ANTECEDENTES DO CAPITALISMO

ANTECEDENTES DO CAPITALISMO

Carlos Gomes

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7.3 – ARISTOCRACIA

O que caracteriza as classes senhoriais é o facto dos seus membros não realizarem uma actividade de carácter produtivo directo mas poderem apropriar-se duma elevada parcela da riqueza social graças à disposição dos meios materiais de produção mais importantes, a qual se estendia de forma mais ou menos acentuada até à própria pessoa dos produtores. Este domínio era acrescido por certos meios de acção acessórios como o poder político centralizado no soberano, a força das armas da nobreza ou o predomínio espiritual e cultural do clero.

No sistema tributário, o soberano, o clero e a nobreza, constituíam as classes dominantes: o soberano desempenhava as funções estatais, a igreja prestava ajuda espiritual, a nobreza protecção militar. Em troca exigiam da população o pagamento sob a forma de cultivo de terras e prestação de serviços. As condições necessárias da existência económica das classes senhoriais constituíam função directa da percepção dum tributo ou duma renda.

A classe soberana desenvolveu-se no seio de numerosas sociedades agrícolas e pecuárias. Esta classe congregava os grupos que detém, duma forma clara e aceite ou não por todos, directa ou indirectamente, o poder político, o poder económico e, eventualmente, o poder judicial e ideológico. A classe que detém o poder material detém, em geral, ao mesmo tempo, o poder espiritual.

Antes, o xamane era o único especialista religioso. Tornou-se depois sacerdote e o seu poder religioso combinou-se com o poder económico e político. O que define o clero como classe dominante são as relações mantidas com as outras camadas da população. A força espiritual exercida constituía um dos mais fortes elementos que permitiu o alargamento constante da sua riqueza, facilitando o reforço da sua posição económica. Entre os factores não económicos que concorriam para assegurar o especial poderio do clero é de registar o exclusivo da cultura, a imensa projecção espiritual e a sua força política com efeitos materiais profundos. A classe dos sacerdotes desempenhava na sociedade um papel de relevo sendo o sumo-sacerdote referido como a pessoa mais respeitada depois do soberano. O seu poderio económico resulta duma direcção centralizada e da conservação da riqueza, acumulada através dos tempos, sob formas institucionalizadas impeditivas da dispersão de bens ao longo das sucessivas gerações.

Existiam duas camadas distintas de clérigos: uns, eram membros do clero secular, desfrutando de grandes domínios e rendimentos; outros, membros do clero regular, constituíam um grupo mais numeroso e viviam modestamente por imperativo económico. Alguns destes sacerdotes eram autênticos camponeses colonos dos superiores hierárquicos. Entre estas duas camadas existiam relações de dependência, com direitos e deveres mútuos. Os grandes templos, podiam ter um grupo de funcionários, incluindo um número elevado de escribas, capatazes, guardas, encarregados de armazéns, dos celeiros e do gado, e um grupo de trabalhadores livres, servos e até escravos.

A actividade social da nobreza não era apenas determinada pelos interesses assentes nas formas de exploração das terras e domínios que lhes pertenciam. Era um grupo senhorial que dependia economicamente do soberano, das quantias anuais recebidas e dos réditos da administração territorial. Com o fim de alargar a sua base económica como classe dominante era frequente tentar a usurpação de domínios dos reis e da própria Igreja. Das posições da fidalguia transparece a legitimação política da sua existência e manutenção pelos serviços prestados à coroa, serviço que em regra deriva da colaboração militar ou da cooperação na actividade administrativa em benefício dos monarcas. O poder da nobreza existia em função da sua capacidade de apropriação de uma renda e de importantes excedentes, como o tributo. Esse poder assentava também na sua força militar.

Com o desenvolvimento do comércio, uma parte da nobreza a viver de rendas fixas a longo prazo vê-se arruinada, na medida em que o domínio da terra se degrada como forma e fonte de riqueza, perdendo assim a sua posição dominante. Porém, a riqueza dos nobres que decidiram investir noutros sectores, como comércio por atacado, indústria, construção naval e finanças, em aliança com a burguesia, foi aumentando a um ritmo constante.

A defesa das aldeias, enquanto os agricultores e os pastores se encontravam no campo, deu lugar ao aparecimento gradual duma classe de guerreiros profissional. Em caso de perigo todos os homens válidos pegavam em armas mas, com o decorrer do tempo, uns quantos acabavam por assumir com permanência a responsabilidade da manutenção da segurança. Tais actividades exigiam um comandante, papel que coube inicialmente ao chefe da aldeia ou da tribo, cujos poderes assumiram também um carácter militar. Os guerreiros mantidos pelos palácios constituíam uma espécie de aristocracia militar que beneficiava de grandes propriedades rurais em troca dos serviços que prestavam. Por vezes, estes militares eram parentes do rei. O aparecimento de novas actividades aliadas a uma insegurança crescente, levaram à ampliação da classe guerreira que foi assumindo um papel determinante na sociedade. À medida que se desenvolvem conflitos bélicos frequentes, ou quase permanentes, passou a existir uma classe de militares a assumir uma importância crescente e a constituir um novo grupo social. O aparecimento de novas técnicas na arte da guerra estava associado à elevação deste grupo social que consistia em guerreiros especializados.

O líder militar passou a ter um papel cada vez maior e o cargo tornou-se permanente em vez de temporário. Os chefes militares tinham direito a uma parcela considerável dos saques de guerra, eram responsáveis pela guarda dos templos, dos palácios e dos cidadãos, concentravam cada vez mais o poder nas suas mãos, empurrando as instituições tradicionais para segundo plano. Frequentemente um comandante militar bem sucedido apoderava-se do poder.

Na Europa Ocidental, o poderio da nobreza não foi, em parte alguma, totalmente eliminado antes do fim do século XVIII. Até então, as bases do poder mantiveram-se as mesmas: isenções fiscais, a posse hereditária da terra, a ocupação de elevados cargos tanto ao nível da administração, como do exército e da igreja.

Na América, os astecas tinham um chefe hereditário e as circunscrições principais dispunham de chefes de circunscrição nomeados, normalmente oriundos da classe guerreira. Entre os incas, o vértice do poder era um soberano com poderes autocráticos; entre a nobreza saíam muitos dos administradores de nível superior, com uma variedade de funções destinadas à conservação e expansão do império.