Revista: DELOS Desarrollo Local Sostenible


DESENVOLVIMENTO X CRESCIMENTO NO ESTADO DO AMAZONAS: ANÁLISE DO MUNICÍPIO DE PARINTINS ENTRE 2000 A 2010 SOB O OLHAR DA QUESTÃO SOCIAL

Autores e infomación del artículo

Laranna Prestes Catalão
Patrício Azevedo Ribeiro
larannaprestes@hotmail.com
Universidade Federal do Amazonas


Resumo

O artigo objetiva fazer uma análise reflexiva sobre a realidade social do município de Parintins, Estado do Amazonas, no que concerne ao seu desenvolvimento e/ou crescimento entre os anos de 2000 a 2010 tendo como base no processo de análise a discussão sobre a questão social. Para tanto, utilizou-se de fontes bibliográficas científicas e dados extraídos no site da Secretaria de Estado de Planejamento e Desenvolvimento Econômico (Seplan) e Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Parintins, que tem chamado atenção principalmente pelo Festival Folclórico dos Bois Caprichoso e Garantido, ainda precisa oferecer melhores condições de vida a seus habitantes. Moradia e acesso a bens e serviços sociais básicos como água, energia, coleta de lixo e esgoto devem ser prioridades, tendo em vista a busca pela qualidade de infraestrutura da cidade, consequentemente um desenvolvimento numa perspectiva econômica, social e sustentável.
Palavras-chave: Crescimento – Desenvolvimento – Questão Social – Amazônia – Parintins.

Abstract

The article aims to make a reflective analysis on the social reality of the city of Parintins, Amazonas State, in relation to its development and / or growth between the years 2000 to 2010 based on analysis of the discussion process on the social issue . For this, we used the data from the scientific and the State Secretariat for Economic Planning and Development (Seplan) and the Brazilian Institute of Geography and Statistics (IBGE) site bibliographic sources. Parintins, which has drawn attention mostly by Folk Festival Bois Guaranteed and Capricious, still need to offer better living conditions to its inhabitants. Housing and access to basic goods and social services such as water, energy, waste disposal and sewage must be prioritized in order to search for the quality of infrastructure in the city, consequently a development an economic, social and sustainable perspective.
Keywords: Growth - Development - Social Issues - Amazon – Parintins.

Resumen

El artículo tiene como objetivo hacer un análisis reflexivo sobre la realidad social de la ciudad de Parintins, Estado de Amazonas, en relación con su desarrollo y / o crecimiento entre los años 2000 a 2010, basado en el análisis del proceso de discusión sobre la cuestión social. Para esto, se utilizaron los datos de la comunidad científica, de la Secretaría de Estado de Planificación y Desarrollo Económicos (SEPLAN) y del Instituto Brasileño de Geografía y fuentes bibliográficas estadísticas de la web (IBGE). Parintins, que ha llamado la atención sobre todo por el Folk Festival Bois garantizado y Caprichoso, todavía tienen que ofrecer mejores condiciones de vida para sus habitantes. Vivienda y el acceso a bienes y servicios sociales básicos, como el agua, la energía, la eliminación de residuos y de aguas residuales deben ser priorizados a fin de buscar la calidad de la infraestructura en la ciudad, por consiguiente, un desarrollo en el punto de vista económico, social y sostenible.
Palabras-clave: Crecimiento - Desarrollo - Asuntos sociales - Amazonas - Parintins.


Para citar este artículo puede uitlizar el siguiente formato:

Laranna Prestes Catalão y Patrício Azevedo Ribeiro (2014): “Desenvolvimento x crescimento no estado do Amazonas: análise do município de Parintins entre 2000 a 2010 sob o olhar da questão social”, Revista DELOS: Desarrollo Local Sostenible, n. 21 (octubre 2014). En línea: http://www.eumed.net/rev/delos/21/parintins.html


Introdução

A leitura que faz do legado sócio-histórico da Amazônia desvela informações pelas quais se subentende que houve de fato crescimento e desenvolvimento desde seus momentos pretéritos até a atualidade. Contudo, é fato também a compreensão de que em muitos momentos da história, por meio dos grandes projetos criados para a Amazônia, esta por sua vez, mais cresce do que se desenvolve.
Diante disso, o presente artigo objetiva fazer uma análise reflexiva sobre a realidade social do município de Parintins, Estado do Amazonas, no que concerne ao seu desenvolvimento e/ou crescimento entre os anos de 2000 a 2010, tomando como referência de análise as discussões da questão social. A escolha temporal não é aleatória, pois, é neste período que se observa uma maior expansão de Parintins nos indicadores de população, domicílios, precarização no trabalho entre outros; além disso, é neste intervalo de tempo que a cidade passar a ser divulgada consideravelmente pelo cenário regional, nacional e mundial em virtude do Festival Folclórico dos bois Caprichoso e Garantido.
Assim sendo, utilizou-se de fontes bibliográficas científicas e dados coletados no site da Secretaria de Estado de Planejamento e Desenvolvimento Econômico (Seplan) e Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os quais dispõem de dados sobre a realidade dos municípios amazônicos.
Para abordar a temática proposta, escolheu-se um caminho que abarcasse uma leitura macro até se chegar à realidade social do município de Parintins. Neste sentido, faz-se a princípio algumas notas reflexivas sobre desenvolvimento, crescimento e subdesenvolvimento com ênfase no cenário brasileiro; em seguida discute-se a questão social na região amazônica, onde se percebe particularidades quanto suas expressões; posteriormente faz-se uma análise reflexiva, a qual tem como cenário o município de Parintins, enfocando discussões do seu desenvolvimento e/ou crescimento, situando neste processo as refrações da questão social local.

1          DESENVOLVIMENTO, CRESCIMENTO E SUBDESENVOLVIMENTO: notas reflexivas

Desde o século XVIII, o progresso e, logo depois, o desenvolvimento, tomaram conta das teorias econômicas que tentavam explicar em uma perspectiva macroeconômica uma dada realidade, considerando a produtividade do trabalho, a distribuição e a utilização do produto social. O desenvolvimento de uma sociedade prediz não apenas o caráter econômico; busca-se também a melhoria no padrão de vida da população e nas estruturas desta economia.
Todavia, o que se percebe no Brasil é um desmantelamento destas duas vias, privilegiando-se apenas o crescimento econômico, como apresentam, por exemplo, os objetivos do próprio Estado em seus programas: de um lado, programas de distribuição de renda, de outro, incentivos fortes em Programa de Aceleração do Crescimento que não levam em conta as demandas sociais.
Contextualizam-se as definições e sua discussão no Brasil por meio do estudo de Celso Furtado (2009), tratando-os à luz das teorias econômicas e Mário Theodoro (2004), abordando os conceitos e noções do desenvolvimento no país. Para este artigo, considera-se a importância desses dois estudiosos, pois Celso Furtado (2009) foi economista e se debruçou no estudo desses conceitos por meio dos princípios teóricos das doutrinas clássica, marxista e keynesiana. Este autor apresenta o desenvolvimento e o crescimento econômico como partes de um mesmo processo. O primeiro será um estágio posterior ao crescimento, pois deverá considerar o progresso técnico e a mudança das estruturas de uma dada sociedade.
Conforme postula Furtado (2009, p. 28):

O desenvolvimento econômico é um fenômeno com uma nítida dimensão histórica. Cada economia que se desenvolve enfrenta uma série de problemas que lhe são específicos, se bem que muitos deles sejam comuns a outras economias contemporâneas. O complexo de recursos naturais, as correntes migratórias, a ordem institucional, o grau relativo de desenvolvimento das economias contemporâneas singularizam cada fenômeno histórico de desenvolvimento.

Neste sentido, é quase impossível fazer uma generalização considerando o modo abstrato e histórico pelo qual perpassou dada realidade social, cada uma será ímpar, ou como o próprio autor afirma, são universos fundamentalmente heterogêneos, uma vez que os recursos e fatores se apresentam de forma diversa. Não cabe nestas notas um aprofundamento relativo ao sistema econômico à luz das teorias apresentadas por Furtado (2009), mas uma reflexão acerca dos conceitos e definições por ele apresentados.
O subdesenvolvimento precisa de uma interpretação teórica própria, pois é um processo histórico e não uma etapa pela qual passaram os países considerados desenvolvidos. Para sua compreensão é necessário levar em conta a expansão do capitalismo industrial europeu, que se dá em três formas marcantes: o desmantelamento da economia artesanal pré-capitalista; a ocupação de terras não povoadas similares às europeias; e a ocupação de regiões povoadas, mas que em si estavam imersas na economia artesanal pré-capitalista e que passaram a assimilar a ideologia capitalista industrial ou permaneceram na cultura preexistente.
É esta última que Furtado (2009) considera por sua dualidade econômica, o fenômeno do subdesenvolvimento contemporâneo. Afirma o autor:

O processo de desenvolvimento se realiza seja através de combinações novas dos fatores existentes no novel da técnica conhecida, seja através da introdução de inovações técnicas. Numa simplificação teórica se pode admitir como plenamente desenvolvidas, num momento dado, aquelas regiões em que, não havendo desocupação de fatores, só é possível aumentar a produtividade [...] introduzindo novas técnicas. Por outro lado, as regiões cuja produtividade aumenta ou poderia aumentar pela simples implantação das técnicas já conhecidas são consideradas em graus diversos de subdesenvolvimento (FURTADO, 2009, p. 85).

Por estes motivos, não se pode considerar o subdesenvolvimento como uma etapa para o desenvolvimento econômico e social. Não há “país em desenvolvimento”, o que há são processos históricos diferentes, em que pese o grau da técnica e das inovações produzidas em cada país; a distribuição de riquezas e a condição de vida dos sujeitos. Conclui o autor que:

O subdesenvolvimento não constitui uma etapa necessária do processo de formação das economias capitalistas modernas. É, em si, um processo particular, resultante da penetração de empresas capitalistas modernas em estruturas arcaicas. O fenômeno do subdesenvolvimento apresenta-se sob as formas várias e em diferentes estágios. O caso mais simples é o da coexistência de empresas estrangeiras, produtoras de uma mercadoria de exportação, com uma larga faixa de economia de subsistência, coexistência esta que pode perdurar, em equilíbrio estático, por longos períodos. O caso mais complexo – exemplo do qual nos oferece o estágio atual da economia brasileira – é aquele em que a economia apresenta três setores: um, principalmente de subsistência; outro, voltado sobretudo para a exportação e o terceiro, como um núcleo industrial ligado ao mercado interno, suficientemente diversificado para produzir parte dos bens de capital que necessita para seu próprio crescimento (FURTADO, 2009, p. 171).

Resulta deste processo, uma baixa capacidade dos países de economia subdesenvolvida de produção e inovação, pois o núcleo industrial tende a produzir produtos parecidos aos importados, com baixos custos de produção e venda, e consequentemente, um proletariado que cresce com lentidão e reduzido.
Por fim, Celso Furtado aponta que o desenvolvimento só será real nos países de economia subdesenvolvida quando forem criadas condições para uma participação mais ampla da riqueza para as massas urbanas e rurais. Para isso, aponta dois caminhos: o primeiro é o “aumento de produtividade nas indústrias e da transferência dos frutos da maior produtividade para os setores assalariados”, permitindo o crescimento do poder aquisitivo inclusive da população rural; e o segundo, “a transferência direta da estrutura agrária” que permita racionalizar o uso da mão de obra, ampliação da produção de bens de produção e ampliando o mercado de manufaturas na zona urbana. Estes dois caminhos levarão a uma distribuição de renda menos desigual da renda social.
Mário Lisboa Theodoro (2004), economista e pesquisador voltado ao mundo do trabalho, faz uma releitura da questão do desenvolvimento no Brasil em termos histórico associados à modernidade e mudança, tanto no discurso republicano quanto do econômico-científico, em uma perspectiva evolutiva.
Theodoro (2004) diz que, inicialmente, o desenvolvimento surgiu no Brasil sob o aspecto de progresso, inspirado no pensamento positivista – e que se juntou à “ordem” em nossa bandeira.

Na segunda metade do século XX, a situação ideal e limite – de modernidade e progresso – ganha designação de “desenvolvimento”. Desenvolvimento que, em sua trajetória, assume contornos diversos nos discursos vigentes sobretudo nas últimas décadas; marcadamente associado ao aspecto econômico até os anos 70, incorporando em seguida um significado mais social nos anos 80, passando, nos anos 90, a adotar uma conotação de desenvolvimento sustentado e, hoje, estando mais vinculado à questão da maior ou menor inserção do país na economia globalizada (THEODORO, 2004, p. 15).

Estas vias cronológicas apontam a um patamar de modernidade perseguido pelo país, empenhado a ultrapassar o grau de subdesenvolvimento em que está submerso. Subdesenvolvimento está para este autor, em suas leituras da conjuntura brasileira, associado a um “segmento não moderno – em geral designado de setor de subsistência ou setor informal – em convivência com um segmento moderno, percebido como capitalista ou setor de mercado” (SINGER apud THEODORO, 2004, p. 17).
Refletindo sobre estes aspectos, e baseado em Celso Furtado, observa-se o caráter dual que está permeado no desenvolvimento. Para Theodoro, um salto qualitativo nesta análise será o entendimento de que o ideário de um Brasil moderno deve parar de desconsiderar as peculiaridades socioculturais, formadores deste país. Isto é,

esse mote do desenvolvimento eterniza-se como contraponto ao Brasil “profundo”, ao Brasil caboclo e/ou mestiço. Forja-se assim uma espécie de negação de um passado, sem que, no entanto, este tenha se conformado como tal: um passado que não passou; que é presente, presente negado, em prol de uma ideia de pais, um ideal de nação, um modelo de sociedade cujo paradigma é “branco-moderno-europeu”. [...] De fato, um país imaginário que, ainda que não se realize na prática, parece povoar corações e mentes, e sobretudo, justificar a ação do Estado e, por decorrência, as políticas públicas (THEODORO, 2004, p. 18).

Com base em Castells (1976), Theodoro (2004) aprofunda o entendimento do desenvolvimento em três categorias de análise: noção, conceito e formação teórico-ideológica, onde a primeira está para um discurso ideológico, que recheou o discurso político em vários aspectos; a segunda está para um discurso cientifico, inaugurando e consolidando as principais correntes que fundaram o pensamento econômico social a partir dos anos 50 e 70 na América Latina; e a última, um conjunto articulado de noção e conceito, trazendo à tona que “no Brasil, a ideia do desenvolvimento [...] é um dos elementos fundantes do discurso do bem comum, do interesse geral” (THEODORO, 2004, p. 38).
A noção de desenvolvimento traz a necessária característica do “moderno”, em que atraso e miséria são o foco das ações do Estado, contudo, sempre embasados em ideias modernas enraizadas em estruturas tradicionais. Mesmo o moderno na era global, o Brasil continua de forma subordinada ao mercado mundial, privilegiando desde a República uma lógica de eficiência que privilegia a economia em detrimento da cidadania e da regulação estatal de proteção social.
O conceito de desenvolvimento no contexto acadêmico brasileiro tem três características gerais, oriundos ao longo de sua trajetória em diferentes matizes e conjecturas. Uma, centrada na análise dualista de centro e periferia, onde centro – moderno – estava para o progresso técnico e periferia – arcaica, não moderna – à condição de subdesenvolvimento, grosso modo pensamento cepalino. Outra, que trata do crescimento econômico como etapa necessária dos países subdesenvolvidos para o desenvolvimento. Por fim, a busca pela modernização como projeto de nação.
Neste sentido, observa-se uma formação teórico-ideológica brasileira que deve considerar sim os avanços econômicos alcançados com a industrialização e a transformação social experimentada a partir dos anos 50. Contudo, o desenvolvimento, a modernidade, sempre apontaram em busca de um modelo vigente nos países já desenvolvidos, sem considerar os próprios brasileiros e a economia presente no país. A industrialização como projeto de modernidade parte do pressuposto de muitos sujeitos inicialmente absorvidos neste mercado e que, no entanto, destes foram expulsos com o avanço tecnológico que prediz máquinas e rapidez, ditadas pelas elites, e levando sujeitos de volta ao setor de subsistência ou comércio.
Finda Mário Theodoro (2004, p. 40) asseverando que:

A informalidade e a subsistência, antes de se constituírem como expressões do atraso (ou do não desenvolvimento), devem ser vistas como formas de organização e de resistência a um dado tipo de modernidade. A modernidade brasileira está associada à reprodução da desigualdade, gerada inclusive pela existência de formas institucionais excludentes. Em uma palavra, é a modernização sem mudanças [...]. O porvir desenvolvido é (e estará) sempre por vir.

Destarte, o desenvolvimento de um país vai além de suas metas de crescimento econômico, obviamente necessários. Todavia, se este crescimento for desassociado do bem-estar da população e do crescimento da produção e da produtividade que assegure oportunidade de emprego e a consolidação dos direitos sociais do cidadão de direitos e não do cidadão do consumo, de nada valerá.
O resultado dessa dissociação contribui no aumento das demandas sociais e na intensificação de velhas e novas expressões da questão social. Neste sentido, no próximo tópico serão abordadas concepções teóricas para apreensão desta questão social e de como o desenvolvimento pensado para a Amazônia tem impactado a vida dos amazônidas.

2          EXPRESSÕES DA QUESTÃO SOCIAL NA AMAZÔNIA: reflexos do capitalismo contemporâneo

O desenvolvimento pensando para a Amazônia trilhou um caminho de repercussão positiva nas mãos dos detentores do capital e enfraqueceu o mundo daqueles que dão base para esta construção – a classe que vive do trabalho – pois objetivou apenas o crescimento e não especificamente o desenvolvimento dessa região. Em decorrência deste processo, as expressões da questão social precisam ser apreendidas em sua totalidade, dimensões estas que só serão possíveis de compreender por meio do debate acadêmico e em uma dada realidade.
O debate sobre a questão social na atualidade difunde-se na concepção de vários autores. Iamamoto (2008) é uma das autoras que dialoga sobre este termo. De maneira particular, ela discute numa sintonia com o Serviço Social, já que esta profissão tem na questão social a base de sua fundação enquanto especialização do trabalho. Nestes termos, assevera-se:

Questão social apreendida como o conjunto das expressões das desigualdades da sociedade capitalista madura, que tem uma raiz comum: a produção social é cada vez mais coletiva, o trabalho torna-se mais amplamente social, enquanto a apropriação dos seus frutos mantém-se privada, monopolizada por uma parte da sociedade (IAMAMOTO, 2008, p. 27, grifo da autora).

Pela assertiva acima se pode observar que é no bojo antagônico das classes sociais que se formam as refrações da questão social. O produto resultante do trabalho coletivo não é tomado igualmente entre ricos e pobres, pois apenas uma parcela da população se beneficia, enquanto a outra fica a mercê deste processo.
Para Iamamoto (2008), as expressões da questão social podem ser visualizadas em vários aspectos da vida cotidiana. Os indivíduos as experimentam no trabalho, na família, no contexto habitacional, nas políticas setoriais como saúde, assistência social, entre outros.
Com as inflexões rotuladas, hoje, em virtude da política neoliberal que permeia a sociedade capitalista brasileira, na qual a globalização, a flexibilização e precarização nas relações de trabalho imperam, é fundamental repensar a questão social e como esta se aplica nos âmbitos desta sociedade. É conhecendo suas refrações de maneira estrutural e política que se podem encontrar caminhos para seu enfrentamento de maneira qualificada e propositiva.
Diante dessa premissa, pensar a questão social na Amazônia é compreender o legado sócio-histórico e cultural das populações moradoras das diferentes localidades. É na formação de um mercado de trabalho dependente e em condições precárias a partir do processo de descolonização, que se evidencia as expressões da questão social na Amazônia (BARBOSA; SÁ, 2009).
O homem amazônida tem travado um duelo secular com a natureza (BATISTA, 2007). A riqueza da sociobiodiversidade de sua região gera um processo de muitos embates econômicos, culturais e políticos, tudo por conta da busca infinita de riqueza. Verifica-se o desrespeito para com aqueles que singraram em primeiro momento as matas e terras do território amazônico, visto que, cada vez mais são alijados e destituídos do seu meio, sobrepujando assim, a entrada do capitalismo perverso que não mede esforços para conseguir mais lucro e poder.
Para Barbosa e Sá (2009, p. 73) a questão social aparece mediante iniciativas institucionais necessárias à acomodação dos conflitos sociais. “As dinâmicas de mudanças nas relações de produção passam a constituir-se no elemento essencial às ações do Estado na esfera das políticas sociais”.
No contexto amazônico, parece ser a partir das últimas décadas do século XX que ocorre a intensidade do crescimento populacional no campo, porém, mais ainda nas cidades. Assim sendo,

multiplicam-se bairros insalubres nas periferias das cidades, formando aglomerações residenciais sem infraestrutura básica, sem condições de higiene e segurança. A presença do Estado é exigida para exercer práticas de controle, em busca do ajustamento desse contingente populacional aos padrões impostos socialmente, como forma de equacionar conflitos e manter o equilíbrio e a regularidade do processo social (BARBOSA; SÁ, 2009, p. 73).

Imbricada nessa conjuntura está a questão social, aglutinada por feixes de pobreza financeira, miséria, expropriação de terras, famílias sem acesso às políticas públicas, enfim expressões que vão se perdurando no tempo, haja vista o pouco compromisso e intervenção por parte do Estado na vida cotidiana dos sujeitos individuais e coletivos.
Se nas áreas urbanas as intervenções estatais já são ínfimas, nas áreas rurais pior ainda, pois as populações tradicionais indígenas, quilombolas, ribeirinhos, pescadores entre outras tem que conviver com a precarização das políticas setoriais deixando-os à margem dos direitos sociais constituídos. Essa configuração complexa rural/urbana vai sendo segregada e, ao mesmo tempo juntada, na medida em que ocorrem os conflitos agrários, a busca pelo acesso às melhores condições de vida e a luta pela efetivação das políticas estatais.
Em realidade, “a questão social é, portanto, uma consequência da sociedade de mercado enquanto modelo de organização societal, mesmo onde os arranjos típicos deste modelo de sociedade não foram plenamente desenvolvidos, como é o caso da Amazônia” (BARBOSA; SÁ, 2009, p. 74).
A “Operação Amazônia”, criada pelo Estado autoritário, foi um projeto de desenvolvimento econômico para envolver a região no processo de industrialização pelo qual passava o Centro-Oeste e o Sul do país. Como mecanismo de regulação, justificou-se a criação de instituições como a Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia (SPVEA) que logo depois (por volta de 1964) foi metamorfoseada para Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam); o Banco de Crédito da Amazônia, sendo designado em 1966 como simplesmente Banco da Amazônia (Basa); a criação da Transamazônica em 1972; a Rodovia Cuiabá-Santarém; as repercussões da Zona Franca de Manaus datada desde 1957; o Projeto Radar da Amazônia (Radam) criado a partir do Programa de Integração Nacional em 1970 (BATISTA, 2007).
Por outro lado, expressar a questão social na Amazônia exige também a leitura da realidade de suas principais capitais, Manaus e Belém, e de projetos de desenvolvimento que visavam uma reprodução burguesa em comum durante o ciclo da borracha e que tomaram caminhos diversos com a instalação da Zona Franca de Manaus e da criação de seu Distrito Industrial; e o Programa de Pólos Agropecuários e Agrominerais da Amazônia (Poloamazônia), ambos projetos de desenvolvimento do Programa de Integração Nacional de meados dos anos 50 e 60.
Scherer (2009) no livro intitulado “A Questão Social na Amazônia”, do qual é organizadora, publicou dois artigos que tratam do cenário manauense e como este se assenta frente às complexidades exacerbadas pelo sistema capitalista vigente. Destarte, a autora apresenta a cartografia da questão social em Manaus e, ao mesmo tempo, a fragilidade e/ou quase ausência das políticas públicas para intervir nesta realidade.
Assim como muitas cidades do Brasil, Manaus vivencia o endeusamento das mansões de luxo e riqueza, possui sua elite dominante, lojas e construções que esbanjam um verdadeiro mapa de concentração do capital. Entretanto, é também formada pelo outro lado da moeda. Os contrastes estruturais e contradições sociais fazem parte dessa capital.

Ela convive com um outro lado, que se expressa nas mais graves privações e sofrimento humano: a pobreza que se espraia no diversos espaços e territórios, seja periféricos e centrais fruto da expansão desordenada e, também, nos igarapés que cortam a cidade e assim como nas áreas ribeirinhas. O desemprego, os hansenianos e os mendigos nas ruas, as crianças e adolescentes pedintes nas esquinas e ruas, a prostituição adulta e infanto-juvenil, as famílias catadoras de lixo constituem e expressam a questão social (SCHERER, 2009, p. 131).

Reproduzir estas descrições da autora não é por acaso, na verdade este é o panorama da cidade manauense. O que pode ser explicado pela produção da riqueza que é socialmente distribuída de forma desigual entre os sujeitos que compõem as famílias moradoras dos muitos bairros de Manaus.
Na concepção de Scherer (2009) a cidade de Manaus se modernizou ‘pelo alto’, uma vez que, manteve na sua essência precariedades na efetivação da cidadania e dos direitos. A criação da Zona Franca vista como modernidade e próspera para o desenvolvimento caminha lado a lado com o avesso do progresso.
Da época da borracha – fins do século XIX e início do século XX – até o momento presente, pode-se afirmar que houve avanços nos aspectos econômicos, políticos, culturais, territoriais e sociais, todavia, permanece um legado que, ao mesmo tempo, desmistifica a afirmação acima. Neste sentido, seria compreender que houve mais crescimento do que o próprio desenvolvimento do quadro situacional da cidade, onde a realidade da capital do Pará não é diferente.
Se no Amazonas, a integração à economia nacional foi estimulada pela abertura dos portos para livre comércio e pela implantação das indústrias da Zona Franca, no Pará estes incentivos econômicos foram motivados principalmente pela exploração vegetal e mineral e suas agroindústrias. A relação entre capital/trabalho neste Estado tem apresentado diversos conflitos entre os capitalistas que pretendem fixar suas indústrias de exploração e o coletivo de trabalhadores que identificam-se pelo que fazem, em sua economia de subsistência – castanheiros, pescadores, quebradeiras de coco babaçu (NASCIMENTO, 2009).
Portanto, é notável a relação entre os projetos e modelos de desenvolvimento econômico implantados na Região Amazônica e as expressões da questão social resultantes do processo apresentadas ao longo deste tópico. Percebe-se o crescimento deste local inclusive em comparação com as demais regiões do país, contudo, não tem se processado nesta conjuntura um desenvolvimento econômico e social que contemple a maioria da população amazônica, visto que as políticas públicas continuam centralizadas nas metrópoles, de modo que, ainda seja necessário o deslocamento das populações interioranas para a área urbana em busca do acesso aos bens e serviços públicos que lhe são de direitos.
Compondo o contexto da Amazônia está o município de Parintins conhecido mundialmente pelo Festival Folclórico dos Bois Caprichoso e Garantido. Neste, assim como nos demais municípios, presencia-se as relações entre crescimento econômico e desenvolvimento, processo no qual se situa as refrações da questão social. Desse modo, faz-se importante analisar de forma crítica-reflexiva alguns pontos sobre Parintins considerando suas particularidades e posição no cenário regional.

3          O MUNICÍPIO DE PARINTINS: desenvolvimento ou crescimento entre os anos de 2000 a 2010?

Trazer para a discussão alguns aspectos do cotidiano parintinense, os quais remetam para a questão social presente neste cenário, significa atentar para uma visualização entre 2000 a 2010 de como está situado o município dentro do “globo” mundial, nacional e regional. Somado a isto, é nesse processo, também, que se podem descortinar as políticas públicas e como estas estão sendo aplicadas junto à população que forma a chamada “ilha encantada” – palco de uma das maiores manifestações folclóricas do país: o Festival Folclórico de Parintins.
O Festival ocorre no mês de junho, inicialmente com apresentação de quadrilhas, danças, bois-bumbás mirins e com os bois-bumbás Garantido e Caprichoso, que trazem seu espetáculo anualmente no último fim de semana de junho. O evento torna-se atração mundial a partir dos anos 1990 quando, por intermédio do Governo do Estado, recebem patrocínio de marcas multinacionais como a Coca-Cola e passam a ser transmitidos ao vivo pela televisão.
Segundo Rodrigues (2006), o festival é consolidado como “produto cultural” a partir dos anos 90, por meio de grande apelo das massas, aumento do turismo, do incentivo de patrocinadores, ampla divulgação na mídia nacional e internacional, inclusive com transmissão ao vivo da disputa na arena do Bumbódromo. O que outrora foi um momento de lazer organizado pelos jovens parintinenses na década de 60, e que agora, abre-se como uma nova perspectiva econômica para o município.
Os impactos deste crescimento à cidade são observados no número de turistas que visitam a ilha no mês de junho ou em demais temporadas para conhecer o evento; os profissionais que são chamados para trabalhar nas agremiações, ou nos setores hoteleiros, de alimento, de lazer e turismo (AZEVEDO, 2002; RODRIGUES, 2006).
Os bois Garantido e Caprichoso foram transformados em marcas fetichizadas que têm uma identidade jurídica, divulgação por meio de todos os meios de comunicação de massa, atraem simpatizantes e torcedores para cada bumbá e, a cada ano, adequam-se às técnicas mercadológicas para continuarem atendendo às necessidades dos consumidores.
Para Azevedo (2002), os bois de Parintins tem os 4 P’s necessários para ser um produto do marketing cultural: Produto, Preço, Praça (distribuição) e Promoção. Ingredientes importantes ao mercado, uma vez que o Festival é concreto, tem ciclo duradouro e consumo individualizado; os preços são aplicáveis a todos os bens e serviços oferecidos aos turistas; é comercializável e distribuídos nos produtos gerados pelas marcas Garantido e Caprichoso, como cds, dvds e camisas oficiais, e também nas latas de cerveja, panfletos e cartazes das empresas que promovem seus produtos se utilizando da imagem dos bumbás.
É uma brincadeira que dá lucro – reproduz o sistema capitalista e também cria e transforma as relações sociais. Para alcançar o mercado, o Festival precisa profissionalizar-se, tal é a nova roupagem em que é inserido a partir dos anos de 1990: para mais investimentos públicos e privados na festa e na infraestrutura da cidade, é preciso profissionais mais capacitados e uma mão-de-obra artística e inovadora para inebriar os olhos do turista e dos torcedores.
Nesse processo, a Amazônia também é uma marca importante que se simboliza a necessidade de sua conservação/preservação da biodiversidade que abriga e por seus mitos e saberes tradicionais. Uma festa como o Festival Folclórico de Parintins que desde 1999, canta e conta o cotidiano amazônico por meio dos bumbás, incrementa mais ainda o interesse de conhecer esta região e sua festa.
Desvincular a leitura da realidade social, econômica e política do município de Parintins dos impactos que este espetáculo ocasiona à cidade é não considerar todos os investimentos públicos direcionados para a cidade em todas as dimensões de bens e serviços públicos. Neste tópico, far-se-á uma análise do município para apreender se houve crescimento ou um desenvolvimento de Parintins no período objetivado neste estudo.
Segundo dados da SEPLAN, a localização geográfica deste município está assim situada: faz parte da Mesorregião Centro Amazonense e integra à 9ª Sub-Região do Baixo Amazonas; fica à margem direita do rio Amazonas, banhado por águas barrentas formando uma ilha; sua área territorial é de 5.952 km2 e fica distante da capital manauara a 369 km em linha reta e 420 km via fluvial; o acesso a esta localidade é somente via aéreo com duração de 1h e/ou fluvial com aproximadamente 18h de barco. Tem como limite o Estado do Pará e os municípios de Barreirinha, Urucurituba e Nhamundá.
No que se refere à demografia de Parintins, verifica-se que no ano de 2000 a população perfazia um total de 90.150 habitantes sendo 58.125 (64,48%) da área urbana e 32.025 (35,52%) da área rural. Em 2010 o número populacional é de 102.033 habitantes, destes 69.890 (68,50%) estão situados na zona urbana e 32.143 (31,50%) contabilizados na zona rural; no universo populacional de 2010 se constata ainda que 52.304 (51,26%) são pessoas do sexo masculino e 49.729 (48,74%) do sexo feminino. Esta estimativa da população de 2010 faz de Parintins o segundo maior município do Estado do Amazonas, sendo Manaus o maior de todo o Estado. A tabela a seguir demonstra a estimativa populacional de 2001 a 2010:

Tabela 1 – Estimativa da População em dados (2001 a 2010)

Anos

População

Crescimento da População (%)

2001

93.883

--

2002

96.750

3,05

2003

99.813

3,17

2004

105.002

5,2

2005

109.150

3,95

2006

112.636

3,19

2007

102.044

-9,4

2008

105.742

3,62

2009

107.250

1,43

2010

102.033

-4,86

Fonte: Secretaria de Estado de Planejamento e Desenvolvimento Econômico (SEPLAN)/ Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Depreende-se da tabela 1 que de 2001 a 2010 houve um crescimento significativo da população parintinense, pois de 93.883 habitantes passou para 102.033, ou seja, um aumento de 8.447 pessoas. Chama atenção o intervalo entre 2009 a 2010, haja vista que o crescimento populacional teve resultados negativos, isto é, -4,86%.
Pautado nestes dados, pode-se tirar uma afirmação, em que pese seus limites: é fato o crescimento da população de Parintins no intervalo de dez anos (2001 a 2010), o que pode ser explicado pela migração ocorrente da zona rural em direção à zona urbana. Isto porque, o convívio no meio rural é permeado pelas fragilidades e/ou quase nulo acesso às políticas públicas levando os sujeitos à busca por melhores condições e qualidade de vida na cidade. Como bem lembra Souza (2009), a centralização histórica dos investimentos no centro urbano, em consonância com as necessidades de acumulação e circulação do capital converge para o processo de migração rural-urbano.
Por outro lado seria afirmar também que, o espaço urbano, muitas vezes, não conta com uma infraestrutura adequada, nem tão pouco, mercado de trabalho acessível a todos e quando se tem oportunidades é necessário educação e qualificação profissional, sendo que esta constante ainda é fragmentada em muitos municípios das microrregiões brasileiras.
Parintins tem uma divisão geográfica folclórica da ilha. Seus bairros estão do lado vermelho e azul, marcados pela linha divisória onde está a Catedral de Nossa Senhora do Carmo e o Bumbódromo. De um lado é o território do Boi Garantido, como os bairros de São Benedito, São José; ou território do Boi Caprichoso, como os bairros da Francesa e Emílio Moreira. Espaços estes onde estão concentrados seus currais de ensaio e galpões sede de confecção de alegorias e indumentárias e demais itens para a apresentação. Apesar desta divisão, a cidade subdivide-se em vinte bairros, conforme dados da tabela a seguir.

Tabela 2 – Estimativa da População por Bairro e Faixa-Etária (2010)

N

Nome do bairro

Total

0 a 4 anos

0 a 14 anos

15 a 64 anos

65 anos e +

1

Paulo Corrêa

13666

15,2

45,5

52,2

2,3

2

Itaúna II

7785

10,6

39,8

56,9

3,4

3

Palmares

6683

8,8

31,5

61,0

7,5

4

Itaúna I

5574

9,9

34,7

61,8

3,5

5

Centro

5286

7,1

25,7

64,0

10,3

6

São Benedito

4128

6,4

27,0

63,6

9,4

7

Nossa Senhora de Nazaré

3308

8,7

31,0

62,6

6,5

8

São José

3048

10,5

32,6

61,4

6,0

9

Francesa

2971

7,8

28,3

63,5

8,2

10

Santa Rita

2120

8,9

31,4

63,2

5,4

11

Santa Clara

1934

8,1

28,7

62,9

8,4

12

Dejard Vieira

1880

9,8

30,5

66,0

3,5

13

São Vicente de Paula

1676

8,7

31,1

64,0

4,9

14

Vitória Régia

1649

8,7

28,6

66,4

5,0

15

Emílio Moreira

1119

8,8

29,0

66,9

4,0

16

Raimundo Muniz

981

7,8

22,7

73,5

3,8

17

João Novo

929

6,8

25,7

72,3

1,9

18

Castanheira

487

11,9

42,9

54,2

2,9

19

Jacareacanga

282

11,0

41,8

56,7

1,4

20

Distrito Industrial

5

-

-

-

-

Fonte: Sistematização dos autores a partir de dados do Instituto Brasileiro de Geografia Estatística – IBGE/2010.

Os dados em análise desvelam que o bairro mais populoso é o Paulo Corrêa (13.666 hab.), seguido do Itaúna II (7.785 hab.) e Palmares (6.683hab.). Tais bairros são considerados zonas periféricas na cidade de Parintins a partir dos aspectos habitacionais e de acesso a bens e serviços. Os demais perfilam entre 5 a 5.574 habitantes.
A cidade de Parintins considerada uma ilha à margem do Rio Amazonas possui esta diversidade de bairros. Chama atenção que, aqueles mais populosos são resultantes de ocupações desordenadas que aconteceram nos últimos anos do século XX e início do XXI.
Quanto à questão dos domicílios particulares, em 2007 o município contabilizava 19.754, ao passo que em 2010 este total é de 22.175 domicílios. O IBGE desvela, conforme a tabela abaixo, os resultados quanto ao número de domicílios referentes ao ano de 2010:

Tabela 3 – Total de domicílios concentrados em Parintins – 2010

Descrição

Valores absolutos

Domicílios particulares

22.175

Domicílios particulares ocupados

20.662

Domicílios particulares não-ocupados fechados

103

Domicílios particulares não-ocupados de uso ocasional

630

Domicílios particulares não-ocupados vagos

780

Domicílios coletivos

136

Domicílios coletivos com morador

55

Domicílios coletivos sem morador

81

Fonte: elaboração própria a partir de dados do Instituto Brasileiro de Geografia Estatística – IBGE/2010

A tabela 3 infere dados que se analisados demonstram alguns resultados que merecem reflexões. Os domicílios particulares perfazem 22.175, entretanto, deste total apenas 20.662 encontram-se ocupados, significa então que 1.513 domicílios estão fechados (103), em uso ocasional (630) e outros vagos (780). Já aqueles considerados coletivos totalizam 136 domicílios, porém, apenas 55 possuem morador enquanto que, 81 estão vazios.
Uma explicação para alguns desses resultados no que diz respeito a domicílios não ocupados em se tratando do espaço urbano é por conta do Festival Folclórico dos Bois Garantido e Caprichoso. Isto porque, diversos moradores constroem ou restauram habitações para serem alugadas na época do Festival e, depois disso, voltam a ficarem vagas sem nenhuma ocupação.
Outro dado importante a atentar é em relação à proporção de domicílios com acesso a rede de abastecimento de água, coleta de lixo e ao escoamento do banheiro ou sanitário. Fazendo uma média entre os dez anos indicados a este estudo, 72,% da população tem acesso à água; 62,6% tem acesso a coleta de lixo e apenas 20,5% tem esgotamento sanitário adequado – o que indica inclusive, um alerta à saúde.
Se tomado por base os dados anteriores de população e os de domicílio, é notório que a cidade vai anualmente crescendo seja em número populacional seja na questão domiciliar, contudo o desenvolvimento da mesma não acompanha em mesmo nível este processo. No tópico 1 deste artigo, por meio das concepções de Furtado (2009) e Theodoro (2004), foram referenciadas as diferenciações entre as noções de desenvolvimento e crescimento e, portanto, são acepções que para melhor configuração de um território precisam andar juntas, pois do contrário seria cair em fragmentações econômicas e sociais.
Neste contexto, se expressa as refrações da questão social na cidade, pois com aumento da população, sendo muitas vezes de forma desordenada e com parcas intervenções de políticas públicas, cria-se um círculo de precariedade como trabalho infantil, exploração sexual, uso de drogas, pobreza socioeconômica, enfim um cenário fragilizado que deve ser analisado considerando todos estes aspectos e inclusive, os impactos dos três dias de Festival Folclórico no desenvolvimento do município.
Uma das questões que chama atenção diz respeito aos casos de violência e exploração sexual. Segundo dados do Relatório de Gestão do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), Parintins diagnosticou no ano de 2010, 74 casos incluindo abuso e exploração sexual, destes 51 envolveram crianças e adolescentes de 7 a 14 anos (SOUZA, 2011). Contudo, não se verifica nesta realidade instituições qualificadas para acolher as crianças e adolescentes vítimas desse fenômeno da violência e a gestão municipal pouco tem se posicionado sobre tal.
A economia do município é pautada em três setores, assim distribuída: a) setor primário: Extrativismo, Agricultura, Pecuária, Hortifruticultura e Avicultura. Todavia, através dos dados evidenciados pela SEPLAN (2010) observa-se que a pecuária, em particular o rebanho bovino é o “carro chefe”, pois, em 2000 eram 99.897 cabeças de gado e em 2010 chegou-se a 147.382 cabeças; b) setor secundário: composto basicamente por micro e pequenas empresas, como indústria madeireira, alimentícia, mobiliária, vestuária, naval, gráfica entre outras; c) setor terciário: neste, se constata os estabelecimentos comerciais como varejistas e atacadistas dos mais diversos produtos, desde gêneros alimentícios até materiais. Somado a isto ainda se tem os serviços, incluindo eletrônicas, hotéis, pousadas, restaurantes, serviços médicos, entre outros.

Entre os anos de 2005 a 2009, o Produto Interno Bruto (PIB) do município cresceu 65,2%, onde prevalece o Setor de Serviços com o quantitativo de 72,5%, seguido pela Agricultura com 14,1%, a Indústria com 9,9% e os Impostos com 3,5%, como exemplifica o Gráfico 1, em comparação entre os anos de 2002 a 2009.

Quantos aos gastos públicos, as maiores despesas (ou seriam investimentos?) estão assim concentradas: 37,5% para a Educação; 27,3% para a Saúde; 10,7% para a Administração; 9,3% com o Urbanismo; e 3,9% para a cultura local (IBGE, 2010).
No aspecto de emprego e renda, observa-se que de 2004 a 2010, o mercado formal cresceu 100%, pois se em 2004, empregou-se 369 pessoas; em 2010 foram 661 contratados. Contudo, estes dados não impressionam se relatar que se em 2004, 364 trabalhadores foram desligados do mercado formal, em 2010 esse número sobe para 777 desempregados.
É a Administração Pública o setor que tem o maior volume de trabalhadores formais. E, 2004 foram admitidas 2.078 pessoas e, em 2010, 4.789. Este setor é seguido pelo Comércio, Serviços e Indústria, como apresenta a Tabela 4:

Tabela 4 – Quantitativo de postos de trabalho formal por setor de atividade de Parintins em 2004 e 2010

Setor/Ano

2004

2010

Indústria de Transformação

123

205

Serviços a indústria

89

121

Construção civil

30

17

Comércio

658

1089

Serviços

341

537

Administração Pública

2.078

4.789

Agropecuária

68

15

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE/2010).

Estes números, contudo, não devem esconder o setor de trabalho informal, para além devem esclarecer que o setor informal de serviços, dentro do setor formal é claro, principalmente quando se aponta, por exemplo, que apenas 17 trabalhadores foram contratados para trabalhar na construção civil.
Em contraposição a estes dados econômicos ainda, vale ressaltar o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de Parintins. O PNUD considerada para análise quantitativa este cálculo em três níveis: renda per capita (poder de compra); as condições de saúde (longevidade); e condições de educação (taxa de alfabetização e matrículas nos níveis de ensino médio, fundamental e superior). Na escala o baixo desenvolvimento humano é menor que 0,500; o médio desenvolvimento humano está entre 0,500 e 0,800; e o alto desenvolvimento humano está acima de 0,800.
No ano de 2000, Parintins teve o índice de 0,855 para a Educação; 0,527 para Renda; 0,705 para a Longevidade; e 0,696 para o índice municipal (PNUD). Logo, conclui-se que, segundo estes índices, pode-se considerar que há o médio desenvolvimento humano, no que tange ao IDH. Esta qualificação clarifica a este estudo a necessidade de sempre considerar a totalidade de uma dada realidade para análise. Ressalta-se, no entanto, a observância para que não apenas o crescimento econômico influencie em análises, mas, também, os aspectos econômicos e sociais, principalmente de um município como Parintins, conhecido mundialmente por sua festa, pela cultura e hospitalidade de seu povo.

Considerações finais

Ao longo deste artigo, discutiu-se por meio de dados estatísticos, a evolução que se deu no município de Parintins, entre os anos de 2000 a 2010, nas dimensões econômicas e sociais, tanto pelo entendimento acadêmico do que está quanto para o crescimento e desenvolvimento e seus impactos na vida dos sujeitos, a que chamamos de questão social.
O município que tem chamado atenção principalmente por sua festa popular, precisa ainda, oferecer melhores condições de vida a seus habitantes. Moradia e acesso a bens e serviços sociais básicos como água, coleta de lixo e esgoto, devem ser prioridades para a melhoria das condições de infraestrutura da cidade.
O setor econômico vem se desenvolvendo, principalmente no setor de serviços e na contratação pelo principal setor, a administração pública, o que ainda condiciona muitos parintinenses a buscar o mercado como via para trabalho, o que, hipoteticamente, leva a quantidade tão grande do setor de serviços.
O desenvolvimento econômico e social precisa experimentar um caminho que implique no aumento da produção e na produtividade do sistema econômico e na ampliação de ofertas a seus habitantes tanto em emprego quanto a acesso a bens e serviços garantidos por meio de políticas públicas e não apenas por projetos ou iniciativas sem nenhuma estrutura e metodologia que garantam sua sustentabilidade.
Parintins apresenta um crescimento que só dará condições ao seu desenvolvimento se este não for seu objetivo último, mas processo para garantia da melhoria das condições e qualidade de vida de seus parintinenses.
Com base nos dados teóricos e estatísticos discutidos no decorrer deste trabalho, pode-se afirmar que Parintins, no supracitado intervalo temporal, mas cresceu do que se desenvolveu. Do ponto de vista populacional houve um aumento considerável, porém, este aumento não foi acompanhado de serviços e políticas públicas de qualidade que possa proporcionar condições dignas de qualidade de vida da população local.

Referências

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1 Faleiros (1998) sinaliza em seus estudos que o Abuso sexual envolve contatos ou interações entre crianças ou adolescentes e adultos, quando a criança é usada para a estimulação deste ou de outros adultos. No contexto do abuso sexual, o abusador está em posição de poder ou controle sobre a criança.

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