PROCESSOS DE MUDANÇA, TURISMO E DESENVOLVIMENTO RURAL: AS ALDEIAS DO XISTO DO CONCELHO DE GÓIS E O PAPEL DA LOUSITÂNEA

PROCESSOS DE MUDANÇA, TURISMO E DESENVOLVIMENTO RURAL: AS ALDEIAS DO XISTO DO CONCELHO DE GÓIS E O PAPEL DA LOUSITÂNEA

Luiz Rodolfo Simões Alves (CV)
Universidade de Coimbra

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Lousitânea e a sua importância enquanto ator dinamizador das Aldeias do Xisto de Góis

Objetivos, estrutura orgânica e valências

As Associações de Desenvolvimento Local (ADL) têm sido a estrutura preferencial de organização da sociedade civil para assumir um papel ativo no processo de desenvolvimento dos territórios. Estas Associações são, na maior parte das vezes, constituídas de parcerias, com atores públicos e privados, que reúnem vários agentes económicos, sociais e institucionais podendo ser, em outros casos, constituídas e criadas em torno de uma ideia ou para um fim muito específico. Para além disso, têm tido um papel de crescente intervenção no âmbito de diferentes programas de apoio ao desenvolvimento, cumprindo projetos específicos nas suas áreas de influência. As iniciativas instituídas por estas organizações apresentam uma dimensão multidimensional e multidisciplinar muito importantes tendo como objetivo, a nível local, dar resposta a um âmbito de atuação específico contribuindo, de forma paralela, para a amenização de algumas necessidades de âmbito económico e social, a vários níveis, podendo funcionar como uma fonte de emprego e um instrumento para o desenvolvimento da solidariedade a nível local.
No que diz respeito às ADL, estas “agem em função de interesses de âmbito local (uma vezes concelhio mas outras vezes abrangendo vários concelhos vizinhos), possuindo um campo de intervenção muito alargado, desde o apoio às atividades económicas até à vida cultural e recreativa, etc. A autonomia da sua intervenção é elevada, dependendo, naturalmente, dos interesses dos respetivos associados” (Albergaria; 2002:206). As ADL envolvem e promovem, ainda, outras intervenções de carácter social, na qualificação dos agentes dos territórios, na cooperação interterritorial (de escala nacional e internacional) e até em processos de cooperação descentralizada para o desenvolvimento. Estas têm tido a capacidade de se envolver na gestão local de fundos comunitários, com eficácia e eficiência, e na dinamização de processos de animação territorial através da participação cívica dos agentes constituintes do tecido local, sob a forma de parcerias.
De facto, além de dinamizarem os seus territórios de intervenção, de promoverem a qualificação da oferta, do apoio técnico prestado aos promotores de projetos privados, de estimularem e de, por vezes, se assumirem como pontes para a potenciar a constituição de parcerias e de redes de cooperação para a promoção, divulgação, comercialização e troca de experiências (entre muitas outras iniciativas), as Associações de Desenvolvimento Local têm assumido, também, um papel fundamental e indutor da inovação territorial em favor do desenvolvimento local.
As Associações de Desenvolvimento Local têm identificado o turismo rural, de forma particular, como o principal indutor de desenvolvimento nos espaços rurais criando, a partir do turismo, um efeito consequente que possa alavancar a criação e integração de outras atividades no território que, no conjunto, possam criar uma rede local e regional de atores capazes de induzir o desenvolvimento pretendido nas áreas rurais. De facto, a dinamização da atividade turística tem tido um impacto direto nas economias locais, sendo muitas vezes o mote para a criação de outras iniciativas de caráter ambiental e paisagístico que se refletem, também, na (re)construção ou consolidação da identidade dos territórios e na respetiva coesão social e desenvolvimento económico (Teixeira, 2013).
É assim, neste contexto, que se integra a Lousitânea – Liga de Amigos da Serra da Lousã, associação privada sem fins lucrativos, com sede1 na Aldeia do Xisto da Aigra Nova (freguesia e concelho de Góis), que tem como finalidade promover atividades de conservação da natureza, valorizar o património cultural rural (etnográfico, histórico, gastronómico, artesanal, identitário, entre outros) e promover atividades de animação turística, desportiva, educativa, económica e social no espaço geográfico da região da Serra da Lousã e nos territórios seus constituintes, incidindo a sua atuação, de forma mais intensa e consequente nos concelhos de Góis, Castanheira de Pera e Lousã, intervindo ainda, embora de forma menos profícua do que nos territórios enunciados anteriormente, nos concelhos de Figueiró dos Vinhos, Miranda do Corvo, Pampilhosa da Serra, Pedrógão Grande e Penela.
A Lousitânea foi fundada a 3 de dezembro de 20032 , em Castanheira de Pera, tendo na sua génese um ideal organizacional que propunha uma visão e um âmbito de atuação transversal sobre a totalidade do território da Serra da Lousã. Após a sua fundação foram enveredados esforços com o intuito de estabelecer contactos com cidadãos dos municípios de Castanheira de Pera, Lousã e Góis, bem como com os respetivos executivos das Câmaras Municipais, com o claro desígnio de envolver os múltiplos atores do território, quer na captação de apoios institucionais quer no envolvimento de todos nos projetos e na atuação da associação. Porém, por escassez de apoio financeiro e material por parte dos municípios de Castanheira de Pera e da Lousã, a Lousitânea, mudou a sua sede e centrou o seu âmbito de atuação e as suas atividades no concelho de Góis, numa primeira fase com sede instalada na vila de Góis e, mais tarde, em 2009, com sediação na Aldeia do Xisto da Aigra Nova, local onde se encontra até aos dias de hoje.  
Com o decorrer do tempo e com a prossecução dos seus projetos, esta Associação tem vindo a mostrar um forte impacto no desenvolvimento do território, que vai muito para além das Aldeias do Xisto, tendo instituído uma dinâmica de parcerias (a vários níveis, como a nível económico, social, institucional, entre outros) com agentes locais e com instituições (públicas e privadas) internas e externas à Região de atuação, detendo, neste momento, uma imagem e estrutura de atuação consolidada que lhe tem legitimado o reconhecimento de várias entidades e instituições, quer no domínio do desenvolvimento local, mas também nas áreas da etnografia; da recuperação, conservação e valorização do património rural serrano; da conservação e proteção da natureza; na captação e atração de agentes empresariais e consumidores; entre outros. Destaque, ainda, para os vários projetos em que a Lousitânea está inserida, todos eles relacionados com as temáticas da conservação da natureza e da valorização do património, como são exemplo a gestão da Rede das Praias Fluviais do Pinhal Interior; a implementação e animação de ações no âmbito do programa das Aldeias do Xisto; a implementação da Rede de Percursos Pedestres do concelho de Góis; o levantamento dos vestígios de ocupação humana no Vale do Ceira; e a prossecução dos estudos científicos na área abrangida pela crista quartzítica dos Penedos de Góis, com vista à sua classificação como Monumento Natural; entre outros. Realce também para a candidatura realizada e aprovada, em parceria com a Pinus Verde, de Valorização dos Produtos Agroalimentares do Território das Aldeias do Xisto.
No que concerne à sua estrutura constitutiva, a nível dos Órgãos Sociais, a Lousitânea agrega três órgãos (Figura 113): Assembleia Geral, Direção e Conselho Fiscal.
Os Órgãos Sociais, no atual mandato, são constituídos por um total de dez membros, tendo ocorrido a tomada de posse dos Órgãos Sociais vigentes a 8 de janeiro de 2011, com um mandato de 3 anos, que termina em dezembro de 2013. Destaque para a integração e participação, nos Órgãos Sociais, dos habitantes das Aldeias do Xisto do concelho de Góis (à semelhança do que sucede na grande maioria das iniciativas levadas a cabo pela Associação, como teremos oportunidade de salientar mais à frente nesta investigação), principal espaço de atuação da Lousitânea e onde tem a sua sede. 
A Lousitânea, a 1 de janeiro de 2013, apresentava um quadro total de quatro funcionários, sendo que, paralelamente, tem estabelecidos vários acordos e protocolos com escolas profissionais, universidades e politécnicos para a realização de estágios curriculares, bem como com o Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP), para a realização de contractos de inserção no mercado de trabalho, bem como de estágios profissionais.
Atualmente, a Lousitânea, dispõe das seguintes valências e infraestruturas de apoio ao seu funcionamento e às suas atividades:
 ‒ Gestão da Casa de Campo da Comareira (TER), na Aldeia do Xisto da Comareira (concelho de Góis). Trata-se de um imóvel com 3 quartos, 3 casas de banho e uma cozinha, propriedade da Câmara Municipal de Góis com a qual a Associação estabeleceu um protocolo3 que visa a cedência deste espaço com o intuito de gerar receitas para o funcionamento da Lousitânea.
‒ Gestão da Loja do Xisto da Aigra Nova, situada na Casa de Convívio da Aigra Nova (concelho de Góis). Para a gestão, exploração e utilização deste espaço existe um contrato 4 de franchising assinado com a ADXTUR, “Saber das Mãos”, Município de Góis e com a Associação das Aigras, Comareira e Cerejeira (as duas primeiras entidades ao nível do contrato de franchising da marca “Aldeias do Xisto” e as duas últimas para a cedência do imóvel). Nesta Loja do Xisto são comercializados produtos com a marca “Aldeias do Xisto” e outros produtos agroalimentares quer das aldeias próximas à Aigra Nova (sobretudo de produtos como o mel, a aguardente e os licores) quer de toda a região da área de influência da Rede das Aldeias do Xisto.
‒ Gestão do Ecomuseu Tradições do Xisto, com o Núcleo Sede na Aigra Nova e com vários Núcleos nas restantes Aldeias do Xisto do concelho de Góis (assunto que será aprofundado mais à frente).
‒ Implementação e gestão da Rede de Percursos Pedestres do concelho de Góis.
O Projeto de criação de uma Rede de Percursos Pedestres no concelho de Góis surge por iniciativa da TransSerrano ‒ Aventura, Lazer e Turismo (sendo esta mesma empresa a entidade promotora do projeto), em colaboração com a Lousitânea ‒ Liga de Amigos da Serra da Lousã, com a Câmara Municipal de Góis bem como com todas as cinco juntas de freguesia que compõem o concelho de Góis. À TransSerrano cabe, ainda, a execução do projeto sendo ainda a entidade responsável pelo processo de homologação dos percursos pedestres, enveredando esforços junto da Federação de Campismo e Montanhismo de Portugal (a entidade, em Portugal, com incumbência de gerir e proceder à respetiva homologação dos percursos pedestres).
Neste contexto, a Lousitânea, efetuou uma candidatura ao Programa de Desenvolvimento Rural (PRODER, Acção 3.1.3/2010 ‒ Desenvolvimento de atividades turísticas e de lazer) através do Grupo de Acção Local (GAL) ADIBER ‒ Associação de Desenvolvimento Integrado da Beira Serra, com a apresentação de um projeto que visa a criação e implementação de uma Rede de Percursos Pedestres para o concelho de Góis, com um número total de dez percursos 5 de Pequena Rota (PR) e um outro de Grande Rota (GR), cuja distância total terá cerca de 250 quilómetros (Figura 114).
A implementação da supramencionada rede será efetuada em três fases distintas e prolongadas no tempo. Numa primeira fase, entretanto já concluída 6, serão implementadas e apresentadas cinco pequenas rotas, sendo elas: Trilho dos Pisões (PR2 GOI), na freguesia de Álvares; Trilho do Vale do Ceira I (PR3 GOI), na freguesia do Cadafaz; Trilho da Serra do Açor (PR4 GOI), na freguesia do Colmeal; Trilho das Minas (PR5 GOI), na freguesia de Góis e, por fim, o Trilho do Vale Encantado (PR6 GOI), na freguesia do Cadafaz. Numa segunda fase, já em prossecução, serão implementadas as restantes cinco pequenas rotas e, por fim, na terceira fase do projeto será implementada a grande rota do concelho de Góis (que, em parte, será coincidente com a Grande Rota das Aldeias do Xisto). Destaque, ainda, para alguns outros percursos pedestres, não marcados mas que podem ser realizados mediante contacto com a Lousitânea. O município de Góis apoiará parte do financiamento ao projeto cabendo às juntas de freguesia assegurar a manutenção dos trilhos marcados.
O referido projeto pretende valorizar a promoção turística do concelho de Góis, a partir da divulgação e estabelecimento de condições para a prática de pedestrianismo que, para além da componente desportiva e lúdica, pode ser um meio e um importante veículo para fazer face às necessidades de educação ambiental mas, também, como forma de valorizar e dar a conhecer o vasto património natural e cultural deste território, promovendo o contacto com a população, com os costumes, com a gastronomia e com os saberes locais.
A Lousitânea dispõe, ainda, de um escritório contíguo ao Núcleo Sede do Ecomuseu e à Loja das Aldeias do Xisto, num espaço de propriedade da Câmara Municipal de Góis. No 1º piso deste espaço encontra-se a Casa de Convívio da Aldeia, espaço multiusos que foi, no final de 2012, alargado com a cobertura do terraço, um espaço todo envidraçado com estrutura em madeira (financiado no âmbito da candidatura ao PRODER) que poderá albergar diversos tipos de eventos na aldeia.
A Lousitânea dispõe, ainda, na rua dos Carvalhos (Aigra Nova) de um espaço de arrumos cedido, gratuitamente, pelos herdeiros da D.ª Idalina (habitante da Aldeia do Xisto da Comareira) para armazém da associação.

1 A sede da Lousitânea na Aigra Nova resulta de um protocolo tripartido celebrado entre a Associação de Melhoramentos das Aigras, Comareira e Cerejeira, o Município de Góis e a Lousitânea, a 14 de janeiro de 2009, sendo renovado automaticamente por períodos de 3 anos. Atualmente o protocolo só poderá ser revisto em janeiro de 2015.

2 A fundação da Lousitânea deve-se a uma iniciativa levada a cabo por um grupo constituído por três pessoas: Fátima Curado, Fernando Romão e José Augusto Pais.

3 O protocolo foi celebrado a 2 de março de 2005, sendo renovado automaticamente por períodos de 5 anos, vigorando a atual concessão até março de 2015. Esta Unidade de Turismo em Espaço Rural encontra-se em funcionamento desde 2006.

4 O protocolo foi celebrado a 14 de janeiro de 2009 e é renovado automaticamente por períodos de 3 anos. Atualmente o protocolo só poderá ser revisto em janeiro de 2015. Esta infraestrutura encontra-se em funcionamento desde 2008.

5 Para além da Rota das Aldeias do Xisto (PR1 GOI) e da Grande Rota das Aldeias do Xisto.

6 Mas, sendo que, nenhum dos Percursos Pedestres se encontra homologado pela Federação de Campismo e Montanhismo de Portugal.