TURyDES
Vol 2, Nº 6 (noviembre/novembro 2009)

O PLANEJAMENTO TURÍSTICO NAS CIDADES DE PEQUENO E MÉDIO PORTE DO ESTADO DA BAHIA- BRASIL

Ericka Amorim, Cyntia Andrade, Jorge Umbelino (CV)

 

1. Introdução

O turismo, no contexto mundial, vem registrando, ao longo dos tempos, a sua importância, principalmente se considerados os campos econômicos e sociais. A estimativa de 1,6 bilhões de turistas internacionais para o ano de 2020, da Organização Mundial do Turismo (OMT) reafirma a importância da atividade a nível global. O crescimento do turismo mundial se destaca principalmente nos países considerados emergentes, que vêm apresentando um 6-8%, frente aos países industrializados, desenhando um caminho em busca de um crescimento econômico sustentável (OMT, 2008).

O turismo é uma atividade latente na economia brasileira que, nos últimos anos, vem apresentando um crescimento no mercado mundial. Mesmo apresentado recursos naturais e culturais diversificados, o Brasil ainda participa pouco dos benefícios causados pela expansão da atividade. Uma pesquisa sobre o turismo brasileiro (JORNAL DA UNICAMP, 2007), concluiu que o país tem um turismo amador, pouco relevante para a economia. O diagnóstico apresentado pelo Ministério do Turismo, por meio do Plano Nacional de Turismo 2003-2007, aponta que o turismo, no país, ainda precisa ser mais bem gerido e planejado. Reconhece-se que a atividade é capaz de gerar emprego, renda e distribuir recursos entre as regiões do país, fato importante, caso se considerem as discrepâncias socioeconômicas entre as diferentes regiões do território nacional.

O turismo ocupa uma cifra mínima dentro da produção econômica anual, sendo responsável apenas por 2,23% do PIB nacional (IBGE, 2007), enquanto em países como, por exemplo, a Espanha abarca os 12%. O país recebe menos turistas que países com pouca diversidade histórico-cultural e, mesmo com todo o reconhecimento da sua exuberância natural e cultural, ainda cresce a passos lentos no mercado internacional, ante a imensa possibilidade de desenvolvimento.

Neste contexto, a atividade passa por um importante momento de valorização e conseqüente profissionalização, fato que impacta na qualidade do produto ofertado. Importantes ações estão sendo discutidas e implementadas nos níveis das três esferas governamentais, conjuntamente com os demais agentes ligados ao turismo. Contudo, apesar de o contexto nacional apresentar essa realidade, quando analisado o planejamento do turismo em nível local, especificamente nas cidades de pequeno e médio porte, constata-se que o planejamento não é efetivo ou ainda é desempenhado de forma rudimentar.

Estados como a Bahia, que desponta como um destino turístico consolidado no mercado nacional e apresenta uma crescente posição no mercado internacional, fazem do turismo uma base real de sua atividade econômica, atraindo investimentos públicos e privados que colocam o Estado em posição de destaque e referência de modelo de gestão e planejamento do turismo. A regionalização do turismo baiano em zonas geográficas e culturalmente comuns é um modelo de interiorização da atividade e um intento de atender a necessidade de diversificação de ofertas frente à concorrência do mercado. Na pratica, se constata distorções entre o planejamento débil nas cidades de pequeno e médio porte frente ao que acontece na capital baiana.

A Bahia ocupa hoje o terceiro lugar no ranking do turismo nacional, segundo a Secretaria de Turismo da Bahia (SETUR, 2009). O presente artigo tem como objetivo discutir a realidade do planejamento turístico das cidades baianas de pequeno e médio porte, contrastado com a realidade do planejamento e organização do turismo na capital baiana.

Serão apresentados e discutidos os principais fatores que contribuem para que a maior parte dos municípios brasileiros ainda planeje de forma inadequada e, posteriormente, será feita uma abordagem do contexto baiano. Obviamente, não se pretende aqui generalizar, nem desprezar as evidentes diferenças no território nacional. Contudo, diante da situação problemática identificada entre o planejamento municipal e o porte municipal, em que os municípios de menor porte apresentam de forma geral, menor envolvimento com o processo de planejamento, destaca-se a relevância da discussão. Além disso, esse fator também é evidente na realidade do estado da Bahia.

Os dados foram coletados por meio da aplicação de questionários e apresentam a realidade do planejamento turístico no Brasil, segundo a óptica de profissionais e investigadores em planejamento turístico.

Inicialmente, serão abordados os aspectos teórico-conceituais acerca da atividade turística, bem como do planejamento, fazendo-se analogias entre eles. Posteriormente, realiza-se uma breve contextualização do turismo no Brasil e uma análise do planejamento da atividade. Será apresentada a metodologia utilizada nesta investigação e a discussão dos resultados obtidos, bem como o debate de importantes sugestões apresentadas pelos profissionais que contribuíram com esta investigação. Por fim, será abordado o tema aplicado ao contexto baiano.

2. Referencial teórico

O turismo é uma atividade que pode acarretar diversos benefícios e malefícios, denominados de impactos positivos e negativos (MATHIESON e WALL, 1982). Esses efeitos podem ocorrer nos campos socioculturais, econômicos e ambientais.

Decorrente dessa situação, Inskeep (1993) destaca a necessidade do planejamento do turismo como processo capaz de estruturá-lo e potenciar benefícios nas comunidades locais. O turismo (e as comunidades), como aponta o autor, por intermédio do planejamento, pode alcançar um melhor nível de qualidade global, pela capacidade de interferência direta no seu desenvolvimento.

No âmbito econômico, o turismo pode gerar renda e emprego, aumentar a arrecadação, mas pode, também, desequilibrar economias pela concentração do trabalho no setor de serviços, escoação de recursos para outros países por meio de empresas multinacionais, entre outros fatos. No campo sociocultural, se, de um lado, a atividade turística pode promover o desenvolvimento social, valorizar e contribuir com a preservação e recuperação de sítios e monumentos de reconhecida importância histórico-cultural, conservação da herança cultural, etc., por outro lado, pode causar mudanças significativas na estrutura social e no comportamento, assim como nos próprios padrões culturais da comunidade local (ACERENZA, 2002).

No ambiente, o turismo pode conduzir à conservação de áreas de importância natural, de manutenção da qualidade ambiental, recuperação de ambientes degradados, entre outros efeitos positivos. Entretanto, se não devidamente planejado, pode causar ações negativas nesse mesmo ambiente, como poluição de uma forma geral, destruição e modificações excessivas na paisagem.

É nesse contexto do turismo que o planejamento pode atuar positivamente. O conceito de turismo sustentável levanta a necessidade de ordenação da atividade turística de forma a que seja mantido o respeito por todos os elementos do destino. A descaracterização e degradação dos recursos naturais e culturais, bem como os efeitos maléficos causados no campo social, além de conduzirem as localidades ao extremo da insustentabilidade extraem o que elas têm de mais atrativo: a sua essência (ALMEIDA, 2006).

Quanto à importância do planejamento turístico, Dias (2003, p.37) discute:

O turismo é um consumidor intensivo de território, e portanto [sic] deve-se planejar seu desenvolvimento numa ótica [sic] que aponte claramente quais objetivos econômicos se deseja alcançar, quais os espaços devem ser protegidos e qual a identidade que será adquirida ou fortalecida. O patrimônio natural e cultural está integrado ao território e, portanto, qualquer iniciativa de desenvolvimento deve contemplar utilização racional dos recursos dentro de [sic] uma perspectiva de um modelo de desenvolvimento sustentável.

Inskeep (1993) destaca a importância do desenvolvimento sustentável para o turismo porque o seu crescimento depende das atrações e atividades relacionadas com o ambiente natural e com o patrimônio histórico e cultural das localidades.

É fundamental elucidar que o ato de planejar tem relação direta com o desenvolvimento local e, portanto, deve visar primordialmente ao benefício da população residente, sendo, portanto, essencial a participação de todos nos processos de gestão e planejamento.

A dimensão conceitual de desenvolvimento reporta à condição de melhoria do padrão geral de vida e bem-estar da população de um país (ALMEIDA, 2006), fato que, segundo o Banco Mundial (2003), é alcançado por meio de um conjunto de riquezas, entre elas os recursos naturais, físicos, outros ativos produzidos, bem como os recursos humanos e o capital social.

Um desenvolvimento, para ser pleno, deve satisfazer as necessidades tanto materiais (alimentação elementar, vestuário, moradia e sustento), quanto não-materiais (aspirações, realizações, cidadania), conduzindo a uma melhor qualidade de vida para a população (RAPOSO, 1998).

Nesse sentido, a relação do binômio planejamento / desenvolvimento é estreita e requer uma coordenação harmônica. Se, por um lado, para alcançar o desenvolvimento sustentado e sustentável o planejamento é um processo essencial, por outro, o planejamento de destinos deve focalizar a condição de desenvolvimento dos mesmos.

Ao discursar sobre o planejamento, Carvalho Jr. (2002) confirma que esse processo é a aproximação para dirigir a energia humana, objetivando uma finalidade racionalmente predeterminada, ou seja, representa uma ação coordenada de esforços para atingir um determinado objetivo. O mesmo autor afirma ainda que, para se chegar a esse objetivo, é necessário que os agentes sociais realizem diagnósticos e previsões, procedam a acompanhamentos e avaliações e construam cenários sobre o presente e o futuro, fundamentados na reflexão sobre o passado e nas expectativas de futuro.

Planejar exige os atos de prever e seqüenciar ações que serão definidas durante todo o processo de planejamento. A especificação de objetivos e metas deve ser bem definida já, que envolve decisões que afetarão, diretamente, questões socioeconômicas, como a distribuição de rendimentos, as questões ambientais, culturais, o uso de recursos naturais e culturais.

Para Carvalho Jr. (2002), o processo de planejamento possui três dimensões, que variam segundo a óptica abordada:

• de ordem técnica, em que planejar é visto como um processo de elaboração de diagnósticos e prognósticos sobre a realidade do local de intervenção, formulação de planos e programas, definição de estratégias e metas, etc. Assim, faz-se necessário dominar determinadas metodologias, que vão desde as ciências até à estatística e o emprego de modelos econométricos e variadas abordagens sociais. É fundamental a reunião de uma equipe multidisciplinar qualificada que trabalhe com tecnologias de informação modernas e, fundamentalmente, com informações confiáveis de natureza social, econômica, ambiental, política, etc.;

• de ordem financeira, para que sejam definidas as fontes de financiamento com a finalidade de garantir a execução daquilo que foi programado. No âmbito governamental, a ordem financeira é muito importante porque, entre outras coisas, é necessário seguir regras, normas, leis de controle e orientação de gastos. Além das fontes de recursos financeiros, é preciso realizar análises de custo e benefício e de taxas de retorno, como subsídios ao planejamento;

• de ordem política, que o autor considera a mais importante, sob a justificativa de que planejar é um ato de tomar decisões sobre ações presentes e futuras; portanto, um ato político que envolve a escolha de alternativas, pessoas, grupos de interesse, partidos políticos, relações sociais, disputa de espaço e mercado, entre outras questões. A execução do planejamento é função que depende da habilidade dos executores do planejamento no trato das relações humanas, além de depender de uma boa avaliação da situação social, econômica e política em que será implementado.

Carvalho Jr. (2002) sentencia que a dimensão política é a mais importante. Essa dimensão é apontada como determinante e, na ausência de seu apoio, não há processo de planejamento, já que a decisão entre planejar e não planejar é caracterizada como uma decisão política.

Contudo, apesar da reconhecida importância e determinação da dimensão política, é importante esclarecer que, pela própria natureza do processo, as demais dimensões reúnem fundamentais aspectos que também o viabilizariam, ou não. O planejamento configura-se num processo lógico, fundamentado em informações coletadas e suas adequadas análises, o que torna indispensável a dimensão técnica. Da mesma forma, para que seja colocado em prática tudo o que é analisado, definido, discutido e decidido, há necessidade de recursos financeiros, o que permite que apenas seja viável o processo se também essa dimensão estiver presente e de forma adequada. Portanto, o processo de planejamento, numa visão sistêmica, deve reunir um conjunto de condições, essencialmente relativas aos aspectos técnico, financeiro e político, para que seja colocado em prática de forma adequada.

Beni (2003, p. 110) discursa sobre o planejamento do ponto de vista governamental, no qual o turismo se enquadra. Para o autor, o planejamento, na área de administração pública, é definido como “um processo que estabelece objetivo, define linhas de ação e planos detalhados para atingi-los, e determina os recursos necessários à sua consecução”.

3. Planejamento e organização do turismo no Brasil

O Turismo, uma prioridade da atual gestão federal, teve, ao longo desses últimos anos, esforços direcionados para a gestão descentralizada e compartilhada, situação que surtiu efeitos positivos, comprovados estatisticamente. Durante o 4º Salão do Turismo-Roteiro do Brasil (2009), o Ministério do Turismo divulgou que, no período de 2000 a 2005, o turismo cresceu 76% e gerou 900 mil empregos, o que corrobora com dados do 9º Foro Mundial de Turismo (World Travel and Tourism), realizado em Florianópolis (2009), que revelou que o Brasil se situa como a 14ª economia do turismo mundial, com tendência a crescimento rápido a curto e médio prazo, situado em 5,3% até 2017.

O Mtur (2008) destaca o crescimento do turismo brasileiro onde

A pesar de la crisis económica internacional, los números de la receta turística brasileña continúan rompiendo records sucesivamente en 2008. Con la entrada de US$ 478 millones en octubre, el acumulado del año ya es un 19% más alto que el registrado en el mismo período en 2007. La evolución positiva en los gastos de turistas extranjeros en Brasil, aún durante un mes en que los otros sectores de la economía ya sienten los impactos de la crisis mundial, demuestra el potencial del sector en la economía brasileña.

O desembarque de turistas estrangeiros no País, como mostra a figura 1, sinaliza o fluxo do mês de abril , que foi de 484.805, por cima do mesmo mês nos dois anos anteriores. A queda de gastos no mesmo mês pode ser uma representação real do contexto socioeconômico atual, onde o ano de 2008 apresentou um índice mais satisfatório de gastos.

Entretanto, apesar da apresentação desses resultados positivos, em análises específicas ainda são identificadas condições desfavoráveis ao desenvolvimento do turismo de forma sustentada e sustentável. Para além dos dados quantitativos, os aspectos estruturais e organizacionais do turismo, associados a uma avaliação qualitativa, foram fatores que despertaram uma inicial preocupação por parte da esfera federal, seja relativo ao produto “Brasil”, como um todo, seja referente às regiões turísticas ou municípios turísticos.

Em um cenário de crise mundial, o país ainda apresenta números positivos do turismo internacional até o momento, endossados pela imagem econômica atual e a divulgação da marca Brasil nos principais eventos do turismo mundial e esforços internos como reconhecimento e organização do setor turístico, a articulação entre os principais agentes do turismo em esfera federal, estadual e municipal, a qualificação de da mão-de-obra no turismo.

Vale destacar, entretanto, que, no Brasil, o setor público pouco participa na infra-estrutura turística, atuando apenas em alguns tipos de atrações turísticas. No que se refere aos incentivos, o setor público fornece melhores condições para implantação de empreendimentos capazes de promover algum desenvolvimento a regiões ou trazer algum outro tipo de benefício, como geração de renda e emprego.

Outra questão é que o turismo, no Brasil, atinge fundamentalmente as regiões do litoral, sendo esses locais coincidentemente os mais urbanizados do País. Cruz (2001) constata que, apesar de inadequada, essa concentração se dá com a intenção de oferecer aos turistas uma infra-estrutura básica e turística mais adequada. Como exemplos de que há uma preocupação em dotar os locais turísticos prioritariamente de infra-estrutura básica adequada, estão os investimentos realizados pelo Prodetur (Programa Nacional de Desenvolvimento do Turismo).

Para oferecer um turismo de melhor qualidade, o governo, principalmente nas esferas federais e estaduais, vem fiscalizando e certificando as empresas do setor, com o intuito de também garantir a qualidade do produto turístico, como um todo. Fica subentendido que esse produto global é constituído por produtos que se complementam e o compõem.

Na gestão e planejamento em turismo, o setor ainda parece estar à margem dessa tendência de profissionalização. Evidentemente, por se tratar de cargos públicos, existem diferenças com relação às empresas privadas. Além disso, há limitações nas relações entre as diferentes esferas governamentais, entre estas (setor público) e o setor privado, fato que impacta no planejamento da atividade (MINISTÉRIO DO TURISMO, 2006a).

Porém, mesmo diante dessa argumentação, faz-se crer que, ainda assim, os ocupantes desses cargos devem estar de acordo com a função desempenhada, seja na sua formação, seja em experiências adquiridas.

Como confirma o Ministério do Turismo (2006a), apesar da potencialidade do País e dos bons e crescentes resultados alcançados nos últimos anos, o turismo brasileiro ainda não atingiu a estabilidade, assim como não ocupa um lugar privilegiado no turismo nacional e internacional condizente com essa que é uma de suas grandes vocações.

O Ministério do Turismo (2006 a) sugere que, nos próximos anos, no âmbito da gestão e planejamento, se invista na capacitação de “gestores dos componentes nos roteiros turísticos para conhecimento da abrangência institucional para gestão do turismo no Brasil”, bem como na criação de “um programa de qualificação da gestão pública em turismo no País, que permita capacitar o maior número possível de gestores estaduais e municipais, unificando uma linguagem de interlocução com o Mtur”.

4. Cidade Turística: Implicações da dimensão na efetivação do Planejamento

Atualmente, em escala global, cerca de 46% da população mundial vive em áreas urbanas e espera-se que, no ano de 2030, cerca de 61% da população viverá em ambiente urbano (HENRIQUES, 2003, p.32). Esta projeção exige que o olhar esteja atento às cidades, sobretudo quando o assunto é planejamento de destinos turísticos. Reconhece-se a fragilidade dos destinos não-urbanos, mas é o ambiente urbano que mais atrai turista e, por conseqüência, muito há, a saber, sobre com os efeitos negativos do turismo. Assim sendo, o que vem a ser uma cidade?

Sabe-se que não há uma definição consensual e as maiores divergências referem-se a termos quantitativos, ou seja, número de habitantes. Desta forma, compreende-se que as realidades diferentes exigem posturas diferentes e, analisando o fator quantitativo, não seria possível apresentar os mesmos critérios em países como Brasil, com cerca de 180 milhões de habitantes e Portugal, que tem cerca de 10,4 milhões de habitantes , por exemplo. Henriques (2003, p.33) reforça a dificuldade em definir cidade, entretanto, apresenta o conceito da Comissão Européia, que afirma ver a cidade ‘como uma aglomeração mais ou menos regular de edifícios e vias públicas, onde as pessoas podem viver e trabalhar, e também onde há muitas atividades sociais, culturais, e tem, pelo menos, 10000 residentes’. Henriques (2003, p. 33) ainda destaca que esta proposta de definição engloba critérios como número de habitantes, tipo de atividades desenvolvidas por esses mesmos habitantes (peso relativo de indivíduos que se dedicam ao comércio e à indústria, em oposição aos que se dedicam à agricultura), nível de concentração das suas habitações, entre outros, além de deixar implícita a confluência de várias dinâmicas no espaço, nomeadamente a econômica, social, cultural e política. O Brasil possui a designação de município para a menor unidade político-administrativa que, não necessariamente, corresponde ao limite da cidade, já que este também agrega, muitas vezes, ambientes rurais.

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2009) define que qualquer comunidade urbana caracterizada como sede de um município é considerada uma cidade, independentemente de seu número de habitantes, sendo a parte urbanizada de seus distritos considerados prolongamentos destas cidades. No contexto do turismo, o destino turístico nem sempre corresponde à limitação geográfica ou político-administrativa de uma cidade, região ou país. Um destino turístico pode ser uma cidade ou um conjunto delas, sem que haja a coincidência com delimitações de outra natureza. Assim, ao tratarmos do planejamento de cidades, deveremos ter em conta que este poderá ocorrer no âmbito da gestão da própria cidade, em conjunto com outras cidades ou, ainda, numa menor escala, nos bairros ou atrativos turísticos. Quando a cidade assume a capacidade de manter os seus próprios habitantes e, além disso, de atrair turistas, são criados os alicerces para a constituição de um destino turístico (Henriques, 2003, p. 43). Alinhado a essa discussão, Henriques (2003, p.32-33) caracteriza os centros urbanos e salienta a diferença entre estes e a própria cidade, afirmando que

As áreas/ centros urbanos podem apresentar várias dimensões, desde grandes cidades a pequenos centros que dificilmente podem ser chamados de cidade. Os perímetros fixados às áreas/centros urbanos raramente coincidem com a cidade geográfica – entendida enquanto forma de ocupação dos solos e entidade individualizada com certa dimensão e densidade – onde se desenrola um conjunto expressivo e diversificado de atividades várias indissociáveis do modo de vida dos habitantes. Os perímetros são, regra geral, menores que os limites administrativos ou de planejamento, embora em áreas/ centros urbanos de grande vitalidade econômica e demográfica a cidade geográfica ultrapasse os limites fixados pela divisão administrativa ou política

E citando Bonello (1996), Henriques (2003, p. 33) complementa que a cidade ‘está para além de toda a perspectiva geográfica, económica, sociológica ou histórica, porque ela nasce da interacção entre os indivíduos, o que interdita qualquer definição estática ou descritiva. Tratando-se de uma comunidade viva, ela é de grande mobilidade, uma vez que escapa a qualquer permanência’. Há necessidade de ressaltar essas distinções visto que, apesar do planejamento turístico tratado neste artigo, referir-se ao planejamento político e submetido à ordem administrativa das cidades, regiões e países, é igualmente necessário perceber a existência de outros níveis de planejamento, que se interpõem e refletem no desenvolvimento do destino, e não somente aqueles institucionalizados nas escalas geográficas mais tradicionais.

Considerando a dicotomia global/local, a cidade pode ser encarada como global, na medida em que há a ligação entre o local e o mundo, através de redes de capital, pessoas, bens e de fluxo de informação. Por outro lado, pode ser consideradas a nível local, quando abordada acerca das vidas social, políticas e econômicas. Essa dicotomia também é revelada no turismo, quando apresenta características globais pelo fato de atravessar fronteiras, movimentar recursos financeiros e, apesar disso, ser uma atividade eminentemente local, pelas singularidades do destino, seja cultural, de desenvolvimento, dentre outras (CHANG E HUANG, 2004, p, 255). Para Fischer (2004), a noção de “local” contém idéias complementares e antagônicas. Sendo o local a referência espacial delimitada e podendo ainda ser identificado como base, território, microrregião, indicado por outras designações que sugerem constância ou certa inércia, por outro lado, contém, também, o sentido de espaço abstrato de relações sociais e indica movimento e interação de grupos sociais que se articulam e se opõem em torno de interesse comuns.

No âmbito das relações sociais, do território e da discussão acerca do sentido de cidade, Fischer (2004) conclui, citando Milton Santos, que “Quando quisermos definir qualquer pedaço do território, devemos levar em conta a interdependência e a inseparabilidade entre a materialidade, que inclui a natureza e o seu uso, que inclui a ação humana, isto é, o trabalho e a política” (SANTOS; SILVEIRA, 2001, apud FISCHER, 2004). Compreendemos, assim, que a definição de cidade é complexa e ainda, muito divergente. Ela envolve diversos critérios, seja objetivos, como o número de habitantes, sejam eles subjetivos como, o tipo e a intensidade das relações humanas existentes.

5. Metodologia

Ao analisar a situação problemática de baixa incidência do planejamento turístico entre os municípios brasileiros de pequena e média dimensão, bem como do planejamento inadequado da atividade turística em muitos outros municípios, foram levantados alguns fatores que poderiam estar ocasionando essa situação. Assim, analisaram-se as variáveis, os recursos financeiros e a qualificação dos profissionais responsáveis pelo planejamento do turismo em nível local.

Esta seção tem como objetivo explicitar os principais fatores que ocasionam a ineficácia, ou mesmo a inexistência do processo de planejamento, entre os municípios turísticos brasileiros de pequena e média dimensão.

Para tanto, o questionário foi selecionado como instrumento de recolha de dados, totalizando 162 questionários enviados, com o percentual de retorno de 27%, o que é consideravelmente satisfatório se avaliado o instrumento e o meio de contato. No que se refere à confiabilidade dos resultados, estes também são considerados relevantes, em razão da seleção meticulosa realizada para a obtenção do universo e da amostragem.

A principal vantagem identificada na sua utilização consistiu na possibilidade de atingir profissionais e órgãos públicos ligados ao turismo na vastidão do território brasileiro. Além disso, outras vantagens importantes também identificadas foram os custos e o tempo necessários para sua aplicação, diante da localização geográfica da amostra selecionada. Os questionários foram enviados, na sua totalidade, por meio de endereço eletrônico e, no caso das secretarias estaduais de turismo, foram realizados também contatos telefônicos. Entre os entrevistados foram selecionados dois grupos distintos: os profissionais de turismo e os órgãos e as empresas públicas ligadas ao setor. Entre as empresas e os órgãos públicos foram contatados: o Ministério do Turismo; o Ministério da Cidade; as secretarias estaduais de turismo de todos os estados das Regiões Sul, Sudeste e Nordeste, pela participação relativa dessas regiões na entrada de turistas no País ; o Banco do Nordeste, pela responsabilidade com o Programa de Desenvolvimento do Turismo — Prodetur/ NE.

Com relação aos profissionais de turismo, a amostra foi selecionada obedecendo a um conjunto de critérios que garantiriam a qualidade dos resultados e tornariam possível a execução da pesquisa. Foram identificados profissionais cadastrados na Plataforma Lattes (CNPq) que apresentassem conhecimentos teóricos e/ou práticos em planejamento turístico. Os currículos foram cuidadosamente analisados, ponderando-se os seguintes critérios preestabelecidos: Os profissionais selecionados obtinham grau de pós-graduação (especialistas, mestres e doutores), com a finalidade de garantir resultados baseados em conhecimentos teóricos mais elevados; Foi considerada a relação entre a formação e/ ou produção científica com o tema abordado, planejamento e desenvolvimento do turismo; Foram levadas em consideração, também, as experiências profissionais em planejamento turístico, de forma a que aqueles profissionais que não apresentavam nos currículos conhecimentos teóricos em planejamento, mas haviam desenvolvido planos turísticos em localidades, fossem igualmente adicionados à amostra.

6. Análise e discussão dos resultados

A exposta situação do planejamento turístico brasileiro evidencia a baixa incidência entre os municípios de pequena e média dimensão. As variáveis “qualificação dos profissionais responsáveis pelo turismo em nível local” e “recursos financeiros” foram confirmadas como razões de forte influência ou determinantes da atual situação.

Quando questionado sobre se “uma das principais razões para não planejar é a de que os funcionários responsáveis (secretarias municipais) pelo planejamento local possuem pouco conhecimento técnico-científico” ( Figura 2), tinha a intenção de conhecer a posição dos entrevistados com relação à influência da baixa qualificação dos profissionais que ocupam cargos nas secretarias municipais de turismo na baixa incidência do planejamento nos municípios turísticos brasileiros.

Do total de respostas obtidas, 31% afirmaram concordar plenamente e 39% afirmaram concordar com a afirmativa, o que indicaria um total de 70% concordando totalmente ou concordando com a questão proposta. Esse resultado confirma a condição de influência da pouca qualificação dos profissionais (afirmando, inclusive, esse fato) na atual situação de baixa incidência do planejamento do turismo nos municípios turísticos brasileiros de pequena e média dimensão. Aqueles que se demonstraram indecisos representam apenas 7% da totalidade, enquanto aqueles que discordam, 21%, e os que discordam plenamente, 2%, totalizam, apenas, 23% de discordância. Se considerados apenas os resultados dos questionários aplicados pelas secretarias estaduais de turismo, 50% das respostas são “concordando” e 50% “concordando plenamente”, confirmando-se, assim, na perspectiva do Poder Público e do Banco do Nordeste, os resultados dos profissionais de turismo.

Na figura 3, o questionamento sobre a “necessidade de apoio técnico-científico aos municípios para que estes elaborem e implementem seus planos locais”, 86% dos entrevistados afirmam “concordar” (36%) ou “concordar plenamente” (50%), 7% se dizem “indecisos” e apenas 5% “discordam” e 2% “discordam plenamente”. Se consideradas apenas as posições das secretarias estaduais de turismo, 50% “concordam” e 50% “concordam plenamente” com o enunciado, confirmando-se as respostas dadas pelos profissionais de turismo.

Contrastando os resultados da figura anterior, em que 70% dos entrevistados “concordam” ou “concordam plenamente” com a afirmativa de que uma das principais razões para não planejar é o pouco conhecimento técnico-científico, 7% afirmam estar “indecisos” e 23% “discordam” (21%) ou “discordam plenamente” (2%); existe, pois, maior percentual de concordância (86%) quando os entrevistados foram questionados diretamente e sem relacionar a condição técnico-científica dos profissionais das secretarias municipais de turismo com o ato de planejar ou não planejar.

Assim, apesar de as duas questões apontarem resultados em que acreditam, majoritariamente, que os municípios não possuem profissionais capacitados, em suas secretarias de turismo, o percentual é superior quando se questiona se existe a necessidade de um apoio técnico-científico externo; ou seja, em termos técnico-científico, muitos acreditam que esta seja uma das principais razões para que os municípios não planejem, sendo, no entanto, em número ainda superior aqueles que crêem que existe uma necessidade de apoio para que os municípios possam planejar adequadamente.

Ao fazer relação entre o grau de concordância, quando relacionada a condição de planejar, ou não, com o pouco conhecimento técnico-científico, apresenta-se um alto grau 3,74 , muito próximo ao grau atingido quando questionados, somente, se existe a necessidade do apoio técnico-científico para que os municípios elaborem e implementem os seus planos, cujo grau de concordância é de 3,88.

A figura 4 reúne um conjunto questões sob o enunciado “A Secretaria Nacional de Programas Urbanos (Ministério das Cidades), no Departamento de Apoio à Gestão Municipal Territorial, apresenta como um dos objetivos específicos a criação de uma rede de instituições não-governamentais e entidades profissionais que atuem no apoio técnico à gestão urbana”. É importante lembrar que, nesse conjunto de questões, há uma tentativa de negar tudo aquilo que foi exposto anteriormente.

No item P1 dessa questão, afirma-se que, apesar desse departamento buscar o auxílio externo à gestão e ao planejamento, existe a capacidade técnico-científica dos municípios em desempenhar adequadamente suas necessidades sem apoio externo. Nesse item, 85% dos entrevistados discordam — 30% discordam plenamente e 55% apenas discordam —, 7,5% se declaram indecisos, 5% afirmam concordar e 2,5% concordam plenamente com a afirmação, atingindo-se um grau de concordância de 1,95. Ou seja, há uma rejeição com relação à afirmativa, o que confirma a opinião dos questionados quanto à incapacidade técnico-científica dos profissionais da maior parte dos municípios turísticos brasileiros de pequena e média dimensão.

No item P2, afirma-se que “os municípios turísticos brasileiros, na sua maioria, não sentem a necessidade de elaboração de planos de desenvolvimento turístico e essa é a principal razão para a baixa incidência desses planos”. Nessa questão, houve um percentual de 57,5% que concordaram, sendo 35% concordam e 22,5% concordam plenamente. Já o número de indecisos totalizou 7,5% e de discordância, 35%, dos quais 30% apenas discordam e 5% discordam plenamente, atingindo-se o grau de concordância de 3,4 na escala de Likert. Ou seja, quanto à necessidade dos municípios em elaborarem seus planos de desenvolvimento turístico, os questionados acreditam que os municípios ainda não sentem a necessidade, e essa é a principal razão para a baixa incidência do planejamento entre os municípios.

Com esse questionamento, pretendia-se conhecer a posição do entrevistado acerca da necessidade dos planos por parte dos municípios, descobrindo-se que o reconhecimento da pouca importância desses planos é a principal razão da baixa incidência desses documentos, entre os municípios. Com o elevado percentual de concordância, pode-se afirmar que a pouca “necessidade” dos municípios (podendo-se interpretar o termo “necessidade” como o conhecimento da importância de planejar) é uma das principais razões para a atual situação de baixa incidência do planejamento nos municípios brasileiros de pequena e média dimensão.

Ainda na figura 4, item P3, assevera-se que “a baixa incidência do planejamento nos municípios brasileiros não tem relação com os custos de elaboração e implementação dos planos de desenvolvimento”. Nessa questão, procura-se negar a associação dos custos elevados de elaboração e implementação dos planos de desenvolvimento. O alto percentual de discordância confirma, por meio dos resultados dos questionários, a relação da baixa incidência do planejamento nos custos de planejar. Nesse item, 65% afirmaram discordar, 52,5% discordam, 12,5% discordam plenamente e apenas 7,5% concordam, 15% concordam plenamente e 12,5% afirmam estar indecisos. O grau de concordância foi, portanto, de 2,6. Assim, os questionados discordam de que não exista relação entre os custos de elaboração e implementação, ou seja, confirmam a condição de relação entre os custos de elaboração e implementação dos planos turísticos e a baixa incidência destes.

Vale destacar que, nessa questão, a totalidade (100%) das secretarias estaduais de turismo discordou que a baixa incidência do planejamento do turismo, nos municípios brasileiros, não tenha relação com os custos de elaboração e implementação dos planos, ou seja, todas as secretarias acreditam haver relação entre os custos de planejar e a baixa incidência do planejamento nos municípios turísticos brasileiros.

No item P4, no qual é afirmado que “os profissionais das secretarias de turismo são capacitados para desenvolver os planos de desenvolvimento turístico, faltando, porém, que ocorra a iniciativa por parte dos municípios para que ocorra” [sic], o percentual de discordância foi grande, atingindo 77,5%, enquanto apenas 12,5% se demonstraram indecisos quanto à questão, e 10% afirmaram concordar (5%) ou concordar plenamente (5%). Esse resultado, ainda uma vez, confirma a opinião dos entrevistados sobre a condição de os profissionais que ocupam cargos nas secretarias municipais elaborarem e implementarem os planos de desenvolvimento turístico. Considerando o grau de 2,08 de concordância na escala de Linkert, os questionados, ao discordarem da questão, concordam, mais uma vez, que os profissionais não estão capacitados.

6.2 - Algumas reflexões acerca dos resultados obtidos

A qualificação dos responsáveis pelo planejamento municipal foi apontada como inadequada, já que os ocupantes dos cargos nas secretarias de turismo possuem pouco, ou nenhum, conhecimento sobre planejamento turístico, além de não serem capazes de conduzir, elaborar e/ou implementar o processo. Ao abordar essa variável, foi enfatizada a necessidade de rápida intervenção. Essa situação é confirmada, inclusive, pelo atual diagnóstico do turismo brasileiro e é destacada como um entrave para o adequado avanço na profissionalização do setor. De fato, pouco adianta uma gestão federal forte que, no entanto, não tem possibilidades de atingir os níveis estaduais e locais em razão da incapacidade técnica e científica daqueles que conduzem o turismo nesses níveis.

Com relação à variável “recursos financeiros”, constatou-se que não representa exatamente um impasse no planejamento. Acredita-se que os municípios brasileiros possuem recursos para investir no planejamento; no entanto, outros fatores, como o técnico e o político, são os principais determinantes. Apesar disso, há indicação de que essa variável, quando bem atrativa, tem a capacidade de impulsionar a adesão dos políticos ao processo de planejamento.

Ao abordar o aspecto político, verificou-se que foi, indiscutivelmente, aludido como principal fator determinante da baixa incidência no planejamento turístico. Entre os principais pontos desfavoráveis relacionados estão a descontinuidade política por fragmentação de ações e a priorização daquelas que dão maior visibilidade, o desconhecimento ou o desinteresse político pela atividade turística, muitas vezes, inclusive, pelo fato de o retorno não ocorrer em curto prazo e não ser associado, por parte do eleitorado, a realizações do político, ou partido.

A dimensão política, entretanto, foi apontada como a principal limitação para a viabilização de uma atividade turística, no âmbito local, de forma planejada e, conseqüentemente, responsável e sustentável. A atual situação da mão-de-obra do turismo no Brasil, especificamente quanto à gestão e ao planejamento da atividade, configura-se, por um lado, pela deficiente qualificação do profissional atuante e, por outro, pela absorção inadequada dos profissionais qualificados. Essa situação reflete-se na qualidade do produto turístico ofertado, exercendo impacto negativo na sustentabilidade do destino nas suas diversas abordagens.

7. Cidades Turísticas Baianas de Pequeno e Médio Porte – Uma abordagem contextual face à realidade do país.

O processo de investimento no setor turístico do nordeste apresenta um mercado amplamente diversificado, devido às características geográficas e históricas, ademais de mão-de-obra baratas e com baixa qualificação profissional. Os investimentos em infra-estrutura e em equipamentos turísticos, além de atrair turistas nacionais, internacionais e ingressos, atraem também fatores que, a médio e largo prazo, se transformam em efeitos negativos da atividade, principalmente, nas áreas carentes de planejamento. A emigração, a degradação ambiental, os impactos socioculturais na população receptora, são alguns dos resultados menos desejados pela atividade turística; inserir todos os atores no processo de planejamento ainda é um desafio na realidade atual. Silva e Fernades (2005) reforçam que os danos causados pelo turismo, invasivo e sem planejamento, podem ser irreversíveis para a identidade cultural do povo receptor.

O turismo representou 7,9% do PIB da economia baiana, segundo dados da Estratégia Turística da Bahia 2003-2020, como resultado de investimentos de Programas como PRODETUR/NE (Programa de Desenvolvimento de Turismo/ Nordeste), que se encontra em sua segunda etapa. A geografia do turismo baiano (Figura 5) foi desenhada, em 1995, em pólos turísticos considerados prioritários para investimentos de infra-estruturas e expansão da atividade, se dividindo em Costa do Descobrimento, Costa de Cacau, Costa dos Coqueiros, Costa do Dendê, Costa da Baleia, Baia de todos os Santos e Chapada Diamantina. Os investimentos avançam com a criação de outras zonas turísticas de interesses, contemplando equilibradamente o território baiano, com os Caminhos do Oeste, Lagos de São Francisco, Caminhos de Sertão e o Vale de Jequiriçá (SETUR, 2009).

A nova geografia turística da Bahia é reflexo da representação geoeconômica do espaço, ou seja, vem contemplar a diversidade ecológica e cultural de um território rico de histórias e paisagens que necessitam ser planificados para uso e manejo com bases econômicas sustentáveis.

A Bahia recebeu, em 2008, cerca de 3,5 milhões de turistas, o que impulsiona a criação de projetos que atentem para diversificação da oferta como o etnoturismo no Vale do São Francisco, do turismo étnico e o São João da Bahia, ademais dos segmentos náutico, de golfe e religioso. Atualmente as zonas turísticas contam com 87 municípios inseridos em sua programação; a inclusão de outros e a criação de uma nova zona, Caminhos do Sudoeste, são resultados divulgados pela Bahiatursa, dentro do processo de re-mapeamento das zonas turísticas da Bahia (BAHIATURSA, 2008).

Os municípios baianos situados no litoral são os que mais apresentam mudanças na paisagem natural, onde o processo de litoralizaçao e ocupação territorial, principalmente por grandes investimentos imobiliários, substituem paisagem assim como impactam na cultura local. Oliveira (2007, p.198) analisa o município de Itacaré, onde

O impacto a esses espaços naturais não se restringe apenas a natureza, a comunidade local e sua cultura também sofrem estes impactos, desde quando o cotidiano da cidade é modificado e novos valores são introduzidos na comunidade. Quando esta cultura importada passa a predominar, a cultural local perde seu valor, causando verdadeiros conflitos entre a população nativa, que não consegue se adequar aos novos costumes.

O autor ainda ressalta a falta de um plano oficial de desenvolvimento para o setor e que as decisões relevantes referentes à atividade no município são tomadas pela Secretaria de Turismo ou pela Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia. O modelo de descentralização turística não se aplica, quando analisado de forma específica. A falta de planejamento local é um ponto ameaçador para o bom desenvolvimento da atividade, já que não leva em consideração a realidade fora de uma mesa de negócios. Segundo o secretário de turismo da Bahia, Domingos Leonelli (SECTUR, 2009), o Estado passa pela necessidade de inovação dos produtos, frente à crescente concorrência do mercado, o que seria o terceiro salto do turismo baiano,

E o que significa esse terceiro salto? Primeiro, significa reconhecer um novo quadro de competição em que a Bahia está inserida hoje e não estava há 10 anos, quando Pernambuco, Minas Gerais, Santa Catarina e Ceará estavam anos luz atrás de nós. Por isso, a inovação, a qualidade e a integração do produto turístico baiano à economia, se constituem em necessidades, e não apenas numa opção. No eixo da qualificação, por exemplo, estamos atuando 2 em duas vertentes: na atração e qualificação do fluxo de turistas e na capacitação profissional e empresarial dos serviços turísticos.

Os avanços para a profissionalização da atividade são contínuos, embora a carência de recursos humanos qualificados e conseqüente responsabilidade, com o desenvolvimento da atividade turística local, se refletem no baixo ou desacelerado ritmo de crescimento econômico em municípios potencialmente turísticos. A formação de profissionais comprometidos com a responsabilidade do saber-fazer turístico, com um melhor preparo na área de planejamento, desenvolvendo projetos turísticos partido de uma experiência real, ademais de preparar-los profissionalmente, auxilia os municípios na efetivação do planejamento local, como é o exemplo da agência-escola da FIB (Faculdades Integradas da Bahia ).

A necessidade do setor em atrair novos investimentos nacionais e estrangeiros, principalmente para a construção imobiliária, deve-se aliar ao investimento dos recursos humanos nos municípios menos providos de qualificação para o setor, agregando a cultura local como agente diferenciador na formatação de um produto turístico. Cultura, população e território são elementos prioritários no processo de planificação da atividade turística.

8. Considerações finais

Como apontado anteriormente, para viabilizar o processo de planejamento é necessário reunir adequadamente as dimensões técnica, financeira e política. No contexto dos municípios turísticos brasileiros de pequena e média extensão, foram diagnosticados problemas em todas as dimensões acima citadas. O maior problema destacado foi de natureza política, apesar de o desempenho ser igualmente inadequado nas outras dimensões, o que afeta designadamente a tomada de decisões. Em outras palavras, muitos municípios não efetivam o planejamento turístico por (falta de) decisão da gestão pública.

No contexto da gestão do turismo das cidades turísticas baianas, é verificada uma preocupação com a conjuntura do turismo, de forma a garantir a sustentabilidade, assim como a competitividade. Então, para além do potencial para o turismo, uma vocação baiana notória, hoje se compreende que não basta ter atrativos para que o turismo venha a desenvolver-se e promover o desenvolvimento nas localidades. Além disso, é preciso assegurar a qualidade do destino, tanto para os turistas quanto para a população residente e, inserido na idéia de qualidade, teremos cidades bem planeadas, orientadas para a sustentabilidade e para a competitividade e inovação.

A disseminação desta idéia parece já ocorrer entre as cidades turísticas baianas, o que pode ser compreendida através das dinâmicas organizacionais e suas iniciativas nos campos ambientais, político-administrativos, formativos, dentre outros. Há também a compreensão, por parte da gestão dos destinos, da importância do trabalho em rede, bem como do comprometimento com todos os atores envolvidos com o turismo, a começar pela própria comunidade.

Apesar destes avanços na consciência social e política e dos crescentes investimentos neste sentido, será já suficiente? Muitas cidades turísticas baianas ainda vivem realidades de abandono e de retórica no campo do planejamento. Propostas de projetos com retornos financeiros e sociais assegurados que, algumas vezes, são perdidos, ao meio de desavenças políticas e choque de interesses. Há também, ainda, grande deficiência na formação dos planejadores e gestores do turismo, situação que não será revertida com medidas pontuais. No que tange ao financiamento e investimentos na área do turismo, muitas organizações ainda são atraídas pela mão-de-obra barata (e, por conseguinte, desqualificada), o que compromete na qualidade do produto como um todo e termina por constituir uma fraqueza para o turismo na região.

Estas são apenas algumas problemáticas relacionadas às três principais vertentes do planejamento no contexto das cidades turísticas baianas (técnica, financeira e política). Apesar de constatado que as cidades baianas seguem, ideologicamente, numa direção coerente e orientada para a sustentabilidade, será que os problemas conjunturais serão atempadamente solucionados? Será que segue em um ritmo adequado para garantir a qualidade e competitividade destes destinos e, conseqüentemente, esta própria orientação para a sustentabilidade?

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