CONSERVAÇÃO IN VITRO E EX SITU E VALORIZAÇÃO DE ENDEMISMOS IBÉRICOS DAS APIACEAE PORTUGUESAS

Ana Cristina Pessoa Tavares dos Santos

Floração in vitro de D. carota subsp. halophilus

 Durante os ensaios de micropropagação de D. carota subsp. halophilus verificou-se, em alguns casos, a formação de flores nos rebentos caulinares formados in vitro. Com o objetivo de determinar as condições que levavam a este tipo de organogénese foram realizados ensaios com vista à determinação das condições de floração.

Indução da floração

Segmentos nodais de plantas silvestres foram utilizados como explantes (Fig. 19a) e cultivados em meio MS + 1,5 mg/L BA + 0,5 mg/L IAA, de acordo com a metodologia descrita. Decorridas 4 semanas de cultura observou-se a formação de calos de crescimento reduzido e o desenvolvimento de rebentos (Fig. 19b).

Após 2 meses de cultura, os rebentos caulinares foram subcultivados no mesmo meio e, decorridos mais 2 meses de cultura, era notório o aparecimento de inflorescências (Fig. 19c), que evoluiram atingindo o desenvolvimento máximo por volta das 4 semanas de cultura (Figs. 19d, 19e).
Os resultados mostraram que quando a parte basal (Fig. 20a) da zona de proliferação dos rebentos florais foi subcultivada nas mesmas condições (MS + 1,5 mg/L BA + 0,5 mg/L IAA) verificou-se novamente a formação de rebentos onde, decorridas 4 semanas se voltavam a formar inflorescências, nas mesmas condições que foram acima descritas (Figs. 20a-c). Estes ciclos de floração puderam se repetidos sempre que se procedeu ao isolamento e cultura da parte basal dos rebentos caulinares (Fig. 20a), induzindo-se assim a formação de novos ciclos de floração (FIg. 20c), a cada 4 semanas, tendo as culturas mantido este potencial por mais de 3 anos.
A parte basal dos rebentos (seta da Fig. 20a) foi de novo inoculada em meio com a mesma composição; a parte apical, com as umbelas, foi inoculada em meio base MS (Fig. 20b-seta do tubo da direita), onde ocorreu o desenvolvimento da umbela. A parte mediana contém segmentos nodais (meristemas axilares) que se inocularam no mesmo meio ou em meio com BA, para proliferação.
Decorridas quatro semanas observaram-se os novos rebentos em floração (Fig. 20c).
Verificámos que nas plantas com flores, cultivadas em meio base, os frutos não tinham as sementes formadas e, até um mês nesse meio, acabavam por secar e morrer.

A análise morfológica permitiu observar as diferentes fases deste tipo de morfogénese, tendo sido definidas 4 fases de desenvolvimento das umbelas, indicadas na Figura 21. Essas fases foram designadas: 1) umbela fechada (Fig. 21a), 2) umbela com pétalas visíveis verdes, mas ainda fechadas (Fig. 21b), 3) umbela com pétalas visíveis brancas mas ainda fechadas (Fig. 21c) e 4) umbela com flores abertas e com os estames expostos (Fig 21d).

Efeitos de diferentes PGRs na floração

Utilizando o modelo de indução floral descrito, testou-se o efeito do IAA e da BA na formação e desenvolvimento das inflorescências. Assim, os explantes foram culttivados no meio controlo (MS) e em meios contendo apenas IAA (0,5 mg/L), BA (1,5 mg/L) ou a combinação dos dois PGRs. Os resultados estão expressos na Figura 22 e mostram que o meio com ambos os PGRs originou o maior número de inflorescências (155), enquanto os piores resultados (47 inflorescências) foram obtidos no meio contendo apenas BA (Fig. 22).
 O tratamento 1 (Fig. 22) refere-se aos resultados da floração no meio base MS, ou no meio com IAA, ou com BA, de culturas provenientes do meio inicial, com os dois PGRs (BA + IAA).

Para além da indução floral, verificou-se que o meio de cultura afeta também o desenvolvimento das flores, tendo-se verificado que o meio com IAA, e o meio base MS, permitiram um melhor desenvolvimento das inflorescências que o meio com BA ou o meio com os dois PGRs. De facto, nestes últimos meios, não foi possível observar o desenvolvimento das quatro fases das inflorescências, ou seja a abertura das flores nas umbelas, o que no entanto se verificou no meio controlo, em que ocorreram todas as fases florais, e também no meio com apenas auxina, onde se verificou o máximo de inflorescências abertas, a fase morfológica mais adiantada (Fig. 23).

Para avaliar o efeito isolado de IAA e BA na indução e na evolução morfológica das umbelas e se o meio onde os rebentos eram mantidos influenciava a resposta posterior, foi realizada uma segunda fase de experiências (Figs. 25 e 26), com o mesmo tempo de cultura.
Na sequência da experiência anterior, os explantes mantidos em IAA, quando subcultivadas no mesmo meio, produziram a maior quantidade de inflorescências (120) (Fig. 25), observando-se neste meio a formação das quatro fases morfológicas, com grande quantidade de flores abertas (75) (Fig. 26). No entanto, os explantes em meios com IAA quando subcultivados em meios com BA, produziram o menor número de inflorescências (40) (Fig. 25). Esta situação também ocorreu nas culturas em MS, quando os explantes foram subcultivados em MS, onde se observou o maior número de inflorescências (105) (Fig. 25), a maioria na fase morfológica mais avançada, flores abertas (67) (Fig. 26).
A resposta foi muito semelhante a esta última quando os explantes do meio MS foram subcultivados em meio com BA, mas observou-se menor quantidade de inflorescências produzidas (60 vs 105) (Fig. 25). Os explantes provenientes de BA, quando subcultivados em meio MS desenvolveram a maioria das inflorescências na fase um, fechadas (80) (Fig. 26), mas o número total de inflorescências foi menor do que na subcultura dos explantes do meio com BA para meio com IAA (75 vs 90) (Fig. 25), indicando que IAA será necessária para promover a indução de flores.

Para além da BA e IAA testou-se ainda o efeito do GA3 e da sacarose na indução e desenvolvimento floral. Os resultados estão expressos nas Tabelas 17 e 18. Como se pode observar, o GA3 favoreceu a formação de umbelas, em maior número relativamente ao meio base, embora o valor máximo de indução tenha ocorrido na menor concentração (Tabela 17).

Tabela 17: Efeito da concentração de ácido giberélico (GA3) na indução da floração in vitro de Daucus carota subsp. halophilus.


GA3 (mg/L)

Nº de explantes cultivados

Indução (%)

Nº de inflorescências/explante*

0

40

25,0

0,25 ± 0,05

0,5

45

42,2

0,42 ± 0,04

1

45

40,0

0,40 ± 0,07

2

49

28,6

0,28 ± 0,06

Total

179

34,1

61

* Cada valor é a média com erro padrão de três réplicas.

Relativamente à ação da sacarose os resultados obtidos são muito irregulares, verificando-se apenas que no meio com a concentração de 6% se produziu o maior número de umbelas (Tabela 18).

Tabela 18: Efeito da concentração da sacarose na indução da floração in vitro de Daucus carota subsp. halophilus.


Sacarose (%)

Nº de explantes cultivados

Indução (%)

Nº de inflorescências/explante*

0

40

30,0

0,31 ± 0,06

6

46

41,3

0,39 ± 0,12

9

41

9,8

0,10 ± 0,02

12

48

20,8

0,20 ± 0,07

Total

175

25,7

45

* Cada valor é a média com o erro padrão de três réplicas.

Em todos os meios testados se observou o desenvolvimento dos quatro estágios morfológicos sem anomalias morfológicas.

Caracterização das flores formadas in vitro

A análise das flores formadas in vitro mostrou que elas eram estruturalmente semelhantes às flores fomadas pelas plantas em condições naturais, à exceção das dimensões, que se verificou serem muito mais reduzidas nas primeiras (Fig. 27). Assim, as flores formadas in vitro assemelhavam-se a miniaturas das formadas naturalmente.

A análise por SEM permitiu também seguir as diferentes fases de diferenciação das inflorescências. Em rebentos caulinares em desenvolvimento (até 1 semana de cultura), verificou-se que o meristema apical caulinar estava presente (Fig. 28a) e o seu funcionamento originava um grande número de primórdios foliares (Figs. 28 b, 28c, 28d).

 De acordo com as observações efetuadas, a transição do meristema vegetativo para meristema inflorescencial (evocação floral) parece ocorrer entre os 7 a 10 dias de cultura, pois foi durante este período que se observou uma alteração na organização do meristema apical (Figs. 29a, 29b), apresentando-se este com maiores dimensões e originando um tipo de estruturas laterais diferentes dos primórdios foliares, de forma globosa (Figs. 29a, 29b). Essas estruturas apresentavam-se como massas laterais de células representando, provavelmente, novos meristemas inflorescenciais que dão origem às diferentes umbelas (Fig. 29c, 29d) que se formam em condições naturais (Fig. 29e).

Em cada inflorescência (Fig. 30a), o meristema inflorescencial produzia lateralmente um número considerável de meristemas florais (Fig. 30b) os quais originavam, por sua vez, os diferentes órgãos florais em fases mais adiantadas da cultura, por volta dos 15 a 20 dias (Figs. 30c, 30d).

Para complementar as figuras de SEM apresentam-se as observaçãoes das flores à lupa (Fig. 31), onde se analisa melhor o aspeto geral da morfologia das flores, em diferentes fases.

À semelhança do aspeto geral das flores verificou-se que, para além do tamanho, também a morfologia das estruturas reprodutoras (estames e carpelos) era semelhante nas flores formadas in vitro e in vivo. Assim, verificou-se que o gineceu era constituído por dois carpelos em ambos os tipos de plantas (Fig. 32a, 32b). No entanto, nas flores formadas in vitro, nunca foi possível observar a formação de embriões, que pudemos observar nas plantas silvestres (Fig. 32c), o que sugere que embora os órgãos reprodutores sejam morfologiacamente normais a sua funcionalidade é afetada pelas condições de cultura in vitro.

Análise do pólen

Com o objetivo de caracterizar o pólen formado in vitro procedeu-se à observação dos grãos de pólen maduros após esmagamento das anteras em carmim ou em DAPI. No caso do DAPI a fluorescência emitida era, na maior parte dos casos, muito fraca tendo sido difícil visualizar os diferentes núcleos. No entanto, algumas observações mostraram a presença de 3 núcleos de dimensões semelhantes, embora um ligeiramente maior que os outros dois (Fig. 33a). Esta observação parece sugerir uma divisão do núcelo generativo para formação dos dois gâmetas sem que ocorra formação do tubo polínico.
Observações semelhantes foram obtidas com carmim acético (Fig. 33b). Os grãos de polén foram estudados em umbelas com as flores enroladas e pétalas verdes (fase 2). O aspeto geral do pólen formado in vitro era muito idêntico ao pólen formado em condições naturais, embora neste nunca tenham sido observados três núcleos mas apenas dois correspondentes ao núcleo generativo e vegetativo (Fig. 33c).

Tentativas para conseguir a germinação do pólen in vitro foram infrutíferas, mesmo utilizando concentrações de sacarose da ordem dos 18%. No entanto, a germinação do pólen de plantas a crescer no campo também não foi conseguida. De referir ainda que no caso da polinização artificial das flores formadas in vitro não foi possível conseguir a germinação dos graõs de pólen (quer produzido in vitro, quer em condições naturais) no estigma.

Estudos histológicos

Os estudos histológicos realizados nos explantes cultivados para indução de floração (tempo 0) mostraram a existência de meristemas axilares formados por células muito vacuolizadas (Fig. 34a-d). Em alguns casos esse meristemas apresentavam já algum desenvolvimento tendo originado novos rebentos em formação (Fig. 34b), também formados por células com uma acentuada vacuolização. Estes meristemas são os responsáveis pela proliferação de rebentos, descrita na secção 3.2.1.6.1. Um aspeto interessante que se observou foi a formação de meristemas adventícios próximos dos meristemas axilares (Figs 34c, 34d). À semelhança dos meristemas axilares este tipo de meristemas era também formado por células muito vacuolizadas, sendo facilmente observáveis as ligações vasculares destes meristemas aos tecidos subjacentes (Fig. 34d). Estes meristemas surgiam isoladamente ou em grupos (Fig. 34d) sendo provavelmente responsáveis pela elevada proliferação de rebentos observada nesta espécie, o que também significa que parte dos rebentos terá origem não em meristemas axilares mas sim em meristemas adventícios.

As observações realizadas entre 4 e 7 dias de cultura mostraram o desenvolvimento dos meristemas axilares e a concomitante origem de rebentos caulinares (Fig. 35). Em virtude destes meristemas axilares assumirem agora uma posição na extremidade dos rebentos serão a partir daqui designados por SAM (shoot apical meristem). Em termos de organização estes meristemas eram muito similares aos descritos no tempo zero, sendo caracterizados pela presença de células muito vacuolizadas (Fig. 35 a) e por uma camada L1 muito nítida que se demarcava claramente das restantes células do meristema (Fig. 35a, 35b). Estes meristemas originavam lateralmente meristemas axilares (Fig. 35a). No entanto, em algumas secções analisadas (em particular aos 7 dias de cultura) verificou-se a presença de zonas meristemáticas com características diferentes. Assim, em alguns casos, os meristemas apicais apresentavam maiores dimensões (Fig. 35c) e ocorria uma zona de transição formada por células mais achatadas entre o meristema e os tecidos subjacentes (Fig. 35c). Noutros casos, foi possível observar zonas meristemáticas com células pouco vacuolizadas, de citoplasma denso e de núcleos volumosos (Fig. 35e). Ao contrário do verificado nos meristemas vegetativos, estes meristemas não apresentavam uma camada L1 tão diferenciada relativamente às restantes e os planos de divisões observados não eram exclusivamente anticlinais (Fig. 35e). Estas observações representam, provavelmente, a modificação do meristema vegetativo para meristema floral, um conjunto de alterações vulgarmente conhecido por evocação floral.

Após 11 dias de cultura, a parte apical dos rebentos apresentava já uma organização típica da fase de floração, com a presença de um meristema inflorescencial e de meristemas laterais do tipo floral (Fig. 36a). O meristema inflorescencial apresentava o mesmo tipo de características descritas no parágrafo anterior embora com a camada L1 mais bem definida e com as células apresentando um maior grau de vacuolização (Fig. 36b). Os meristemas laterais (florais) surgim como massas de células globosas (ver Fig. 30a) sem uma diferenciação muito nítida e formadas por células de tipo meristemático (Figs. 36 a, 36c). Em fases mais adiantadas, para além das duas semanas de cultura, os meristemas florais diferenciaram flores onde se podia observar a diferenciação dos órgaõs florais (Fig. 36d).

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