ANTECEDENTES DO CAPITALISMO

ANTECEDENTES DO CAPITALISMO

Carlos Gomes

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4.4 – COMUNICAÇÕES MARÍTIMAS

Antes do início das viagens oceânicas, os transportes marítimos eram essencialmente costeiros, raramente os navegadores perdiam a terra de vista. Mesmo sem bússola, pequenos barcos e jangadas à vela levavam a cabo um comércio junto à costa e conseguiam ligar regiões marítimas distintas. Na navegação de cabotagem eram utilizadas embarcações artesanais, pequenas e rudimentares, dispondo dum mastro e duma vela, mas que já transportavam regularmente os mercadores com os seus artigos, além de provisões, guerreiros e despojos saqueados. Outras embarcações eram impulsionadas por remos, calculando-se que tivessem capacidade para vinte pares de remadores. A força dos remos continuou a ser um elemento crucial mas foi gradualmente reduzida, ficando restrita a pequenos barcos.

A construção de melhores barcos permitiu travessias mais económicas e mais seguras. Providos de instrumentos náuticos, de cartas e de conhecimentos técnicos cada vez mais aperfeiçoados, hábeis marinheiros podiam estabelecer a ligação dos seus países com o resto do mundo. Os portos foram dotados de cais, oficinas de reparação e armazéns de aprovisionamento. Locais bem escolhidos eram dotados de numerosos de faróis e bóias, o que ajudava os marinheiros a seguir as suas rotas com mais segurança.

Os navios de guerra não eram apenas utilizados para fins militares, mas também para garantir a segurança da navegação e dificultar a pirataria ou o corso. Com frequência, as galés eram utilizadas em acções de transporte de produtos e, por sua vez, os navios de comércio eram usados como apoio nas expedições bélicas.

As viagens de marinheiros e mercadores proporcionaram o povoamento de inúmeras ilhas e a fundação de inúmeros povoados junto à costa, muitos dos quais passariam mais tarde a cidades.

O progresso dos transportes marítimos teve por base o crescimento da produtividade agrícola e o desenvolvimento da circulação mercantil, sobretudo através do comércio externo. A via marítima tornou-se o meio mais utilizado para o transporte comercial.

Com a expansão dos transportes marítimos, a ousadia comercial obrigou a calcular os riscos incorridos. As primeiras taxas de coberturas de riscos foram calculadas com base no acaso. Porém, no século XVII, leis matemáticas relativas ao risco foram estudadas em diversos países da Europa com o auxílio do cálculo das probabilidades que ocupou então o espírito dos melhores matemáticos. Os mecanismos de partilha de riscos foram importantes para encorajar o comércio e ampliar o crédito.

Os seguros marítimos e comerciais foram instaurados em Itália antes de 1300. No século XIV, foi criada, pelos portugueses, a Companhia das Naus que inscrevia todos os navios, incluindo os reais, com o registo dos preços das embarcações, a idade, os seus lucros, o que constituiu a base de cálculo de eventuais indemnizações. Os comerciantes e donos dos navios depositavam, como participação obrigatória, 2% do valor dos lucros de cada viagem. No século XVII, na Índia os seguros cobriam o valor dos bens transportados. Na praça de Antuérpia foram estabelecidas as Ordenações de Seguros, mas só no século XVIII o seu uso se tornou universal. O sistema de seguros generalizou-se por meio de contratos controlados pelas corporações mercantis. Além das mercadorias podiam segurar-se o casco, a mastreação e o recheio do navio. Era cobrada uma taxa de seguro que variava entre 6 e 10% para portos europeus e cerca do dobro para as viagens a portos africanos ou americanos.

Os primeiros carregamentos de mercadorias podem ter ocorrido no Egipto, onde as embarcações se deslocavam na costa do Mar Vermelho com produtos locais: ébano, marfim, ouro, resina, peles de leopardo.

No Mar Egeu, as reduzidas capacidades das ilhas para desenvolver a economia agrícola forçou os seus habitantes a concentrar a atenção no mar e nos seus recursos. Os seus navios estabeleceram trajectos, que permitiam a ligação entre as ilhas e a costa do Mediterrâneo Oriental, sem perderem de vista a terra. Os aperfeiçoamentos introduzidos pelos fenícios na construção naval permitiram a navegação no alto mar facilitando o comércio de longa distância.

No início da nossa era, os barcos já não eram obrigados a praticar a navegação de cabotagem podendo viajar por mar alto, o que trouxe grande prosperidade às cidades do Sul da Arábia e provocou uma expansão do comércio entre o Egipto e a Índia e entre esta e a China.

Na China, no I milénio d. C, realizaram-se grandes progressos na construção de barcos e na navegação, os marinheiros passaram a guiar-se também pela bússola. No século XI, a China tornou-se uma grande potência marítima. Estes avanços permitiram aos navios chineses contornar a Ásia Meridional, desembarcar nas margens do Mar Vermelho, atingir a África Oriental e navegar até ao Japão e Sudeste da Ásia. A sua extensa costa e os bons portos de abrigo possibilitaram a intensificação do transporte costeiro de cereais e outras mercadorias, como tecidos, produtos manufacturados, louça de porcelana. Porém, no ano de 1433, as expedições chinesas foram interrompidas bruscamente, a China pôs fim à sua actividade marítima com o exterior e fechou-se numa espécie de isolamento. Terminou assim um período de cerca de quatro séculos em que foi a principal potência marítima da Ásia

Após a fundação do islamismo, os árabes desenvolveram a navegação no Mar Vermelho; as rotas marítimas ligavam o Mediterrâneo à costa atlântica de Marrocos; a Índia era uma escala natural destas rotas marítimas, que chegaram à China e Indochina; raramente enfrentavam os mares do Extremo Oriente; a navegação árabe contribuiu para ligar as várias regiões do Oriente e do Ocidente numa vasta rede comercial. No porto de Áden aportavam os navios indianos e chineses, cujas cargas eram depois transferidas para embarcações árabes que subiam o Mar Vermelho. Os mercadores traziam as suas mercadorias da Malásia; partiam da Índia em direcção à Arábia ou desviavam-se para a costa oriental africana, donde traziam os escravos. No século. XVI, os árabes não dispunham de meios técnicos para competir com os europeus porque ainda usavam barcos à vela incapazes de navegar contra a direcção do vento.

Na Europa, até aos séculos XIII e XIV, a maior parte dos transportes marítimos ainda era feito unicamente por cabotagem, o que justifica a grande quantidade de portulanos, mapas minuciosos das costas marítimas, que foram levantados nessa época.

A notável actividade marítima dos portugueses não podia surgir do nada. Além da técnica naval que tornou possível a construção das frotas das caravelas, a prática da navegação anterior facilitou a existência dum corpo de marinheiros dispondo de pilotos que guiavam as caravelas, bem como de mestres e capitães que as dirigiam. Os pescadores da orla marítima desempenharam um papel de vulto na criação da marinhagem comercial. A influência árabe, que já se dedicava largamente ao comércio marítimo, legou conhecimentos essenciais que, uma vez aperfeiçoados, contribuíram para o avanço dos descobrimentos. Porém, a navegação árabe e muçulmana começou a declinar desde que os portugueses entraram no Oceano Índico. No século XV, foram armadas caravelas e procurou-se dar início a um novo tipo de relacionamento, de cariz mercantil, tendente a desviar as redes comerciais terrestres para o litoral e iniciar o combate económico contra as caravanas.

Em 1508, os portugueses estabeleceram o controlo completo sobre o golfo Pérsico e proibiam os barcos nativos de negociar no golfo sem uma licença. O domínio da navegação no Índico, levou as autoridades portuguesas a criar um salvo-conduto para os comerciantes, denominado “cartaz”, mediante o pagamento duma determinada quantia, sob pena de a carga ser apreendida e o navio apresado ou metido a pique. A adopção desta medida era uma forma de estabelecer o domínio sobre a navegação e os circuitos comerciais interasiátios e impor um monopólio do comércio marítimo do Índico. Porém, a última década do final do século marcou um período de sérias dificuldades, vítima de ataques de holandeses e ingleses, que lentamente começaram a estruturar carreiras regulares implementadas com a formação de companhias privilegiadas.

Na Oceânia, século XVI, os nativos estavam de posse duma avançada tecnologia de canoagem à vela, o que lhes permitiu viajar pelos Oceanos Índico e Pacífico. Fizeram explorações em enormes barcos à vela de casco duplo concebidos para atravessar as vastidões oceânicas.

Na América Central, os maias, que viviam nas áreas costeiras, construíram grandes canoas. No século XVII, já sob ocupação espanhola, foram usados grandes navios que transportavam de emigrantes e grandes quantidades de mercadorias. Na viagem de regresso, estes navios partiam com carregamentos de prata.