TURyDES
Vol 4, Nº 10 (julio/julho 2011)

O PLANO DIRETOR PARTICIPATIVO MUNICIPAL (PDP) COMO REFERÊNCIA PARA O PLANEJAMENTO DO DESENVOLVIMENTO INTEGRAL E SUSTENTÁVEL DOS MUNICÍPIOS TURÍSTICOS

Dea Caldas Niquini (CV) y Reinaldo Dias (CV)

 

INTRODUÇÃO

Este artigo objetiva investigar o Plano Diretor Participativo Municipal – PDP como um instrumento de política urbana orientador do planejamento público do desenvolvimento integral e sustentável dos municípios turísticos. O PDP compreende um instrumento de política urbana municipal que, segundo o Estatuto da Cidade (2001), deve orientar a elaboração de todos os demais, tais como: a Lei de Diretriz Orçamentária – LDO, a Lei de Orçamento Anual – LOA, o Código de Posturas e todos os demais planos setoriais, os quais pretendem aprofundar nas matérias mais específicas relacionadas à gestão do município, assim como o Plano Municipal de Turismo. Para a investigação, foi desenvolvido primeiramente um referencial teórico que objetivou conhecer as definições e conceitos já desenvolvidos acerca do tema. Após o referencial, foram feitas entrevistas semiestruturadas com agentes públicos da área do planejamento e do desenvolvimento das cidades e do turismo, a fim de entender a função do Plano Diretor Municipal como orientador das políticas públicas municipais, ou seja, dos planos setoriais, estudar o processo de planejamento do desenvolvimento integral e sustentável dos municípios turísticos, pesquisar as perspectivas de relação entre o PDP e o planejamento do desenvolvimento integral e sustentável dos municípios turísticos. Também foi realizado o estudo do caso de Ouro Preto, cidade mineira, Patrimônio com reconhecido apelo turístico e consolidado fluxo de turistas, a fim de confrontar as teorias e informações adquiridas do referencial teórico e entrevistas com a realidade de uma cidade turística mineira.

A cidade de Ouro Preto foi elevada, em 1933, a Monumento Nacional. No ano de 1938, Ouro Preto teve seu conjunto arquitetônico urbanístico inscrito no Livro de Tombo de Belas Artes e em 1986 nos Livros Histórico e Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Tamanha sua importância arquitetônica, o Iphan mantém em Ouro Preto a 13ª Coordenação Regional do Iphan e a 13ª Sub-Regional II para tratar dos assuntos relacionados à preservação desse Patrimônio Arquitetônico Histórico e Cultural.

Por compreender um tema bastante complexo, outras investigações, análises e conclusões podem ser mais bem esclarecidas por meio da leitura da dissertação O Plano Diretor como instrumento para o planejamento público do desenvolvimento turístico: o caso do município de Ouro Preto – MG.

APRESENTAÇÃO

O processo de globalização ocasionou modificações na estrutura do poder público e na forma de condução das decisões e intervenções políticas e jurídicas relativas ao desenvolvimento das cidades. O novo discurso pressupõe ao poder público municipal a obrigação de suprir as necessidades locais dependendo o mínimo possível dos demais níveis de governo.

Diante da diversidade e da complexidade dos problemas das cidades, torna-se o planejamento do seu desenvolvimento uma ação de grande importância no sentido de se construírem cidades mais justas para a maioria da população e evitar o desperdício de energia em ações ineficientes e ineficazes para o desenvolvimento do local. No processo de desenvolvimento das cidades, planejar implica estudar e reconhecer a realidade e traçar estratégias para o desenvolvimento a partir dela. Significa interpretar as estruturas endógenas e principalmente reconhecer as divergências, os potenciais interesses diversos.

A partir da perspectiva de desenvolvimento em âmbito local, a atividade turística tem sido entendida como uma excelente alternativa econômica para o desenvolvimento dos territórios de interesse turístico. De acordo com a OMT – Organização Mundial de Turismo (2003), “o setor de viagens e turismo é o maior e mais diversificado do mundo” (OMT, 2003, 17). Tem se consolidado em muitas nações como fonte de geração de renda, criação de postos de emprego e melhoria da infraestrutura, impulsionando o crescimento do setor privado. E nesta perspectiva, a atividade “se tornou um dos principais setores socioeconômicos mundiais” (p.17).

Entretanto, para fins do desenvolvimento socioeconômico dos municípios de interesse turístico, devem constar alguns imperativos, a fim de que o turismo efetive a melhoria da qualidade de vida local e a sustentabilidade da localidade como destino turístico. Para que o turismo se estabeleça como uma via de desenvolvimento dos territórios de interesse turístico, é essencial a articulação do desenvolvimento da atividade com o desenvolvimento do município de uma forma geral.

Para isto é fundamental manter a coerência do turismo local com as demais políticas públicas de desenvolvimento da cidade, contempladas pelos instrumentos de política urbana. O objetivo deve ser o de estabelecer um ambiente sinérgico e cooperado por meio da coerência entre o planejamento do desenvolvimento do turismo e as demais expectativas de desenvolvimento da cidade, de modo que o turismo se efetive como uma via do desenvolvimento integral e sustentável das localidades.

O PDO COMO REFERÊNCIA PARA OS PLANOS SETORIAIS

O Estatuto da Cidade, Lei nº 10.257 de 2001, capítulo II, seção I, art. 4º, inciso III, estabelece as diretrizes gerais da política urbana de planejamento municipal e os instrumentos necessários à ordenação e ao uso do solo. Entre eles estão:

CAPÍTULO II – DOS INSTRUMENTOS DA POLÍTICA URBANA

Seção I – Dos Instrumentos
Art. 4º Para os fins desta lei, serão utilizados, entre outros instrumentos:
I – planos nacionais, regionais e estaduais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social;
II – planejamento das regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões;
III – planejamento municipal, em especial.
a) Plano Diretor; b) disciplina do parcelamento, do uso e a ocupação do solo; c) zoneamento ambiental; d) plano plurianual; e) diretrizes orçamentárias e orçamento anual; f) gestão orçamentária participativa; g) planos, programas e projetos setoriais; h) planos de desenvolvimento econômico e social; [...].

Como premissa da Lei 10.257, de acordo com o Guia do Estatuto (2001), o PDP deve corresponder ao plano de partida para a elaboração dos demais instrumentos de política urbana, de modo que mantenham uma referência comum. A Lei do Estatuto da Cidade determina aos municípios a revisão dos instrumentos que tenham sido elaborados anteriormente ao PDP, adequando-os às regras e orientações contidas no mesmo, após sua aprovação.

Por sua vez, o PDP deve se manter adequado às premissas da Lei Orgânica Municipal , a qual deve reger a relação entre os poderes municipais.

Segundo a Caixa Econômica Federal , a partir da leitura da cidade real, que envolve temas e questões relativos aos aspectos urbanos, sociais, econômicos e ambientais , o Plano Diretor deve embasar a formulação de hipóteses realistas sobre opções de desenvolvimento e modelos de territorialização. Mukai (2001, p.33) entende o Plano Diretor como um “instrumento legal que visa propiciar o desenvolvimento urbano (portanto, da cidade) do município, fixando diretrizes objetivas (metas), programas e projetos para tanto, em horizonte de tempo determinado”.

A partir dos autores de PDP estudados, o instrumento deve se orientar por algumas premissas básicas: manter como objetivo o desenvolvimento do bem comum (coletivo) em detrimento de interesses particulares; respeitar o equilíbrio entre as formas de desenvolvimento econômico, social e humano da cidade; assumir como princípio balizador o redirecionamento dos recursos e riquezas de forma mais justa; garantir o exercício do direito a cidades sustentáveis e a preservação do meio ambiente natural/ecológico; perseguir a eliminação da pobreza e das desigualdades sociais; e priorizar a inclusão e o atendimento das necessidades dos grupos marginalizados e excluídos da cidade.

Para o Crea-MG (2005), as principais funções do PDP são, neste sentido, garantir que a terra urbana sirva para o benefício da coletividade; que o desenvolvimento local ocorra de maneira sustentável; a realização da melhoria da qualidade de vida e da justiça social; a preservação e a reabilitação do patrimônio cultural e ambiental ; e a boa aplicação dos recursos públicos.

O PDP, como instrumento do planejamento do desenvolvimento da cidade, deve também fornecer orientações sobre a utilização e a expansão do espaço urbano e rural, e ainda estabelecer diretrizes para adequada ocupação por parte do poder público, da iniciativa privada e da população. O Estatuto (2001) afirma o instrumento como “parte integrante do processo de planejamento municipal, devendo o plano plurianual , as diretrizes orçamentárias e o orçamento anual incorporar as diretrizes e as prioridades nele contidas” (§ 1° do art. 40). De modo que as suas diretrizes sejam cumpridas e efetivem o pleno, sinérgico, integrado e equilibrado desenvolvimento da cidade. A execução do PDP vai exigir recursos orçamentários e financeiros. Por isto é fundamental a contemplação das ações previstas no instrumento pela Lei Orçamentária Anual – LOA, a qual descreve, no exercício anterior, os gastos previstos pelo Executivo, observadas as premissas contidas na Lei de Diretriz Orçamentária.

Por possuir caráter de plano e para que reflita a integralidade do território, a elaboração do instrumento deve ser antecedida por uma série de reflexões coletivas a respeito do desenvolvimento e expansão locais, e a sua elaboração concebida como uma forma de compactuar estas reflexões num plano comum de atuação. Os demais instrumentos de política urbana, tributária e fiscal terão, neste sentido, que ser capazes de providenciar que as reflexões, aspirações e expectativas, contidas no PDP, sejam realmente implementadas. Todavia, cabe citar a reflexão de Gasparine (2005), o qual considera que a característica de plano do instrumento não impede que sejam editados planos setoriais, após a instituição do PDP. Planos esses mais específicos a cada área de atuação estratégica para o desenvolvimento local, e que podem, inclusive, contribuir para a exeqüibilidade do PDP, na medida em que estiverem coerentes com o instrumento. Para o autor, os planos setoriais devem ser assim concebidos: “leis específicas ou genéricas destinadas a regular determinadas situações dentro de áreas indicadas no Plano Diretor. Nesses casos, todas essas leis devem estar devidamente atreladas ao Plano Diretor” .

É obrigatória a elaboração/revisão e a implementação do PDP para as cidades com mais de 20.000 habitantes; integrantes de região metropolitana; integrantes de áreas de especial interesse turístico; situados em áreas de influência de empreendimentos ou atividades com significativo impacto ambiental, segundo artigo 182 da CF/88 e artigo 41 do Estatuto da Cidade.

O PLANEJAMENTO PÚBLICO DO DESENVOLVIMENTO INTEGRAL E SUSTENTÁVEL DOS MUNICÍPIOS TURÍSTICOS

Como o ente que representa a coletividade, o governo se apresenta como o ator responsável pelo planejamento, elaboração, realização e acompanhamento dos mecanismos capazes de desenvolver o território sob sua jurisdição em parceria com os demais agentes. Inclusive é ele o ator que deve fomentar a participação e o envolvimento dos demais nos processos desenvolvimentistas. Ressalta-se a importância do desenvolvimento equilibrado e sustentado, para o qual se objetiva o desenvolvimento dos diversos ambientes em consonância com as capacidades endógenas locais.

Nesta perspectiva, a atividade turística tem sido interpretada, para a gestão de territórios, como uma alternativa econômica viável e ainda em expansão. Como exemplo, Pacheco (2007) recorda que as atividades relacionadas ao turismo geraram em 2006 mais de 30 bilhões de reais ao Brasil, tendo havido um aumento de passageiros circulantes em aeroportos de 7,38% em relação ao ano de 2005. Segundo ela, o ingresso de recursos de turistas estrangeiros chegou a 4,3 bilhões de dólares, aumento de 11,77%, se comparado a 2005, e o volume de recursos para o turismo, vindo do BNDES, chegou, no mesmo ano, a 84 milhões de reais.

O fenômeno turístico tem uma incidência de primeira ordem na vida das sociedades do núcleo receptivo. Positivos ou negativos, causar impactos é inevitável para uma atividade que se desenvolve em territórios gerando um aumento significativo de população, no caso flutuante, que ao mesmo tempo em que gera de recursos financeiros ao território, o consome. E consome seus recursos naturais e infraestrutura, tanto turística como básica.

Com relação aos impactos que o turismo pode gerar ao meio ambiente, Dias (2003) observa ter a atividade nascido sob os auspícios do capitalismo e, desta maneira, adquirido a racionalidade individualista e consumidora dos recursos naturais de forma insustentável, que caracteriza, inclusive, esse modo de produção.

De acordo com Cooper et al (2001, p.253), “o desenvolvimento bem-sucedido do turismo exige a construção de um plano ou de uma estratégia de desenvolvimento que seja flexível e minucioso”. Para os autores, a minúcia no planejamento do desenvolvimento da atividade se deve à complexidade da indústria turística e às consequências ambientais e sociais do seu desenvolvimento. Admitida a sustentabilidade, inclusive, como nada mais do que o planejamento sólido, na medida em que o desenvolvimento requer que o caminho seja sustentável. De outra forma, o processo estabelecido não pode ser identificado como “desenvolvimento”.

Planejar o desenvolvimento do turismo nas localidades, de modo que a atividade se efetive como melhoria da qualidade de vida da maior parte da população interessada, demanda a avaliação racional sobre as perdas e os ganhos advindos da atividade. Para isto, é necessário diagnosticar as potencialidades e necessidades de investimentos; estimar os possíveis impactos e providenciar os mecanismos para a minimização dos impactos negativos; pactuar os objetivos e metas entre os diversos atores; identificar as ações que deverão ser desenvolvidas para que os objetivos sejam alcançados; estabeler fontes de recursos; e determinar os responsáveis por cada tarefa descrita no plano local de desenvolvimento do turismo.

Beni (2002) avalia que o planejamento configura o raciocínio sobre os fundamentos do turismo, contendo três pontos essenciais e distintos: “estabelecimento de objetivos, definição de cursos de ação e determinação das necessidades de recursos” (p.80). Conforme o autor, o planejamento deve corresponder a um processo cíclico, em que as ações desenvolvidas são constantemente reavaliadas, realimentando um futuro processo de planejamento, a partir das informações geradas do processo anterior, tal como a figura que se segue

Admitido como um processo contínuo, permanente e dinâmico, segundo Petrocchi (2001), as estruturas de planejamento são capazes de manter o sistema de turismo em contínua operação, sendo realimentado a partir da “enorme interdependência e interação de seus elementos componentes” (p.80).

No tocante à administração pública do turismo em âmbito municipal, Dias (2003) faz algumas considerações. Aponta que o turismo espontâneo anteviu o desenvolvimento dos organismos oficiais do turismo, sendo necessário que esses se integrassem ao pessoal administrativo oriundo de outros campos, o que, agravado pelo sistema de capacitação ineficiente, proporcionou desequilíbrio (e proporciona até hoje) na composição do quadro de pessoal, aumento excessivo de técnicos sem o conhecimento necessário e suficiente sobre o turismo, e desequilíbrio entre o tamanho das administrações nos diferentes níveis governamentais. O autor menciona a elevada quantia gasta em salários e ordenados, com a consequente insuficiente porcentagem destinada à promoção, a obras de infraestrutura e a linhas de crédito ao empresariado relacionado ao turismo. E ainda, a atuação da administração pública geralmente se desenvolve de forma isolada da atividade privada, quando não em franca oposição ou disputa do tipo política.

O planejamento público do desenvolvimento estratégico do município por meio do turismo tem como objetivo estabelecer que o desenvolvimento da atividade ocorra de maneira ordenada, equilibrada e previamente pensada, de modo que efetive o desenvolvimento integral e sustentável do território. A participação do poder público no desenvolvimento do turismo deve ter como referência o bem comum, o coletivo, e deve a todo custo sustentar e, inclusive, fomentar a observação desse foco pelos demais agentes, durante todo o processo de planejamento e intervenção, ou seja, de realização e monitoramento do Plano Municipal de Turismo.

O PDP COMO REFERÊNCIA PARA O PLANEJAMENTO DO DESENVOLVIMENTO DOS MUNICÍPIOS TURÍSTICOS

O assessor da Presidência do Crea-MG para Assuntos de Planejamento Urbano, José Abílio , a princípio, compreende que o Plano Diretor deveria ser uma exigência imposta a todos os municípios. De modo a potencializar os impactos positivos do turismo na localidade, segundo o assessor, é possível que os municípios se preparem a partir do planejamento para atuar como destino turístico.

Na medida em que os Planos Diretores correspondem a um instrumento de planejamento cuja elaboração e execução deve ser coletiva, democrática e participativa, a comunidade, ao participar, pode inclusive se resguardar dos impactos que a atividade pode gerar.

A diretora de cidades do IAB-MG, Jurema Rugani , a inclusão desta categoria de cidade no rol das obrigadas a elaborar e implantar seus PDPs é simplesmente o reconhecimento de uma situação recorrente no cenário nacional, e que, pela ótica do planejamento (físico-territorial e financeiro), poderia começar a ser tratada a partir da elaboração PDPs.

Para ela, as cidades turísticas são especialmente atingidas por demandas originadas devido à pressão dos fluxos de turistas, que acabam por exigir maior resposta nos campos da infraestrutura, ou seja, saneamento (esgoto e água tratada, coleta e disposição de lixo), circulação e transporte, e saúde.

De acordo com o diretor executivo do Instituto Cidades, André Azevedo , se o ordenamento da cidade e a forma como se expande já são fundamentais em qualquer cidade, naquelas que têm pretensão turística tudo pode ser colocado a perder, se o crescimento da cidade não ocorrer de maneira organizada e controlada.

Segundo o diretor, a beleza e a qualidade ambiental das cidades turísticas são elementos de percepção sobre a qualidade do destino pelo turista. Não há, portanto, motivo para se pensar apenas tardiamente no seu desenvolvimento sustentável para conservar os seus potenciais, resolver as suas necessidades e ampliar os seus limites em consonância com a qualidade de vida local.

Conforme o diretor executivo da Associação dos Municípios do Circuito do Ouro, Leonardo Campolina , por mais que o turista busque um atrativo específico, ele leva na memória, seja fotográfica ou mesmo no imaginário, a cidade como um todo, com suas ruas, passeios, mobiliário urbano, seu povo e seus costumes. A cidade toda se integra com os atrativos turísticos e por isso deve crescer ordenada, de forma a proporcionar um ambiente agradável e harmonizado. Acredita o diretor que “uma cidade só será boa para o turista se antes for boa para quem vive nela. E nesta perspectiva, acredita ser o PDP fundamental.

Para a assessora técnica da Secretaria Nacional de Programas Urbanos do Ministério das Cidades, Yêda Barbosa , o impacto do turismo sobre as áreas urbanas é muito forte, podendo alterar completamente a dinâmica local – tomem-se como exemplo a especulação imobiliária ou a construção dos condomínios de segunda residência. E, se não for observada a capacidade de suporte local, pode haver um colapso dessa estrutura urbana, provocado pelo impacto gerado, caso da falta de água nas altas temporadas em alguns destinos turísticos.

Assim, para a assessora, a inserção dos municípios turísticos no rol de obrigatoriedade do Estatuto da Cidade estimula a prática de ações planejadas para esses territórios.

O assessor especial da Setur-MG, Mauro Werkema , entende o PDP como instrumento essencial, como uma indispensável tecnologia de gestão urbana que permite direcionar o crescimento da cidade, qualificar equipamentos urbanos, manter equilibradas as condições da vida domiciliar com a vida comercial e industrial, entre outros benefícios. Da mesma forma, assim se daria com a própria reabilitação urbana, hoje adotada em várias cidades do mundo que abrigam bairros antigos.

Segundo ele, as cidades com vocação turística, de natureza histórica/patrimonial, ou natural, ou com outros tipos de atrativos que as tornam destinos turísticos, exigem tratamento urbanístico especial, que deve ser contemplado pelos PDPs. Uma cidade turística torna-se uma cidade de qualidade turística quando conserva: segurança, limpeza, boa orientação ao visitante, boa oferta de serviços, acesso aos bens turísticos, entre outros aspectos. Tais condições são fundamentais para o desenvolvimento sustentável do turismo e exigem posturas e visão especiais de proteção e conservação do meio ambiente, com o devido enquadramento em políticas urbanas próprias.

O consultor da Coordenação Geral de Regionalização do Ministério do Turismo, Bruno Wendling , entende que, no momento atual, a organização do turismo nos municípios e regiões turísticas é fator fundamental para que o desenvolvimento dos destinos ocorra de maneira sustentável. Para isto, indica como referência para a organização do desenvolvimento da atividade o PDTIS (Plano de Desenvolvimento Turístico Integrado e Sustentável) como referência do planejamento do desenvolvimento da região turística à qual o município pertence e o Plano Diretor Participativo como referência do planejamento do desenvolvimento integral da cidade.

O profissional liberal do ramo de planejamento e arquitetura, Magalhães , reforça que a adoção do Plano Diretor como um instrumento de referência contribuiria para o desenvolvimento do turismo de maneira mais sustentável.

Os turistas não consomem somente os espaços especificamente turísticos, mas sim o destino de um modo geral. Nesta medida, deve o planejamento do desenvolvimento turístico do município considerar a cidade como um todo, inclusive financiando algumas intervenções neste sentido. No caso de Ouro Preto, a Lei Complementar número 29 se encontra em vigor desde 28 de dezembro de 2006 e estabelece o Plano Diretor do Município de Ouro Preto.

Para o secretário de Patrimônio e Desenvolvimento Urbano do Município, Gobbi , o que fundamenta a necessidade da elaboração dos PDPs para os municípios com interesses turísticos é a necessidade de se ter um planejamento estratégico correto e duradouro para as cidades que têm algum diferencial e/ou potencial turístico. Pois é sabido e notório que a cultura das administrações públicas, em especial as municipais, são imediatistas e não planejam suas ações e resultados a médio e longo prazo.

De acordo com o secretário, com a obrigatoriedade de construção e implementação dos PDPs, nada mais se objetiva que não seja um planejamento estratégico com respaldo legal, essencial ao futuro desses municípios considerados “especiais”, como Ouro Preto. Segundo ele, o Plano Diretor, como o próprio nome indica, direciona as estratégias e ações do Executivo Municipal no sentido de proporcionar o desenvolvimento sustentável do município em todas as áreas, proporcionando não só melhor qualidade de vida aos cidadãos, mas principalmente interferindo na melhoria das condições da cidade. Isto acaba por ser um indutor de desenvolvimento, principalmente do setor turístico, pois uma cidade melhor para os seus cidadãos é também melhor para os turistas.

Assim como para outros entrevistados, para o secretário, “limpeza, saneamento, prédios bem conservados, trânsito ordenado e controlado, eventos periódicos etc. só contribuem para incrementar o turismo e consequentemente se reflete no desenvolvimento e progresso da região”.

Para o secretário do Meio Ambiente de Ouro Preto , a maior importância da existência de um PDP para a cidade se deve, principalmente, ao seu “inquestionável patrimônio natural e cultural”, que inclusive justifica a vocação da cidade para o turismo.

Alguns entrevistados separaram, em um primeiro momento, o desenvolvimento do turismo do desenvolvimento da cidade. No decorrer das entrevistas acabaram demonstrando ter a percepção de que o desenvolvimento da cidade se desdobra para o turismo e vice-versa. Caso do vereador Andrade , quando menciona que o PDP não está diretamente relacionado ao turismo, mas salienta que a atividade é a maior vertente de transformação atual de Ouro Preto.

Esta transformação, segundo ele, pode ser observada na mudança do comércio que ocorria na Rua Direita e na Praça Tiradentes, que atendia em sua maioria à população local, com açougue, supermercado, sapataria, e agora são pontos comerciais voltados ao turismo. Há ainda a mudança de visão da população com relação ao turismo, que passou a ser entendido como uma alternativa de renda e não mais como “coisa de gente de fora”. A atividade, segundo o entrevistado, seguramente emprega hoje 3.000 pessoas na cidade, enquanto a indústria, que já empregou o mesmo número, atualmente emprega apenas 700.

Ao mesmo tempo em que vereador afirma que o PDP do município ainda não restringe e nem incentiva nada no tocante ao turismo, afirma também que o instrumento tem sido fundamental no sentido de organizar o desenvolvimento da cidade; diminuir o fluxo nos lugares atrativos como o Centro Histórico (Rua Direita, Rua São José, Alto da Cruz); organizar o funcionamento e o crescimento da cidade; conservar o patrimônio, já que Ouro Preto é uma cidade do século XXI, funcionando num espaço do século XVIII. Para o entrevistado, o PDP possui apenas uma relação indireta com o turismo, apesar de ser uma importante ferramenta de preservação do patrimônio, que ao mesmo tempo permite melhor qualidade para os moradores da cidade, que hoje enxergam o turismo como fonte de renda.

O Secretário de Turismo e Cultura de Ouro Preto, Toffolo , admite que o PDP representa um instrumento importante, de caráter abrangente. E realça a necessidade do complemento do instrumento com uma política municipal de turismo, que defina o planejamento estratégico para o setor. Segundo ele, a metodologia participativa e o planejamento turístico de base local devem ser aspectos turísticos abordados no PDP para um destino socialmente justo e inclusivo. Mas, segundo ele, o PDP não explicita as ações destinadas para o setor, apenas se manifesta sobre a necessidade de adoção do plano municipal de turismo, que ainda não existe e é urgente no caso de Ouro Preto.

Ao mesmo tempo o secretário diz que concebe o PDP como um instrumento precioso na ordenação do espaço público, o que se reflete no planejamento econômico estratégico do setor turismo. Além disso, contempla uma distribuição espacial eficiente e justa dos recursos e das atividades econômicas.

Para Gobbi, Ouro Preto apresenta todas as prerrogativas de uma cidade atrativa turisticamente do ponto de vista cultural e natural. E o PDP contribui para o desenvolvimento turístico sustentável da cidade na medida em que a cidade se torna melhor para seus cidadãos. Exemplifica: ”Todos os aspectos ligados à infraestrutura urbana (saneamento básico, trânsito e transporte, saúde, limpeza urbana) são essenciais em qualquer plano, por refletir diretamente no resultado do turismo de qualidade e consequentemente sustentável”. E de acordo a sua assessora especial, Cairo, o PDP ainda institui, neste sentido, princípios norteadores que estabelecem equilíbrio entre as formas de desenvolvimento econômico e o desenvolvimento social e humano da cidade. Isto pode ser observado nos arts. 3º; art. 12º, parágrafo IV; art. 13º, parágrafos II e III da Lei do Plano Diretor de Ouro Preto.

CONCLUSÃO

A partir deste estudo compreende-se a municipalidade, nos seus diversos segmentos, como a responsável por administrar, gerir, regular, orientar e direcionar o desenvolvimento da cidade em função do bem-estar da coletividade. Quanto ao turismo, a função de desenvolver o território municipal, transformando-o em um destino turístico sustentável, garantindo o planejamento estratégico e articulado das ações e o envolvimento da população residente, também é do poder público municipal.

Ao governo local incide a responsabilidade de garantir que o desenvolvimento do turismo no município contribua para melhoria da qualidade de vida da maior parcela possível da população interessada. Para tanto e frente à complexidade do desenvolvimento das cidades, é cada vez mais necessária a elaboração e a implantação de mecanismos de planejamento estratégico, controle e articulação das ações dos diversos agentes locais.

O Plano Diretor Participativo municipal – PDP surge nessa perspectiva como um instrumento para subsidiar o planejamento do desenvolvimento do destino turístico que obriga considerar o desenvolvimento equilibrado da integralidade do território municipal e, além disso, atender aos interesses coletivos, por meio da função social da cidade e da organização da sua expansão e da construção do instrumento de maneira participativa e democrática.

O PDP compreende o plano comum de desenvolvimento da cidade e neste sentido, todos os entrevistados o afirmaram como referencia para a elaboração dos processos de planejamento local, mesmo aqueles que incidam em matérias mais específicas, tal como do desenvolvimento da atividade turística.

Desta forma, conclui-se que o PDP municipal, na media em que contempla em um plano comum o desenvolvimento das diversas atividades da municipalidade, e os diversos interesses, atividades econômicas, necessidades de investimentos, limites de crescimento e regulações, e considera a integralidade do território, deve ser referencia para o processo de planejamento do desenvolvimento integral e sustentável dos municípios turísticos.

Os municípios turísticos, pela imposição advinda do Estatuto da Cidade, estão obrigados a elaborar e implantar suas leis do PDP como um plano de desenvolvimento da cidade, legitimamente acordado pela municipalidade. E nesta perspectiva poderão contar com um instrumento importante nos seus processos de planejamento do desenvolvimento da atividade.

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VILLAÇA, Flávio. As ilusões do Plano Diretor. São Paulo: Studio Nobel, Fapesp, Lincoln Institute, 2001. 94p. Disponível em: <www.puc-campinas.edu.br/pos/>. Acesso em: 12 nov. 2007.



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