ANTECEDENTES DO CAPITALISMO

ANTECEDENTES DO CAPITALISMO

Carlos Gomes

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1.2 – SISTEMA TRIBUTÁRIO

As classes que assumiram o poder nas anteriores comunidades agrícolas, chefes de aldeia e de tribos, chefes militares e religiosos, feiticeiros e sacerdotes, sujeitaram ao seu domínio os outros habitantes, apoderaram-se dos seus campos e pastagens e reduzindo-os à categoria de servos, rendeiros ou pastores, forçaram-nos a pagar um tributo, pelo seu uso, equivalente a uma porção significativa das suas colheitas ou a um certo número de animais dos seus rebanhos. A terra arável e os pastos começaram a ser atribuídos a famílias inseridas na comunidade agrícola que tendem a cultivar, por sua própria conta, os campos comunais, a apropriarem-se dos instrumentos de trabalho e dos frutos recolhidos. A massa populacional, que vive na tribo ou no domínio, estava à disposição do chefe ou do senhor. Passou a haver grupos que possuíam a terra, bens fixos, gado, matérias-primas e outros meios de trabalho, mas não trabalhavam, e grupos que os sustentavam embora não fossem os possuidores destes meios de produção.

Os grupos dominantes basearam o seu poder na apropriação de excedentes e rendimentos, no domínio da terra e outros meios de produção, na acumulação de riquezas. Além do poder económico, a aristocracia passou a deter o poder político, religioso, militar e social.

Com o rendimento da tributação, as classes dominantes asseguravam a sua própria subsistência, a acumulação de riqueza, pagavam em espécies aos seus súbditos, soldados e funcionários e a pessoas que trabalhavam nos seus domínios. Em todos os continentes, embora em épocas diferentes, desde o Egipto faraónico aos antigos impérios asiáticos ou americanos, vemo-nos perante sociedades de tipo senhorial ou tribal que baseiam os seus rendimentos na tributação coerciva das classes subordinadas. Os camponeses não dispõem do controlo da terra nem da liberdade das suas pessoas, e o tributo assume a forma duma renda, duma corveia prestada na propriedade do senhor ou de dízima às instituições religiosas. O funcionamento dum aparelho estatal exigia uma desmedida recolha de excedentes produzidos pelas comunidades agrícolas. Os tributos incidiam também sobre moinhos ou outros bens fixos, utilizados tanto por camponeses como por artesãos. As prestações provinham, segundo os casos, duma unidade familiar, comunidade de aldeia ou tribo, podendo vir das unidades produtoras para serem entregues ao poder central ou fazer parte duma longa cadeia de tributos sucessivos.

O domínio tribal abrange em geral um território que envolve uma área de residência, de pastagens, de caça e de terras comuns. Os recursos do território, mesmo quando uma tribo impõe o seu controlo, são geridos segundo o livre acesso de todos os seus membros aos recursos hídricos e vegetais que dentro dessa área se encontram.

A criação de gado sofria igualmente a influência das relações económicas estabelecidas, como se pode observar nas terras comunitárias utilizadas para pastagens. Os encargos da sua utilização pagos pelos possuidores de gado constituíam uma receita, total ou parcial, da classe senhorial. Entre os povos nómadas a criação intensiva e posse de grandes rebanhos nas mãos de criadores individuais ou comunitários conduziu a que a tributação exigida por aqueles que reinavam assumisse a forma de entrega de cabeças de gado.

As classes dominantes não participam na actividade produtiva. Esta era realizada: por escravos que, além dos serviços domésticos, eram empregues na execução de tarefas mais rudes como certas modalidades de trabalho artesanal, minas e pedreiras; por servos, que não dispunham de si mesmo nem dos seus bens, e estavam adstritos ao cultivo de terra alheia, sem poder abandonar esse cultivo; pelo conjunto dos camponeses livres ou dos colonos que dispunham da sua parcela de terreno, da sua casa, da sua exploração e de instrumentos de trabalho. A ocupação de todo o tempo na actividade agrícola obriga a que a produção de instrumentos e os artefactos tenha de ser entregue a artífices independentes especializados na criação desses meios de produção. Alguns artífices trabalhavam nos arsenais ou nas oficinas dependentes dos serviços existentes dentro dos próprios palácios ou templos. Alguns deles estavam autorizados a trocar, em seu benefício, a produção excedente. A troca interna assume, numa primeira fase, a forma directa materializada entre produtores.

O senhor ou chefe da unidade económica detém, pelo costume ou pelo direito, todos os poderes dispondo assim soberanamente de todos as forças produtivas. A actividade produtiva está encerrada num quadro restrito, constituído por comunidades que formam economias autárcicas. Praticamente, são inexistentes as trocas externas com outros domínios, salvo quando realizadas entre povos nómadas e sedentários, pelo que são acompanhadas por uma quase ausência de espécies monetárias.

A técnica utilizada é muito rudimentar e pouco progressiva, baseada em ferramentas, pois as invenções são raras. O trabalho é realizado essencialmente por encomenda e o conjunto dos consumidores bem delimitado. Tratando-se duma economia fechada, onde as necessidades são conhecidas e pouco susceptíveis de alterações, é baixa a pressão demográfica e os mercados estão limitados ao domínio senhorial ou tribal. Os artesãos sujeitam-se apenas aos riscos provenientes de defeitos de construção ou exteriores, não correndo riscos económicos. Embora a esperança de lucro não esteja totalmente ausente, não constitui o móbil essencial da produção artesanal.

No âmbito dos domínios, senhorial e tribal, integram-se, além da terra e das pastagens, os bens imobiliários utilizados na actividade produtiva com carácter económico de bens de consumo duradouro. O primeiro objectivo da propriedade dos meios de produção é o gado e os prisioneiros reduzidos à escravatura, só depois surgem os instrumentos de trabalho e outros meios de produção, pertencentes total ou parcialmente aos produtores directos, nas esferas fundamentais da produção. Estava a cargo dos produtores o investimento em bens necessários à produção, bem como a constituição de reservas de produtos de consumo produtivo e a sua conservação.

Não é apenas na base da intensificação da exploração que as classes senhoriais podem aumentar a sua riqueza. Esta só pode crescer de forma vultuosa na proporção do alargamento da base territorial, onde podem buscar novos excedentes através do aumento do ritmo das suas conquistas.

Nas áreas da Mesopotâmia, Egipto, Vale do Indo e China, existia uma próspera agricultura com uma estável produção de excedentes, mas também uma divisão da sociedade em duas classes principais: uma classe de produtores rurais e artesãos e uma classe dominante que exigia uma parte da produção para si própria sob a forma de tributos.