Revista: CCCSS Contribuciones a las Ciencias Sociales
ISSN: 1988-7833


ENTRE QUILOMBOLAS E FAZENDAS:O CONFLITO PELO USO DO TERRITÓRIO NA COMUNIDADE QUILOMBOLA DE PITIMANDEUA (PA)

Autores e infomación del artículo

Aiala Colares de Oliveira Couto *

Lyara Carlyle Carneiro Brito **

Daiane de Cássia Feio Pinheiro ***

Universidade do Estado do Pará (UEPA), Brasil

aialacolares@hotmail.com

RESUMO

Formada na virada do século XIX para o XX, a Comunidade Quilombola Menino Jesus de Pitimandeua localiza-se no município de Inhangapí,Nordeste do Pará.Tal grupo étnico-cultural construiu uma territorializaçãosimbólica, atribuindo valor e significado ao uso do território através da expressão da cultura e resistência negra na Amazônia. Porém, a necessidade da titulação da terra para uso coletivo ressalta o desafio em termos político-jurídicosenfrentado ainda hoje, visto que o território quilombola está “cercado” por fazendas improdutivas com vistas à especulação fundiária. Este conflito territorial representa os limites e possibilidades para o fortalecimento dos movimentos socioterritoriais quilombolas no Pará, sobretudo ao considerar o papel do Ministério Público do estado ao requerer a desapropriação das fazendas e a restituição da comunidade como forma de legitimar a condição de existência dos quilombolas, fato que não é aceito pacificamente por latifundiários e pelo Estado.

Palavras-chaves: Território. Quilombo. Terras. Conflitos.

 

BETWEEN QUILOMBOLAS ANDFARMS: THE CONFLICT FOR THE USE OF THE TERRITORY IN THE QUILOMBOLA COMMUNITYOF PITIMANDEUA (PA)

ABSTRACT

Established at the turn of the century XIX toXX, the Quilombola community Menino Jesus de Pitimandeua is located in Inhangapí, in northeast Pará. This ethno-cultural grouphas build a symbolicterritorialisation by the assignment of value and significance to the use of the territory through the expression of both culture and black resistance in the Amazon. However, the need for land ownership titles for collective use emphasizes a still faced challenge in terms of politics and law to the extentthatthe Quilombola territoryis “surrounded” by unproductive farms with an eye on land speculation. This territorial conflict represents the limits and possibilities for the strengtheningofthe Quilombola socio-territorialmovements in Pará, speciallywhenconsidering the role of the State Prosecutor's Office that requires the expropriation of the farms and the restitution of the community as a way of legitimizing the existence conditionofthe Quilombolas, whathasnot been peacefully accepted by the landowners and the State.

Keywords: Territory. Quilombo. Lands. Conflicts.


Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Aiala Colares de Oliveira Couto, Lyara Carlyle Carneiro Brito y Daiane de Cássia Feio Pinheiro (2018): “Entre Quilombolas e Fazendas:o conflito pelo uso do território na comunidade Quilombola de Pitimandeua (PA)”, Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, (enero-marzo 2018). En línea:
http://www.eumed.net/rev/cccss/2018/01/conflito-territorio-quilombola.html

http://hdl.handle.net/20.500.11763/cccss1801conflito-territorio-quilombola


1. INTRODUÇÃO

Nos últimos anos ganha força no Brasil o debate acerca da demarcação e titulação de terras indígenas e quilombolas como forma de garantir os direitos adquiridos historicamente por estes povos tradicionais que fizeram (e ainda fazem) parte do processo de construção sociogeográfica do território nacional.  Destacam-se as pressões dos movimentos sociais e a própria organização política de indígenas e negros sobre o Estado na figura do INCRA 1, órgão encarregado de fazer o reconhecimento territorial (se tratando de terras federais).  Além disso, um papel importante é desenvolvido pela Fundação Cultural Palmares, sobretudo no âmbito da catalogação e certificação de Comunidades Quilombolas no Brasil.
Na Amazônia paraense, a escravidão negra ocorreu a partir da segunda metade do século XVIII, quando a política de Marquês de Pombal proíbe o trabalho escravo do indígena, enfraquecendo o poder econômico e político da igreja católica. Esta incorporação tardia como força de trabalho na região resultou no processo de formação de vários aglomerados de negros libertos ou fugidos do sistema escravista.
Afirma-se entãoo surgimento de dois tipos de Quilombos no Pará: o primeiro estabeleceu-se através da fuga de escravos que,como estratégia de defesa, se refugiaram em áreas de difícil acesso; o segundo,a partir de terras doadas pelos senhores logo após o fim da escravidão, onde fazendas foram ocupadas por negros libertos. Formaram-se conjuntos populacionais que se multiplicaram pela região do rio Trombetas no Baixo Amazonas, Marajó, Baixo Tocantins e Nordeste do Pará.
Hoje, existem exatamente 58 Comunidades Remanescentes Quilombolas com a titulação já consolidada e com o documento entregue pelo INCRA ou pelo ITERPA2 .É importante ressaltar que a certificação dada pela Fundação Palmares é apenas uma primeira etapa que não garante a titulação efetiva, prescindindo de outros processos nos órgãos já citados para que sejaconcluída. Existem questões burocráticas que atrasam todo o procedimento, tais comoa demarcação territorial, ordem e decisão judicial, falta de documentos e, inclusive, conflitos internos envolvendo as comunidades.
Enquanto mais de 100 comunidades negras não receberam o reconhecimento e certificação e, por isso, não puderam ainda encaminhar o pedido de titulação da terra, algumas outras já aguardam a titulação definitiva, como é o caso da Comunidade Menino Jesus de Pitimandeua, localizada no município de Inhangapí (Nordeste do Pará), um Quilombo que se encontra cercado por fazendas e transformado em uma “ilha” envolta por latifúndios, isolado e com dificuldades de acesso à terra para o uso coletivo.
O objetivo deste trabalho é compreender os conflitos pelo uso do território envolvendo os quilombolas de Menino Jesus de Pitimandeua e os fazendeiros da região. Parte-se do princípio de que as terras cercadas pelos fazendeiros são utilizadas para fins de especulação, são terras improdutivas que limitam a possibilidade de utilização da terra pelas famílias.
A metodologia desta pesquisa foi construída através de trabalhos de campo, da realização de entrevistas e conversas com os quilombolas de Pitimandeua, registros fotográficos, observações sistemáticas e participantes a partir do cotidiano da comunidade, pesquisa bibliográfica e análise de documentos.
Assim, este ensaio divide-se em três momentos. Na primeira seção discute-se o território usado em uma perspectiva geográfica como primeira aproximação do tema. Na segunda, apresenta-se de forma breve a história e características da Comunidade Quilombola Menino Jesus de Pitimandeua, e, por fim, a terceira seção aborda os conflitos pelo uso do território em Pitimandeua.

2. O USO DO TERRITÓRIO NUMA PERSPECTIVA GEOGRÁFICA

O debate sobre o uso do território dentro de uma perspectiva geográfica aparece no Brasil a partir dos trabalhos do geógrafo Milton Santos, um dos responsáveis pelo movimento de renovação da Geografia. Contudo, nas últimas décadas, disciplinas comoa Antropologia, a Biologia, a Ciência Política, a Economia e a Sociologiatambém se debruçaram sobre temas que partem da variável territorial para compreender o movimento político, econômico e cultural que está por trás das relações sociais.
Porém, a Geografia é a disciplina que melhor se apropria deste debate. Sobretudo em tempos de multiterritorialidades (HAESBAERT, 2004), compreender as relações de poder e os diversos usos do território tornaram-se objetivos recorrentes nas reflexões teóricas e empíricas da produção cientifica contemporânea, principalmente daqueles que estudam a produção do espaço e as formas de apropriação/dominação que nele se materializam. 
Diversos autores da Geografia apresentaram definições importantes acerca do conceito de território, destacam-se Souza (1995), Haesbaert (2004), Saquet (2004) e Santos (1998). Aqui, enfatiza-se o termo “território usado” para se chegar aos conflitos pelo uso do território na Comunidade Quilombola de Pitimandeua em que a teoria de Santos (1998) se aplica melhor.
Milton Santos teorizou sobre a definição da categoria território a partir do texto “O retorno do território”, no qual, segundo ele:

Vivemos com uma noção de território herdada da Modernidade incompleta e do seu legado de conceitos puros, tantas vezes atravessando os séculos praticamente intocados. É o uso do território, e não o território em si mesmo, que faz dele objeto da análise social. Trata-se de uma forma impura, um híbrido, uma noção que, por isso mesmo, carece de constante revisão histórica. O que ele tem de permanente é ser nosso quadro de vida. Seu entendimento é, pois, fundamental para afastar o risco de alienação, o risco da perda do sentido da existência individual e coletiva, o risco de renúncia ao futuro (SANTOS, 1998, p.137).

De acordo com Santos (1998), ao longo do século, caminhamos da antiga comunhão individual dos lugares com o universo à comunhão hoje global, ou seja, a interdependência universal dos lugares é a nova realidade do território. É claro que Milton Santos está se referindo ao contexto da globalização, com a crescente internacionalização dos mercados graças ao advento das técnicas; mais precisamente, este quadro se consolida com o advento do “meio técnico científico e informacional” (SANTOS, 1996).
E sendo assim, para Santos (1998,p. 137):

Nesse longo caminho, o Estado-Nação foi um marco, um divisor de águas, entronizando uma noção jurídico-política do território, derivada do conhecimento e da conquista do mundo, desde o Estado Moderno e do Século das Luzes à era da valorização dos recursos chamados naturais.

Para Santos (1998), o território era a base, o fundamento do Estado-Nação que, ao mesmo tempo, o moldava. Hoje, vivendo uma dialética do mundo concreto, evolui-se da noção, tornada antiga, de Estado Territorial para a noção pós-moderna de transnacionalização do território. Acerca desta transnacionalização diz-se que é reflexo da globalização econômica, com fortes implicações na política e na cultura dos Estados nacionais.

Mas, assim como antes tudo não era, digamos assim, território “estatizado”, hoje tudo não é estritamente “transnacionalizado”. Mesmo nos lugares onde os vetores da mundialização são mais operantes e eficazes, o território habitado cria novas sinergias e acaba por impor, ao mundo, uma revanche. Seu papel ativo faz-nos pensar no início da História, ainda que nada seja como antes. Daí essa metáfora do retorno (SANTOS, 1998, p.138).

Essa forma de abordagem sobre o conceito de território na concepção miltonsantiana passa também pela definição de que “o território são formas, mas o território usado são objetos e ações, sinônimo de espaço humano, espaço habitado” (SANTOS, 1998, p. 38). Portanto, interpreta-se como espaço construído por relações de poder, grafados, objetivados pela sociedade.
A partir dessa realidade que se encontram hoje no território novos recortes, além da velha categoria região, ou seja, resultado da nova construção do espaço e no novo funcioidnto do território, considerando as horizontalidades e verticalidades. Assim, as horizontalidades seriam os domínios da contiguidade, daqueles lugares vizinhos reunidos por uma continuidade territorial, enquanto as verticalidades seriam formadas por pontos distantes uns dos outros, ligados por todas as formas e processos sociais (SANTOS, 1998).
Por isso, Santos (1998, p.138) destaca que “[...] a ideia de espaço banal, mais do que nunca, deve ser levantada em oposição à noção que atualmente ganha terreno nas disciplinas territoriais: a noção de rede”. Seria, então, esta a forma mais comum de pensar os territórios: em redes, diante do processo de globalização ou de transnacionalização dos lugares.
Desse modo,

As redes constituem uma realidade nova que, de alguma maneira, justifica a expressão verticalidade. Mas além das redes, antes das redes, apesar das redes, depois das redes, com as redes, há o espaço banal, o espaço de todos, todo o espaço, porque as redes constituem apenas uma parte do espaço e o espaço de alguns (SANTOS, 1998, p. 139).

A noção de territórios em redes na obra de Milton Santos está afinada ao conceito de horizontalidades e verticalidades. Segundo ele:

O território, hoje, pode ser formado de lugares contíguos e de lugares em rede: são, todavia, os mesmos lugares que formam redes e que formam o espaço banal. São os mesmos lugares, os mesmos pontos, mas contendo simultaneamente funcionalidades diferentes, quiçá divergentes ou opostas (SANTOS, 1998, p. 139).

Santos (1998) é categórico ao afirmar que antes do enfraquecimento atual do Estado Territorial, a escala da técnica e a escala da política se confundiam, porém, na atualidade essas duas escalas se distinguem e se distanciam. Por isso mesmo as grandes contradições do nosso tempo passam pelo uso do território.
Por fim, há de se considerar também que, embora essa vinculação direta e exclusiva do território ao controle estatal tenha sido ultrapassada pela contemporaneidade, não fica clara – na proposição apresentada – a nova delimitação espacial que substitui a escala nacional (MORAES, 2013, p.112).
Para além das críticas, é importante também atribuir ao geógrafo Milton Santos o valor que o território adquire diante da perspectiva de um mundo como possibilidade ou de uma globalização mais humana, pois o território hoje é também vetor de transformações e resistência a uma globalização perversa imposta a toda sociedade. O território, nestes termos, é também protagonista das possibilidades que podem levar a uma consciência universal, proposta por Milton Santos em “Por uma outra globalização”. Há um distanciamento das concepções de Milton Santos em relação aos trabalhos de Souza (1995), porém este autor também concorda com a ideia de que o espaço é anterior ao território.
O mundo contemporâneo encontra-se diante de um intenso processo de globalização/fragmentação do espaço, ao mesmo tempo em que vê emergirem movimentos nacionalistas e regionalistas de cunho separatistas que redefinem o sentido de região e, por conseguinte, o de território. O território passa a ter um valor não apenas relacionado ao enraizamento de um grupo ou até mesmo ao exercício do poder legitimado pelo uso da violência, mas também adquire um significado simbólico ou cultural que é expresso pelos vários grupos sociais que compõem o espaço em sua totalidade.

3. O QUILOMBO DE MENINO JESUS DE PITIMANDEUA

A história de formação do Quilombo de Pitimandeua se inicia com a presença de escravos libertos que buscavam refúgio e uma forma de sobrevivência a partir do trabalho familiar na agricultura, principalmente no plantio da mandioca para subsistência da população que passava a se aglomerar no vilarejo.
A Comunidade se autodenomina como Menino Jesus de Pitimandeua, uma referência à antiga fazenda Menino Jesus que deu origem a formação do Quilombo. Segundo relatos resgatados durante os trabalhos de campo, sete ex-escravos oriundos da região de Caraparú desceram pelo rio até as terras de Ana Maria Inês, uma portuguesa dona de uma grande extensão de terra, na qual existia um engenho de açúcar. Por volta de 1905, Ana Maria da Silva, sem descendentes, decide doar as terras para os sete ex-escravos. Tal doação foi uma forma de recompensá-los pelos serviços prestados.
O nome Pitimandeua surge do processo produtivo de farinha d´água, sobretudo de uma etapa da produção nos igarapés, onde a mandioca era posta no rio para amolecer e liberava um forte odor, chamado de pitiú da mandioca. Esta prática deu origem ao nome do rio Pitimandeua que passava pelas terras da fazenda Menino Jesus, logo, Pitimandeua significa lugar do pitiú, terra do pitiú. O nome da comunidade mescla então a nomenclatura da antiga propriedade Menino Jesus e a do Rio Pitimandeua.
Aos poucos a comunidade aumentou o contingente populacional e estabeleceu-se a vila de Pitimandeua, seguida pela vila de Itaboca, e mais recentemente a vila de São Pedro, ambas pertencendo ao mesmo terreno doado pela portuguesa e que hoje encontram-se em processo de reconhecimento pelo INCRA e certificação do ITERPA.
Os quilombos atravessaram gerações em toda história do Brasil, indicando a participação ativa da população negra na formação histórica e cultural da sociedade brasileira, destacando as identidades construídas a partir das lutas travadas no âmbito da cultura, da religião e da economia rural. Essas lutas apontam para os movimentos reivindicatórios que continuaram até nossos dias, exigindo do estado e da sociedade civil maior visibilidade às populações quilombolas (MOURA, 2001).
De acordo com Leite (2010, p.18), a invisibilidade dos grupos rurais negros no Brasil é a expressão máxima da ordem jurídica hegemônica e também expõe uma forma de violência simbólica. Sua característica principal é a criminalização daqueles que lutam para permanecer em suas terras.
Como bem demonstrou Foucault (1999), a violência não é uma invariante ou um objeto natural, mas uma espécie de significante sempre aberto para receber novos significados. Daí a necessidade de, antes de tudo, contextualizar, produzir referências, descrever percursos e experiências que foram guardadas nas memórias orais dos grupos, expor fatos que não se encontram nos documentos escritos, no mundo dos papéis, em cartórios ou em bibliotecas quando se pretende abordar a violência.
Estudos e mobilizações políticas de remanescentes de quilombo trazem para o primeiro plano dos debates a reivindicação dos direitos fundamentais da população negra brasileira. Desde a década de 1980 o debate sobre a questão quilombola entrou no cenário político nacional e culminou, no ano de 1988, com os quilombos tornando-se matéria constitucional (MOURA, 2001).
Os quilombos no Brasil, existentes desde o século XVI, são uma demonstração de resistência sócio-política e cultural. A maioria das comunidades estão situadas em áreas rurais de difícil acesso, muitas ainda sem energia elétrica e água tratada ou acesso às políticas públicas básicas como educação, saúde, transporte. Habitar e cultivar a terra nos interiores de todas as regiões do Brasil foi uma das estratégias de sobrevivência dos povos quilombolas. Viver em territórios longe dos centros políticos administrativos, “capital”, “província”, de modo a dar continuidade à sua existência.
A educação quilombola é compreendida como um processo amplo - que inclui a família, a convivência com os outros, as relações de trabalho e com o sagrado e as vivências nas escolas, nos movimentos sociais e em outras organizações da comunidade. Assim, compreende-se a educação como um processo que faz parte da humanidade e está presente em toda e qualquer sociedade, sendo a escolarização um recorte do processo educativo mais amplo (MOURA, 2001).
Para Leite (2010) o conceito de identidade social dá espaço para o reconhecimento das instâncias organizativas dos grupos que se autoreconhecem a partir de noções de pertenças construídas e legitimadas no interior dos próprios grupos, embora decorrentes de dinâmicas e forças sociais em movimento. Assim, a autora ressalta que o direito intitulado “quilombola” emerge no cenário de redemocratização do país como um dos vetores representativos de grupos até então invisíveis no cenário político nacional. Ou seja, emerge como reivindicação de grupos que não tinham espaço de mobilização, situação esta comum após duas décadas de regime militar. O que não quer dizer falsificados ou ancorados em premissas infundadas. Se assim fosse estaríamos desconsiderando todos os fundamentos que instituem o social e os próprios Estados-Nação não teriam qualquer base de sustentação como organizações humanas criadas com autênticos propósitos políticos e sociais.
Imagem 1 – Entrada da Comunidade Menino Jesus de Pitimandeua

A imagem acima apresenta a entrada da Comunidade de Menino Jesus de Pitimandeua é importante destacar no detalhe a imagem de nossa senhora de Nazaré na Praça que fica centralizada na vila. Esta imagem deixa bem explícita a relação de poder que a igreja católica tem sobre os moradores e sobre o quilombo de maneira geral.  Hoje um dos grandes desafios para o reconhecimento total da ancestralidade é questão religiosa. Pois, a religião de matriz africana ainda é tida como marginal pela própria população que é predominantemente católica.
No que tange a Amazônia, os remanescentes quilombolas persistem na busca pelo reconhecimento de suas terras junto ao INCRA e ao ITERPA, pois a titulação não só os dá uma legitimidade aos olhos do estado, mas também possibilitam a aplicação de investimentos do governo federal para a produção de subsistência. Nesse sentido, é importante defender o uso coletivo da terra considerando que muitas comunidades interidnte enfrentam problemas em relação a espaços de utilização para o trabalho enquanto reprodução da via campesina.
Destaca-se que,

As histórias dos grupos negros rurais guardam narrativas de conflitos que advém da primeira República. Conflitos que nunca foram tratados do ponto de vista social, mas como meros casos de polícia. O tratamento dispensado a estes nas primeiras décadas após a abolição do trabalho escravo em 1888 assemelhou-se aos métodos utilizados com os praticantes da capoeira e do candomblé: a penalidade, a repressão policial, a condenação. A criminalização de certas práticas e grupos é a forma mais comumente usada para transformá-los em “foras da lei”, justificando com isto a sua exclusão social pela via da condenação penal. É desde esse lugar que muitas lideranças de grupos negros passaram a ser cassados, encurralados e banidos (LEITE, 2010, p. 30).

Historicamente os grupos negros no Brasil sempre conviveram com as adversidades que envolvem preconceito, exclusão, precariedade e repressão. Na atualidade, o negro ainda ocupa a maior parte do sistema carcerário do Brasil, também ocupa as favelas e periferias das cidades; no campo enfrenta conflitos de ordens territoriais envolvendo posseiros e grileiros.
Os quilombos representam uma herança histórica e um movimento de resistência de uma identidade e cultura que, mesmo subjugada e perseguida, permaneceu como elo do Brasil com a África. São comunidades que estão localizadas em zonas rurais distantes dos centros urbanos e de acesso precário, o que hoje se destaca como um dos fatores que torna a educação problemática nesses lugares. Além disso, carecem de políticas públicas em diversas áreas, incluindo serviços de saúde, infraestrutura de transportes, telecomunicações, saneamento básico, tratamento de água potável, dentre outros.
Quando se enfocam questões referentes à estruturação de serviços básicos e a noção de desenvolvimento destas comunidades, prevalecem as intervenções que se apresentam como modelos civilizatórios, passando por cima das características peculiares das regiões onde os quilombos se encontram. Assim, mecanismos de mercado e de um projeto neoliberal são postos como teoria política em que os primeiros utilizam a terra como uma mercadoria, limitando as ações de coletividade-plantio-colheita-subsistência. Daí a necessidade de demarcação e titulação das terras para possibilitar de modo efetivo o estabelecimento de um modelo endógeno de desenvolvimento que considere as práticas do bem viver.
De acordo com Lander (2005),

[...]. Essas dificuldades devem-se, em larga medida, ao fato de que o neoliberalismo é debatido e combatido como uma teoria econômica, quando na realidade deve ser compreendido como o discurso hegemônico de um modelo civilizatório, isto é, como uma extraordinária síntese dos pressupostos e dos valores básicos da sociedade liberal moderna no que diz respeito ao ser humano, riqueza, natureza, história, ao progresso, ao conhecimento e boa vida. As alternativas propostas aos neoliberais e ao modelo de vida que representam não podem ser buscadas em outros modelos ou teorias no campo da economia, visto que a própria economia como disciplina científica assume, em sua essência, a visão de mundo liberal (LANDER, 2005, p.08).

O conhecimento empírico da comunidade acerca dos recursos da floresta é essencial para a garantia da preservação da natureza pelos quilombolas de Pitimandeua. A comunidade utiliza os igarapés para a reprodução das sociabilidades, seja durante o horário em que as mulheres se reúnem para lavar as roupas e louças da casa, seja no encontro dos jovens durante as tardes para o lazer. Há também o respeito mítico em relação aos igarapés e o horário de banho neles é respeitado pela comunidade, ou seja, ao meio dia e a partir das 18h poucos se arriscam a mergulhar no igarapé e quando se arriscam pedem licença à natureza. Além disso, os moradores mais antigos utilizam ervas medicinais para a cura de problemas de saúde, uma tradição que passava de pai para filho e que vem se perdendo devido às influências da modernidade-colonialidade que atingem cada vez mais o quilombo.

4. CONFITOS PELO USO DO TERRITÓRIO NO QUILOMBO DE PITIMANDEUA

Quando nos referirmos ao Quilombo, corriqueiramente, em um primeiro momento, vêm a ideia de encontrar os elementos culturais e simbólicos essenciais de resistência dos escravos, como o batuque do tambor, o terreiro do candomblé, a capoeira e as danças africanas, bem como, o valor a estes símbolos e o autoreconhecimento do sujeito enquanto descendente de seres humanos que foram escravizados.
Longe desta afirmativa, hoje no Nordeste do Pará, as Comunidades Remanescentes Quilombolas são predominantemente católicas, assim como Pitimandeua, e neste aspecto a igreja tem uma forte influência política, econômica e cultural sobre o Quilombo. Nesse sentido, há uma rejeição em relação à religião de matriz africana que é realizada de forma marginal, e, portanto, este fato, inaugura o primeiro conflito interno que o Quilombo enfrenta, ou seja, a negação da sua própria história a partir da catequização realizada pela Igreja Católica.
O desafio das Ciências Sociais é desconstruir a colonialidade do saber. Porto-Gonçalves (2005) nos revela que, para além do legado de desigualdade e injustiça sociais profundos do colonialismo e do imperialismo, já assinalados pela teoria da dependência dentre outras, há um legado epistemológico do eurocentrismo que nos impede de compreender o mundo a partir do próprio mundo em que vivemos e das epistemes que lhes são próprias.  Negar a epistemologia do sujeito é negar sua própria origem enquanto sujeito, algo que não se apresenta apenas nas teorias que são incorporadas a partir da imposição colonizadora do conhecimento científico produzido pelo centro, mas também pelas formas de estudo do tema e pelo desconhecimento da necessidade de se buscar teorias alternativas a partir do Sul.
A Igreja Católica coordena também a festividade religiosa do Círio de Pitimandeua que ocorre durante o segundo domingo de novembro de todos os anos, se destacando enquanto o quarto Círio mais antigo do Pará com vinte e dois anos de existência, ficando atrás dos Círios de Belém, Vigia de Nazaré e Bragança respectivamente. Somando-se a isso, a igreja também conta com terras dentro da comunidade intituladas de “terras da Santa”. Este breve comentário demonstra um pouco do poder civilizatório que a Igreja católica impõe sobre os Quilombos.
A formação do Quilombo de Pitimandeua, como já ressaltado, se deu a partir da aglomeração de negros na fazenda Menino Jesus e, durante todo o período de existência de Pitimandeua, a comunidade comercializava o excedente de seus produtos agrícolas com comerciantes de Castanhal e Belém, ou dirigiam-se eles próprios paras as feiras livres nestas cidades, a fim decomercializarem a farinha produzida nos retiros da comunidade, também chamados de casa de farinha. Essa relação constrói um forte laço de solidariedade entre os quilombolas ao mesmo tempo em que cria possibilidade de autonomia.
Como destaca Nascimento (1980, p.32),

Quilombo é um movimento amplo e permanente que se caracteriza pelas seguintes dimensões: vivência de povos africanos que se recusavam à submissão, à exploração, à violência do sistema colonial e do escravismo; formas associativas que se criavam em florestas de difícil acesso, com defesa e organização sócio-econômico-política própria; sustentação da continuidade africana através de genuínos grupos de resistência política e cultural.

Estas características que definem o Quilombo necessitam de um resgate pleno e constante a partir das comunidades, ou seja, esse resgate torna-se uma estratégia para garantir os direitos de uso da terra pelos povos remanescentes. Fortalecendo inclusive o processo de desapropriação dos latifúndios em torno das áreas de presença dos povos negros quilombolas do Pará.
Em Pitimandeua, o território quilombola é cercado por grandes fazendas ou grandes latifúndios que utilizam as cercas como forma de demarcação de suas terras.A paisagem da estrada que dá acesso à comunidade destaca a presença do latifúndio em que se observa a quase ausência de gado, caracterizando-se muito mais enquanto um latifúndio improdutivo.
As cercas limitam a agricultura familiar ou a roça para o plantio de mandioca, arroz, milho, feijão da colônia, cacau, macaxeira, dentre outros. Simultaneamente, ainda estimulam o êxodo rural, provocando a diminuição do número de famílias que habitam o Quilombo.Atualmente, Pitimandeua conta coma presença de 44 grupos familiares, sendo no passado constituída por uma quantidade de habitantes muito maior. Um dos fatores que explicam tal redução populacional é justamente a falta de terra para trabalhar.
O Quilombo de Pitimandeua diminuiu em extensão territorial por conta da venda de terras. Alguns descendentes dos sete ex-escravos que foram para a região, com certo tempo, venderam para fazendeiros os territórios em que viviam com suas famílias. Este fato contraditório decorreu principalmente do pouco esclarecimento quanto à importância do autoreconhecimento quilombola, pois na época os moradores eram leigos em relação ao assunto, o que foi aproveitado por fazendeiros e implicou na compra de pedaços de terra e na formação das fazendas que cercam a comunidade.
Imagem 2 – Fazenda no entorno da estrada que dá acesso à Pitimandeua.

A imagem destaca uma das fazendas que está sobre o entorno de Pitimandeua, ou seja, para se ter acesso ao quilombo é necessário passar por uma estrada que está cercada por terras improdutivas, pois se verifica também que são fazendas que tem uma função especulativa da terra. Essas terras são reivindicadas pelos quilombolas e estão em processo de discussão com o ITERPA e com o governo do estado do Pará para devida desapropriação e indenização de seus atuais donos, onde o destino final será o uso coletivo através do título coletivo da terra.
Para Santos (2001, p.19),

Por território entende-se geralmente a extensão apropriada e usada. Mas o sentido da palavra territorialidade como sinônimo de pertencer àquilo que nos pertence [...] esse sentimento de exclusividade e limite ultrapassa a raça humana e prescinde da existência de Estado. Assim, essa ideia de territorialidades se estende aos próprios animais, como sinônimo de área de vivência e de reprodução. Mas a territorialidade humana pressupõe também a preocupação com o destino, a construção do futuro, o que, entre os seres vivos, é privilégio do homem.

Esta interpretação acima a partir da perspectiva do território usado é a que neste ensaio trata a vivência no Quilombo, pois o território usado marca as contradições e os conflitos que envolvem a questão da terra. Por outro lado, também é oportunidade para se pensar um uso sustentável da terra, pois a terra tem um valor simbólico para os povos remanescentes quilombolas.
A terra é usada pelos quilombolas que dependem da floresta para a caça, extrativismo da castanha, cacau, açaí, cupuaçu, dentre outros. Também a terra se transforma em roça para o plantio de mandioca utilizada na produção de farinha, milho, banana e arroz, e fechando esse ciclo tem os igarapés onde se realizam a pesca, ou seja, são formas de uso do território quilombola. Mas, com a presença das áreas de fazendas esse uso fica limitado a poucas famílias.
Santos (2001) impõem a noção de “espaço territorial”: um Estado, um espaço, mesmo que as “nações” sejam muitas. Esse espaço territorial está sujeito a transformações sucessivas, mas em qualquer momento os termos da equação permanecem os mesmos: uma ou mais nações, um Estado, um espaço.
Portanto,

O que interessa discutir, então, é o território usado, sinônimo de espaço geográfico. E essa categoria, território usado, aponta para a necessidade de um esforço destinado a analisar sistematicamente a constituição do território. Como se trata de uma proposta totalmente empiricizável, segue-se daí o enriquecimento da teoria (SANTOS, 2001, p. 21).

Os conflitos que se estabelecem no Quilombo são justamente em função do uso da terra, ou seja, poucas famílias têm terras para cultivar. Esta questão só será resolvida mediante as ações do ITERPA e do Ministério Público sobre o Estado, onde o último deve desapropriar as fazendas considerando dois tipos de titulação: a) conceder o título individual para os que têm a terra a partir da herança dos fundadores da comunidade e b) desapropriar e indenizar os fazendeiros, devolvendo e redistribuindo a terra à Comunidade Quilombola de Pitimandeua.
Portanto, a reprodução das relações de trabalho no Quilombo depende do habitar, do cultivar e do viver o lugar. A valorização da história de formação e resistência dos Quilombolas perpassa por elementos políticos, econômicos e simbólicos atribuídos a terra, significando liberdade, resistência e reprodução social. Desse modo, o seu uso é a garantia de territorialidade, da constituição do território quilombola na Amazônia paraense.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

As comunidades remanescentes quilombolas no Pará, como foi apresentando neste ensaio a partir do Quilombo Menino Jesus de Pitimandeua, enfrentam grandes dificuldades de acesso a terra e, por conseguinte, dificuldades também de manutenção de seus territórios para a coletividade do trabalho no campo. Sendo assim, pode-se dizer que o Quilombo, por se tratar de uma ocupação histórica que diz respeito aos movimentos de lutas e de resistências das identidades negras no Brasil, representa a expressão materializada da possibilidade de um modelo autônomo de desenvolvimento.
Com efeito, os conflitos internos em Pitimandeua tornam-se uma ameaça ao processo de titulação e o seu uso coletivo, considerando as dificuldades de se chegar a um acordo entre os moradores, por isso, a solução é a titulação individual para quem tem terra e é da comunidade e a titulação coletiva a partir das desapropriações as fazendas no território Quilombola.
Além disso, o uso do território de formas divergentes entre fazendeiros e quilombolas constitui outro conflito que precisa ser resolvido, pois as fazendas ocupam grande parte do território, são utilizadas para a especulação e pecuária,limitando o uso do território em relação às atividades sustentáveis realizadas pelos remanescentes.
Por fim, há de se considerar o papel preponderante que os quilombolas desempenham na preservação dos recursos naturais, não significando, porém, que não há risco de problemas ambientais, pois a agricultura itinerante e a produção do carvão vegetal são questões problemáticas na comunidade. Todavia, é preciso reconhecer o valor atribuído à natureza.
Portanto, a titulação da terra a partir das desocupações das fazendas é a única forma de se resolver os conflitos pelo uso do território em Pitimandeua, caso contrário, a comunidade continuará a sofrer com a expansão do latifúndio, dificultando o acesso a terra e o uso do território como possibilidades de direitos e de reprodução social, cultural, econômica e política.

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* Geógrafo, Doutor em Desenvolvimento Sustentável do Trópico Úmido (NAEA/UFPA).
** Graduanda em Geografia (UEPA), Bolsista de Iniciação Científica (PIBIC – CNPq) e integrante do Grupo de Pesquisa Territorialização Camponesa na Amazônia (GPTECA).
*** Graduanda em Geografia (UEPA), Bolsista do Grupo de Pesquisa NECAPS/UEPA.
1 Instituto de Colonização e Reforma Agrária. Este órgão é responsável pelo levantamento de dados sobre terras indígenas e Quilombolas no território da união.
2 Instituto de Terras do Pará. Faz o reconhecimento das áreas que estão sob a jurisdição do estado do Pará.


Recibido: 05/01/2018 Aceptado: 11/01/2018 Publicado: Enero de 2018

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