INTRODUÇÃO A EPISTEMOLOGIA DA CIENCIA

INTRODUÇÃO A EPISTEMOLOGIA DA CIENCIA

Christian José Quintana Pinedo(CV)
Karyn Siebert Pinedo (CV)

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3.5.2 A filosofia de Bruno.

A característica básica da filosofia de Giordano Bruno é a sua volta aos princípios do neoplatonismo de Plotino, e ao hemetismo da Europa pré-cristã, notadamente nos trabalhos que conhecemos como “O Corpus Hermeticum”. Nos primeiros séculos da era imperial romana durante o desenvolvimento do movimento cristão, veio à tona uma surpreendente literatura de caráter filosófico-religioso, cujo traço de união era, segundo seus autores, as revelações trazidas por Thot, o deus escriba dos egípcios, que os gregos identificaram com Hermes Trismegisto, de onde o nome de literatura hermética. Parece que o Thot egípcio foi, realmente, uma figura religiosa histórica real que o tempo se incubou de envolver nos véus da lenda.

Seja como for, temos conhecimento desses escritos filosófico-religiosos que remontam à tradição iniciada pelo movimento de Thot-Hermes, e que nos chegaram, em parte. O suporte doutrinário dessa literatura, segundo Reale e Antiseri (1990), é uma forma de metafísica inspirada em fontes do medioplatonismo, do neopitagorismo, da tradição de Apolônio de Tiana, e do nascente neoplatonismo. A iluminação pessoal, com a conseguinte salvação da alma, segunda esta doutrina, depende do grau de conhecimento (gnosis) e maturidade a que chega o homem em sua luta por compreender o porquê? Da existência terrena, que é a ante-sala do mundo supra-sensível, além do plano físico. Em virtude da profundidade destes escritos, alguns pais da Igreja (Tertuliano, Lactâncio e outros), consideraram Hermes Trismegsito um tipo de profeta pagão anterior e preparador do ensino de Cristo, embora esta história tenha sido abafada pelo fanatismo católico posterior da Idade Média.

Resgatando parte desta tradição, Bruno se coloca na trilha dos magos-filósofos que ressurgiram na renascença, que, embora procurando manter-se dentro dos limites da ortodoxia cristã, leva-o às últimas conseqüências. O pensamento de Bruno é gnóstico em essência, profundamente mesclado ao pensamento hermético e neoplatônico que o sustenta. Ele conduz a magia renascentista às suas fontes pré-cristãs e as demonstra serem tão válidas e ricas quanto a cristã, tendo, inclusive, o mérito de se enriquecerem mutuamente.

É necessário aceitar o diferente, segundo Bruno, com suas riquezas e pontos de vista complementar ao modo de ver do mundo cristão. Bruno, tal como antes fizera Plotino, considerava a religiosidade pré-cristã uma forma de exercício para uma vivência plena, mística e direta com o Uno. Isso foi fatal para Bruno, que surgiu uma época de extrema intolerância religiosa (e que - sejamos honestos - ainda perdura de forma sutil e ainda mais cruel na Igreja Católica, como no exemplo da condenação da Teologia da Libertação) e de seus formuladores, como Leonardo Boff, e no falso discurso ecumênico que esconde interesses políticos, em que é cegamente seguida por sua filha pródiga: o universo das igrejas e seitas evangélicas), e que buscava no hermetismo um refúgio a cegueira fanática da inquisição. E Bruno vem à tona pregando um reconhecimento da herança pagã antiga e da liberdade de pensamento filosófico-religioso, o que, por si, era uma ameaça e uma atitude por demais revolucionárias para serem suportadas pelo poder de Roma.

O pensamento de Bruno era holista, naturalista e espiritualista. Dentre suas idéias especulativas, destacamos a percepção de uma sabedoria que se exprime na ordem natural, onde todas as coisas, quer tenhamos idéia ou não, estão interligadas e se interrelacionam de maneira mais ou menos sutil (holismo); a pluralidade dos mundos habitados, sendo a Terra apenas mais um de vários planetas que giram em volta de outros sistemas, etc. Por tudo isso, por essa ousadia em pensar, Bruno - que estava séculos adiante de seu tempo - pagou um alto preço. Mas sua coragem serviu de estopim e incentivo ao progresso científico e filosófico posterior.