ANTECEDENTES DO CAPITALISMO

ANTECEDENTES DO CAPITALISMO

Carlos Gomes

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4 – ACTIVIDADES TRANSPORTADORAS

4.1 – SISTEMA DE TRANSPORTES

O sistema de transportes é inegavelmente uma actividade produtiva, que exige o dispêndio duma certa quantidade de trabalho, e provoca o desgaste de materiais e instalações próprias. A locomoção das pessoas e dos bens tem implícita a utilidade e a valorização dos bens transportados. A deslocação não os afecta materialmente mas altera-os economicamente, pois ocasiona um aumento do seu valor e, consequentemente, a sua expressão monetária, o seu preço. Nisto assenta a base económica da actividade transportadora. Os transportes põem as matérias-primas, os meios de produção, os produtos fabricados, os bens de consumo ao dispor dos produtores ou consumidores que os irão utilizar.

Muitas limitações condicionavam os primeiros sistemas de transportes. Além das dificuldades naturais, com os caminhos intransitáveis em determinados períodos do ano, a navegação fluvial ou marítima tinha de escolher as melhores épocas para os seus carregamentos. Os meios utilizados no transporte eram tão rudimentares que era impensável acelerar a capacidade de escoamento dos produtos num curto prazo ou encurtar o tempo médio de duração de cada viagem. O elemento “tempo” era um dado que escapava em parte à vontade do homem. A coordenação dos meios de deslocação era muito incipiente, meramente empírica e não ultrapassava a esfera regional. Esta situação era agravada pelas deficientes técnicas de conservação de géneros deterioráveis.

Todos os meios de transporte, face ao valor das mercadorias que carregavam, exigiam o uso de meios de defesa e o acompanhamento de forças militares. Os cocheiros também acabavam por estar envolvidos em actividades militares. Eram frequentes os assaltos em terra e mês no mar.

No sistema tributário, o transporte das mercadorias por terra ou por água era dificultado pela exiguidade dos reinos, dos feudos ou dos municípios. Continuamente era preciso pagar portagens, direitos alfandegários ou municipais, tanto sobre as importações como sobre as exportações.

Mesmo com estas limitações, os transportes não deixaram de evoluir acompanhando de muito perto o crescimento da produção e a intensificação das trocas internas e, progressivamente, as transacções externas. Foi muito intensa a influência exercida sobre as actividades locais, sobretudos nas condições de subsistência de alguns povoados. Os transportes contribuíram ainda para o acréscimo da quantidade de bens fabricados, para a mudança de economias quase hermeticamente fechadas, a diminuição de núcleos auto-abastecidos, e para colocar à disposição da sociedade os bens susceptíveis de comercialização. Os mercadores tiravam vantagens significativas destes factos. Com a evolução das estruturas comerciais, o transporte destaca-se como ramo de actividade distinto.

A unificação de muitos povos sob um único poder político influenciou a intensidade do trânsito, tanto terrestre como fluvial ou marítimo. Foram abertas novos sistemas de comunicação, novas rotas mercantis que ligaram terras distantes e permitiram não só a troca de mercadorias, mas também a divulgação de conhecimentos científicos, de novos produtos e de descobertas tecnológicas. Em contrapartida, também disseminaram epidemias e abriram caminhos a invasores. Alguns países, pela sua posição geográfica ou condições naturais, tornaram-se progressivamente elos de ligação de rotas internacionais de transportes e redes de comercialização. O estabelecimento de rotas comerciais terrestres e, posteriormente, transoceânicas entre o Oriente e o Ocidente permitiu o acesso aos conhecimentos e inventos acumulados durante séculos por cientistas e tecnólogos chineses, indianos, árabes e persas.

Algumas dessas rotas ficaram célebres na história. É o caso da rota do âmbar que na Europa permitiu a distribuição de diferentes tipos de metais e estabeleceu vínculos estreitos entre diferentes regiões muitas vezes distantes umas das outras. Uma outra importante rota terrestre europeia, denominada “Estrada das Peles” começava a norte de Constantinopla e terminava nas florestas polacas, russas e siberianas, abastecendo aquelas regiões de peles e também de escravos provenientes do mundo islâmico. As rotas gregas seguiam vias fluviais e terrestres que atravessavam a Crimeia, o Cáucaso e chegavam à Rússia Central.

O comércio exercido por terra pôs em contacto os povos das estepes asiáticas, turcos e mongóis, com as grandes civilizações sedentárias o que lhes permitiu desempenhar um papel central na transmissão de bens e técnicas, bem como a riqueza cultural e as descobertas científicas. As rotas comerciais mais famosas eram as que percorriam as regiões do Sara, ligando a África Ocidental ao Mediterrâneo, cujas origens remontam ao século XI. As tribos nómadas, por uma questão de segurança, percorriam as rotas comerciais sempre em caravanas.

Uma das mais célebres rotas terrestres foi a chamada “Rota da Seda” que ligava a China ao Mediterrâneo, através dum sucessão de oásis, em direcção às cidades sírias e a Constantinopla; estendia-se por cerca de sete mil quilómetros e era a única rota transcontinental; algumas trajectórias complementares atravessavam a Índia e países da Ásia Central. Esta rota foi a primeira via de disseminação da seda, mas a China beneficiou também com a introdução de importantes culturas agrícolas provenientes sobretudo da Ásia Central. Com a expansão da navegação marítima portuguesa a rota terrestre da seda perdeu a preponderância.

Com a abertura das Rotas do Grande Mar, as antigas estradas de caravanas perderam a sua importância e as ligações com o ocidente foram desfeitas. A rota do cabo assumiu, no princípio do século XVI uma função predominante na economia portuguesa ao provocar, entre outras consequências, a subordinação dos entrepostos africanos. Iniciou a sua actividade num regime de liberdade de comércio, mas bem cedo foi decretado o monopólio régio.