Revista: CCCSS Contribuciones a las Ciencias Sociales
ISSN: 1988-7833


JUDICIALIZAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIAIS

Autores e infomación del artículo

Sabrine Passos *

César Augusto Costa **

Universidade Católica de Pelotas/RS/BRASIL

abrinepassosadv@hotmail.com

RESUMO: Quando ocorre a violação de direitos a população, geralmente, busca uma solução através da chamada judicialização, ocorrendo o afogamento do poder judiciário. A implementação de Políticas Públicas adequadas, poderá ajudar estas pessoas na efetivação de seus direitos, sem haver a necessidade de ingresso com ações judiciais. Para tanto, faz-se necessária a atuação de outros profissionais, como por exemplo, os assistentes sociais, para que identifiquem as carências daquela população referente à serviços básicos resguardados pela Constituição Federal. Trataremos de três pontos básicos, começando pela conceituação de Políticas Públicas, adentrando na questão da judicialização como forma de acesso à justiça, e, então, a questão da judicialização de políticas públicas e sociais.
 
PALAVRAS-CHAVE: Judicialização, Judiciário, Direitos, Políticas Públicas e Sociais.

ABSTRACT: When the violation of rights occurs, the population generally seeks a solution through the so-called judicialization, with the drowning of the judiciary. The implementation of Public Policies, can help these people in the realization of their rights, without the need to file lawsuits. In order to do so, it is necessary to perform other professionals, such as social workers, to identify the needs of the population regarding basic services protected by the Federal Constitution. We will deal with three basic points, beginning with the conceptualization of Public Policies, going into the question of judicialization as a form of access to justice, and then entering into the question of the judicialization of public and social policies.

KEYWORDS: Judiciary, Judiciary, Rights, Public and Social Policies.


Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Sabrine Passos y César Augusto Costa (2018): “Judicialização de políticas públicas e sociais”, Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, (enero-marzo 2018). En línea:
http://www.eumed.net/rev/cccss/2018/01/politicas-publicas-sociais.html

http://hdl.handle.net/20.500.11763/cccss1801politicas-publicas-sociais


INTRODUÇÃO

Ocorre a chamada judicialização quando as pessoas ingressam perante o poder judiciário para que possam garantir direitos que entendem estar sendo violados.
Estes direitos poderiam estar sendo garantidos e protegidos, através da utilização de políticas públicas eficientes.
No primeiro capítulo, será abordada a conceituação de Políticas Públicas para que possa-se, então, adentrar no segundo capítulo, que tratará, especificamente, sobre a chamada judicialização e acesso à justiça.
Após estes entendimentos, passa-se ao terceiro capítulo que analisará a judicialização das políticas públicas e da questão social.

 

1. POLÍTICAS PÚBLICAS

Política Pública, a partir da etimologia da palavra, se refere ao desenvolvimento a partir do trabalho do Estado junto à participação do povo nas decisões.
Thomas Dye descreve a política pública como “tudo o que um governo decide fazer ou deixar de fazer” (Dye, 1972, p.2).
Azevedo (2003) apontou a existência de três tipos de políticas públicas: as distributivas, as redistributivas e as regulatórias.
Menciona que as políticas públicas redistributivas consistem na redistribuição de renda na forma de recursos e/ou financiamento de equipamentos e serviços públicos, como por exemplo, os programas de cesta básica, renda cidadã, isenção de IPTU e taxas de energia elétrica.
Já as políticas públicas distributivas, implicam nas ações cotidianas que todo e qualquer governo precisa fazer, dizem respeito à oferta de equipamentos e serviços públicos de acordo com a demanda social ou pressão de grupos de interesse, como por exemplo, reparos em uma creche, podas de árvores etc.
Enquanto que as políticas públicas regulatórias consistem na elaboração das leis que autorizarão os governos fazerem ou não determinada política pública redistributiva ou distributiva.
Aduz que escolha de políticas públicas é atribuição do Poder Executivo, através de um juízo de conveniência e oportunidade, levando em consideração as necessidades prioritárias da população e os recursos orçamentários disponíveis.
Bazua e Valenti (1993, p.29) ao se referir à amplitude do uso do termo política pública escrevem que a
[…] noción de policy tiene una larga historia en la cultura occidental. Probablemente su primer uso más o menos sistemático se llevó a cabo en el campo de la ciencia económica, en la famosa investigación de La Naturaleza y causas de la Riqueza de las Naciones de Adam Smith, publicada en 1776.

Enríquez e Roca Ruiz (2001, p. 09) afirmam que o conceito de política pública é de dificil delimitação:
Se habla de política para referirse a un conjunto muy amplio deactividades relacionadas con los mecanismos que una sociedad utiliza para regular los asuntos públicos; en un sentido reducido esto equivale a hablar del estado, de su configuración, de la competencia entre partidos para ocupar su dirección o, entre otras muchas cosas, de las política estatales como conjunto de medidas que ese Estado pone en marcha. En un sentido mas amplio, encontramos la política en casi todos lós aspectos de la vida social, puesto que vivimos en sociedades en las que la presencia del estado es muy fuerte, mucho más que en siglos pasados, sociedades muy reguladas por normas legales (aprobadas por un gobierno o un parlamento, frutos de la competencia entre partidos) y cuya economía no podría sostenerse sin la actividad ordenadora, fiscalizadora e inversora del estado.

Paula Arcoverde Cavalcanti (2007) informa que as políticas públicas são entendidas como feitas em nome do "público"; a política geralmente iniciada por um governo; as políticas públicas podem ser implementadas por atores do setor público, atores de setores privados ou ainda por atores de organizações não governamentais; a política pública é o que o governo pretende fazer ou não fazer e que é possível perceber a existência de elementos comuns nas definições de política pública. Um deles é o referente à tomada de decisão e às ações a ela ligadas. Ou seja, as definições enfatizam, de um lado, o processo contínuo de tomada de decisões e, de outro, e de forma complementar o fato de que a política pública deve ser entendida como um conjunto de ações interligadas. Nesse sentido, alguns autores falam de políticas públicas que potencialmente serão implementadas, enquanto que outros estabelecem sua conceituação tendo em vista a efetiva implementação das ações em um determinado período de tempo.
Paula Arcoverde Cavalcanti (2007) expôs a definição sobre política pública apresentada por diversos autores, conforme verificaremos abaixo:
Aguilar Villanueva (1996a,) indicou que: Una política es en un doble sentido un curso de acción: es el curso de acción deliberadamente diseñado y el curso de acción efectivamente seguido No solo o que el gobierno dice y quiere hacer. También lo que realmente hace y logra, por si mismo o en interación con actores políticos y sociales, más allá de suas intenciones. Por una parte a política que se decide y se quiere llevar a cabo es básicamente un conjunto más o menos interrelacionado de acciones, que es razón de los recursos con los que cuentam los actores, los medios que emplean y las reglas que siguen, es considerado idóneo y eficaz para realizar el estado de cosas preferido.
Albi (2000) informou que: Las políticas públicas tienen procedimientos de aplicación complejos e dejan entrever obstáculos políticos, económicos, burocráticos, de manera que al intervención pública se desarrolla a lo largo del tiempo, dentro de una realidad social, y su gestión, desde la toma de decisiones hasta la ejecución de las mismas, presenta complicaciones que ponen en peligro la eficiencia y la equidad necesarias para el bienestar social (apud, PARRA RAMIREZ, 2003).
Anderson (1984) aduziu que: Política es el curso intencional de acción que sigue un actor o un grupo de actores al tratar un problema o asunto de interés. El concepto de política presta atención a lo que de hecho se efectúa y leva a cabo, más que a lo que se propone y quiere. Dintingue también la política de una decisión, que es la mera elección de alternativas (apud AGUILAR VILLANUEVA, 1996).
Dye (1992) expôs que: Política pública é uma decisão puramente caracterizada por uma conduta consistente. É tudo aquilo que o governo escolhe fazer ou não fazer.
Easton (1953) mencionou que: Las políticas públicas como una serie de decisiones e acciones que distribuyen imperativamente los valores en la sociedad (apud TRABADA, 2003).
Heclo e Wildavsky (1974) disse que: Una política pública (policy) es una acción gubernamental dirigida hacia el logro de objetivos fuera de la misma (apud, ROTH DEUBEL, 2006a).
Larrue (2000) alegou que: “Una concatenación de actividades, decisiones o de medidas coherentes por ló menos en su intención, y tomadas principalmente por lo actores del sistema político -administrativo de un país con la finalidad de resolver problema colectivo (apud MICHEL, 2002).
Peters (1986) indicou que: Una política pública es la suma de las actividades de los gobiernos, bien por medio de una actuación directa , bien por medio de agentes en la medida en que tenga influencia sobre la vida de los ciudadanos (apud, TRABADA 2003).
Subirats (1994) aduziu que: Comprende normalmente un conjunto de decisiones relacionadas con una variedad de circunstancias, personas, grupos y organizaciones. El proceso de elaboración y la posta en práctica de esa política se desarrolla en un cierto período de tempo y puede comportar la existencia de diversos sub-procesos.
Diante das definições acima expostas é possível verificar a diversidade de conceituação sobre políticas públicas

2. JUDICIALIZAÇÃO E ACESSO À JUSTIÇA
                     
Não podemos confundir acesso à justiça com judicialização.
A questão do acesso à Justiça tem como ponto de partida a obra de Cappelletti e Garth (1988) que definem três ondas de acesso à Justiça: a primeira tem como principal característica a expansão da oferta de serviços jurídicos aos setores pobres da população; a segunda, trata da incorporação dos interesses coletivos e difusos; a terceira conhecida como “abordagem de acesso à Justiça”, inclui a Justiça informal (advocacia judicial e extrajudicial).
A garantia ao acesso à Justiça a partir da visão introduzida por Cappelletti começou a ser encarada enquanto um direito social. De acordo com J. M. de Carvalho,
“[...] a garantia da justiça exige a interferência do poder de Estado, assim como o exige a política de bem-estar. Ela não representa uma reação ao Estado, um direito negativo. Corresponde a um momento da sociedade liberal em que o Estado já foi convocado para garantir, pela intervenção, um direito inicialmente estendido a parcela limitada da população”. (Carvalho, 2002:108)

A judicialização pode ser entendida como uma das maneiras com que os cidadãos buscam a efetivação dos seus direitos, através do ingresso de ações judiciais que são analisadas e julgadas por uma terceira pessoa, o juiz.
Garapon reconhece na Justiça o “último refúgio de um ideal democrático desencantado” (1999:26). O sucesso da Justiça é inversamente proporcional ao descrédito que afeta as instituições políticas clássicas, causadas pela crise de desinteresse e perda do espírito público. Portanto, “[...] a cooperação entre os diferentes atores da democracia não é mais assegurada pelo Estado, mas pelo direito, que se coloca, assim, como a nova linguagem política na qual são formuladas as reivindicações políticas. A justiça tornou-se um espaço de exigibilidade da democracia. Ela oferece potencialmente a todos os cidadãos a capacidade de interpelar seus governantes, de tomá-los ao pé da letra e de intimá-los a respeitarem as promessas contidas na lei”. (Garapon, 1999:48-49). Para Garapon, esse crescimento do poder da Justiça esta ligado ao enfraquecimento do Estado e ao desmoronamento simbólico do homem e da sociedade democrática.
De acordo com Garapon, “[...] o juiz surge como um recurso contra a implosão das sociedades democráticas que não conseguem administrar de outra forma a complexidade e a diversificação que elas mesmas geraram. O sujeito, privado das referências que lhe dão uma identidade e que estruturam sua personalidade, procura no contato com a justiça uma muralha contra o desabamento interior. Em face da decomposição do político, é então ao juiz que se recorre para a salvação”. (Garapon, 1999:26- 27).
Todas as pessoas têm o direito de buscar a solução de seus conflitos e, se for através da esfera judicial, o juiz tem o dever de julgar o caso de forma imparcial. Podemos verificar que os poderes atribuídos à ele foram amplamente modificados e ampliados, se compararmos o Código de Processo Civil de 1973 e o vigente (2015), conforme verifica-se abaixo:
Código de Processo Civil de 1973:
Seção I Dos Poderes, dos Deveres e da responsabilidade do Juiz
Art. 125. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, competindo-lhe:
I - assegurar às partes igualdade de tratamento;
II - velar pela rápida solução do litígio;
III - prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da Justiça;
IV - tentar, a qualquer tempo, conciliar as partes. (Incluído pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994) (grifos nossos)

Código de Processo Civil de 2015:
CAPÍTULO I
DOS PODERES, DOS DEVERES E DA RESPONSABILIDADE DO JUIZ
Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe:
I - assegurar às partes igualdade de tratamento;
II - velar pela duração razoável do processo;
III - prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça e indeferir postulações meramente protelatórias;
IV - determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária;
V - promover, a qualquer tempo, a autocomposição, preferencialmente com auxílio de conciliadores e mediadores judiciais;
VI - dilatar os prazos processuais e alterar a ordem de produção dos meios de prova, adequando-os às necessidades do conflito de modo a conferir maior efetividade à tutela do direito;
VII - exercer o poder de polícia, requisitando, quando necessário, força policial, além da segurança interna dos fóruns e tribunais;
VIII - determinar, a qualquer tempo, o comparecimento pessoal das partes, para inquiri-las sobre os fatos da causa, hipótese em que não incidirá a pena de confesso;
IX - determinar o suprimento de pressupostos processuais e o saneamento de outros vícios processuais;
X - quando se deparar com diversas demandas individuais repetitivas, oficiar o Ministério Público, a Defensoria Pública e, na medida do possível, outros legitimados a que se referem o art. 5o da Lei no 7.347, de 24 de julho de 1985, e o art. 82 da Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990, para, se for o caso, promover a propositura da ação coletiva respectiva.
Parágrafo único. A dilação de prazos prevista no inciso VI somente pode ser determinada antes de encerrado o prazo regular. (grifos nossos)

Para Cappelletti, a compreensão do acesso à justiça, deve abranger tanto a acessibilidade do sistema às pessoas que dele necessitem, quanto o bom funcionamento da estrutura judiciária, proporcionando aos cidadãos a produção de resultados socialmente justos.

 

3. JUDICIALIZAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS E DA QUESTÃO SOCIAL

Segundo o entendimento pacífico do Supremo Tribunal Federal, o judiciário tem legitimidade para controlar e intervir nas políticas públicas que visem a garantir o mínimo existencial conforme indica a decisão abaixo:
ADPF 45/DF : "Ementa: arguição de descumprimento de preceito fundamental. A questão da legitimidade constitucional do controle e da intervenção do poder judiciário em tema de implementação de políticas públicas, quando configurada hipótese de abusividade governamental. Dimensão política da jurisdição constitucional atribuída ao supremo tribunal federal. Inoponibilidade do arbítrio estatal à efetivação dos direitos sociais, econômicos e culturais. Carácter relativo da liberdade de conformação do legislador. Considerações em torno da cláusula da 'reserva do possível'. Necessidade de preservação, em favor dos indivíduos, da integridade e da intangibilidade do núcleo consubstanciador do 'mínimo existencial'. Viabilidade instrumental da argüição de Descumprimento no processo de concretização das liberdades positivas (direitos constitucionais de segunda geração). "

O Poder Judiciário, embora não realize diretamente o planejamento ou a execução de políticas públicas, é um dos principais atores nesse cenário pois tem concedido direitos relacionados aos direitos sociais como aos ligados à saúde, educação e previdência social, protegidos pela carta magna.
Estes direitos sociais requerem do Estado políticas públicas dirigidas a segmentos específicos da sociedade, com o intuito de tentar dar tratamento igualitário à todas as pessoas da sociedade, conforme assegurado pela Constituição Federal.
A possibilidade do Poder Judiciário apreciar políticas públicas surgiu com a promulgação da Constituição Federal de 1988, onde constata-se que o poder de atuação do Judiciário ampliou-se mediante a possibilidade de revisão de atos dos demais poderes.
A dignidade da pessoa humana deverá ditar as políticas públicas, garantindo o mínimo existencial a todos e a máxima efetividade da Constituição Federal. Deste modo, a doutrina e a jurisprudência vêm consolidando o entendimento da possibilidade da interferência do poder judiciário nas políticas públicas, tendo vários julgados neste sentido.
Vianna et al. (1999, p. 42) refere que a sociedade civil, especialmente os setores mais pobres e desprotegidos, “depois da deslegitimação do Estado como instituição de proteção social, vêm procurando encontrar no judiciário um lugar substitutivo, como nas ações públicas e nos Juizados Especiais, para as suas expectativas de direitos e de aquisição de cidadania”.
 Esteves (2005, p.14) considera que "ou os magistrados assumem o papel de guardiões da Constituição e garantidores da cidadania, ou no futuro, talvez próximo, o judiciário seja colocado no rol das instituições desacreditadas pela sociedade e termine como peça de retórica e legitimadora da desigualdade social". 
A partir da Constituição de 1988, os juízes têm exercido o papel de guardiães, passando a assumir a função de defesa dos direitos individuais e de minorias e esta atribuição rompe com a concepção da relação harmônica entre os poderes.
Os juízes têm se tornado atores relevantes no processo político pois na medida em que as sentenças produzem impactos sobre a gestão das políticas, não se amplia apenas o poder dos juízes, e sim, a sua responsabilidade (CAPPELLETTI, 1989).
Para Junqueira (1996), a pressão por mudanças no direito ocorreu, inicialmente, devido ao crescente fenômeno das invasões urbanas e da incapacidade do Poder Judiciário de resolver os novos conflitos emergentes na sociedade brasileira. Ao longo da década de 1990, depois de promulgada a Constituição de 1988, as políticas sociais foram submetidas às condições ditadas pelas medidas políticas e econômicas de ajuste fiscal. A redução no orçamento provocou a degradação dos sistemas de proteção social, ampliando a demanda pelo Poder Judiciário, desencadeando o processo de judicialização da política e da questão social.
De acordo com Salvador (2010, p. 60), em 2009, foram desviados para alguns setores econômicos quase 70 bilhões de reais, que faziam parte do orçamento da seguridade social. O autor também comenta que não houve compensação, pois o governo não adotou medidas no sentido de garantir o emprego e ampliar a proteção social. Em grande parte, estas ações fazem com que o Estado deixe de cumprir seu dever constitucional de garantir a proteção social aos cidadãos brasileiros. Ao abdicar desta função, intensifica-se a tendência de aumento da demanda por direitos sociais no Poder Judiciário e a judicialização da política resulta da omissão do Poder Executivo no encargo da efetivação de direitos, mediante a execução das políticas públicas.
Para Werneck Vianna, numa sociedade de capitalismo retardatário e de democracia incipiente, a judicialização não seria resultado apenas do processo de privatização das normas como destacou Garapon (1995), mas sobretudo, “do avanço da agenda igualitária em um contexto que, tradicionalmente, não conheceu as instituições da liberdade” (VIANNA, 1999, p. 150).
Nesse processo, enquanto os cidadãos recorrem ao Judiciário visando à efetivação de seus direitos, o Poder Judiciário é acusado de ser indiferente aos limites orçamentários da administração pública (BARROSO, 2007).  O Poder Judiciário tem sido procurado em vista da possibilidade de efetivação de direitos, apesar da desconfiança com relação à sua eficácia tendo em vista a morosidade existente.
Segundo Sadeck (2004, p. 88), há uma crise no Poder Judiciário, que diz respeito à sua estrutura pesada, sem agilidade e incapaz de fornecer soluções, em tempo razoável, previsíveis e a custo acessível para todos.
A judicialização da política e da questão social é uma tendência que tem se acentuado no Brasil. Segundo Vianna, Burgos e Salles (2007, p. 41), o juiz tem se tornado protagonista direto da questão social, num processo claro de substituição do Estado e dos recursos classicamente republicanos. De acordo com Aguinski e Alencastro (2006, p. 20), tal processo ocorre “em detrimento do compromisso mais efetivo do Estado e da esfera pública”.
Silva (2012, p. 556), em seu estudo sobre a judicialização do Benefício da Prestação Continuada (BPC), afirma que quase 6% dos beneficiários tiveram reconhecidos seus direitos por determinação judicial. Todavia, a autora conclui que, apesar da inegável importância do Judiciário no acesso ao benefício mencionado, as desigualdades regionais acabam sendo reforçadas, visto que o acesso à justiça é menor nas regiões mais empobrecidas.
Assumpção (2012) também investigou a judicialização do Benefício da Prestação Continuada (BPC) e destacou ser este processo resultado do confronto entre a interpretação, por parte dos juízes, da Constituição e das leis infraconstitucionais, citando como exemplo a Lei Orgânica da Assistência Social (Loas). Por estipular apenas um quarto da renda per capita para ter acesso ao BPC, a Loas estaria restringindo um direito constitucional somente aos que vivem em extrema pobreza. Além disso, passou a ser contestada também por estabelecer um critério estritamente quantitativo para definir a pobreza.
Se, por um lado, a judicialização pode ser uma alternativa para a efetivação de direitos, por outro, pode se traduzir em resultados negativos, reforçando a tendência do Judiciário em aplicar o seu poder “prioritariamente de forma coercitiva ou repressiva, direcionado para o disciplinamento, a normalização de condutas” (FÁVERO, 2005).
De fato, a judicialização da política tende a intensificar a judicialização da questão social, mas enquanto a primeira pode ser concebida positivamente, a outra tende a ser identificada como aumento do poder de coerção e controle. Segundo Sierra (2011, p. 259), a judicialização da política remete à intromissão do Poder Judiciário nos processos de deliberação política, admitindo com isso o conflito na relação entre os Poderes, enquanto a judicialização da questão social refere-se ao aumento da interferência dos aparatos de controle judicial sobre a pobreza, quer seja para proteção e defesa dos direitos de cidadania, quer seja para repressão dos comportamentos penalmente puníveis.
O serviço social tem participado fornecendo subsídios às decisões judiciais. Segundo Souza (2006, p. 59), o assistente social é parte constituinte e constitutiva dos conflitos judicializados. Tradicionalmente o serviço social é convocado para realizar o estudo social e o parecer técnico. Todavia, outras atribuições estão sendo exigidas desse assisistente, como emitir relatórios de avaliação, formular projetos de intervenção, além de realizar visitas domiciliares, esclarecer aos usuários os seus direitos, bem como fazer encaminhamentos para o acesso às políticas públicas e realizar contatos interinstitucionais, dentre outras atribuições.
Num país onde a extrema desigualdade social acentua a desigualdade no acesso e garantia de direitos, o Serviço Social Judicial, ao lidar com a parcela da população que enfrenta inúmeras dificuldades de acesso aos direitos sociais básicos, procura alinhar o trabalho profissional aos interesses das classes trabalhadoras e subalternas, no sentido do projeto ético político (NETTO, 1999) e dos princípios do Código de Ética da profissão, sendo, portanto, favorável à equidade e à justiça social, numa perspectiva de universalização do acesso a bens e a serviços relativos às políticas e programas sociais, bem como sua gestão democrática.
No Poder Judiciário, a execução do trabalho do assistente social judicial deve se orientar na direção do Código de Ética Profissional e do Projeto Ético-Político-Pedagógico, tendo em vista que pode ser realizado com a finalidade de tornar a justiça mais próxima da realidade das pessoas em situação de vulnerabilidade, procurando fazer com que seja garantido o direito de todos, de forma igualitária.

 

CONCLUSÃO

Constatou-se que as Políticas Públicas são um conjunto de decisões, planos, metas e ações governamentais, seja a nível nacional, estadual ou municipal, voltados para a resolução de problemas de interesse público e a escolha destas políticas públicas são atribuídas pelo Poder Executivo, levando em consideração as necessidades prioritárias da população e os recursos orçamentários disponíveis.
Para que direitos sociais possam ser implementados, é necessário que o Poder Executivo promova a elaboração de políticas públicas que busquem a efetividade de direitos básicos e, muitas vezes, para que seus direitos sejam efetivados, a população utiliza-se do ingresso de ações perante o poder judiciário, ocorrendo a chamada judicialização.
O Poder Judiciário, entre suas atribuições constitucionais, tem o dever de proteger os direitos fundamentais, podendo interferir na implementação de políticas públicas para garantir a efetivação destes direitos.
A possibilidade do Poder Judiciário apreciar políticas públicas surgiu com a promulgação da Constituição Federal de 1988, onde constata-se que o poder de atuação do Judiciário ampliou-se mediante a possibilidade de revisão de atos dos demais poderes.
O Poder Executivo não poderá recusar-se a elaborar políticas públicas relacionadas aos direitos sociais básicos e, tampouco, recusar-se a implementá-los, pois estará descumprindo norma constitucional de ordem pública, imperativa, inviolável e autoaplicável.
Somente haverá o desafogamento do poder judiciário e a não utilização da chamada judicialização, quando passarem a existir políticas públicas efetivas e quando as pessoas forem realmente tratadas conforme menciona a Constituição Federal, de forma igualitária, sem haver distinção de raça, crença, etc. Enquanto as políticas públicas não forem totalmente efetivas para garantir os direitos básicos à população menos favorecida, será necessária a intervenção do judiciário para garantir-lhes o mínimo/básico para que vivam com dignidade.

 

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* Advogada inscrita na OAB-RS/BRASIL sob o nº 91.509; Especialista em Direito Notarial e Registral; Especialista em Direito Processual Civil; Mestranda em Política Social pela Universidade Católica de Pelotas/RS. E-mail: sabrinepassosadv@hotmail.com
** Sociólogo; Pós-doutor em Direito/FURG; Docente e pesquisador no Programa de Pós Graduação e Política Social/UCPEL. E-mail sociologors@gmail.com


Recibido: 14/11/2017 Aceptado: 12/01/2018 Publicado: Enero de 2018



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