INTRODUÇÃO A EPISTEMOLOGIA DA CIENCIA

INTRODUÇÃO A EPISTEMOLOGIA DA CIENCIA

Christian José Quintana Pinedo(CV)
Karyn Siebert Pinedo (CV)

Volver al índice

2.5 ESPÍRITO CIENTÍFICO E FANATISMO

2.5.1 Os cientistas renunciaram à ambição de uma verdade absoluta ?

Contrariamente ao que muitas vezes se julga, o importante na ciência é tanto o espírito como o produto [23]. É tanto a abertura, a primazia da crítica, a submissão ao imprevisto, por mais embaraçoso que seja como o resultado, por mais novo que seja. Há já muito tempo que os cientistas renunciaram à idéia de uma verdade última e intangível, imagem exata de uma “realidade” que espere ser descoberta ao virar da esquina. Os cientistas sabem agora que devem contentar-se com o parcial e o provisório.

Tal esforço vai muitas vezes contra a tendência natural do espírito humano, que reclama unidade e coerência para a representação do mundo nos seus aspectos mais diversos. Na realidade, este conflito entre o universal e o local, entre o eterno e o provisório, vê-se reaparecer periodicamente numa série de polêmicas opondo aqueles que recusam uma visão total e imposta do mundo aos que não podem passar sem ela. Que a vida e o homem se tenham tornado objetos de pesquisa, e não de revelação, poucos o aceitam.

Desde há anos, que se fazem muitas censuras aos cientistas. São acusados de não terem coração nem consciência, de não se interessarem pelo resto da humanidade; e mesmo de serem indivíduos perigosos que não hesitam descobrir terríveis meios de destruição e coerção e servir-se deles. Isto é honrá-los muito. A proporção de imbecis e de malfeitores é uma constante que se encontra em todos os escalões duma população: nos cientistas como nos agentes de seguros, nos escritores como nos camponeses, nos padres como nos políticos. E, não obstante o Dr. Frankenstein e o Dr. Strangelove, as catástrofes da história resultaram menos dos cientistas que dos padres e dos políticos.

2.5.2 Nada é tão perigoso como a certeza de se ter razão.

Porque não é apenas o interesse que leva os homens a matarem-se mutuamente. É também o dogmatismo. Nada é tão perigoso como a certeza de se ter razão. Nada causa tanta destruição como a obsessão duma verdade considerada absoluta. Todos os crimes da história são conseqüência de algum fanatismo. Todos os massacres foram cometidos por virtude, em nome da verdadeira religião, do nacionalismo legítimo, da política idônea, da ideologia justa; em suma, em nome do combate contra a verdade do outro, do combate contra Satanás.

A frieza e a objetividade que se reprovam tantas vezes nos cientistas, talvez sejam mais úteis que a febre e a subjetividade para discutir certos assuntos humanos. Porque não são as idéias da ciência que provocam as paixões. São as paixões que utilizam a ciência para sustentar a sua causa. A ciência não conduz ao racismo e ao ódio. É o ódio que faz apelo à ciência para justificar o seu racismo. Podem criticar-se certos cientistas pelo ardor com que por vezes defendem as suas idéias. Mas nenhum genocídio foi ainda perpetrado para fazer triunfar uma teoria científica. No final deste século XX deveria ser claro para todos que nenhum sistema explicará o mundo em todos os seus aspectos e todos os seus pormenores. Ter contribuído para pôr termo à idéia duma verdade intangível e eterna talvez não seja um dos menores títulos de glória do método científico.