ANTECEDENTES DO CAPITALISMO

ANTECEDENTES DO CAPITALISMO

Carlos Gomes

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4.6 – VALOR

O valor é uma categoria económica inerente à produção mercantil. Não actua nas relações económicas tributárias. As relações geradas pelo domínio senhorial não dependiam nem se regulavam pelo valor do produto. O quantitativo da renda era estabelecido pelas relações directas de subordinação dos produtores ante as classes dominantes. O tributo girava em torno dos bens que constituíam o mínimo necessário ao autoconsumo do produtor directo. Quanto muito podiam aparecer alguns critérios quantitativos a estabelecer para fixar a renda concreta, o que viria a acontecer em certos casos de renda em espécie e nas rendas monetárias. O valor não era a forma económica geral de que se revestia a riqueza. A necessidade da sua determinação manifesta-se duma forma muito limitada, só irrompendo quando parte dos tributos em géneros ou dos excedentes dos produtores se encaminham para o mercado. O valor emerge das trocas e, portanto, só aparece nas sociedades quando se começam a trocar artigos e se produz para o mercado.

O valor representa uma característica social que exprime o que uma mercadoria tem de comum com outras mercadorias, apesar das suas diferentes utilidades. Um valor de uso tem um valor quando nele está corporizado trabalho humano. Todas as coisas úteis podem ser consideradas sob dois pontos de vista: o da qualidade e o da quantidade. Ao primeiro corresponde o conceito de valor de uso que já foi referido. Ao segundo correspondem as noções de valor e de valor de troca, com aspectos diferentes mas interligados.

É o trabalho que constitui a base ou a essência do valor, mas os produtos são numerosos e variados. O esforço na produção varia dum bem para outro, pelo que é indispensável dispor duma medida geral comum a todas as mercadorias. O tempo de trabalho necessário à produção corresponde a este atributo e é um elemento perfeitamente quantificável. Independentemente das propriedades concretas das mercadorias como valores de uso, todas elas são simples condensações de trabalho humano, isto é, de gastos de energias cerebrais, nervosas e musculares. Segundo Karl Marx “O valor de uma mercadoria está para o valor de qualquer outra mercadoria como o tempo de trabalho necessário para a produção de uma está para o tempo de trabalho necessário para a produção de outra” (Karl Marx, O Capital, Livro I, tomo I, pag. 51, Edições “Avante”, 1990)

O possuidor duma mercadoria ao pretender transaccioná-la procura considerar o elemento quantitativo que existe na outra mercadoria que pretende adquirir. Seria impossível quantificar esse factor comum tomando como base a utilidade, pois esta não é redutível a equivalências quantitativas. Impõe-se assim a cedência dos objectos transaccionados em função da comparação quantitativa do valor que lhes é atribuído.

O trabalho em si não tem valor, mas sim a força de trabalho que corresponde ao valor socialmente necessário para a sua reprodução. Todo o trabalho é dispêndio de força de trabalho e nesta qualidade forma o valor das mercadorias. Este valor é essencialmente função do trabalho social médio incorporado nas mercadorias.

No processo concreto de determinação do valor da mercadoria participa primordialmente o valor da força de trabalho ao qual é imputado um valor social medido em tempo, em geral, número de horas de trabalho. Este valor é calculado pela quantidade média de trabalho social necessário à sua produção, num determinado período e contexto histórico. O valor dos meios de produção é incorporado, duma só vez ou por fases, conforme esses meios participam num único processo produtivo, como é o caso das matérias-primas e auxiliares, ou em vários processos produtivos, como é o caso dos instrumentos e utensílios de trabalho, das máquinas, ferramentas, etc. O trabalho anterior já realizado, imputado aos objectos e meios de trabalho transfere-se por completo para o novo produto, ao passo que o valor dos meios de produção fixos vai-se transferindo gradualmente à medida que se vão desgastando.

A magnitude do valor da mercadoria muda em proporção directa com a quantidade de trabalho socialmente necessário e em proporção inversa com a produtividade do trabalho. A produção de mais unidades duma determinada mercadoria com o mesmo número de horas de trabalho significa um aumento da quantidade de valor de uso ao dispor da sociedade e uma diminuição do valor unitário da mesma mercadoria.

Em resumo, o que determina o valor das mercadorias é na sua essência o tempo de trabalho socialmente necessário para as produzir em termos médios, utilizando os instrumentos de produção normalmente em uso em determinada época e espaço. O valor das mercadorias resulta da formação histórica das duas principais características da produção: a divisão do trabalho e a separação dos produtores singulares. Por outras palavras, a formação da propriedade privada dos meios de produção.

As diversas formas de valor expressam-se nas etapas do desenrolar do processo histórico da produção mercantil. Distinguem-se as seguintes formas de valor: a simples ou fortuita, a desenvolvida ou total, a geral e a forma dinheiro do valor. A primeira forma em que se expressa o valor duma mercadoria corresponde à etapa inicial do desenvolvimento da produção mercantil. Esta forma é simples porque o valor da mercadoria é expresso numa só mercadoria; é fortuita porque a mercadoria que exprime o valor é determinado casualmente, dado o pouco desenvolvimento da produção mercantil; a primeira mercadoria assume a forma relativa de valor e a segunda a forma de equivalente. A forma desenvolvida do valor vai substituindo a forma simples à medida que cresce o intercâmbio mercantil e este adquire um carácter mais ou menos regular; a mesma mercadoria começa a expressar o seu valor em relação a muitas outras mercadorias e não apenas a uma. Da forma total do valor decorre a base do conjunto das mercadorias, isto é, o trabalho invertido na sua produção. A forma geral do valor é o resultado subsequente do desenvolvimento da produção mercantil e que conduz à separação duma determinada mercadoria, pela qual se trocam e se expressam o valor das restantes, e que constitui o equivalente geral. Qualquer mercadoria pode desempenhar a função de equivalente geral, mas a pouco e pouco tal função fixou-se numa só mercadoria que assim se converteu em dinheiro. Aparece assim a forma monetária do valor.