DESENVOLVIMENTO EM ÁREAS DE MONTANHA

DESENVOLVIMENTO EM ÁREAS DE MONTANHA

Paulo Carvalho (CV)

3. Questões e orientações para processos de ensino/aprendizagem

Após a apresentação geral do caso de estudo, no alinhamento dos propósitos pedagógicos que estiveram subjacentes ao texto, importa suscitar algumas questões que possa induzir tarefas de ensino/aprendizagem dentro ou fora da sala de aula. A prossecução deste objetivo decorre em dois níveis.
No plano teórico, através de discussão em contexto de sala de aula, a partir de debates, ensaios escritos individuais ou em grupo, sugerimos as seguintes questões:
Questão nº. 1. Explique de que forma o património pode ser utilizado como âncora para processos de requalificação territorial e revitalização económica e social em territórios de baixa densidade como as áreas rurais e as montanhas.
Questão nº. 2. Explicite o papel do planeamento das intervenções (em particular o turismo) para a prossecução dos objetivos da sustentabilidade e coesão no contexto geográfico referido.
No domínio operativo, através de trabalho de campo, incidindo em territórios que foram objeto de programas, planos e intervenções desde meados dos anos 90 (século XX), como as Aldeias do Xisto, ou a partir de outros exemplos como as Aldeias Históricas, as Aldeias Ribeirinhas de Alqueva, as Aldeias Vinhateiras do Douro e as Aldeias com Castelo do Algarve, ou ainda através de exemplos paralelos em outros contextos geográficos e políticos, sugerimos que encontre resposta para as seguintes questões:
Questão nº. 3. Relacione os objetivos dos instrumentos de gestão territorial que suportaram as intervenções, as dinâmicas territoriais, económicas e sociais do(s) lugar(es) intervencionados e a emergência de novos atores.
Questão nº. 4. Identifique novas janelas de oportunidade (programas, eixos e medidas) para os territórios no âmbito do novo quadro de implementação das políticas públicas para o desenvolvimento regional (2007-2013), centrando a reflexão nas áreas do património e dos lazeres turísticos.

Para concluir, apresentamos sugestões de resposta às questões formuladas, a saber:
Questão nº. 1. O património, na sua amplitude conceptual, tem sido utilizado como âncora no âmbito de diversas políticas e instrumentos de promoção do desenvolvimento regional e local, em especial desde o início dos anos 90 (século XX). As grandes linhas de ação contemporânea compreende também a reconstrução de memórias e identidades, a requalificação e renovação da imagem dos territórios e as ações (formais e informais) de educação patrimonial, tendências alinhadas com as orientações, recomendações e outros textos juridicamente vinculativos dos principais organismos internacionais nesta matéria, designadamente a UNESCO e o Conselho da Europa, que por sua influenciaram de modo profundo a evolução conceptual do património e contribuíram para uma certa convergência dos critérios reguladores e da terminologia atualmente utilizada. Hoje, o património é indissociável de uma visão integrada, territorial e dinâmica do património em que os seus elementos apresentam tipologias, escalas e contextos diversos.
A crescente ligação do património aos novos usos do território e aos valores da sociedade pós-moderna deve, igualmente, ser relacionada com o quadro das orientações recentes das políticas públicas de desenvolvimento e dos instrumentos relativos à intervenção espacial, nomeadamente a centralidade do território e as novas formas de gestão territorial.
Os territórios de baixa densidade, em particular as áreas rurais e as montanhas, uma vez que suscitam preocupações prioritárias de intervenção, emergem no centro de políticas, instrumentos e intervenções impulsionadas pelo Estado, agora que deixaram de ser olhados e sentidos apenas na ótica das suas capacidades produtivas.
Com efeito, o quadro evolutivo das políticas europeias para o mundo rural traduz a transição de um modelo orientado para o setor agrícola em direção a um modelo centrado na sociedade rural e na estruturação das suas paisagens, com a crescente valorização de novos recursos e uma maior (inter)dependência da sociedade urbana.
Nesta atmosfera de abertura e diversificação funcional, o turismo emerge como uma oportunidade para requalificar e revitalizar os territórios de baixa densidade (como acontece com a maioria das áreas rurais e das montanhas), melhorar a qualidade de vida das populações e valorizar os seus recursos mais relevantes, nomeadamente o património (natural e cultural).
Assim, o património destaca-se como recurso diferenciador dos territórios e como elemento estratégico no desenho de novos produtos destinados a captar segmentos específicos da procura turística. Ora, as novas tendências que marcam o comportamento dos turistas, sublinham que os turistas são hoje mais ativos e participativos, têm interesses mais diversificados e segmentados, são cada vez mais exigentes e menos influenciados pelas perspetivas da oferta massificada, são mais esclarecidos e informados, e começam a valorizar os produtos e os destinos turísticos mais respeitadores dos recursos.
Contudo, a participação do turismo, com base nos recursos ecológicos e culturais, nas estratégias de desenvolvimento territorial, pressupõe planeamento e deve ter como suporte políticas e instrumentos integrados.

Questão nº. 2. A importância crescente da dimensão territorial no quadro das políticas públicas e o seu reconhecimento como eixo vertebrador do desenvolvimento sustentável contribuíram para repensar o valor estratégico do planeamento em diversas atividades alicerçadas na utilização de recursos finitos e, em alguns casos, não renováveis, como é o caso do turismo. A dimensão espacial do turismo e em particular as suas externalidades negativas conduziram ao reconhecimento da necessidade de repensar a atividade turística segundo uma ótica alicerçada na relação qualidade/continuidade. O forte crescimento do número de turistas (nacionais e internacionais) e a expressão urbanística do lazer e do turismo são outros argumentos de peso que justificam as preocupações atuais em matéria de sustentabilidade e planeamento da atividade turística. Assumindo o planeamento como uma ferramenta indispensável das políticas de promoção do desenvolvimento sustentável, podemos afirmar que a transposição dos seus princípios nucleares para o campo do turismo pretende, no essencial, salvaguardar recursos, criar e distribuir benefícios, e envolver as populações locais. Planear o turismo é uma condição necessária para a organização, a viabilidade e a sustentabilidade da própria atividade, e a sua evolução em harmonia com os pilares do desenvolvimento sustentável designadamente as vertentes económica, social, cultural e ambiental.
No caso específico das áreas de montanha, a diversidade de recursos e bens estratégicos fundamentais, assim como a importância das atividades desenvolvidas pelo homem, tornam ainda mais recorrente a questão do planeamento e da promoção do desenvolvimento sustentável das montanhas e das comunidades que aí vivem. O risco e a vulnerabilidade que está associado às áreas de montanha, ou a modificação dos tipos e padrões de uso da montanha e a sua paisagem, exigem a definição e articulação de políticas e instrumentos orientados para o uso diversificado e para a participação comprometida dos habitantes e atores locais.
A necessidade de instrumentos adaptados às especificidades da montanha exige um maior comprometimento e articulação entre as diferentes políticas que interferem no desenvolvimento das regiões de montanha.
Para além disso o turismo sustentável de áreas de montanha deve: permitir o usufruto do território velando pela sua conservação (nomeadamente, em termos de ambiente, paisagem e recursos, com especial destaque para a biodiversidade e geodiversidade); oferecer um alojamento específico capaz de conjugar formas variadas que vão desde a hotelaria clássica até às Casas de Natureza, passando pelo Turismo em Espaço Rural; privilegiar a gastronomia tradicional e típica de cada região; promover os produtos locais tradicionais; divulgar o património histórico-cultural da região; fazer da interpretação e animação ambiental um traço fundamental da sua essência.
A prossecução destes objetivos significa também um processo de mudança de atitudes e comportamentos quer ao nível do planeamento territorial quer no âmbito da educação para o desenvolvimento sustentável. Na primeira situação, está em causa a adoção de uma nova política de planeamento territorial integrado e uma nova política de infraestruturas adaptadas às características de cada região; no segundo caso, importa considerar o conhecimento e a ação como um binómio indissociável que acompanha a adoção de novas atitudes alicerçadas em pensamento crítico, eticamente referenciado e comprometido.

Questão nº. 3. Esta pergunta pretende suscitar o contacto com os instrumentos de gestão territorial que serviram de base para as intervenções, como os Programas Operacionais Regionais e os Planos de Aldeia, no sentido de ajudar os alunos a compreender as características estruturantes das regiões e dos territórios em estudo; a analisar de forma crítica os objetivos, as orientações e as linhas de ação para o seu desenvolvimento; a averiguar a execução dos planos e os principais resultados das intervenções, com especial incidência no domínio das infraestruturas, equipamentos, espaços públicos, estruturas edificadas (número de imóveis intervencionados, tipologia de utilização e ocupação) e atividades económicas (comércio, restauração, artesanato, alojamento turístico, animação turística, entre outros), atração de novos residentes (permanentes e sazonais) e visitantes (excursionistas e turistas); identificar a emergência de novos atores institucionais e iniciativas de desenvolvimento induzidas pelos instrumentos de gestão territorial que estiveram na base das intervenções.

Questão nº. 4. No caso em análise, as novas janelas de oportunidade, no contexto do atual período de programação e execução das políticas públicas, por sinal mais exigente em matéria de integração, cooperação, parcerias e gestão, estão relacionadas com programas como, por exemplo, o PROVERE e o PRODER.
O PROVERE (Programa de Valorização Económica de Recursos Endógenos), no âmbito do Quadro de Referência Estratégico Nacional (2007-2013), é um instrumento desenvolvido pelo Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional que pretende estimular iniciativas de melhoria da competitividade territorial dos territórios de baixa densidade, através de um consórcio formado por entidades públicas e privadas, a partir de recursos singulares como o património natural e o património cultural.
A iniciativa “BuY NATURE – Turismo Sustentável em Áreas Classificadas” é uma das oito candidaturas aprovadas pelo Programa Operacional da Região Centro (2007-2013) para as ações preparatórias do PROVERE. Esta iniciativa, coordenada pelo Instituto de Conservação da Natureza e da Biodiversidade (com base numa rede de parceiros públicos e privados dos territórios envolvidos, entre os quais se encontram a ADXTUR, a Associação das Aldeias Históricas de Portugal e a Naturtejo), pretende potenciar os recursos endógenos do património natural das áreas classificadas de montanha da Região Centro – complementados pelo respetivo património cultural – através da implementação de uma estratégia de base territorial alicerçada no turismo de natureza, no desporto de natureza e no turismo ativo, que se afirme com uma iniciativa que reforce a competitividade do território, com características inovadoras e sustentável.
Ainda neste contexto, segundo a página WEB das Aldeias do Xisto, a própria ADXTUR, em janeiro de 2009, apresentou uma candidatura ao PROVERE através de uma parceria com mais de 160 entidades territoriais (de 24 municípios). Esta proposta, para o período 2009-2012, representa um investimento de quase 150 milhões de euros (cerca de 70% do qual corresponde aos agentes privados), e apresenta como eixos de ação, a regeneração urbana das aldeias e revitalização do património rural construído; a valorização turística (infraestruturas e serviços); a animação turística (serviços e infraestruturas nas Aldeias e noutros contextos geográficos promocionais; o marketing e a comunicação territorial (para afirmar a marca Aldeias do Xisto, enquanto destino turístico de qualidade, no mercado turístico nacional e internacional); a criação de um centro de valorização e de inovação (recursos humanos, empresas e novos produtos); a consolidação da Rede de Lojas Aldeias do Xisto; a gestão e a promoção integrada da Rede de Praias Fluviais Aldeias do Xisto; a valorização ambiental dos recursos naturais; a requalificação do tecido urbano das vilas sede de concelho das Aldeias do Xisto, e o reforço do sistema de mobilidade (meios de transporte) do Pinhal Interior.
No âmbito do PRODER (Programa de Desenvolvimento Rural do Continente), o seu eixo 3 pretende dinamizar as áreas rurais, através de duas medidas.
A medida 3.1 (“diversificação da economia e criação de emprego”) será concretizada através de ações como a diversificação de atividades na exploração agrícola (mediante atividades económicas de natureza não agrícola, em áreas como o turismo em espaço rural, o turismo de natureza, atividades associadas à caça e pesca em águas interiores, entre outras), a criação e o desenvolvimento de micro-empresas (tendo em vista a densificação do tecido económico e a criação de emprego e, deste modo, contribuir para a revitalização económica e social do mundo rural), e o desenvolvimento de atividades turísticas e de lazer (nas componentes de produtos turísticos, nomeadamente ecoturismo, enoturismo, turismo associado a atividades de caça e pesca, turismo equestre, turismo religioso, turismo de saúde, turismo cultural; alojamento turístico de pequena escala nas modalidades de turismo em espaço rural e turismo de natureza; e infraestruturas de pequena escala, tais como, centros de observação da paisagem, rotas/percursos, animação turística).
A medida 3.2 (“melhoria da qualidade de vida”) incluirá ações em dois domínios: a conservação e valorização do património rural (preservação, refuncionalização e valorização da cultura local), e os serviços básicos para a população rural, designadamente os serviços de apoio à infância, o acompanhamento domiciliário a idosos e deficientes, serviços itinerantes de apoio social, e serviços de animação cultural e recreativa de base local.
A implementação deste eixo, segundo a metodologia LEADER, conduzirá a novas oportunidades para os territórios e as populações/atores rurais (agricultores ou membros do seu agregado familiar, micro-empresas, pessoas singulares ou coletivas de direito privado, autarquias, parcerias privadas, parcerias entre entidades públicas e privadas cuja componente pública não seja maioritária, instituições particulares de solidariedade social e organizações não governamentais), através de apoios concedidos sob a forma de incentivo não reembolsável até uma despesa elegível de 200.000 euros (por projeto). O nível de apoio aos projetos de investimento no quadro da medida 3.1 é variável, de 30 a 60%, de acordo com o montante do investimento total e a criação de postos de trabalho, e no âmbito da medida 3.2 está balizado entre 60% e 70% do montante de despesa elegível (sem outro condicionamento).

Para os leitores que pretendam aprofundar a temática abordada e a problemática suscitada neste caso de estudo, sugerimos a leitura das seguintes referências bibliográficas:

ALVERGNE, C. et TAULELLE, F. (2002): Du local à l’Europe. Les nouvellles politiques d’aménagement du territoire. Paris, PUF.
ASHWORTH, G. and GRAHAM, B. (2005): Senses of Place: Senses of Time (Col. Heritage, Culture and Identity). Aldershot, Ashgate.
BRUNET ESTARELLAS, P. et al. (2005): “Agenda 21: subsidiariedad y cooperación a favor del desarrollo territorial sostenible”. Boletín de la A.G.E. (Asociación de Geógrafos Españoles), nº 39, pp. 423-446.
CARVALHO, A. (2006): “Programa das Aldeias do Xisto: caminhos para o Turismo de Natureza”. Revista Turismo & Desenvolvimento, nº 6, pp. 27-30.
CARVALHO, P. (2009): “Planeamento, turismo e património em territórios de baixa densidade”. Biblos (Revista da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra), Vol. VII (2ª série), pp. 485-506.
CCRC, 2001: Programa Operacional da Região Centro: 2000-2006. Coimbra, Comissão de Coordenação da Região Centro.
COVAS, A. (2006): “A ruralidade do nosso tempo: decálogo da para uma 2ª modernidade”. In FONSECA, M. L. (coord.): Desenvolvimento e território. Espaços rurais pós-agrícolas e novos lugares de turismo e lazer. Lisboa, Centro de Estudos Geográficos, 107-126.
HALL, C. (2000): Tourism Planning. Policies, Process and Relationships. Harlow, Prentice Hall.
HALL, D.; ROBERTS, L. and MITCHELL, M. (eds.) (2003): New Directions in Rural Tourism. Aldershot, Ashgate.
MORENO, L. (2007): Desenvolvimento Territorial – de um sentido ocidental às orientações coesivas para um meio rural inovador. Caminhos e Caminhantes. Lisboa (e-book a partir da dissertação de doutoramento apresentada à Universidade de Lisboa, em 2002).
PLAZA GUTIÉRREZ, J. I. et al. (2003): “Nueva cultura y gobierno del territorio en Europa”. Ería (Revista de Geografia), nº 61, pp. 211-227.
PRICE, M. (2007): Mountain Area Research and Management. Integrated Approaches. London, Earthscan.