula de Cardano, Bombelli encontrava a seguinte expressão:

Como  não é um contido no conjunto dos reais, Bombelli se dispôs a obter os números a e b positivos, tais que:

A partir de sucessivos desenvolvimentos algébricos, Bombelli constatou que  e , pois assim teria . Para isso, começou a operar com o símbolo  da mesma forma como operava com qualquer número real.
Dessa forma, corroborando com Cerri e Monteiro (2001), questões realmente perturbadoras surgiram no mundo matemático do século XVI, e não podiam ser ignoradas, a partir da imperatividade em ter que se operar com . Como pode a raiz quadrada de um numero negativo possibilitar uma solução?! Para o caso em questão, além da extração de raízes quadradas de números negativos, também nos deparamos com uma extração de raízes cúbicas de números de natureza desconhecidas. Quando, nas equações de grau 2º a fórmula de Baskara levava à raiz quadrada de números negativos, era fácil dizer que aquilo indicava a “não existência de soluções”. Agora, entretanto, nota-se que há equações de grau 3 com soluções reais conhecidas, mas cuja determinação passava pela extração de raízes quadradas de números negativos. Isto não ocorre só com esta equação. Neste sentido, não havia como negar que os números reais eram insuficientes para se tratar de equações algébricas. O que estava acontecendo no século XVI era semelhante ao que ocorreu no tempo dos gregos antigos, quando se verificou a insuficiência dos números racionais com a construção do numero , que não era racional: o conceito de número precisava ser estendido.

1.4 AS CONTRIBUIÇÕES DO SÉCULO XVIII E SURGIMENTO DA NOMENCLATURA“i”

A partir dos feitos algébricos de Bombelli, os matemáticos começaram a utilizar em seus postulados raízes quadradas de números negativos e, somente no século XVIII, o matemático suíço Leonhard Euler (1707-1783) estereotipou representar algebricamente  pela letra i. nesta mesma esteira de acontecimentos no século XVIII, Abraham de Moivre (1667-1754) introduziu métodos mais sofisticados na investigação das propriedades dos números complexos, relacionando-os com a trigonometria.

1.5 DE GAUSS À CONSOLIDAÇÃO COM HAMILTON NO SÉCULO XIX

No inicio do século XIX, ante a todo acumulo obtido sobre os números complexos até então, a Europa iria tomar conhecimento em 1799 da representação geométrica dos números complexos no plano, concebida pelo matemático, físico e astrônomo Johann Karl Friedrich Gauss (1777-1855), em sua tese de doutorado ora denominada New Demonstration Of The TheoremThat EveryRational Integral Algebraic Function In Variable Can Be SolvedInto Real Factors Of First Or Second Degree.
Fora Gauss o inventor do termo “Números Complexos”, e em sua tese apresentou uma detalhada explicação de como os números complexos poderiam ser desenvolvidos segundo uma teoria exata, apoiada na representação desses números no plano cartesiano. Antes dele, o matemático suíço Jean Robert Argand (1768-1822) e o matemático norueguês Caspar Wessel (1745-1818) já haviam escrito sobre a representação geométrica dos complexos no plano, porém a pouca representatividade desses matemáticos fez com que seus trabalhos não alcançassem a notoriedade merecida na época.

Finalmente, em 1837, o irlandês William Rowan Halmilton (1805-1865) logrou o ultimo degrau dessas descobertas reconhecendo os números complexos como sendo um par ordenado de números reais (a,b) e reescrevendo as definições geométricas de Gauss na forma algébrica.

Ante a este breve e objetivo resgate histórico e evolutivo dos números complexos, vamos a seguir refletir sobre o que fato fora definido e sistematizado como sendo a Teoria dos Números Complexos na atualidade.