TURISMO E DESENVOLVIMENTO ESTUDOS DE CASO NO CENTRO DE PORTUGAL

Paulo Carvalho

3.4 Planos e projectos

A percepção do turismo como sector de actividade relevante para o desenvolvimento de Miranda do Corvo é um facto relativamente recente. As primeiras preocupações que desencadearam a realização de estudos (na base de planos, projectos e intervenções) aconteceram essencialmente na segunda metade dos anos 80 (século XX), quando outros municípios vizinhos (ou de proximidade) procuravam desenvolver estudos e estruturar projectos tendo em vista intervenções neste domínio.
Assim aconteceu em Arganil, com o Plano de Desenvolvimento e Requalificação da Aldeia do Piódão (1987), tendo em vista requalificar e promover esta aldeia da Serra do Açor (Correia, 2009), e na Lousã, através do Plano de Salvaguarda das Aldeias Serranas (1989), no sentido de fomentar o processo de requalificação e valorização patrimonial de um conjunto de aldeias da Serra da Lousã, na sequência do processo de abandono (despovoamento) e das dinâmicas relacionadas com a residência secundária e a neo-ruralidade (Carvalho, 2005). Ainda na Lousã, em 1993, a ARCIL (Associação para a Recuperação de Cidadãos Inadaptados da Lousã) apresentava um projecto inovador (que integrava o turismo de montanha, a silvicultura, a silvopastorícia, a apicultura e a produção de espécies cinegéticas) com o propósito de recuperar duas aldeias abandonadas (Silveira de Baixo e Silveira e Cima) da Serra da Lousã e respectivas áreas do Casal (abrangendo cerca de 200 hectares), capaz de integrar jovens e adultos portadores de deficiências, com aptidão para o desempenho de tarefas específicas nos referidos domínios.
Como referimos, Miranda do Corvo acompanhou este movimento. Já desde os finais da década de 70 do século XX que é notória a existência de uma preocupação com questões turísticas para o desenvolvimento do concelho, partilhada quer pelo poder político, quer pela população em geral. No primeiro número do jornal local “Mirante”, datado de Abril de 1979, foi redigido um artigo referente a esta temática, o qual teve continuação na edição seguinte, e que demonstrou bem o entusiasmo que existia naquela altura em torno desta matéria (Adelino, 2010).
No início do ano de 1987 foi anunciado o Plano Integrado de Recuperação do Cadaval e Gondramaz. Este visava o aproveitamento da área da Serra da Lousã, na área pertencente ao concelho de Miranda do Corvo, conhecida como Serra do Espinho e de Vila Nova (Adelino, 2010). Neste plano pretendia-se a recuperação do lugar do Cadaval (que já estava abandonado), com a adaptação para aldeamento turístico, a preservação da arquitectura tradicional do Gondramaz e o embelezamento da Senhora da Piedade de Tábuas. Também se previa a arborização de espaços envolventes com as espécies tradicionais, o lançamento de uma reserva de caça com sistemas de reprodução em cativeiro das espécies endógenas como a perdiz, o coelho, a lebre, o javali, o texugo e o repovoamento com trutas das ribeiras de Espinho e da Senhora da Piedade de Tábuas. Pretendia-se também dinamizar as actividades tradicionais agrícolas, especialmente a pastorícia e a agricultura e construir uma rede de estradas que garantissem a ligação entre as diversas aldeias. Este processo de recuperação era extensível aos concelhos de Lousã, Penela e Castanheira de Pêra, no sentido de criar uma “reserva natural” em que fosse preservado o equilíbrio ecológico.
Em 1987 foi terminado o Plano de Turismo do Concelho, elaborado pelo Gabinete da Serra da Lousã, que se localizava junto aos Paços do Concelho. Este plano integrou todas as iniciativas de carácter turístico já iniciadas ou a iniciar no concelho, numa programação plurianual adoptada pela autarquia numa perspectiva de “gestão-objectivos-recursos”. Pretendia-se aproveitar as potencialidades do concelho, tendo em consideração os recursos envolventes, ultrapassando, assim, alguns constrangimentos estruturais que vinham prejudicando o concelho no sector do turismo (Cmmc, 1987).
O plano apresentava cinco objectivos fundamentais: 1. Protecção do artesanato; 2. Integração de pontos turísticos envolventes; 3. Equipamento hoteleiro e similar; 4. Áreas de lazer e ocupação de tempos livres; 5. Infra-estruturas básicas mínimas de suporte ao plano.
Em termos de protecção do artesanato, a autarquia defendia três tipos de acções, nomeadamente apoiar as iniciativas privadas no sector – cooperativas ou não – que se dedicassem à produção de artesanato; criação, no município, de unidades de emprego protegido, com a parceria da ARCIL (Lousã) e uma casa de exposição de artesanato, através da recuperação de um imóvel e a sua área envolvente, propriedade do Município, localizado na vila de Miranda do Corvo.
Relativamente à integração de pontos turísticos envolventes, pretendia-se a criação de roteiros e circuitos turísticos, com partida em Coimbra, visita aos pontos de interesse existentes na altura no concelho e nos concelhos vizinhos.
No que toca aos equipamentos hoteleiros, a Câmara Municipal pretendia adaptar uma quinta que tinha adquirido para uma pousada. Paralelamente, também tencionava comprar a aldeia do Cadaval e adaptá-la a aldeamento turístico, aproveitando as casas serranas existentes.
Em relação às áreas de lazer, pretendia-se a criação de uma coutada na Serra da Lousã, a criação de um centro hípico nas proximidades da aldeia do Cadaval, a adaptação da Senhora da Piedade a área de lazer através da construção de uma piscina fluvial e parques de merendas, o aproveitamento das ribeiras de Espinho e Senhora da Piedade de Tábuas, adaptando-as a percursos de caminheiros e a actividades piscícolas, com repovoamento de trutas, a recuperação de um moinho de farinha movido a água, a recuperação de um lagar de azeite movido a água, o aproveitamento da casa do artesanato, a pavimentação de estradas, a electrificação do Cadaval e o abastecimento domiciliário de água.
Todas estas acções foram incluídas num programa ambicioso e previa-se estarem terminadas em 1989, com um investimento previsto de 165.500 contos (825.250 euros). A programação proposta só seria possível se a autarquia conseguisse apoios financeiros extraordinários, não previstos no seu orçamento, nomeadamente através dos fundos comunitários e nacionais (Cmmc, 1987).
Acreditava-se que os custos e o impacte previsto a nível local e regional, nomeadamente a criação de postos de trabalho, o repovoamento e fixação das populações nas aldeias serranas, justificariam plenamente o esforço realizado.
O Plano de Turismo do Concelho, além de constituir um elemento agregador de várias iniciativas municipais, até então dispersas, foi integrado também em outros planos, de carácter territorial mais abrangente, nomeadamente o Plano de Recuperação Ecológica, Preservação Arquitectónica e Desenvolvimento da Serra da Lousã, realizado no Gabinete da Serra da Lousã, e no Plano Director Intermunicipal da Lousã, Miranda do Corvo, Penela e Vila Nova de Poiares, realizado pelo Gabinete de Apoio Técnico (GAT) da Lousã.
Com o objectivo de desenvolver o concelho, nomeadamente em termos turísticos, podemos afirmar que este foi o primeiro grande plano turístico realizado em Miranda do Corvo com uma perspectiva de integração de projectos, de forma a criar um todo coerente, e que não se limitava às fronteiras de um só concelho, propondo parcerias estratégicas com outros territórios vizinhos. Podemos afirmar também que, até ao final do século XX, este foi o último plano com estas características (Adelino, 2010).
No Plano de Recuperação Ecológica, Preservação Arquitectónica e Desenvolvimento da Serra da Lousã, previa-se, entre outras iniciativas, um espaço de recuperação de espécies cinegéticas, nomeadamente as perdizes, através da criação de uma coutada e um centro reprodutor desta espécie. Dada a boa receptividade das diversas entidades às propostas feitas, chegou mesmo a considerar-se a hipótese de se formalizar um proposta para se considerar a Serra da Lousã como Paisagem Protegida.
Neste contexto, foi concluído, pelo Gabinete da Serra da Lousã, um projecto denominado por “Projecto Integrado de Desenvolvimento da Serra da Lousã – Proposta de Intervenção da Área Florestal”, onde é proposta a criação de uma área de caça gerida pelo Estado. A continuidade dos trabalhos neste sector levou à constituição da Zona de Caça Nacional (Z.C.N.) da Serra da Lousã com 10851 hectares (Paul, 2006).
Posteriormente, no ano de 1988, foi terminado o Plano de Recuperação do Cadaval e Senhora da Piedade de Tábuas. Neste plano pretendia-se a construção de um açude e uma área de lazer na Senhora da Piedade de Tábuas para os banhistas. Com o açude pretendia-se obter um espelho de água com dimensão suficiente no Verão e a área de lazer serviria de apoio ao açude, com casas de banho, balneários e um bar, tudo localizado numa espécie de plataforma que iria facilitar o acesso do Santuário ao açude. Relativamente à aldeia de Cadaval, foi elaborado o levantamento do edificado e estava prevista a recuperação dos imóveis, segundo a sua traça original, para aproveitamento turístico da mesma.
No ano de 1989 foi apresentado o Plano de Valorização do Santuário do Senhor da Serra, alvo de muitos elogios na altura pela forma como foi estruturado. Este não previa muito mais do que a conversão de um edifício na área do Santuário em hospedaria e casas de banho públicas, com a finalidade de acolher os peregrinos que anualmente afluíam ao Senhor da Serra pela Romaria, em meados de Agosto (Adelino, 2010).
Diversos factores estruturais e conjunturais explicam a distância entre os planos/projectos e a sua concretização, em particular as limitações financeiras da autarquia, a grande dependência de ajudas financeiras externas, os ciclos eleitorais, o reduzido empreendedorismo local, a ausência de uma cultura de planeamento, a desvalorização da escala supra-municipal e dos processos de integração, cooperação e parcerias.
Apesar de algumas iniciativas concretizadas como, por exemplo, a Estalagem da Quinta do Viso, o Posto de Turismo, e a requalificação da área envolvente à Senhora da Piedade de Tábuas (com o apoio do Programa LEADER II), que incluiu a construção de uma área de lazer e um açude na Ribeira de Tábuas, a década de 90 foi sobretudo uma fase de transição entre dois momentos principais: o dos (primeiros) projectos/planos (lançados nos anos 80) e o das intervenções/realizações estruturantes (concretizadas na primeira década do século XXI).

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