Nas últimas três décadas, o  quadro evolutivo das políticas europeias para o mundo rural reflecte mudanças  significativas. De facto, após um período de domínio das preocupações  produtivistas e economicistas direccionadas para o sector agrícola (do início  dos anos 60 ao final dos anos 80 do século XX), começa a evidenciar-se a  transição para um modelo de desenvolvimento centrado na sociedade rural e na  estruturação das suas paisagens, privilegiando a dimensão territorial,  ambiental e patrimonial destes territórios de baixa densidade.
  Valoriza-se agora a  multifuncionalidade da agricultura e do mundo rural e reconhece-se a  singularidade e especificidade destes territórios que concentram um potencial  de recursos que merece ser valorizado e preservado, e que são cada vez mais  apreciados pela sociedade urbana. O objectivo central é conciliar a prática  agrícola com as preocupações ambientais, paisagísticas e com a preservação e  valorização do património cultural e natural, onde os conceitos de  sustentabilidade, subsidiariedade e de parceria comandam as principais  orientações para o desenvolvimento das áreas rurais e a melhoria da qualidade  de vida das suas populações.
  Os espaços rurais de  montanha pelas dificuldades  (estruturais e funcionais) e situações de marginalidade que têm sofrido nas  últimas décadas suscitam, de igual modo, preocupações prioritárias de  ordenamento e desenvolvimento territorial. A (re)descoberta da montanha,  a valorização dos seus recursos ecológicos e culturais, e a crescente  utilização do tempo livre, são elementos decisivos que vêm conferir a estes  territórios novas funcionalidades/actividades (residenciais, recreativas,  turismo, desporto, entre outras).
  Neste sentido, apesar da  complexidade, diversidade e frequente desarticulação de políticas e  intervenções, e reconhecendo a necessidade de integrar políticas dirigidas ao  mundo rural de forma a incentivar e diversificar a sua base económica, importa  avaliar e compreender os seus resultados económicos, sociais e territoriais, e  assim influenciar a estruturação de novas políticas e instrumentos de  desenvolvimento.
  A matriz empírica da nossa  investigação aplicada está relacionada com a implementação de programas de  turistificação e patrimonialização, designadamente as Aldeias Históricas de  Portugal (1994-1999; 2000-2006). De forma particular centrámos a nossa análise  na aldeia do Piódão (Serra do Açor – Cordilheira Central), no sentido de  explicitar os resultados das intervenções (e de outras decorrentes de programas  complementares) e o modo com contribuíram para a revitalização do tecido  económico e social, a requalificação territorial, a melhoria da qualidade de  vida dos seus habitantes, e o reforço da capacidade local de atracção de  visitantes.
  Da  parte dos residentes é evidente uma dualidade de opinião sobre o turismo. A  bipolaridade deste fenómeno (com dimensões positivas e negativas) decorre da  percepção de que o turismo não resolveu os problemas mais relevantes para uma  população muito envelhecida, com baixo nível de escolarização, e que perdeu a  sua privacidade com a abertura da Aldeia. Contudo, o turismo incentivou a  criação de novas actividades económicas, nomeadamente restauração, cafetaria,  comércio de artesanato e produtos endógenos, e alojamento (em especial no  contexto do turismo em espaço rural). 

Fonte: Elaboração Própria
Figura 5. Tipologia de utilização dos imóveis (Piódão, Dezembro de 2009)
 
  Por  outro lado, o turismo não conseguiu, até ao momento, alterar de forma  substancial, a matriz da propriedade urbana do Piódão. Ao contrário de outros  lugares de montanha, como é o caso de algumas aldeias da (vizinha) Serra da  Lousã, como o Talasnal e o Casal Novo, onde desde meados dos anos 70 (século  XX) a residência secundária impulsionou a patrimonialização das suas paisagens  e a transição rápida da propriedade dos imóveis para os novos utilizadores  (urbanos), a titularidade dos imóveis do Piódão (utilizados para habitação )  revela uma presença esmagadora de proprietários com ligação familiar à aldeia  (mais de 95%, de acordo com o nosso levantamento de campo realizado em Dezembro  de 2009). Contudo, a tipologia de utilização dos imóveis reflecte de forma  evidente a influência do turismo no Piódão (figura 5).
  O  Piódão abriu-se ao país e ao mundo, que descobriu (e venera) o encanto da sua  paisagem cultural, mas a aldeia permaneceu muito fechada em termos de  titularidade da propriedade urbana e, sobretudo para os mais idosos (que são a  matriz do espírito do lugar), é evidente a dificuldade de adaptação aos sinais  mais impetuosos da modernidade. Dois mundos (os velhos serranos e os  visitantes) que se cruzam a cada instante no mesmo lugar… que partilham espaços  (outrora feudos da vida rural) entre memórias desvanecidas, silêncios e até  vazios de mensagem!
  Das estratégias para o desenvolvimento actual do Piódão (e das Aldeias  Históricas de Portugal), no âmbito do actual período de execução das políticas  públicas (2007-2013), destacamos as novas oportunidades que decorrem de  programas como, por exemplo, o PROVERE (Programa de Valorização dos Recursos Endógenos),  que pretende estimular iniciativas de melhoria da competitividade territorial  de áreas de baixa densidade que visem dar valor económico aos recursos  endógenos e singulares destes territórios (como o património cultural e  natural). Alicerçados numa perspectiva de integração programática inovadora, os  PROVERE centram-se no estabelecimento de parcerias, envolvendo actores públicos  e privados (empresas, associações empresariais, municípios, instituições de  ensino e de I&D, agências de desenvolvimento regional, associações de  desenvolvimento local, entre outras instituições relevantes), e congregam um  conjunto de projectos subordinados à valorização económica de um recurso  territorial emblemático.
  A iniciativa  Rede das Aldeias Históricas de Portugal é uma das oito candidaturas aprovadas  pelo Programa Operacional da Região Centro (2007-2013) no âmbito das Acções  Preparatórias do PROVERE. Este Plano apresentado pela Associação de  Desenvolvimento Turístico das Aldeias Históricas pretende dar continuidade aos  investimentos realizados nos últimos dois Quadros Comunitários de Apoio e  consolidar a Rede das Aldeias Históricas como um produto turístico com  potencial relevante no que diz respeito ao turismo cultural, turismo de  natureza e turismo em espaço rural. 
  A definição de  um novo modelo de gestão da marca “Aldeias Históricas de Portugal”, sob  responsabilidade desta Associação, é ainda complementado no âmbito das  Estratégias de Eficiência Colectiva (EEC), por um recente programa de acção que  apresenta como foco temático a Rede das Aldeias Históricas de Portugal e do  Património Judaico. O PROVERE das Aldeias Históricas e do Património Judaico,  centrado na Beira Interior Norte, Beira Interior Sul, Cova da Beira e Pinhal  Interior Norte, é uma oportunidade para a geração de sinergias ao nível dos  serviços turísticos oferecidos, tornando a associação de ambas as Redes (sem  colocar em causa a identidade e especificidade de cada uma) num produto  turístico mais atractivo, mais valorizado e reconhecido pelos mercados.
  No contexto  das candidaturas aprovadas no âmbito das Acções Preparatórias do PROVERE, e com  particular interesse para o nosso caso de estudo, referimos também o programa  de acção “BuY NATURE – Turismo Sustentável em Áreas Classificadas” coordenado  pelo Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade, com base numa  rede de parceiros públicos e privados que se repartem pelas NUT III da Beira  Interior Norte, Beira Interior Sul, Cova da Beira, Pinhal Interior Norte,  Pinhal Interior Sul e Serra da Estrela, entre os quais se encontram a Agência  para o Desenvolvimento Turístico das Aldeias do Xisto, a Associação das Aldeias  Históricas de Portugal e a Naturtejo. 
  Esta  iniciativa pretende potenciar os recursos endógenos do património natural das  áreas classificadas de montanha da Região Centro (complementados pelo  respectivo património cultural), através da implementação de uma estratégia de  base territorial alicerçada no turismo de natureza, no desporto de natureza e  no turismo activo, e procura afirmar-se como uma iniciativa que reforce a  competitividade do território e promova uma abordagem sustentável no uso dos  recursos endógenos assente num trabalho de parceria entre os agentes locais. 
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