Leandro Seawright Alonso*
Universidade de São Paulo, Brasil
Fagno da Silva Soares **
Universidade Federal Fluminense, Brasil
Resumo: Consideramos os ritos da oralidade pentecostal como sustentadores dos sentidos narrativos que vinculam a Palavra às práticas litúrgicas. Concomitantemente, os imaginários religiosos pentecostais são organizados pela lógica dos mitos em suas narrativas. Podemos analisar a história oral testemunhal considerando as palavras: conversão e testemunho. Avaliamos a possibilidade de fazer entrevistas convencionais de história oral.
Palavras-chave: História oral testemunhal, história, mito.
  Abstract: We consider the rites of pentecostal orality as  supporters of the senses narrative linking the word to liturgical practices. Meanwhile,  the pentecostal religious imaginary are organized by the logic of myths in  their narratives. We can  analyze the testimonial oral history considering the words: conversion and  testimony. We evaluated the possibility of  conventional oral history interviews. 
Keywords: oral testimonial history, history, myth.
Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato: 
Leandro Seawright Alonso y Fagno da Silva Soares (2016): “Ritos da oralidade pentecostal. Reflexões sobre práticas litúrgicas e sentidos narrativos da história oral testemunhal”, Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, (abril-junio 2016). En línea: http://www.eumed.net/rev/cccss/2016/02/ritos.html
http://hdl.handle.net/20.500.11763/CCCSS-2016-02-ritos
INTRODUÇÃO
O protestantismo pentecostal, desde suas origens, fundamentou-se  nas narrativas do homo religiosus estabelecendo  seu principal meio de comunicação das experiências sagradas. Sabemos, contudo,  que grande parte das pesquisas acadêmicas sobre o pentecostalismo brasileiro  restringiu-se à documentação estritamente textual. Consideramos, no entanto, que  a história oral é uma importante alternativa disciplinar para as pesquisas  sobre o pentecostalismo. 1 Nisto reside a nossa hipótese de trabalho, a saber, em se estudar as narrativas  pentecostais por meio de entrevistas de história oral como produtora de ‘documentação  viva’ na busca pelas narrativas testemunhais. Não obstante, a Palavra  ritualizada pela narrativa torna-se ‘fonte de estudos’ sobre as místicas  religiosas pentecostais como proposta pentecostal ao problema do trauma.
   ORALIDADE PENTECOSTAL
   O λόγος (palavra) divino – transcrito na Bíblia Sagrada – foi traduzido para as línguas  vernáculas europeias e, com a invenção da imprensa, materializou-se no papel escrito.  Com base sólida no ‘papel do escrito’, tornou-se, por isso, acessível aos  leitores europeus em um processo moderno de letramento e de distanciamento em ‘longa  duração’ da ‘substância medieval’. No ambiente tensivo, entre católicos e  protestantes, na transição para o moderno, os escritos bíblicos foram difundidos  entre as pessoas comuns do universo letrado durante o Século XVI. A Bíblia,  traduzida do hebraico e do grego para o latim, assim como do latim para as línguas  modernas, ficou inteiramente acessível às inovações negociadas no modus vivendi do povo letrado. Além da  Bíblia, outros documentos escritos pelos protestantes, tais como as 95 teses de  Martinho Lutero, foram impressos e distribuidos para as pessoas comuns da  Alemanha, da Suíça e dos demais países europeus.2 
   Sacramentaram-se, portanto, os princípios educaioncais escriturísticos  como alternativas protestantes para recondução dos religiosos às ‘experiências  salvacionistas’ pictoricamente semelhantes às da Igreja Primitiva das páginas  do Novo Testamento. No âmbito reformado, revalorizou-se a autoridade  escriturística como axioma primordial dogmático dos mitos de origens  neotestamentárias. Por isso, o “crente, individualmente, seria agora seu  próprio sacerdote e o mentor de sua própria vida religiosa em comunhão com  Deus, depois de aceitar Seu Filho como seu Salvador, pela fé somente” – como  preconizou Earle E. Cairns (CAIRNS, 1995, p. 223).
   Basicamente, dos cinco princípios teológicos reformados,  destacou-se Sola Scriptura como  fundamento para os demais. Os outros quatro princípios – Solo Christus, Sola Gratia, Sola Fide e Solo Deo Gloria – resultaram do embasamento escriturístico preponderante  da Reforma Protestante. Disse Hegel que “com a Reforma os protestantes fizeram  sua revolução” (apud. BONI, 2000, p. 7). Acrescentamos apenas mais uma palavra à  frase: com a Reforma os protestantes fizeram sua revolução textual. Inscreverem-se  nas tramas vivenciais a partir da leitura dos textos bíblicos ao mesmo tempo em  que suas “texturas experienciais” atravessaram profundas modificações de “longo  alcance” na mentalidade, na prática e nas “operações religiosas” modernas. 
   Concomitantemente, a tradição textual – na perspectiva  protestante – assegurava o direito das pessoas à salvação do espírito. Por  isso, o conhecimento letrado se tornou desejável para capacitação na  compreensão da Bíblia como palavra de Deus. João Calvino, com essa convicção  teológica, inaugurou as primeiras escolas públicas em Genebra, no ano de 1536 (CARVALHO,  2000, p. 17). Decorreu disso que temas acerca da educação salvacionista se  tornaram interesses nacionais na Suíça. Porque a Bíblia foi passada às mãos do  povo que deveria lê-la com autonomia para fundamentar novas interpretações.
   Na objetividade dos escritos bíblicos estava presente  certa tendência subjetiva do sacerdócio universal dos crentes no invólucro  hermenêutico da palavra. Logicamente, os leitores das escrituras poderiam  interpretá-las segundos seus próprios crivos intelectuais regidos pelas  convergências ou divergências teológicas protestantes. Derivou-se, daí,  determinada “disposição cismática”, multiplicadora, no interior do  protestantismo histórico. Mantiveram-se os núcleos resistentes escriturísticos,  mas as identidades protestantes foram negociadas segundo os diferentes  contextos teológicos, históricos, geográficos e culturais. Sublinhamos,  contudo, que as igrejas – luteranas calvinistas e reformadas – surgiram como  vertentes baseadas no “princípio de subjetividade” interpretativa (HEGEL, 2001,  p. 458). Originou-se a ‘tendência cismática’, divergente e multiplicadora, do  protestantismo histórico 3. 
   Consideramos que, dessemelhante do protestantismo  histórico, o pentecostalismo priorizou as “verbalizações das experiências  religiosas” nos testemunhos de vidas, de obras e de grandes proezas dos mundos  fantásticos. Na Reforma Protestante a Bíblia “desceu dos altares e ficou nas  mãos do povo”, porém no pentecostalismo do Espírito as escrituras cristãs foram  depreendidas como “complexas e de difícil entendimento”. As pessoas ordinárias  tementes comumente dizem: “a Bíblia é um livro muito difícil”. Reforçamos,  entretanto, que para os protestantes pentecostais a Bíblia também é considerada  como Palavra de Deus. Mais, no protestantismo do Espírito “a Bíblia tem apenas  um lugar diminuído” que, ao mesmo tempo, desloca-o da textualidade à oralidade  porque “não é mais livresco” (GODOY; NAJARÍ, 2004 p. 55).
   As práticas do pentecostalismo não estão embasadas na ‘mediação  do papel impresso’, mas na oralidade como hábito religioso fundamental. Instaura-se,  portanto, a oralidade pentecostal em substituição da ‘textualidade exclusiva’  dos protestantes históricos. Trata-se, assim, de um processo histórico de maior  duração entre a imprensa dos dias de Lutero e os púlpitos das igrejas locais,  até às modernas mídias radiofônicas e televisivas da sociedade contemporânea  brasileira. A oralidade religiosa, no entanto, é prática corriqueira comum no  dia-a-dia do pentecostal, pois os feitos maravilhosos do Espírito Santo são  testemunhados constantemente por orientação dos pastores e líderes das  comunidades locais.
   Durante seus cultos, os pentecostais tomam parte da  oralidade na subjetividade envolvente das experiências religiosas. Muitas  manifestações litúrgicas são demonstradas por expressões corporais e, no ‘corpo  pentecostal’, falado, estão as possessões do Espírito em oposição do Diabo. Os murmúrios,  resmungos, gritos ou gemidos baixinhos, bem como as expressões proféticas  testemunhais, são características do pentecostal possuído pelo Espírito Santo.  Semelhantemente, os pentecostais batizados no Espírito Santo falam línguas  angelicais que (des)abrigam significados semânticos, coesão e coerência para “aquele  abençoado” que tem dons de interpretação de línguas. C. Williams descreve as  línguas dos anjos, ou línguas de mistérios, como resmungos, gemidos, sons  incompreensíveis, sons fabricados com fragmentos de palavras, misturas de  fonemas estrangeiros e indígenas, falas em línguas estrangeiras (WILLIAMS,  1970).
   Daí, a glossolalia,  língua(s) estranha(s), é percebida por meio de expressão verbal aparentemente  ininteligível, mas – tomando parte de toda a narrativa pentecostal – os  símbolos linguísticos idiomáticos podem conferir-lhe sentido. É por isso que o  pentecostal, depois do batismo com o Espírito Santo, torna-se falante de, ao  menos, duas importantes línguas intercambiáveis, a saber: seu idioma e,  respectivamente, o idioma dos anjos invocados/avocados diante dos mistérios  espirituais. 
   Sobrenaturalmente, um pentecostal – segundo sua crença  – pode irromper seu discurso piedoso com outros idiomas que nunca tenha  estudado anteriormente. Por exemplo, um pentecostal falante da língua  portuguesa pode falar qualquer outra língua se a divindade quiser se revelar  para os ouvintes estrangeiros, segundo suas crenças. Este último fenômeno,  distinto da glossolalia, é denominado  tecnicamente de xenoglossia – como  fenômeno espiritual miraculosamente possível ao crente pentecostal.
   Há, portanto, uma entrega do crente pentecostal à  divindade possuidora na mesma medida em que a divindade, com todos os seres  angelicais, significa os símbolos linguísticos da glossolalia ou da xenoglossia.  Os mirabolantes feitos narrativos da divindade estão explícitos ou implícitos,  entre dizíveis e indizíveis, nos meandros litúrgicos dos cultos religiosos  extraordinários. Por conseguinte, os corpos dos crentes pentecostais permanecem  em estado de transe e de êxtase que se expressa nas orações, nas narrações de  visões extramundanas e nos sinais referidos por meio das prédicas.
  É certo que, nos tombos durante as possessões, os “corpos  pentecostais” são abolidos para tornarem-se linguagem repleta de significados e  de significantes. Depois da abolição, os corpos pentecostais entram em “terapia  de cura divina”, mas o Espírito encontra novamente seu lugar na subjetividade  humana para ser novamente falado nos testemunhos dos crédulos. Os testemunhos  dos fiéis podem ser realizados por meio da Palavra falada ou da Palavra  cantada. Natanael Francisco de Souza situou as diferentes fases da música  evangélica no Brasil, porém a indústria gospel se fortaleceu ao valorizar as experiências religiosas fantásticas dos  pentecostais (SOUZA, 2008). A cantora gospel Elaine de Jesus canta:
   Sinto  grande emoção/Ao ver os irmãos cantando na igreja/ Os anjos passam entre nós/  Em uma só voz cantam glória a Deus/Um mistério glorioso envolve este povo numa  brisa suave/E afasta todo mal/ É um grande sinal que Deus está aqui/ Deus vai  tocar em você, Jesus Cristo vai te usar/ Fale em línguas estranhas, porque essa  chama não pode apagar/ Canta, chora e profetiza/ Deixa o fogo te queimar/  Quanto mais o fogo queima/ Mais perto de Deus nós vamos ficar/ Sinto grande  emoção/Ao ver os milagres acontecerem/ Mudo fala, surdo ouve, paralítico anda e  o cego vê. (DE JESUS, 1996).
   Salientamos, na canção acima, as descrições dos  transes e dos êxtases vivenciados no campo da subjetividade pentecostal que  vincula o crente ao sagrado. Parece não ser possível resistir ao Espírito Santo  que quer batizar o “corpo pentecostal” para recodificá-lo sublimemente.  Notamos, com isso, que Elaine de Jesus denota a subjetividade experimentada em  meio à possessão narrativa do Espírito Santo. Cantar, chorar e profetizar – em  meio aos anjos – é “um mistério glorioso que envolve este povo numa brisa  suave” que conduz aos caminhos de milagres em que até o “mudo fala, o surdo  ouve, o paralítico anda e o cego vê”. Por Palavra pregada, testemunhada ou  cantada, os pentecostais são contadores de histórias fundadoras de tradições  religiosas que legitimam as experiências trans  humanas com o sagrado narrativo.
   Concebemos, pois, que a oralidade é singular a todo  ser humano saudável, embora desenvolvida em movimentos, culturas e tradições  distintas. Qualquer ser humano, mesmo que não saudável, desenvolve linguagens  que significam de formas distintas seus pensamentos. Para Walter Ong, existem  dois conceitos importantes: “oralidade primária” e “oralidade secundária” (ONG,  1982). A oralidade primária, guardiã da pureza das sociedades ágrafas, passou  por processos de dissolução, porém foi negociada com o advento da escrita que  denominamos, com Ong, de “tecnologia da escrita”. Essa negociação intensa  produziu a intrincada oralidade secundária que se sustenta com base no núcleo  textual conhecido pela sociedade moderna. Os resquícios de oralidade primária,  com sua magia mística, apoiam suas relações com a complexa “tecnologia da  escrita”. No caso pentecostal, as elaborações da oralidade resguardaram certa  tradição oral moderna, mas seus pronunciamentos textuais foram apenas os inícios  que impulsionaram experiências religiosas nas categorias ritualísticas da  Palavra. Desse modo, o pentecostalismo se inscreve no universo da oralidade  secundária, mas resguarda resquícios distantes da oralidade primária.
   Em outra perspectiva, a Bíblia é lida no começo das  prédicas ou dos cultos, mas não é soberanamente decisiva nos processos  hermenêuticos. Quer dizer, as letras sagradas não se sobrepõem ao ‘corpo  pentecostal’ em experiência sobrenatural. Se no protestantismo histórico os  textos são legitimadores das experiências subjetivas, no pentecostalismo do  Espírito as experiências religiosas são legitimadoras das hermenêuticas  textuais. Neste último caso, os textos são servos da Palavra. A Palavra reina.  O Espírito possui. 
MÍSTICA, ORALIDADE E  RITUAL.
   Da mítica grega à mística das sociedades tradicionais,  até aos modernos mitos das sociedades letradas, estão os processos históricos  de constantes atualizações dos imaginários religiosos das sociedades (BARTHES,  2003). Percebemos, na história das religiões, que os mitos adaptados às  diferentes realidades atualizam os ideários religiosos repercutidos nas  experiências dos crentes com seus deuses. Evidentemente, no caso do  cristianismo não é diferente porque existem mitos de origens que são  compartilhados por diferentes denominações na vigência da tradição oral nos  moldes letrados da modernidade. 4 As mudanças sociais, entrementes, oferecem novos sentidos místicos às religiões  por meio de adaptações das histórias fantásticas.
   Dessa forma, as “mudanças sociais produzem, nos fiéis,  modificações de idéias e de desejos tais que os obrigam a modificar as diversas  partes de seu sistema religioso”. Essas alterações implicam em três  decorrências básicas: a primeira se  refere às modificações dos ‘fenômenos religiosos’; A segunda diz respeito à ‘posição do indivíduo no interior da  sociedade’; Na terceira consideramos  as modificações nos “sentimentos religiosos destes indivíduos” (JULIA, 1974, p.  106). 
   No pentecostalismo, não raras vezes, percebe-se que a imitatio dei é decorrente das  modificações nas elucubrações místicas dos imaginários religiosos. Consideramos,  com Mircea Eliade, que o mito “conta uma história sagrada, quer dizer, um  acontecimento que teve lugar no começo do Tempo, ab initio” (ELIADE, 1992, pp. 50 – 51). Além disso, os mitos  representam, nas narrativas, as lutas por visões de mundo díspares ou não, por  interpretações e por significações dos eventos experienciais relevantes. James  Barr disse que
   a  mitologia não é uma manifestação periférica, nem um luxo, mas uma tentativa  séria de integração de realidade e experiência, consideravelmente mais séria do  que hoje chamamos casualmente de ‘filosofia de vida’. Seu objetivo é a  totalidade do que é significativo para as necessidades humanas, materiais,  intelectuais e religiosas. Possui, portanto, aspectos que correspondem a  ciência, a lógica e à fé, e seria errado ver o mito como um substituto  distorcido de qualquer uma destas. (BARR, 1959, p. 3). 
   Com isso, os mitos fundamentam os começos, os decursos  e os fins escatológicos redentores. As coisas que acontecem durante os tempos –  começo, meio, fim ou os movimentos cíclicos – são preenchidas por “atos  heroicos” salvadores e, às vezes, politicamente messiânicos. Corriqueiramente,  os tempos de “paz-paraíso” são substituídos por tempos “catastrófico-infernais”  que, pelo chamado heroico de um homem, ou de um conjunto de pessoas, são  alterados por tempos redimidos soteriologicamente5 .  Os mitos são vinculados processualmente às narrativas redentoras do homo religiosus como “sistema dinâmico  de símbolos, arquétipos e esquemas” que se compõem em narrativa com impulsos  bem articulados na oralidade (teo)lógica (DURAND, 2002, pp. 62 – 63).
   Os ciclos persistentes da mística materializada no  tempo podem resultar em novas catástrofes espirituais que desestruturam  realidades pessoais ou coletivas. Subjaz nisto a busca do oralista pela memória  coletiva dos pentecostais como vinculadora dos mitos estruturais às crenças  messiânicas religiosas – que agrega pessoas em “escala ampliada” dos “laços  sociais” como abalizado por Renato Ortiz (ORTIZ, 2001, pp. 65 – 66).
   Mitos e Ritos são, respectivamente, “agentes  estruturais” que servem “para conformar a ordem humana à celestial” e se  constituem em um “mesocosmo” por meio do qual os religiosos sustentam relações  com o “macrocosmo” (CAMPBELL, 1959, p. 149). No caso pentecostal, e em outros  casos religiosos, concebe-se que o “mesocosmo” hierofânico se torna realidade  apodítica: funda a verdade absoluta do imaginário às irrupções do sagrado no  mundo em escala de modificações históricas.
   Para Eliade, os religiosos dos modelos trans humanos só se conhecem quando  imitam os deuses, para quem “o homem religioso não é dado: faz-se a si próprio  ao aproximar-se dos modelos divinos. Estes modelos, como dissemos, são  conservados pelos mitos, pelas histórias das gestas divinas” (ELIADE, 1992, p.  52). 
   Há, portanto, na imitatio  dei, certos vieses comportamentais religiosos com expressões narrativas das  suas experiências fantásticas. Cabe aos oralistas, então, buscar apreender os  mitos fantásticos como caminhos possíveis à compreensão das suas narrativas nas  entrevistas de história oral até o estabelecimento de textos. Podemos  considerar que as integrações entre realidades com experiências míticas são  partes imprescindíveis da memória religiosa, tanto nos êxtases e nos transes,  quanto nas audições e nas visões, mas – principalmente – na ritualística da Palavra  que transpassa os fiéis pentecostais. 
   Que é um rito? Campbell disse que um ritual é uma organização  de símbolos mitológicos e, participando do drama do rito, o homem é colocado  diretamente em contato com eles (CAMPBELL, 1959). Eliade, complementarmente,  disse que rito é rememoração e conservação da experiência religiosa primordial porque  “toda vida religiosa é comemoração” (ELIADE, 1992, p. 53). Se os mitos  impulsionam os crentes aos ritos, são os ritos que remetem os devotos de volta  aos mitos. Por conseguinte, os ritos resistentes organizam, sistematizam,  rememoram e conservam as experiências religiosas que significam as próprias  histórias religiosas.
   O verbo divino ritualizado, ou a Palavra de Deus,  passa necessariamente pela estruturação mística dos imaginários pentecostais. Consequente  à estruturação mítica, ritualiza-se a Palavra nas liturgias dos cultos até a  sua comunicação aos demais fiéis. Os crentes sentem, na ritualística da  Palavra, os poderes fantásticos dos testemunhos, das pregações, das revelações,  das profecias, das visões enunciadas, das glossolalias e das glossolalias interpretadas, bem  como dos movimentos repetidos das canções extáticas.
   Na subjetividade ritualizada é que os mitos se  sustentam como organizadores lógicos das crenças e das visões de mundo dos  crentes. Segundo Stanley Krippner e David Feinstein, os mitos são historias ou  crenças organizadoras com princípios orientadores (KRIPPNER; FEINSTEIN, 1988). Os  pentecostais, assim como os demais religiosos, não acreditam nos mitos porque  são mentecaptos ou alheados, tampouco porque são isolados da realidade, mas  porque – na estrutura das suas crenças – subjazem certos organizadores lógicos  responsáveis por suas identidades e memórias.
   Para Campbell, os mitos religiosos não são mentiras ou  ilusões. São, ao contrário disto, organizações de “imagens e narrativas simbólicas,  metáforas das possibilidades da experiência humana” e as realizações de “uma  dada cultura num determinado tempo”. Além disso, os mitos possuem ‘função  psicológica’ por meio da qual se pode “lidar com os vários estágios do  nascimento à morte” (CAMPBELL, 2002, pp. 17 – 18; 96). 
   Ressaltamos, contudo, os equívocos dos críticos convencionais  que consideram os mitos como crenças alucinadas, e alucinantes, produtoras de  histórias mentirosas ou incoerentes. Não procuramos, numa pesquisa de história  oral, as “exatidões históricas” ou os “testemunhos de verdades” e, ainda, de  “realidades comprovadas e sim de visões, construções narrativas, idealizações,  que são definidas na exposição dos fatos”. Interessa aos oralistas as falhas da  memória, os desvios, os erros, as camuflagens, as distorções e as invenções. Disse  Sebe Meihy, ademais, que “o respeito à empiria expressa no fazer do documento é  o tesouro buscado pela história oral capaz de revelar a subjetividade contida  nas variações do parâmetro dado pelo estabelecido como verdade” (MEIHY;  HOLANDA, 2007, p. 124).
   Cumpre-nos, portanto, fazer ressalvas à teologia de  Rudolph Bultmann que propôs determinada desmitologização hermenêutica não somente do texto sagrado, mas também das experiências cristãs  transmitidas oralmente às comunidades religiosas (BULTMANN, 2000)6 .  Jacques Le Goff, ao contrário, demonstrou-nos – discorrendo sobre ‘Idade Mítica’  – a presença estruturada do imaginário místico fundamental nas tradições  judaico-cristãs e nas culturas indígenas (LE GOFF, 2008, pp. 283 – 321). A  “desmitologização” como hermenêutica histórica ou teológica, dessa forma,  invoca a desventurada mania do julgamento como exorcizou Marc Bloch. Desde os Annales, Bloch disse que a questão “não é  mais saber se Jesus foi crucificado, depois ressuscitado. O que agora se trata  de compreender é como é possível que tantos homens ao nosso redor creiam na  Crucificação e na Ressurreição.” (BLOCH, 2001, p. 58). 
   Não nos surpreende, todavia, que “tantos homens ao  nosso redor creiam” na ressurreição de Jesus Cristo, mas que tantos acadêmicos  ao nosso redor provoquem a ressurreição da antiga “mania do julgamento” acerca  da veracidade dos relatos. Deve existir, e existe, certa lógica na estrutura mística  que encaminha os ideários religiosos às figuras dos diversos modelos imagéticos  de Jesus Cristo. Outrossim, os pentecostais acreditam no batismo com o Espírito  Santo como habilitação para testemunhar profeticamente sobre as realidades  espirituais ou sobre suas posições político-religiosas assim como no caso do  pentecostalismo renovado no ambiente da Ditadura Militar no Brasil7 .  Nesse sentido, sabemos, com Campbell, que a mitologia tem quatro funções  importantes: a primeira é de  esconjurar um sentimento de espanto ante aos mistérios traumáticos do ser; A segunda é de fazer cosmologias; Subsequentemente,  a terceira se refere ao apoio, ou  não, a uma ordem social vigente; Por fim, a quarta é conduzir as pessoas em direção ao seu enriquecimento e realização espiritual  (CAMPBELL, 1959). 
   Por essas razões, os pentecostais, assim como os  outros crentes, se estruturam miticamente, tanto no seu imaginário experiencial  religioso, quanto na sua oralidade reproduzida pela ritualização do sagrado. Por  isso, a oralidade pentecostal está preenchida com mitos – organizadores lógicos  – das narrativas que completam os sentidos experienciais subjetivos da Palavra na  condução do testemunho religioso.
HISTÓRIA ORAL TESTEMUNHAL
Entre  os gêneros de história oral, tais como: história oral de vida, história oral  temática e tradição oral, emerge outro conceito definido por Meihy como  historia oral testemunhal. O gênero de história oral testemunhal está “ligado  às questões traumáticas, marcadas por pessoas que vivem dramas em suas vidas ou  relações” (FILHO; ROVAI, 2010) 8.  Para entender sucintamente o gênero de história oral testemunhal, no caso  pentecostal, consideramos três importantes expressões: trauma, conversão e  testemunho. 
   Em primeiro lugar consideramos a  expressão “τραύμα” (trauma), em sua raiz etimológica grega, como ferida, lesão ou  machucado provocado pelos agentes dos mundos externos 9. Disto decorre que, em  perspectiva histórica, os traumas podem ser marcados por eventos que machucam a  memória coletiva nacional ou a memória de uma comunidade de destino específica,  bem como a memória pessoal dos afetados por dramas experienciais com diferentes  feições.
   Discorrendo acerca dos “traumas no Brasil”, em sua entrevista para  Eduardo Meinberg de Albuquerque Maranhão Filho e para Marta Gouveia de Oliveira  Rovai, Meihy considera alguns exemplos relevantes:
temos 3  milhões de nordestinos em São Paulo, essa migração pode ser caracterizada como  uma espécie de trauma, mas com feições próprias. Pela sutileza histórica, por  não termos casos explícitos como o Holocausto, a qualificação do que é trauma  nos é diferente, sutil, muito mais “histórico” e de “longa duração. (FILHO;  ROVAI, 2010). 
   Complementarmente, Meihy disse que “estamos em fase de caracterização do  que seria trauma no coletivo brasileiro”. Consideramos, assim, a importância do  conceito de trauma histórico de “longa duração”, mas nos preocupamos também com  os traumas psicológicos pessoais. Escolhemos, portanto, evidenciar duas  perspectivas diferentes sobre os traumas em história oral testemunhal, são  elas: macrotrauma e microtrauma.
   Os macrotraumas são eventos que  machucam a memória coletiva nacional ou a memória coletiva das comunidades de destino estudadas. Esses  traumas induzem consequências de impacto nacional. Não obstante, os  microtraumas são eventos que afetam psicologicamente as pessoas machucadas por  dramas peculiares. Na esfera da cultura social, os microtraumas machucam as  memórias individuais em razão das dores particulares dos afetados. Por isso, os  macrotraumas acontecem nos níveis coletivos e os microtraumas acontecem nos  níveis individuais com diferentes intensidades de consequências coletivas. 
   São característicos dos microtraumas – dos traumas individuais – os  diferentes ritmos na ordem dos acontecimentos da intimidade pessoal. Os  macrotraumas, ou traumas coletivos, são resultados dos acontecimentos que, em  ritmos alternados, atingem diretamente a memória coletiva. Para Paul Ricoeur,  as noções de “trauma ou de traumatismo, de ferida e de vulnerabilidade  pertencem à consciência comum e ao discurso ordinário” da mesma forma que podem  ser “doenças da memória” individual ou catástrofes históricas que afetam a  “memória coletiva” (RICOEUR; In: HENRIQUES, 2005).
   Por lógico, os macrotraumas não se dissociam das individualidades  traumatizadas e, inversamente, os microtraumas não se descolam da memória  coletiva – nas categorias de Maurice Hallbwachs (HALLBWACHS, 1990). É possível,  por exemplo, estudar a Ditadura Militar no Brasil por meio dos seus machucados  catastróficos à memória coletiva nacional e, com distinção, é possível estudar  os traumas pessoais dos torturados que foram obviamente vilipendiados (e individualmente).10  As duas formas de  estudos, no entanto, são plausíveis à história oral testemunhal, mas ambas  partem de um colaborador, ou de vários colaboradores, para compor o “todo” das  redes pretendidas no projeto de pesquisa inicial.
   Salientamos, com Michel Pollak, que “se a análise do trabalho de  enquadramento de seus agentes e seus traços materiais é uma chave para estudar,  de cima para baixo, como as memórias coletivas são construídas, desconstruídas  e reconstruídas, o procedimento inverso”, daqueles que com a história oral  partem “das memórias individuais, faz aparecer os limites desse trabalho de  enquadramento e, ao mesmo tempo, revela um trabalho psicológico do indivíduo  que tende a controlar as feridas, as tensões e contradições entre a imagem  oficial do passado e suas lembranças” (POLLAK, 1989, pp. 3 – 15).  Interessa-nos, no caso pentecostal, essa dimensão psicológica traumática, ou  como denominamos anteriormente – microtraumática.
   Sigmund Freud  abalizou que os traumas psíquicos são causados por “afluxos de excitações  excessivas” que traspõe a tolerância, a resiliência  emocional e a dominação situacional da pessoa afetada (FREUD, 1992)11 .  Por isso, os traumas são invasões de estímulos para os quais o ‘eu’ não está  preparado e, por conseguinte, os eventos traumáticos ficam ‘encapsulados’, ou  enquistados, na vida psíquica – sem ser elaborados. Os traumas psíquicos,  portanto, se constituem como desorganizadores dos mundos interiores. Além disso,  os traumas se concretizam na medida em que as pessoas afetadas por eventos  potencialmente desorganizadores não conseguem suportá-los e tampouco  apaziguá-los nos seus “mundos interiores”. Na mesma direção de Freud, disseram Jean  Laplanche e Jean-Bertrand Pontalis que
   O  afluxo de excitações é excessivo relativamente à tolerância do aparelho  psíquico, quer se trate de um só acontecimento muito violento (emoção forte) ou  de uma acumulação de excitações cada uma das quais, tomada isoladamente, seria  tolerável; o princípio de constância começa por ser posto em xeque, pois o  aparelho não é capaz de descarregar a excitação. (LAPLANCHE; PONTALIS, 1967, p.  501). 
   Em  perspectiva complementar, assinalamos que os traumas psicológicos são conceitualmente  vacilações da “organização subjetiva” como afirmou Felícia Knobloch (KNOBLOCH,  1998, p. 136). Um tempo traumático “configura-se como tempo do presente  absoluto de estupor e paralização” permitindo que as experiências sejam  captadas pela histórica oral – que ocorre, evidentemente, no tempo presente.  (MORENO, 2009, p. 144). Sintomaticamente, outrossim, os traumas conduzem os  afetados para “fora de si” num presente absoluto. Segundo Sándor Ferenczi, os imediatos  absolutos das dores que provocam a impressão de superação “do tempo e do  espaço” presentificam os machucados da alma (FERENCZI, 1990, p. 65).
   As  noções de “afluxos de excitações excessivas”, de vacilações da ‘organização  subjetiva’, de tempo traumático repleto de paralização existencial e do salto para ‘fora se si’ como condição  traumática, devem significar os microtraumas desorganizadores lógicos das  pessoas afetadas. No salto para fora de  si, todavia, os traumatizados perdem os encantos que organizam seus ‘sonhos  pessoais’ e, às vezes, seus projetos de vida. O salto para ‘fora de si’ é, ao  mesmo tempo, desespero de conviver com as vacilações da ‘organização subjetiva’  e desesperança na possibilidade de superação das perplexidades do ‘eu’  desorganizado. 
   No  documentário: Sobreviventes, Miriam  Chnaiderman e Reinaldo Pinheiro demonstram as implicações dos traumas nas  memórias individuais e coletivas12 .  Partindo de traumas pessoais, Bell Marcondes conta sua experiência – num salto  para ‘fora de si’ – de desorganização dos seus mundos interiores com  consequências significativas na sua história de vida. No salto para ‘fora de si’,  Marcondes disse:
   O que  me levou para a rua foi uma série de razões. A primeira delas foi não querer  saber quem eu era. Eu queria esquecer tudo o que estava acontecendo comigo. Não  queria sentir. A violência maior foi a que eu cometi contra mim. É uma sensação  de alívio. De não ter mais que ser [...] Minha situação limite vem desde a  minha infância porque quando uma criança sofre um abuso sexual... [...] Eu  tento carregar essa menina no colo pra ela não sentir mais dor, mas é difícil.  Eu não consigo esquecer essa coisarada toda.(CHNAIDERMAN; PINHEIRO, 2008).
   Nas  vicissitudes dos traumas pessoais de Marcondes estão enraizadas as lembranças  concretas do abuso sexual sofrido na infância como propulsionador das  desorganizações subjetivas do “eu”. Não se trata de memória reminiscente com  vagas lembranças, mas de uma memória resistente do trauma de quem não consegue  “esquecer essa coisarada toda”. Nenhum trauma, portanto, acontece logicamente  fora da história de vida, mas qualquer trauma pode ser testemunho vivo no  interior da história narrada. Se for plausível que os traumas culminam em  vacilações da “organização subjetiva”, então é possível que, no caso dos  pentecostais, as mitificações do imaginário religioso sejam partes  constitutivas na conversão espiritual da pessoa traumatizada como solução  religiosa provisória para as reorganizações da vida. Assim, consideramos em segundo lugar a expressão conversão como  crença pentecostal na possibilidade de superação das experiências traumáticas  por meio das mistificadas hierofanias divinas. 
   As  conversões acontecem, na maioria das experiências pentecostais, durante os  cultos emocionantes repletos de pregações, de canções e de testemunhos que  comprovam as irrupções poderosas da divindade. É verossímil que, conforme  Campbell, os rituais cristãos são organizações dos símbolos mitológicos que  induzem ao drama do rito salvador de Jesus Cristo na sua morte e ressurreição.  Para Eliade, como dissemos anteriormente, os ritos são rememorações das  experiências religiosas primordiais. Num culto pentecostal, entretanto, os microtraumas  pessoais – dos mundos interiores – são preenchidos pelo sentido mítico,  histórico e narrativo do trauma cristão original – que é a crença fundamental  na violenta morte de Jesus Cristo na cruz. Nesse direcionamento, reconhecemos  os cristãos como religiosos que acreditam no trauma crístico como vicário aos  traumas pessoais13 . Trata-se,  então, da substituição mítica, mística e imagética dos dramas pessoais pelos  dramas crísticos.
   Os  pentecostais, segundo suas crenças, não aceitam enfermidades físicas ou  psicológicas duradouras porque acreditam que Jesus Cristo enfermou pelos  convertidos à sua cruz. Repudiam, ainda, as desestruturas traumáticas psíquicas  e da cultura social porque, segundo suas doutrinas, Jesus Cristo morreu em  função substitutiva dos pecados de todas as pessoas afetadas por experiências  dramáticas. No centro das enfermidades psíquicas, tais como a depressão, está o  próprio Diabo como agente perturbador do indivíduo convertido. “São as lutas  espirituais” que provocam grande parte dos males, conforme pregam. Enfermidades  persistentes são rejeitadas, pois recitam: “o choro pode durar uma noite, mas a  alegria vem pela manhã”. Em alguns casos permanecem as tensões entre a fé, suas  consequências e a ciência médica como sendo “obra de homens” ou mero conhecimento  humano: “Jesus é o médico dos médicos” – creem. 
   Por  isso, os traumas pessoais, como desorganizadores dos mundos interiores,  oferecem lugar aos modernos mitos pentecostais transmitidos oralmente como provisórios  reorganizadores lógicos, ou mistificadores (teo)lógicos, que impulsionam  processos de conversão à nova vida como solução espiritual. Daí, a proposta  desmitologizadora de Bultmann encontra fragilidade analítica na vivência  comemorativa dos pentecostais do Espírito Santo. Ao invés de esvaziar os mitos,  propomos uma interpretação situacional das “histórias maravilhosas”. Caso  Bultmann tenha buscando as “verdades da concretude histórica convencional”, os  pentecostais – num tempo de oralidade secundária – procuraram nas narrativas míticas  os preenchimentos subjetivos interiores como alívio para a “memória machucada”.  Assim, ao oralista cabe encontrar elementos analíticos, exegéticos, no interior  dos dramas e das tramas experienciais dos pentecostais.
   A Palavra, que desceu dos altares na Reforma  Protestante, e que foi textualmente diminuída pelos pentecostais, ritualizou-se  na oralidade dos crentes durante as performances litúrgicas da conversão  mediada pelo Espírito. Wiliam James disse que, no momento da conversão  religiosa, os ritos significam convicções singulares das realidades espirituais  e harmonizam as crises psicológicas traumáticas. Segundo James, as pessoas  convertidas no decurso dos ritos
   ouvem  amiúde vozes; vêem-se luzes; presenciam-se visões; ocorrem fenômenos motores  automáticos; e tem-se sempre a impressão, após a renúncia da vontade pessoal,  de que um poder estranho, mais elevado, inundou o íntimo do indivíduo e tomou  posse dele. (JAMES, 1995, p. 148). 
   Conversão  é, com isso, mudança de sentido, ou de direção, segundo novas convicções místicas  que encorajam os crentes à nova vida. Segundo Rubem Alves, na conversão está a  “articulação entre a racionalidade que será construída socialmente depois e as  exigências emocionais da personalidade” (ALVES, 1979, p. 54). Para Prócoro  Velasques Filho, no entanto, a conversão cumpre certa função social porque  contribui para uniformização dos comportamentos de santidade e justiça por meio  da transformação dos crentes. Consideramos que a conversão pentecostal encaminha  novos estados afetivos de ser que fundamentam, amiúde, por meio da oralidade  mitificada, os testemunhos fantásticos do trauma crístico como resolução para os  traumas pessoais, do drama crístico às amenizações dos dramas pessoais – até à  iluminação do Espírito na subjetividade reorganizada.
   No  âmbito pentecostal, prega-se constantemente sobre a cura divina das dores  físicas e das dores da alma, mas fala-se também acerca da cura interior como  possibilidade de libertação das influências psíquicas – às vezes classificadas  como diabólicas – que provocam desorganização na vida. O pastor David Seamands  escreveu um livro de cura divina, intitulado Traumas emocionais, no qual estabelece alguns procedimentos  espirituais para a libertação dos traumatizados. Seamands disse que, para ser  liberto, é necessário “encarar o problema de frente”, “aceitar nossa  responsabilidade no fato”, “perguntar  a nós mesmos se desejamos realmente ser curados”, “perdoar a todos os que estão  envolvidos em nosso problema”, “perdoar a si mesmo” e, finalmente, “pedir ao  Espírito Santo para nos mostrar qual é realmente nosso problema, e como devemos  orar a respeito dele” (SEAMANDS, 1995, p. 25 – 29).
   Em terceiro lugar, perguntamo-nos pelo sentido etimológico da expressão  testemunho. Do grego “μάρτυρας” (mártir), a palavra testemunha tem significado intrincado para a  história oral14 .  Por definição, mártir é todo aquele que sofreu, ou até mesmo morreu, para  sustentar suas crenças diante de algozes intolerantes15 . Quem testemunha está  sempre disposto a morrer. Contar um testemunho é, portanto, fazer uma narrativa  com sentido duplo: busca-se sepultar lembranças anteriores à conversão e  ressuscitar esperanças redentoras da memória pós-traumática. É a morte, a  abolição, dos microtraumas do “eu” subjetivo como forma de ruptura terapêutica  com os machucados passados. Uma espécie de cura da histórica de vida e da  memória por meio da “morte do velho estado traumatizado”. Nesse sentido, os “mártires  testemunhais”, que foram marcados anteriormente pelos microtraumas, reorganizam  suas lembranças individuais segundo a crença na “morte da velha vida, da velha  história”. As narrações dos traumas, e principalmente das conversões  religiosas, são as alternativas pentecostais para as curas das doenças da memória  na afirmação de uma “nova vida”. São “vinhos novos em odres novos”, dizem os  pentecostais. Para Ricoeur, as “doenças da memória” devem ser tratadas segundo  as categorias do perdão que “propõe a cura” e conduz ao esquecimento. Diz  Ricoeur, ainda, que o perdão “tem início na região da memória” e “continua na  região do esquecimento” (RICOEUR; In: HENRIQUES, 2005). Assim, os pentecostais  dizem se lembrar da velha vida no momento da conversão e nos momentos  testemunhais em que comemoram os pecados perdoados – ‘lançados no fundo do mar’–  como pregam. 
   Por esses motivos, os crentes  pentecostais acreditam que as conversões acontecem no momento derradeiro em que  a antiga vida morre. Subsequentemente, o batismo – por imersão nas águas –  demonstra, como rito de passagem, que o crente morreu para uma velha vida (no  momento da imersão), e nasceu para uma nova vida (no momento da emersão). Paralelamente,  contudo, é no batismo do Espírito que os significados míticos são aperfeiçoados  no consolo divino para os machucados da memória. O Diabo, para os pentecostais,  está ligado à batalha pela memória: “quer jogar o passado traumático na cara”. Essa  dualidade demonstra, por sua vez, a permanência do moderno “maniqueísmo” da  luta entre boas memórias e más memórias. De Deus e do Diabo16 .
   Na medida em que o trauma crístico é  vicário aos antigos traumas psicológicos, consolida-se na conversão como  superação das desorganizações subjetivas. Depreendemos, então, que a palavra do  testemunho resulta em testemunho da Palavra – falada, cantada, profetizada, glossolálica ou simplesmente “visionária”.  Importa-nos, portanto, seguir as tendências ritualísticas da Palavra para  ouvirmos os pentecostais por meio da disciplinaridade da história oral. Testemunhar,  para os pentecostais, é conduzir os outros à nova vida e, ao mesmo tempo,  firmar um lugar grosso modo terapêutico da memória. Disso resulta que, entre o passado traumático e a  conversão, instaura-se uma intensa negociação pós-traumática de identidades. 
   Dos púlpitos, por exemplo, ouvimos narrativas  de pessoas que, na velha vida, eram alcoólatras, dependentes químicos ou  vítimas de outros desajustes socioculturais, e que na nova vida deixaram suas ‘concupiscências  pecaminosas’ – segundo dizem. Ouvimos relatos de antigos criminosos, e de ‘outros  pecadores’, como abaliza Camila Caldeira Nunes Dias em sua dissertação de  mestrado intitulada “A igreja como refúgio e a bíblia como esconderijo?  Conversão religiosa, ambiguidade e tensão entre presos evangélicos e massa  carcerária”, ou como assinala Mariana Magalhães Pinto Côrtes em sua dissertação  de mestrado: “O bandido que virou pregador: a conversão de criminosos ao  pentecostalismo e suas carreiras de pregadores”. 
   As dissertações descritas acima, de  Dias e Côrtes, apontam para as conversões como oportunidades, ou oportunismos,  dos criminosos, por exemplo, para reinserção “do pecador” nas malhas sociais. Ao  invés disso, consideramos compreensivamente a crença pentecostal segundo a qual  pode acontecer – no momento da conversão – uma reorganização nas histórias de  vida dos convertidos com vistas à reorganização pós-traumática. Ressuscitar a  “antiga mania de julgamento”, como se a academia fosse detentora da verdade  absoluta sobre os comportamentos, é se esquivar das aproximações possíveis aos  colaboradores pentecostais em projetos de história oral. Não é o caso dos  oralistas que buscam ouvir respeitosamente crentes, e não crentes, almejando o  sentido democrático, experiencial, empírico e político da história oral. 
   
CONSIDERAÇÃO FINAIS
A  história oral testemunhal é, portanto, um gênero emergente que procura ouvir as  pessoas afetadas pelos macrotraumas e pelos microtraumas. Oralidade,  mitificação e, subsequentes conversões ao pentecostalismo, significam as vidas  dos que sofreram dramas pessoais desencadeados pelos microtraumas nas suas  múltiplas relações sociais. As alternativas – oferecidas pelos pentecostais – resultam  no preenchimento mítico como organizadores lógicos das narrativas dos  protestantes. Os testemunhos são fundamentais, tanto para os pentecostais, nos  seus cultos ou na vida cotidiana, quanto para os oralistas que se preocupam com  os procedimentos disciplinares da história oral. Com a Reforma os protestantes  fizeram sua revolução textual, mas com o Espírito  da Palavra os pentecostais fizeram sua revolução testemunhal. 
   Os  dramas pessoais ganham dimensão social na busca por alternativas. Daí, o que  define os sentidos coletivos dos microtraumas são as fabricações de soluções  religiosas para os machucados traumáticos da memória pessoal. Logo, os protestantes  cujos conflitos psicológicos foram amenizados procuram testemunhar como ‘mártires’  face aos seus ‘algozes traumáticos’. Nesse sentido, as expressões trauma,  conversão e testemunho são essenciais para os pressupostos teóricos dos ‘ritos  da oralidade pentecostal’ como elementos para uma história oral testemunhal. 
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* Pos-doutorando e Doutor em História Social pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH/USP). Membro do Núcleo de Estudos de História Oral (NEHO/USP). Professor da Faculdade Sumaré. E-mail: leandroneho@gmail.br
** Doutorando em Geografia Humana pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH/USP) e em História Social pela Universidade Federal Fluminense (UFF), mestre e especialista em História do Brasil pela Universidade Federal do Piauí (UFPI), professor de história do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão (IFMA/Campus Açailândia). Líder do CLIO & MNEMÓSINE Centro de Estudos e Pesquisa em História Oral e Memória (IFMA). Pesquisador do Núcleo de Estudos de História Oral (NEHO/USP) e do (GPTEC/UFRJ). E-mail: fagno@ifma.edu.br
1 Referimo-nos ao pentecostalismo por meio de algumas características universais em todas as vertentes: oralidade, mística e testemunho. Não pretendemos realizar um diálogo estrito com a bibliografia especializada sobre pentecostalismos. Reconhecemos que existem diferentes vertentes do pentecostalismo brasileiro, mas, neste artigo, prescindimos das problematizações sobre clivagens, rupturas, tensões identitárias internas e outros elementos igualmente possíveis.
2 Para os protestantes livrescos os textos sagrados eram axiomas de salvação. Por isso, qualquer ser humano – para ser salvo – deveria ler os textos que demonstravam a justificação por meio da fé (e não das obras). Atualmente, os protestantes históricos sustentam a fundamentação livresca da fé com base na herança hermenêutica protestante.
3 Evidentemente, a multiplicação pode ser concebida, em perspectiva divergente, como uma “tendência fracionária”.
4 Refiro-me à “moderna tradição oral”.
5 A “soteriologia” é uma vertente da teologia sistemática que se dedica grosso modo ao estudo da salvação e suas consequências.
6 Tais ressalvas partem da descrença no esvaziamento da mística narrativa como condição de obtenção da “verdade histórica”.
7 Atualmente, estamos desenvolvendo pesquisas de doutoramento sobre “Ritos da oralidade: a tradição messiânica de protestantes brasileiros na ditadura militar brasileira entre 1964 e 1985”..
8 História oral testemunhal, memória oral e memória escrita e outros assuntos. Entrevista com o professor José Carlos Sebe Bom Meihy. A entrevista, publicada na Revista História Agora, pode ser encontrada na íntegra como consta nas “Referências bibliográficas”.
9 Utilizamos, pois, os termos “mundos externos” para designar as realidades exteriores concretas que tem potencial para afetar traumaticamente qualquer pessoa. Os termos “mundos internos” se referem aos estados subjetivos da pessoa.
10 Consideramos, apesar das graves violações de direitos humanos constatadas no período da Ditadura Militar no Brasil, que não temos nenhum trauma nacional da magnitude catastrófica do Holocausto – como preconizou Meihy.
11 Os conceitos psicológicos expostos neste texto carecem naturalmente de maiores aprofundamentos teóricos, pois estamos abordando especificamente a história oral testemunhal dos pentecostais a partir do trauma e da conversão.
12 Para conhecer um pouco do trabalho de Chnaiderman, assista o testemunho de Bell Marcondes no documentário Sobreviventes: 1http://www.youtube.com/watch?v=sV8QorvlaB01. Acesso em 05 de julho de 2011.
13 O termo “crístico” é amplamente utilizado nos textos teológicos para se referir ao Cristo.
14 A palavra grega “μάρτυρας” pode ser traduzida do grego de duas formas: como mártir mesmo ou como testemunha.
15 O primeiro mártir do cristianismo, segundo tradição neotestamentária, foi Estevão. Depois do seu testemunho aos judeus, Estevão foi fortemente possuído pelo Espírito Santo e, no decurso da sua narrativa, foi apedrejado por Saulo de Tarso. Ver Atos dos Apóstolos 7: 1 – 60.
16 As boas memórias são lembranças das “doenças da memória”, dos microtraumas, que foram perdoadas e curadas no momento da conversão. No entanto, as más memórias são atribuídas aos processos diabólicos de acusações pelo passado indesejado.
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