ANTECEDENTES DO CAPITALISMO

ANTECEDENTES DO CAPITALISMO

Carlos Gomes

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7.6 – INSTABILIDADE MONETÁRIA

As manipulações monetárias verificaram-se, quase sem excepção, por meio da desvalorização da moeda metálica. Quebrar a moeda consistia em alterar para mais o seu valor, pela simples fixação de maior valor para determinados tipos de moeda em curso ou através da sua multiplicação pela recunhagem, em que o valor oficial da moeda continuava o mesmo mas a quantidade de ouro ou prata diminuía.

A instabilidade monetária provinha da dupla existência da pequena moeda de bilhão (moeda feita duma liga de cobre e prata, que chegou a ser só de cobre), de certo modo fiduciária, e das grandes peças de ouro e prata, cujo preço era fixado de harmonia com os seus cursos ordinários. O curso comum das moedas de ouro e prata, que determinaria a prazo maior ou menor o curso oficial era, por seu lado, determinado por circunstâncias económicas diversas.

Para evitar a especulação e a fuga da boa moeda, as autoridades lançaram mão da desvalorização da moeda de conta e do aumento da cotação oficial das moedas de ouro e prata. Cada soberano adoptou providências semelhantes, transformando a medida numa autêntica corrida às desvalorizações. A adopção deste expediente serviu também como meio diminuir a crónica situação deficitária da fazenda das grandes monarquias.

A moeda de conta estava representada na circulação por peças de valor fiduciário. Não era, portanto, necessário reduzir o peso ou a qualidade das grandes peças, mas apenas sobrevalorizá-las em moeda de conta. A escassez de prata forçou alguns soberanos a diminuírem o metal fino das moedas, mediante a junção de cobre ou ainda a cunhagem de cobre puro. Estes expedientes revelara-se insuficientes e incapazes de restabelecer o equilíbrio monetário e, antes pelo contrário, produziram efeitos catastróficos. A desorientação dos governantes fez alterar providências inflacionistas e deflacionistas sem se conseguir a almejada estabilidade e motivou graves perturbações internas, no século XVI. A estabilidade só se conseguiu, no século XVIII, com a declaração de que a unidade monetária corresponde a uma quantidade fixa de metal precioso.

O circuito internacional de feiras oferecia magníficas oportunidades de especulação para homens de negócios e banqueiros. A rede de correspondentes permitia aproveitar qualquer conjuntura de lucro, por meio da prática do que se chamava câmbio por arbítrio, que originou o conceito de arbitragem. O câmbio por arbítrio consistia em sacar letras sobre aquela praça ou feira em que a cotação ou a ulterior disposição do dinheiro se tornasse mais vantajosa. Outra forma de especulação foi o depósito de feira a feira, adiantamento de dinheiro a juro variável, segundo a situação do mercado, que vinha a corresponder ao empréstimo a juros a curto prazo.

No período de declínio do Império Romano agudizou-se a inflação monetária, no século III, verificando-se um desregramento contínuo da cunhagem levada a cabo por um tesouro cujas despesas excediam sempre os rendimentos. A inflação era, porém, um sintoma de problemas económicos mais fundamentais. A inflação monetária foi uma das causas do declínio do Império. Os pesos e o toque das moedas foram reduzidos e, por conseguinte, a moeda tornou-se fiduciária. No século IV, as sucessivas reformas monetárias resultaram numa inflação considerável que em vão se tentou radicar com o congelamento dos preços.

No Japão, século XVII, os governantes dedicaram-se a uma operação de adulteração da moeda, chegando a reduzir em 80 por cento a quantidade de ouro e de prata utilizada na cunhagem, perdendo-se a confiança nas mesmas.

Em Portugal, quebrar a moeda era uma faculdade exercida exclusivamente pelos soberanos, embora na sua efectivação e nas formas de substituição a nobreza e o clero obtivessem privilégios avultados. Esta prerrogativa tinha efeitos calamitosos não só pela extorsão que implicava mas também pelas consequências que originava no equilíbrio económico resultante da alta dos preços, provocando uma redistribuição de rendimentos e conflitos constantes na fixação dos preços.