Quando um matemático fala de seu trabalho, duas são as palavras que não pode deixar de mencionar [25]:
A primeira é problema e corresponde ao “alimento” de que se nutre a Matemática; com efeito, para o verdadeiro matemático, um grande problema é aquele que se torna fonte de novas idéias e é capaz de fertilizar outros campos da matemática.
A segunda palavra é “prova”; uma companheira inseparável da primeira e é quem produz o rigor que dá solidez e consistência ao edifício matemático.
Uma prova matemática é uma seqüencia de raciocínios dedutivos que parte de fatos de veracidade já reconhecida, como teoremas e axiomas, e chega até o resultado em demonstração; somente provas são capazes de dar atestado de veracidade matemática à solução de um problema, semelhantemente ao que fazem observações e experimentos controlados para o cientista natural.
O que é um problema?
Como resolver problemas, segundo G. Polya.
A importância de revisar a resolução.
Níveis de capacidade de resolução.
É a argumentação um obstáculo?
Prática em problemas teóricos.
Problemas computacionais.
3.8.1 O que é um problema matemático?
3.87.1.1 O valor dos problemas na Matemática.
A matemática é a única ciência onde pouco valor se dá à erudição. O valor de um matemático é avaliado não pelo que ele sabe, mas por sua capacidade de resolver problemas, E não é para menos: a matemática vive de problemas. Infelizmente, a retórica da “Resolução de Problemas” virou um dos modismos do Sistema Escolar nos últimos anos. O resultado é o de se esperar: os oportunistas de plantão e os ingênuos despreparados conseguiram deturpar de tal modo o assunto que hoje podemos encontrar as atividades mais ridículas rotuladas como resolução de problemas matemáticos. Assim, que é necessário ouvirmos quem tem o real direito de falar sobre o assunto: os matemáticos produtores e os cientistas e técnicos usuários de matemática.
3.8.1.2 Mas, e o que é um problema matemático?
Um problema matemático é toda situação requerendo a descoberta de informações matemáticas desconhecidas para a pessoa que tenta resolvé-lo, e/ou a invenção de uma demonstração de um resultado matemático dado. O fundamental é que o resolvedor tenha de inventar estratégias e criar idéias; ou seja: pode até ocorrer que o resolvedor conheça o objetivo a chegar, mas só estará enfrentando um problema se ele ainda não tem os meios para atingir tal objetivo.
Resnick apontou várias características dos problemas que, bastante modificadas, resumimos assim:
exigentes: a solução só é atingida após intenso trabalho mental; embora o caminho possa ser curto, ele tende a ser difícil; exigem lucidez para na aparente desordem vermos as regularidades, os padrões que permitirão a construção do caminho até a solução;
complexos: precisam de vários pontos de vista;
sem algoritmização: o caminho da resolução é desconhecido, ao menos em boa parte;
nebulosos: pode ocorrer que nem todas as informações necessárias estejam aparentes; por outro lado, pode ocorrer que existam conflitos entre as condições estabelecidas pelo problema;
Não há resposta única além de normalmente ocorrer de existirem várias resoluções para um dado problema, pode ocorrer de não existir a melhor solução e até de não existir solução; ao contrário do que a Escola ensina:
“Resolver um problema não é o mesmo que achar a resposta”.
3.8.1.3 A diferença entre problema e exercício.
O exercício é uma atividade de adestramento no uso de alguma habilidade/conhecimento matemático já conhecido pelo resolvedor, como a aplicação de um algoritmo conhecido, de uma fórmula conhecida, etc. O exercício envolve mera aplicação e o problema necessariamente envolve invenção ou/e criação significativa.
Exemplificando: Tomemos como “resolvedor” um da oitava série do primeiro grau (é importante apontar a pessoa, pois o que pode ser um problema para uma pessoa, pode não o ser para outra ) :
Exemplo 3.1
Resolver a equação x2 - 3x + 1 = 0
Supõe-se que tal aluno conheça a fórmula de Bhaskara.
Problema: provar a fórmula de Bhaskara (supõe-se que tal aluno nunca tenha visto tal demonstração, mas conheça a fórmula).
Problema: (mais difícil) descobrir, provando, uma fórmula para resolver toda e qualquer equação algébrica do segundo grau (supõe-se que tal aluno não conheça a fórmula de Bhaskara).
Problema: (ainda mais difícil) descobrir uma fórmula diferente da de Bhaskara e capaz de resolver toda e qualquer equação algébrica do segundo grau.
3.8.1.4 O que é um bom problema?
Torna-se cada vez mais comum vermos nos livros-texto elementares a inclusão de desafios matemáticos dirigidos ao leitor. Tipicamente não correspondem diretamente ao material em ensino e, assim, muitos pensam que tratam-se de problemas. Contudo, o mais adequado seria classificá-los como charadas ou quebra-cabeças, do tipo que apareciam no rodapé dos antigos almanaques, e que visam mais o entretenimento.
Um bom problema matemático além de representar um desafio, tanto ao poder dos matemáticos como ao poder da disciplina por eles criada, também “mexe” com a matemática: faz com que a melhor entendamos, fertiliza-a e permite que possamos resolver outros problemas. Um bom problema de matemática é muito mais do que uma charada.
Um ótimo exemplo é o chamado Problema de Fermat:
“Sendo n = 3, 4, 5, . . . , mostrar que não há nenhuma trinca de inteiros positivos x, y e z verificando a equação: xn + yn = zn “.
enunciado mais simples é difícil achar, contudo esse problema precisou de quase 400 anos de esforços até ser resolvido por A. Wilkes em 1995 . Sua grandeza não está na dificuldade e também não está na utilidade desse resultado (que é praticamente inexistente); ela está no fato que as tentativas de resolvê-lo produziram idéias e problemas que fertilizam inúmeros campos: Teoria dos Números, Geometria Algébrica, etc.