SAÚDE DO TRABALHADOR: UMA ANÁLISE SOBRE A PRÁTICA DO ASSISTENTE SOCIAL NO HOSPITAL OPHIR LOYOLA EM BELÉM-PA

SAÚDE DO TRABALHADOR: UMA ANÁLISE SOBRE A PRÁTICA DO ASSISTENTE SOCIAL NO HOSPITAL OPHIR LOYOLA EM BELÉM-PA

Maria Estrela Costa de Sousa (CV)
Marcelo Santos Chaves
(CV)
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará

Volver al índice

1.4 ÉTICA E TRABALHO NA GLOBALIZAÇÃO: NOVAS DEMANDAS AO SERVIÇO SOCIAL.

No exercício do trabalho é importante ser ético tanto no fazer profissional como nas relações interpessoais, no entanto Oliveira (1998) ressalta que os processos de racionalização do trabalho implementados hoje tendem a reduzir o fator humano da produção por considerar o mesmo um fator de instabilidade e perturbação. Esta solução afasta, em grande medida, a ética da problemática da produção. Outro fator também referenciado para a perda da dimensão ética é a destruição das formas de organização do trabalho.
O debate da concepção ética na ação humana em busca de suprir as necessidades básicas implica em reflexões da seguinte forma:
(...) como articular, a partir das tendências estruturais da nova configuração de um sistema econômico globalizado, um projeto de desenvolvimento que tenha como objetivo fundante a efetivação da dignidade e dos direitos elementares do ser humano (...). (OLIVEIRA, 1998, p.192).

Isto mostra a lógica excludente que se torna absolutizada, quando o mercado é considerado o mecanismo único de coordenação da economia moderna. Com a revolução tecnológica, mesmo com suas consequências, possibilitou a superação daquilo que marcou a sociedade do trabalho, a chamada acumulação de riqueza de modo individualizado, embora na contramão do processo haja cada vez mais socialização do processo de produção na contra face da concentração da riqueza produzida em diferentes territórios do planeta.
Com esse processo e sob as mazelas do sistema capitalista surge o Serviço Social como profissão vinculada a resolutibilidade da questão social. De acordo com Netto (2001), a profissionalização nessa área não é mera conseqüência da qualificação e de ações que, mediante a filantropia e o assistencialismo, dirigiam-se à questão social como afirma alguns estudiosos, mas à profissão correspondente a determinadas estratégias do capital em um período específico, a era dos monopólios (apud FORTI, 2006, p.50).
Nesse sentido, para a compreensão dessa afirmação é importante entender a gênese e o percurso histórico do Serviço Social. No Brasil, em particular, a configuração dessa profissão é atravessada pelo debate sobre a ética, como elemento essencial ao tratamento da pobreza originada da exploração do trabalho e das riquezas naturais.
Portanto, o Serviço Social no Brasil recebeu um caráter humanista advindo da Europa que possuía “formulações vinculada ao pensamento sociológico conservador em conexão com a doutrina social da Igreja Católica (...)”(FORTI, 2006, p. 54). Assim a profissão foi referenciada inicialmente por um posicionamento moralizador frente às expressões da questão social.
Porém, é importante ressaltar que ao longo dos anos no Brasil o Serviço Social se institucionalizou enquanto profissão, reconhecida na divisão social do trabalho. Isso se deu segundo Iamamoto (2004) pela criação das grandes instituições assistenciais e autárquicas, especialmente na década de 40, em que o período foi marcado por um Estado corporativista e também por uma política favorável a industrialização1.
Iamamoto (2004) afirma ainda que a estrutura corporativa no enquadramento das novas forças sociais da época exigia a articulação da repressão e da dinamização dos movimentos populares, uma vez que o Estado não permitia a mobilização e a organização do proletariado. Foi nesse contexto que surgiu as grandes instituições assistenciais. O Estado passou a intervir na regulamentação do mercado de trabalho e no controle da sociedade, através da política salarial e sindical.
Nesse período o Serviço Social ainda era embrionário, no que dizia respeito à intervenção social, pois a profissão estava muito ligada a ações em obras assistenciais, as quais lhe tinham dado origem. Todavia é com o surgimento das grandes instituições que o mercado de trabalho, para o Serviço Social, é ampliado. As ações de filantropia e caridade passam a se configurar como profissão e tornam-se uma atividade institucionalizada na medida em que são legitimadas pelo Estado. É a partir dessa imersão no Estado que o Serviço Social inicia uma trajetória de ruptura com o estreito quadro de sua origem.
Vale afirmar que, “a legitimação da profissão virá, também, do mandato institucional confiado ao assistente social, direta ou indiretamente, pelo o Estado. Amplia-se e solidifica-se, assim, a legitimação do Serviço Social pelo poder” (IAMAMOTO, 2004, p.93-94). Segundo essa autora a profissionalização do assistente social leva à constituição de uma categoria assalariada, tornando-se uma das engrenagens de execução das políticas sociais do Estado. Dessa forma, o assistente social dispõe de um suporte institucional e jurídico para se impor perante a demanda atendida. No exercício profissional o assistente social está vinculado:

(...) as organizações estatais, paraestatais ou privados, dedicam-se ao planejamento, operacionalização e viabilização dos serviços sociais à população. Exerce funções tanto de suporte à racionalização do funcionamento dessas entidades, como funções técnicas propriamente ditas. Do ponto de vista da demanda, o Assistente Social é chamado a constituir-se no agente intelectual de ‘linha de frente’ nas relações entre instituição e população, entre os serviços prestados e a solicitação desses mesmos serviços pelos interessados. (IAMAMOTO, 2004, p. 100)

Como afirma Forti (2006) é no decorrer do processo histórico-social e das condições que configuraram a realidade brasileira e mundial que a busca pela cientificidade torna-se um imperativo para a profissão teórica.
Diante dessa compreensão, na década de 1960, surgiu um movimento crítico denominado Movimento de Reconceituação que trouxe inúmeros questionamentos acerca da sociedade e da prática do assistente social. Com esse movimento passa a ser questionado a neutralidade da profissão e também a operacionalização dos programas de Desenvolvimento de Comunidade que existiam na época, os profissionais passam a priorizar discussões referentes à metodologia do instrumental e assim a ter uma visão crítica e politizada da realidade.
Nessa perspectiva, conforme afirma Iamamoto (Op. Cit) o assistente social é um trabalhador assalariado que, nos limites das instituições, possui a possibilidade de materialização da relativa autonomia na execução do seu trabalho. Isso porque precisa articular suas ações com a demanda atendida mediante a burocratização institucional existente onde exerce a profissão.
Iamamoto (2004) ressalta ainda que o Serviço Social, enquanto profissão da divisão do trabalho não é sempre coberta nas suas dimensões e possibilidades pela prática profissional e que por isso não se deve reduzir o espaço institucional a uma prática burocratizada e tarefeira.
A autora entende que a concepção do novo espaço profissional não pode estar voltada ao trabalho nas brechas e nos enganos, mas que o novo está no apropriar-se teórica e praticamente, assim como das possibilidades reais efetivas apresentadas em conjunturas nacionais particulares. Segundo essa autora é um processo resultante das lutas dos movimentos sociais. Assim, ao apropriar-se dessas possibilidades traduziria em respostas profissionais criativas e críticas.
Mediante esse entendimento é que o assistente social precisa articular suas ações no contexto em que estiver inserido. Faleiros entende que a profissão do Serviço Social:
É um movimento de articulação de saberes, de luta por espaços e ao mesmo tempo é regulamentação e corporação. Esse ponto de vista incorpora tanto a visão regulamentadora de uma atividade, a partir da regulamentação do trabalho de um grupo de pessoas que atua numa área determinada, expressa em lei, relativo à presença de um saber ou conhecimento específico reconhecido e de um objeto disciplinar no contexto de divisão social do trabalho, historicamente em movimento nas relações políticas e econômicas. Não há profissão legítima sem reconhecimento legal (...) só existirá profissão reconhecida se existir conhecimento articulado e sistematizado dessa área e um poder capaz de fazê-lo valer socialmente por meio de legitimidade compartilhada ou conquistada. (FALEIROS, 2006, p. 35)

Faleiros (2006) também afirma que o pensar dialético das profissões sobre movimento, organização e saber necessita de uma análise concreta da realidade na qual possui uma pluralidade de dimensões da ação profissional com as organizações, na relação com os usuários e os demais segmentos. Sendo assim, para essa análise é preciso ter conhecimento da dimensão política existente, pois a mesma também está presente nos diferentes momentos da intervenção profissional, seja nos conflitos ou nas relações individuais e coletivos, assim como nas mais gerais.
Como existe uma pluralidade2 de dimensões na intervenção profissional torna-se um desafio repensar novas relações profissionais mediante a correlação de forças presente em uma instituição, mas o importante é que não se perca a capacidade de crítica, de buscar a mudança, pois esse é o desafio mais importante e difícil. Assim, é imprescindível que o profissional qualificado saiba articular e dialogar com aqueles que fazem parte do seu contexto de atuação, utilizando-se da linguagem para realizar atividades importantes no seu ambiente de trabalho e em qualquer área onde esteja inserido, ou seja, nas “mais variadas expressões da questão cotidiana, tais como os indivíduos as experimentam no trabalho, na família, na área habitacional, na saúde, na assistência social pública etc.” (IAMAMOTO 2004, p.28)
Conforme Boutet (apud SILVA, 2002, p.61) a atividade de linguagem e a atividade de trabalho estão estreitamente ligadas, ambas transformam o meio social e permitem trocas e negociação entre os seres humanos.
A valorização da informação se deu segundo Silva (2002) devido à automação e informatização dos meios de produção onde o funcionalismo cotidiano e rotineiro nas diferentes organizações de trabalho baseia-se cada vez mais nas atividades simbólicas. Atualmente, “(...) fala-se cada vez mais de comunicação externa e interna, de intercompreensão, de participação; nesse contexto, o mal entendido, o não-dito, a interpretação inadequada, a retenção de informações influi nas relações de trabalho” (SILVA, 2002, p.61).
É por isso que em uma intervenção profissional é importante o falar; a forma de abordar e explicar precisam ser trabalhados para que o outro consiga receber a informação corretamente, por isso que Faita (2002) descreve que em uma interação seja entre médico e paciente, professor e aluno ou entre profissionais podem ser apreendidas as formas linguísticas, as configurações apreendidas em uma fala podem ser correlacionadas as mais sutis situações. Com isso a ação do profissional precisa ser reflexiva, Para isso Guerra (2007) coloca que, é preciso que a intervenção seja reflexiva e eficaz articulando dinâmicas de conhecimentos, saberes e habilidades, valores e posturas. Para essa postura o profissional precisa ser engajado e compromissado.
Mas não se pode ocultar a existência de diversos projetos no interior da profissão, as suas diferenças, divergências éticas, sociopolíticas e mesmo o grau de influência que as diferentes tendências exercem no conjunto da profissão porque cada uma delas possui uma forma de interpretar a natureza e o significado da profissão na divisão social e técnica do trabalho.
Os diferentes projetos mencionados por Guerra (idem) são projetos profissionais que se organizam em torno de um conjunto de conhecimentos teóricos e de conhecimento interventivos.
Para uma prática profissional que vai além do imediatismo é necessário que esse projeto profissional seja crítico as atividades do cotidiano, esse tipo de projeto propõe um conjunto de referências prático-instrumentais, ele traz também no seu interior:
(...) determinada forma de conceber as funções do Estado e o papel das políticas sociais, como a mediação necessária para impor limites ao processo de mercantilização da vida social, normativa as formas de estabelecer relações com o usuário dos serviços e das políticas sociais; de viabilizar direitos, de organizar e mobilizar a participação dos indivíduos, grupos e populações na vida das instituições, no planejamento e nas decisões institucionais (...). O resultado dessa postura permite que o assistente social estabeleça determinada relação com o Estado, cobrando sua intervenção direta, sistemática e contínua nas expressões da questão social, via políticas sociais públicas, consideradas como direito de cidadania, já que é conquista dos trabalhadores. (GUERRA, 2002, p. 21):

Considerando essa lógica, surge a necessidade de um profissional comprometido com a qualidade de seus serviços. O seu fazer profissional ao longo da sua origem sofreu mudanças nos serviços, principalmente na atualidade porque esses serviços têm sido incorporados à lógica da produção capitalista alterando as relações de trabalho, assim como as formas de sociabilidade. Nesse contexto, o exercício profissional também é incorporado às novas exigências do mundo burguês, exigindo-lhe competência, eficiência, dinâmica e versatilidade. Isso faz com que o mesmo interaja ainda mais com as novas tecnologias existentes para dar conta dos seus serviços. Essa nova dinamização do trabalho acarreta de alguma forma na saúde do trabalhador, diante dessa compreensão serão analisados os impactos do trabalho na saúde de algumas profissionais que atuam no Hospital Ophir Loyola.

1 Industrialização iniciada na década de 30.

2 Segundo Faleiros (2006) essa pluralidade é articular ou regular recursos e problemas.