Revista: CCCSS Contribuciones a las Ciencias Sociales
ISSN: 1988-7833


EVENTOS CULTURAIS E AUTENTICIDADE

Autores e infomación del artículo

Noémi Marujo *

Universidade de Évora/CIDEHUS, Portugal

noemi@uevora.pt


Resumo:

A autenticidade em eventos culturais tem sido objecto de estudo e reflexão em alguns estudos académicos. Cidades e vilas organizam cada vez mais eventos culturais, nomeadamente de carácter tradicional, para melhorarem a imagem do seu destino e captarem mais turistas nacionais e internacionais para as suas regiões. De facto, os eventos culturais com características autênticas não só valorizam o património cultural de uma região, mas também contribuem para o seu desenvolvimento turístico. No entanto, muitos desses eventos apresentam uma autenticidade encenada, o que pode ser rejeitado pela comunidade anfitriã ou pelos turistas com fortes motivações culturais. Mas também, e o no caso dos turistas, a autenticidade num evento vai depender do entendimento que eles têm da cultura que visitam.

Palavras-chave: Eventos Culturais, Autenticidade, Turistas, Comunidade Anfitriã.

CULTURAL EVENTS AND AUTHENTICITY

Abstract

Authenticity in cultural events has been the subject of study and reflection in some academic studies. Cities and towns organize more and more cultural events, including traditional events, to improve the image of their destination and attract more national and international tourists to their regions. In fact, cultural events with authentic characteristics not only value the cultural heritage of a region, but also contribute to tourism development. However, many of these events have a staged authenticity, which can be rejected by the host community or by tourists with strong cultural motivations. But, and in the case of tourists, authenticity in an event will depend on their understanding of the culture they visit.

Keywords: Cultural Events, Authenticity, Tourists, Host Community.

Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Noémi Marujo (2018): “Eventos culturais e autenticidade”, Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, (diciembre 2018). En línea:
https://www.eumed.net/rev/cccss/2018/12/eventos-culturais-autenticidade.html

//hdl.handle.net/20.500.11763/cccss1812eventos-culturais-autenticidade

1-Introdução

O conceito de autenticidade é usado em diferentes contextos do turismo e, por isso, não há um consenso universal sobre a temática da autenticidade no campo do turismo. A autenticidade é abordada em diferentes perspectivas na investigação em turismo (Marujo et al 2016). Trata-se, de facto, de um termo que é aberto a diversas interpretações, mas que tem uma relevância fundamental na área dos eventos culturais que são projectados para o turismo.
Hoje, cada vez mais, os municípios turísticos organizam eventos culturais, especialmente, festivais ou festas de carácter tradicional para captarem mais turistas ou visitantes para as suas regiões. Alguns responsáveis pelo turismo, para melhorarem o desenvolvimento turístico de uma região, também recorrem aos eventos culturais. No entanto, para alguns autores “os eventos culturais para serem bem-sucedidos precisam de ser autênticos” (McCartney e Osti, 2007: 27).
De facto, os eventos com tradições culturais de uma região são um forte atractivo para a promoção e consumo do turismo. A valorização da cultura local ou regional tem sido objecto de uma procura crescente, pois muitas viagens são motivadas pelos eventos culturais tradicionais que certos destinos apresentam. Nessas manifestações culturais a característica da autenticidade constitui um factor-chave para a deslocação de muitos turistas. É óbvio que, em muitos casos, o turista está consciente da autenticidade encenada promovida pela comunidade local ou pelos gestores dos eventos. Mas, há sempre traços da tradição incluída nesses eventos. Aliás, se tal não acontecesse os eventos culturais poderiam correr o risco de serem rejeitados pela comunidade. 

2-Eventos e Autenticidade

No contexto dos eventos, a questão da interpretação da autenticidade torna-se mais difícil porque envolve factores que estão associados aos rituais de uma comunidade, ou seja, aos seus hábitos e costumes e à experiência que os consumidores obtêm quando participam activamente ou passivamente num evento. Assim sendo, “a autenticidade infere uma cultura tradicional de origem, um produto genuíno…feita pelos moradores locais” (Povey e Wyk, 2010: 13). Portanto, e no caso dos eventos, ela está relacionada sobretudo com o sentido genuíno da cultura que o evento transmite.
As festas e/ou festivais, que englobam a tradição, são geralmente descritos como autênticos ou inautênticos. Tudo depende se esses eventos são realizados ou não pela comunidade local segundo a tradição (MacCannell, 2003). Note-se que a autenticidade é considerada por alguns investigadores como “um factor crucial na motivação dos visitantes para assistir a qualquer evento” (Povey e Wyk, 2010: 14). De facto, muitos turistas quando pretendem consumir um evento com características tradicionais procuram sempre traços de autenticidade, ou seja, aquilo que representa a cultura de um povo.
Nos eventos culturais, “a autenticidade está ligada à reprodução dos rituais e traços culturais genuínos e rigorosamente correspondentes à sua forma original” (Mccartney e Osti, 2007: 28). No entanto, o grau de autenticidade atribuído a um evento é muitas vezes diferente para os distintos turistas. Logo, o conceito de autenticidade é socialmente construído, negociável e varia de acordo com os turistas e o seu ponto de vista (Cohen, 2001). Assim sendo, a autenticidade pode ser entendida como“.. um componente essencial do imaginário turístico” (Dias, 2009: 138).
Para muitos visitantes e/ou turistas a percepção da autenticidade depende, especialmente, do entendimento que eles têm sobre a cultura, do seu nível educacional e da sua apreciação sobre as formas de arte como, por exemplo, as danças (Povey e Wyk, 2010). Assim, a autenticidade não é sempre vista como “uma qualidade do objecto, mas sim como um valor cultural criado e reinventado constantemente nos processos sociais” (Olsen, 2002: 163). Segundo o autor, a criação de contextos que permitem experiências que possam ser identificadas como autênticas, tornou-se uma questão importante para o turismo. Tais contextos são, muitas vezes, criados com o envolvimento dos turistas em actividades onde as características geralmente atribuídas ao papel do turista não são mais viáveis para a adequada acção social no contexto particular do turista. “Essas performances no turismo ainda se relacionam muitas vezes com ideias de autenticidade associadas com o objecto, mas não necessariamente com objectos do passado” (Olsen, 2002: 175).
Refira-se que muitos dos eventos culturais são fruto de uma adopção de rituais passados e da (re) criação de formas tradicionais. Assim sendo, a autenticidade dos eventos “é ligada à reprodução mais fiel e detalhada quanto possível à sua forma original de rituais e traços culturais” (Mccartney e Osti, 2007: 28). Todavia, para que os eventos culturais tenham traços de autenticidade é necessário que os gestores de eventos se envolvam com a população local (Richards, 2007) porque ela, de facto, é a principal guardiã da cultura. Portanto, ela tem um papel decisivo na valorização das singularidades culturais e é quem também identifica o que é encenado por parte dos gestores. Assim, e sempre que possível, os gestores dos eventos devem contar com o apoio da população local no planeamento e organização de um evento. No entanto, saliente-se, que também as comunidades criam e reinventam constantemente as culturas em processos socais e, por isso, a percepção da autenticidade cultural por estas está também em mudança (Olsen, 2002).
É fundamental que a comunidade anfitriã considere os eventos culturais autênticos, mas também é essencial que estes sejam considerados autênticos pelo turista (Mccartney e Osti, 2007). De facto, “os residentes tendem a ter uma visão construtiva da autenticidade ligada às referências culturais e sociais, enquanto os visitantes utilizam uma visão mais existencial da autenticidade relacionada com a fruição do evento e a experiência da diferença” (Richards, 2007: 33). Segundo Fine e Speer (1985), uma experiência autêntica envolve a participação num ritual colectivo onde estranhos se reúnem numa produção cultural para compartilhar um sentimento de proximidade e solidariedade.
Ryan (2003) apresenta um modelo (Tabela I) de interacção entre a cena e a expectativa com referência à autenticidade do evento em que existem, particularmente, duas dimensões: O turista que vê o evento como real ou encenado e a natureza do evento em si como sendo real ou encenada. O modelo de Ryan (2003) indica que os turistas com uma expectativa e necessidade de autenticidade ficarão insatisfeitos se encontrarem um evento inautêntico ou se o perceberem como tal.

Getz (2002) também desenvolveu três perspectivas da autenticidade em eventos: a da antropologia social; a dos organizadores de eventos e festivais e a dos visitantes/turistas. Para a Antropologia Social, a autenticidade é entendida como uma medida dos significados culturais próprios das festividades e celebrações, ou seja, as pessoas partilham elementos válidos da sua cultura. Para os organizadores de eventos e festivais, a autenticidade é vista como uma medida de controlo comunitário e de sucesso em mobilizar a comunidade anfitriã para apoiar o acontecimento e participar nele. Para os visitantes ou turistas, a autenticidade é uma medida de percepção. Segundo o autor, “turistas que não raciocinam muito podem visualizar um evento comercial como autêntico ou podem perceber a sua falta de autenticidade, mas mesmo assim gostam da produção. Outros turistas procuram a autenticidade e sentem-se frustrados quando correcta ou incorrectamente não a encontram” (Getz, 2002: 431). A Figura (I) ilustra as três perspectivas do autor sobre a autenticidade do evento: controle de comunidade e aceitação; significados culturais e perspectiva do evento.

Segundo Getz (2002), no alto da pirâmide encontra-se o festival tradicional e não-mercantilizado. Mesmo que ele seja presenciado por turistas, possui um alto controlo comunitário e aceitação. Sublinhe-se que o controlo comunitário é o principal factor que determina como o evento é apresentado e promovido (Smith, 2003). Para esta autora, se o evento é aprovado pela comunidade, então é “provável que o turista tenha uma experiência autêntica e divertida” (Smith, 2003: 21). No nível médio, Getz (2002) coloca os eventos inventados e orientados para os turistas que podem inicialmente ter um significado cultural baixo, mas que podem mudar com o passar do tempo. “O resultado pode ser uma convergência de significado e aceitação comunitária até que, hipoteticamente, novas tradições sejam criadas” (Getz, 2002: 432). Saliente-se aqui o conceito de autenticidade emergente entendido como um processo no qual um “produto cultural, ou uma característica do mesmo, que estava geralmente planeado como artificial, ou não autêntico, poderá no decurso do tempo, tornar-se reconhecido como autêntico” (Cohen, 2004: 109-110). Para Getz (2002), os eventos com pouco controlo e aceitação da comunidade podem não atingir a autenticidade cultural. Por outro lado, os eventos com pouco significado cultural serão percebidos como estranhos e indesejados resultando, deste modo, em divergência. Na base da pirâmide, segundo o autor, está a perspectiva variável dos visitantes ou dos turistas cuja reacção ou percepção são imprevisíveis. O autor afirma que “os que procuram altos níveis de autenticidade serão presumivelmente atraídos por eventos do topo e repelidos por eventos da base. Mas eventos de entretenimento puramente comerciais podem ter pouca autenticidade e aceitação comunitária, apesar de ainda atraírem turistas. Consequentemente, a perspectiva do turista é o objecto da pesquisa de mercado, com o objectivo de comparar o evento certo com os desejos dos segmentos apontados” (Getz, 2002: 432).
Sublinhe-se que o pós-turista sabe que o turismo é constituído por uma série de jogos. Ou seja, “os pós-turistas encontram prazer na multiplicidade dos jogos turísticos. Sabem que a experiência turística não existe, que ela não passa de uma série de jogos ou textos que podem ser exercitados ou interpretados”(Urry, 2001: 28). Por este motivo, o pós-turista “está consciente de que a experiência turística é largamente mercantilizada, e que a questão da autenticidade é um pouco fútil” (Smith, 2003: 21). Assim, essa nova experiência turística do pós-turista pode ser descrita como uma simulação do real (Craik, 2003). Assim sendo, o consumo da experiência turística pode ser acompanhado por um senso de ironia. Ou seja, “queremos autenticidade extra, que é melhor do que a realidade…Queremos a estimulação através da simulação de formas de vida como gostaríamos que elas fossem, ou tivessem sido no passado” (Boniface e Fowler, 1993: 7). Aliás, Chhabra et al (2003) estudaram a autenticidade encenada num festival e concluíram que a percepção da autenticidade genuína pode ser alcançada mesmo quando o evento é realizado fora do seu lugar original.

3- Conclusão

Os eventos culturais, que reflectem a cultura de um lugar, funcionam como uma espécie de arena onde o conhecimento local é produzido e reproduzido, onde a história e a herança cultural distinguem os destinos uns dos outros. Em muitos casos, os eventos culturais constituem a motivação principal para a prática do turismo e oferecem ao turista oportunidades para aprender sobre os hábitos e costumes da cultura que ele visita. São eventos ao vivo que possuem traços de autenticidade e que procuram transmitir ao outro o que é distinto numa cidade, vila ou aldeia. Os eventos, caso sejam bem planeados, preservam a tradição cultural de um povo e, também, criam laços emocionais entre os turistas e a comunidade local.
A autenticidade ou autenticidade encenada nos eventos são o resultado de como os turistas ou os visitantes veem as actividades ou programação dos eventos, de acordo com as suas perspectivas e interpretações. A experiência da autenticidade em eventos é relativa a cada tipo de turista que pode ter a sua própria definição, experiência e interpretação da autenticidade.  No entanto, especialmente para a comunidade anfitriã, se um evento cultural não apresentar características autênticas ele corre o risco de ser rejeitado por ela. Por isso, ela deve ser sempre envolvida nesta tipologia de eventos.

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*Doutorada em Turismo pela Universidade de Évora. Directora do Mestrado em Turismo e Desenvolvimento de Destinos e Produtos da Universidade de Évora

Recibido: 24/09/2018 Aceptado: 29/12/2018 Publicado: Diciembre de 2018

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