1.3.1 O que é epistemologia?
O termo significa “estudo da ciência” (do grego episthme = conhecimento, ciência, e logo = estudo, discurso). É usada em dois sentidos [26]:
Para indicar o estudo da origem e do valor do conhecimento humano em geral (e neste sentido é sinônimo de gnosiologia ou crítica).
Para significar o estudo as ciências (físicas e humanas), dos princípios sobre o qual se fundam, dos critérios de verificação e de verdade, do valor dos sistemas científicos.
Pode-se dividi-la em dois sentidos básicos:
1º. A crítica do conhecimento científico: exame dos princípios, das hipóteses e das conclusões das diferentes ciências, tendo em vista determinar seu alcance e seu valor objetivo.
2º. A filosofia da ciência (empirismo, racionalismo, etc), e a história do desenvolvimento científico.
1.3.2 Breve prospecto histórico.
Desde que Auguste Comte negou à filosofia um domínio próprio de objetos e confiou-lhe como tarefa específica o estudo das ciências, a determinação de seus objetos e de suas tarefas, a sua divisão e coordenação, a atenção dos filósofos dirigiu-se sempre mais para a ciência, a qual se tornou, para muitos, o argumento principal e central de sua análise. Além disso, a indagação atenta e aprofundada das características e das funções do saber científico era exigida quer pela orientação positiva da filosofia, quer pelos enormes desenvolvimentos e pela extraordinária importância que a ciência havia adquirido durante os últimos dois séculos, período no qual ela demonstrou ser um saber extremamente fecundo e prático.
Essas instâncias foram o ponto de partida de uma parte da filosofia, chamada filosofia da ciência, ou epistemologia. Esta se identifica com a crítica metodológica da ciência, na medida em que essa crítica tende à explicitação consciente e sistemática do método e das condições de validade dos juízos particulares, singulares ou universais; tornados próprios pelos cientistas, perseguindo assim uma reconstrução racional, convencionalmente designada por senso empírico-pragmático, do conceito de conhecimento científico.
A epistemologia propõe-se a responder às seguintes questões:
O que é conhecimento científico?
Em outras palavras, em que consiste propriamente o trabalho do cientista?
Que faz ele quando faz ciência ?
Interpreta, descreve, explica, prevê?
Faz apenas conjecturas ou verdadeiras asserções (gerais e singulares) que espelham fielmente os aspectos dos fatos?
E quando o cientista explica o que é que ele explica dos fatos: sua função, origem, gênese, essência, fim?
Qual é o status lógico das leis na ciência?
São elas resultados de procedimentos indutivos (e o que quer dizer indução para a ciência?),
Ou antes, conjeturas da imaginação científica que deverão sujeitar-se a provas empíricas?
Em que sentido se fala em causalidade nas ciências empíricas?
Quando, então podemos dizer que uma teoria é “melhor” do que outra?
O que queremos dizer quando afirmamos que as ciências empíricas são objetivas?
Qual é o papel da experiência na pesquisa científica?
Podemos observar que na epistemologia existem mais perguntas que respostas. Tais perguntas brotam da pergunta inicial sobre o que seja o conhecimento científico. Essas questões começaram a preocupar à atenção dos filósofos pelo fim do século XVIII, no momento em que a atitude de confiança otimista e exaltação cega das ciências foi substituída por um ceticismo e uma crítica aguda nos confrontos do conhecimento científico. O nascimento e desenvolvimento da filosofia da ciência deve-se diretamente à tomada de consciência da problematicidade desse conhecimento. Tal consciência era ainda ausente em Descartes, Isaac Newton, Immanuel Kant, Comte, e Spencer.
Os primeiros resultados significativos dessa nova disciplina dizem respeito à matemática e à geometria. Estas não são mais concebidas como ciências reais, como representações de situações objetivas, mas sim como construções formais:
“como sistemas fundados em postulados escolhidos arbitrariamente e construídos com técnica da dedução lógica das conseqüências que comportam tais postulados”.
Assim, por ação dos epistemólogos e outros estudiosos, a matemática e a geometria tomaram consciência de sua especificidade como ciência do possível, diferente da física, que ao contrário, é a ciência do real.
No concernente à física e às ciências experimentais em geral, passa-se de uma visão estática e mecanicista a uma visão dinâmica, probabilista e relativista das leis da natureza. Essa mudança foi motivada pelas descobertas da entropia, da radiatividade, dos quanta, etc. Conseqüentemente, os conceitos de um espaço, e de um tempo absolutos, como também os de simultaneidade, perderam todo o valor. A idéia de espaço curvo toma o lugar da idéia euclidiana de espaço retilíneo. A idéia de relações necessárias de causalidade é substituída pela idéia de indeterminação.
Nas ciências da natureza, no início do século XIX, ressalta-se uma série de questões filosóficas relativas ao caráter e à função do conhecimento experimental. As ciências naturais não aparecem mais no campo do saber como conhecimento absoluto com pretensões imperialistas e limites próprios. Seu âmbito é a quantidade. De tal sorte a física ganha um perfil matemático, relegando a segundo plano as intenções ontológicas e os elementos sensíveis. Daí a tendência a reduzir o conhecimento experimental a puros dados métricos e ao esquema relacional desses dados. Tal esforço de quantificação e matematização da física acentua os traços que a distinguem tanto do conhecimento comum, quanto do filosófico.
A filosofia da ciência propriamente dita teve um considerável desenvolvimento em nosso século, dando origem a três movimentos principais:
o neopositivismo;
a interpretação metafísica;
o racionalismo científico.