Revista: CCCSS Contribuciones a las Ciencias Sociales
ISSN: 1988-7833


A RESPONSABILIDADE CIVIL EM DECORRÊNCIA DE DANO MORAL PRATICADO CONTRA O NASCITURO: ANÁLISE DE CASO REAL AMPARADO NAS LEGISLAÇÕES BRASILEIRA E ARGENTINA

Autores e infomación del artículo

Jociane Machiavelli Oufella *

Levi Hülse **

Adelcio Machado dos Santos ***

PPCJ/UNIVALI, Brasil

direito@uniarp.edu.br.

RESUMO
O presente trabalho aborda a possibilidade de indenização por dano moral em decorrência de ilícito praticado contra o nascituro. Por nascituro entende-se o ente já gerado e que está por nascer, sendo protegido e tutelado, tendo seus direitos resguardados até que se concretizem com seu nascimento com vida. No que tange ao nascituro a República Federativa do Brasil adota a teoria natalista, enquanto que a República da Argentina adota a teoria concepcionita, certo é que ambos enquanto signatários do Pacto de São José da Costa Rica precisam resguardar a vida do nascituro e em consequência os demais direitos que dela decorrem. O dano moral que se refere aos atos que ferem a integridade moral do indivíduo, a sua imagem, transtornos psicológicos, danos físicos e perda de ente querido, sem que isso implique necessariamente na diminuição do seu patrimônio também possuem previsão legislativa para sua reparação. Em analise de caso real se vislumbrará a possibilidade de indenização por danos morais causado ao nascituro, garantindo assim a dignidade da pessoa humana, dignidade esta que precisa ser garantida ao ser humano desde o momento de sua concepção.
PALAVRAS-CHAVE: Nascituro – Direito Civil – Direito Civil Argentino – Dano Moral

ABSTRACT

The present paper deals with the possibility of compensation for moral damages as a result of unlawful practices against the unborn child. By unborn is understood the entity already generated and that is unborn, being protected and protected, having their rights protected until they materialize with their birth alive. Regarding the unborn child, the Federative Republic of Brazil adopts the natalist theory, while the Republic of Argentina adopts the concepcionita theory, certain that both as signatories of the Pact of San José of Costa Rica need to protect the life of the unborn child and consequently the Other rights arising from it. The moral damage that refers to acts that damage the moral integrity of the individual, his image, psychological disorders, physical damage and loss of loved one, without this necessarily implying in the decrease of his patrimony also have legislative forecast for its repair. In a real case analysis, the possibility of compensation for moral damages caused to the unborn child will be envisaged, thus guaranteeing the dignity of the human person, a dignity that must be guaranteed to the human being from the moment of conception.

KEYWORDS: Nascituro - Civil Law - Argentine Civil Law - Moral Damage

Resumen: El presente trabajo aborda la posibilidad de indemnización por daño moral en consecuencia de ilícito practicado contra el no nacido. Por nacturo se entiende el ente ya generado y que está por nacer, siendo protegido y tutelado, teniendo sus derechos resguardados hasta que se concreten con su nacimiento con vida. En lo que atañe al nacer la República Federativa del Brasil adopta la teoría navideña, mientras que la República de Argentina adopta la teoría concepcionita, es cierto que ambos como signatarios del Pacto de San José de Costa Rica necesitan resguardar la vida del no nacido y, otros derechos que de ella se derivan. El daño moral que se refiere a los actos que hieren la integridad moral del individuo, su imagen, trastornos psicológicos, daños físicos y pérdida de ser querido, sin que ello implique necesariamente en la disminución de su patrimonio también poseen previsión legislativa para su reparación. En el análisis de caso real se vislumbrará la posibilidad de indemnización por daños morales causado al nacer, garantizando así la dignidad de la persona humana, dignidad ésta que necesita ser garantizada al ser humano desde el momento de su concepción.

PALABRAS CLAVE: Nacimiento - Derecho Civil - Derecho Civil Argentino - Daño Moral


Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Jociane Machiavelli Oufella, Levi Hülse y Adelcio Machado dos Santos (2017): “A responsabilidade civil em decorrência de dano moral praticado contra o nascituro: análise de caso real amparado nas legislações brasileira e Argentina”, Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, (octubre-diciembre 2017). En línea:
http://www.eumed.net/rev/cccss/2017/04/responsabilidade-civil.html

http://hdl.handle.net/20.500.11763/cccss1704responsabilidade-civil


INTRODUÇÃO

O presente artigo procura analisar e discorrer sobre a possibilidade de responsabilização civil em decorrência de atos ilícitos, basicamente na esfera moral, praticados contra o nascituro.
Ao nascituro se garante o direito fundamental a vida, e este direito no âmbito  internacional, está previsto na Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada em 10 de dezembro de 1948  em Paris, que em seu Articulo III dispõe:   “Todas as pessoas têm direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.” Posteriormente se estabelece na Convenção Interamericana dos Direitos Humanos, conhecida como Pacto de São José da Costa Rica, instrumento firmado e ratificado  pelo Brasil e também Argentina, em seu artigo 4º, inciso 1,  que: “Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida.  Esse direito deve ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente.” Em decorrência do direito a vida tem-se os demais direitos da personalidade resguardados, como a honra, imagem, entre outros.
Sabe-se que o homem é um ser que necessita da vida em sociedade e em decorrência desta necessidade disciplinou-se a sua forma de convivência, positivando quais condutas são ou não permitidas ao ser humano para que haja uma convivência harmoniosa.
A partir do momento que o homem pratica atos contrários ao ordenamento jurídico estamos diante de um ato ilícito. O ato ilícito gera como consequência, na esfera civil, o dever de indenizar, a noção de indenização está vinculada à noção de responsabilidade civil.
Por responsabilidade civil entende-se a ideia de segurança ou garantia de restituição ou compensação do bem sacrificado. Teria, assim, o significado de recomposição, de obrigação de restituir ou ressarcimento. A responsabilidade civil pode ser originária de dolo ou culpa. No dolo verifica-se a intenção do agente na prática do ato ilícito. Já quando nos referimos à culpa, estamos tratando de negligencia, imprudência ou imperícia do agente, que sem intenção acaba por lesionar outrem, sendo então obrigado a ressarcir o dano causado.
O presente artigo questiona se o ato ilícito, vinculado principalmente a questões não patrimoniais, praticado contra o nascituro é passível de indenização? Seria o nascituro parte legitima para estar figurando como sujeito ativo em uma ação de indenização por danos morais?
Assim o objetivo geral do presente artigo refere-se a demonstrar a existência da responsabilidade civil por dano moral praticada contra o nascituro, e como objetivos específicos o estudo do nascituro e as doutrinas que visam explicar sua existência e possibilidade de fixação de seus direitos; verificando o instituto da responsabilidade civil, analisando através de caso real ocorrido no Brasil a possibilidade do nascituro ser sujeito ativo de ação de indenização oriunda de dano moral.
Mesmo sendo o nascituro uma pessoa por nascer, sua dignidade deve ser respeitada, desde o momento de sua concepção, uma vez que estamos tratando de um novo ser que está por nascer.

  1. CONCEITO DE NASCITURO – PERSONA POR NASCER

 

O que há de vir ao mundo já estando concebido, mas cujo nascimento ainda não ocorreu refere-se a terminologia de nascituro.( PUSSI, 2008)
Quer designar, ainda, com expressividade, o embrião [venter, embrio, foetus], que vem sendo gerado ou concebido, não tendo surgido ainda à luz como ente apto [vitalis], na ordem fisiológica. Sua existência é intra-uterina [pars viscerum matris], no ventre materno [in uterus], adstrita a esta contingência até que dele se separe, sendo irrelevante se por morte natural ou artificial, concretizando-se o nascimento com vida, existência independente e extrauterina para aquisição do atributo jurídico de pessoa.( MAIA, 1980)
Partindo da analise do Direito Civil Brasileiro tem-se que nascituro é um ente já concebido que se distingue de todo aquele que não foi ainda concebido e que poderá ser sujeito de direito no futuro, dependendo do nascimento, tratando-se assim de prole eventual. (VENOSA, 2005)
Refere-se a um sujeito despersonificado humano, os sujeitos despersonificados podem ser humanos ou não-humanos. O homem e a mulher enquanto estivessem em gestação no útero materno, já seriam sujeitos de direitos, embora ainda não pessoas. O Código Civil Brasileiro estabelece que a personalidade civil começa do nascimento com vida, porém a lei resguarda desde a concepção os direitos do nascituro, significando dizer que antes do nascimento com vida, homem e mulher não possuem personalidade, mas já são considerados sujeitos de direitos. (COELHO, 2009).
A situação de prole eventual remete à ideia de direito eventual, o qual é um direito em mera situação de potencialidade, de eventualidade, atribuído neste sentido àquele que ainda não foi concebido. (VENOSA, 2005).
Segundo o Código Civil Brasileiro, Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002, a  proteção que a Lei confere ao que está por nascer tem importantes desdobramentos jurídicos, como na situação em que morre o pai quando o filho já se encontra em gestação no útero da mãe, o nascituro vai ser o sucessor, ao menos se este nascer com vida; pois embora referido Código traga a previsão de que a personalidade jurídica do homem inicia do nascimento com vida, a lei põe a salvo desde a concepção os direitos do nascituro.
A expressão da linguagem jurídica brasileira nascituro é comumente utilizada para indicar apenas o ser concebido, durante o tempo em se encontra no seio materno, que o acolhe e o protege. Sendo fiel ao sentido que se lhe dá a língua latina, para indicar aquele que vai nascer.( BERTI, 2008).
Se o nascituro vier a nascer morto este é chamado de natimorto, e na esfera sucessória este não é considerado sujeito de direito, não se tornaria sucessor, deixando de concorrer à herança, a condição para que o nascituro seja sujeito de direito, isto é, tenha seus direitos legalmente protegidos, é a de que venha a nascer com vida. Se falecer antes de cumprida essa condição, não será considerado sujeito de direito pela lei brasileira. Em outros termos, para que o nascituro vingue como pessoa, ou seja, nasça com vida e, consequentemente adquira personalidade jurídica.( COELHO, 2009, p. 145).
Uma das condições para que o nascituro seja sujeito de direito, é que este venha a nascer com vida. Para o direito brasileiro, já é suficiente se o nascituro nascer somente com um sopro de vida, apenas uma respiração, já teria resguardado direitos de ordem sucessória, sendo indiferente se o recém-nascido vai ou não gerar chances reais de evolução, tendo sobrevivido mesmo que por um segundo após o nascimento o nascituro irá preservar todos os direitos que ele já possuía antes de nascer, desde sua concepção. Isto é, receberá direitos de quem for sucessor e, se vier a falecer logo em seguida transmitirá a seus próprios sucessores. ( COELHO, 2009)
Sobre o tema Gagliano e Pamplona Filho (2007, p.122) ensinam que:
[...] o instante em que principia o funcionamento do aparelho cardiorrespiratório, clinicamente aferível pelo exame de docimasia hidrostática de Galeno, o recém-nascido adquire personalidade jurídica, tornando-se sujeito de direito, mesmo que venha a falecer minutos depois [...].
Analisando o conceito de nascituro na legislação Argentina tem-se que La existencia del ser humano y, por tanto, de la persona humana comienza en el momento mismo de la concepción, es decir, en el momento de la unión del ovocito con el espermatozoide. Desde ese momento se verifica la existencia de un “individuo” humano, titular de los derechos fundamentales, que en nuestro ordenamiento positivo recibe la denominación de “persona por nacer”. (LAFERRIÈRRE, 2010).
O Código Civil Argentino pode ser considerado como um dos códigos que melhor segue a tradição romanista e que, em consonância com esta tradição, traduziu de forma mais sólida a definição conceitual entre concebido e nascido, identifica o homem e pessoa e reconhece que o começo da existência da pessoa se perfaz no momento de sua concepção. A categoria de pessoa por nascer (nascituro) resulta em um aporte cientifico e jurídico que se consolidou e se incorporou nos debates atuais. (LAFERRIÈRRE, 2010).
O Novo Código Civil da República Argentina vigente desde agosto de 2015 manteve o momento da existência da pessoa, agregando a qualificação de “humana”, desde o momento de sua concepção assim como previa Vélez Sarfield seguindo a Teixeira de Freitas e ao Código prussiano, de modo que, o concebido é considerado pessoa humana para os efeitos do Código nos mesmos termos e com a mesma extensão, limitação e condição (nascimento com vida), que até a atualidade. Se reconhece ao nascituro ou pessoa por nascer, como sujeito de direitos, protegido pela legislação civil, passível de adquirir direitos e obrigações desde o momento de sua concepção. (CARAMELO, 2015).

A concepção que acontece no “seio materno” (conforme preceitua o artigo 63 do Código Civil Argentino) responde a coerência que o Código manteve com a Lei 26.743 que se refere a identidade de gênero.(CARAMELO, 2015)

 

  1. AS TEORIAS ADOTADAS SOBRE O NASCITURO

O Código Civil Brasileiro, Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002 dispõe em seu artigo  2ª  que a personalidade civil da pessoa começa com o nascimento com vida; mais a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro. (BRASIL, 2002).
Personalidade jurídica entende-se como a aptidão genérica para adquirir direitos e contrair obrigações ou deveres na ordem civil. É pressuposto para a inserção e atuação da pessoa na ordem jurídica [...] É qualidade jurídica que se revela como condição preliminar de todos os direitos e deveres.” (GONÇALVES, 2010, p. 70).
Desta forma, o inicio da personalidade jurídica do nascituro é objeto de grandes discussões e debates doutrinários no Brasil. A primeira corrente de juristas entende que o nascituro não é dotado de personalidade jurídica, tem apenas mera expectativa de direitos, pois está só começa a partir do nascimento com vida, teoria esta denominada como natalista.( RODRIGUES, 1997).
Por sua vez a teoria da personalidade condicionada sustenta que a personalidade começa a partir da concepção, mediante a condição suspensiva do nascimento com vida, que vindo a se concretizar, os efeitos da personalidade retroagem à data de sua concepção. (BOMTEMPO, 2015)
A teoria concepcionista parte do pressuposto que os direitos e obrigações do nascituro começam a partir da concepção,
O nosso Código Civil afastou essas hipóteses, que originavam incerteza, dúvidas, pois, no seu art. 2º, não contemplou os requisitos da viabilidade e forma humana, afirmando que a personalidade jurídica inicia-se do nascimento com vida, ainda que recém-nascido venha a falecer instantes depois. Nessa mesma linha estão o Código Civil suíço (art. 31); o português de 1966 (art. 66, I); o alemão (art. 1ª) e italiano (art. 1ª). (FREITAS, 2011, P. 45)
Embora existam estas e outras teorias, a adotada pelo ordenamento jurídico brasileiro é a natalista, ou seja, a personalidade civil só tem inicio com o nascimento com vida.
O nascituro não tem direitos propriamente ditos. Aquilo a que o próprio legislador denomina ‘direitos do nascituro’ não são direitos subjetivos. São na verdade, direitos objetivos, isso é, regras impostas pelo legislador para proteger um ser que tem potencialidade de ser pessoa e que, por já existir, pode ter resguardado eventuais direitos que virá a adquirir ao nascer.(FREITAS, 2011, P. 44)
Resta inequívoco que a teoria adotada no Brasil é a Natalista, onde só o nascimento com vida permite a aquisição de personalidade, em que o sujeito de direito pode adquirir e transmitir obrigações na esfera civil.
Por outro norte, como  visto no conceito de nascituro, o atual Código Civil Argentino, de agosto de 2015, manteve a existência da pessoa desde o momento da concepção, o concebido é considerado pessoa  humana para os efeitos do Código Civil e protegido pela legislação podendo adquirir direitos e contrair obrigações, amparado na chamada teoria concepcionista que prevê que o nascituro possui todos os direitos desde o momento de sua concepção.

  1. O INSTITUTO DA RESPONSABILIDADE CIVIL

 

Para discorrer sobre a possibilidade do nascituro receber indenização em decorrência de um ilícito, como por exemplo de um dano moral, necessário se faz o estudo do instituto da Responsabilidade Civil, o que se verá a seguir.
O homem é um ser que necessita da vida em sociedade, desde os primórdios da civilização o homem percebeu que não poderia viver sozinho, que necessitava de seu semelhante para os mais diversos atos da vida civil, realização de negócios jurídicos e até mesmo para simples companhia.
Da necessidade da vida em sociedade nasce para o homem os mais variados ramos de negócios jurídicos, e destes negócios jurídicos direitos e deveres a eles inerentes. Ocorre que, em determinadas situações os deveres não são cumpridos pelas partes, necessitando da proteção Constitucional, nascendo à chamada “RESPONSABILIDADE CIVIL”.
A palavra "responsabilidade", segundo o vocabulário jurídico origina-se do vocábulo responsável, do verbo responder, do latim respondere, que tem o significado de responsabilizar-se, vir garantindo, assegurar, assumir o pagamento do que se obrigou, ou do ato que praticou.
 O termo "civil" refere-se ao cidadão, assim considerado nas suas relações com os demais membros da sociedade, das quais resultam direitos a exigir e obrigações a cumprir.
  Diante dos conceitos acima mencionados, tem-se a conceituação de Carlos Roberto Gonçalves (2010, P. 23), para o assunto mencionando que a palavra
“responsabilidade” origina-se do latim respondere, que encerra a idéia de segurança ou garantia de restituição ou compensação do bem sacrificado. Teria, assim, o significado de recomposição, de obrigação de restituir ou ressarcir.
 Portanto, verifica-se a existência de requisitos essenciais para a apuração da responsabilidade civil, como a ação ou omissão, a culpa ou dolo do agente causador do dano e o nexo de causalidade existente entre ato praticado e o prejuízo dele decorrente.
 A Responsabilidade Civil como categoria jurídica que é, tem por escopo a análise da obrigação de alguém de reparar o dano que causou a outrem, com fundamento em normas de Direito Civil. Os alicerces jurídicos em que se sustenta a responsabilidade civil, para efeito de determinar a reparação do dano injustamente causado, são oriundos do direito romano, da impossibilidade de se lesar a terceiro.
O uso da expressão responsabilidade civil ganhou o mundo, não só porque a diferencia da responsabilidade criminal, mas também em razão de ser apurada no juízo cível. É, portanto, na esfera do Direito Civil, que se indaga, tramita, litiga e decide para que se exije a reparação civil, que vem a ser a sanção imposta ao agente ou responsável pelo dano.
De início o dano encontrava-se fora da esfera do direito, pois era reparado através da vingança privada. Depois, já tutelado juridicamente, através da Lei de Talião, onde o legislador intervém declarando a condição de retaliação por parte da vítima. Posteriormente, surge a composição a critério da vítima, subsistindo a forma de reintegração do dano sofrido (DIAS, 2006).
Sobre a evolução da Lei das XII Tábuas pode-se citar que:
este período sucede o da composição tarifada, imposto pela Lei das XII Tábuas, que fixava, em casos concretos, o valor da pena a ser paga pelo ofensor. É a reação contra a vingança privada, que é assim abolida e substituída pela composição obrigatória. Embora subsista o sistema do delito privado, nota-se, entretanto, a influência da inteligência social, compreendendo-se que a regulamentação dos conflitos não é somente uma questão entre particulares. A Lei das XII Tábuas, que determinou o quantum para a composição obrigatória, regulava casos concretos, sem um princípio geral fixador da responsabilidade civil. (LIMA, 1999, p. 21)  
Assim, o Estado assumiu a função de punir, o que fez nascer a ação de indenização. O que era antes então uma responsabilidade só, passou a ser dividida entre civil e penal, onde a indenização e a pena tornaram-se institutos separados. O principal objetivo da ordem jurídica passa a ser proteger o lícito e reprimir o ilícito.
A responsabilidade civil origina-se da agressão a um interesse particular, obrigando o infrator ao pagamento de uma compensação pecuniária para à vítima, nos casos em que não possa restituir a coisa no seu estado anterior. (GAGLIANO, 2007).
Carlos Gonçalves posiciona-se quanto à responsabilidade civil na teoria geral do direito:
a responsabilidade civil decorre de uma conduta voluntária violadora de um dever jurídico, isto é, da prática do ato jurídico, que pode ser lícito ou ilícito.  Ato jurídico é espécie de fato jurídico. Fato jurídico, em sentido amplo, é todo acontecimento da vida que o ordenamento jurídico considera relevante no campo do direito. O que não têm repercussão no mundo jurídico é apenas “fato”, dos quais não se ocupa o direito, por não serem “fatos jurídicos”. (GONÇALVES, 2007, P. 13) 
Embora possa parecer separada a responsabilidade jurídica da moral, isto é impossível, pois apesar de a responsabilidade moral ser muito mais ampla, considerando que onde se fere a moral pode não estar-se ferindo o direito, a responsabilidade jurídica é mais pontual, caracterizada pelo dano em si. (DIAS, 2006)
A responsabilidade civil significa a reparação do dano causado, seja ele material ou moral, pois todos os segmentos de um negócio jurídicos são suscetíveis de danos, gerando então a obrigação de repará-lo. A responsabilidade pressupõe uma atividade danosa ilícita que violando uma norma jurídica trás consigo o dever legal de indenizar. (GAGLIANO, 2007)
A atividade danosa ilícita prevista pelo doutrinador anteriormente citado está disciplinada na legislação civil brasileira:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 927. Aquele que por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. (BRASIL, 2002)
O doutrinador Silvio Venosa (2005, P. 537) faz a conceituação de ato ilícito nos seguintes termos:
se o agente dos negócios e atos jurídicos, por ação ou omissão, pratica ato contra o Direito, com ou sem intenção manifesta de prejudicar, mas ocasiona prejuízo, dano a outrem, estamos no campo dos atos ilícitos. O ato ilícito pode constituir-se de ato único, ou de série de atos, ou de conduta ilícita.
Tanto no dolo como na culpa, a vontade humana é predominante. Porém no dolo a conduta já nasce ilícita, ou seja, há a plena vontade do resultado antijurídico, então o resultado é decorrente da origem, já na culpa a conduta é lícita, porém o resultado é contrário à ordem jurídica pela falta de cuidado.( CAVALIERI FILHO, 2009)
Por sua vez o advento no novo Código Civil Argentino prevê em seu artigo 1.737:
Concepto de daño. Hay daño cuando se lesiona un derecho o un interés no reprobado por el ordenamiento jurídico, que tenga por objeto la persona, el patrimonio, o un derecho de incidencia colectiva.(ARGENTINA, 2014)
Nesse mesmo sentido, o artigo 1.738, o qual cita-se abaixo, inclui expressamente a perda de uma chance como modalidade autônoma de indenização. Apresentando um rol meramente exemplificativo de interesses passíveis de violação, considerados como legítimos, dentre os quais se encontra inclusive o projeto de vida.
ARTICULO 1738.- Indemnización. La indemnización comprende la pérdida o disminución del patrimonio de la víctima, el lucro cesante en el beneficio económico esperado de acuerdo a la probabilidad objetiva de su obtención y la pérdida de chances. Incluye especialmente las consecuencias de la violación de los derechos personalísimos de la víctima, de su integridad personal, su salud psicofísica, sus afecciones espirituales legítimas y las que resultan de la interferencia en su proyecto de vida.(ARGENTINA, 2014)
Já o artigo 1.739 aponta os requisitos indispensáveis para que o dano seja passível de indenização:
ARTICULO 1739.- Requisitos. Para la procedencia de la indemnización debe existir un perjuicio directo o indirecto, actual o futuro, cierto y subsistente. La pérdida de chance es indemnizable en la medida en que su contingencia sea razonable y guarde una adecuada relación de causalidad con el hecho generador. (ARGENTINA, 2014)
Desta forma verifica-se que seja na legislação civil Brasileira como na Argentina o ato praticado contrario a lei é considerado ilícito e seu causador será responsabilizado, ou seja, obrigado a reparar o dano. Esta reparação compreende os danos materiais, morais, perda de uma chance, lucros cessantes, ou seja, a reparação do dano deve ser plena.       

  1. A RESPONSABILIDADE CIVIL EM DECORRÊNCIA DE DANO MORAL PRATICADO CONTRA O NASCITURO

Com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em seu art.5º, incisos V e X, consolidou-se a indenização dos danos morais no sistema jurídico brasileiro. Assim, na ocorrência de um ato ilícito, o lesante não mais se restringe a efetuar o pagamento dos danos patrimoniais causados; entende-se devido também a indenização por dano moral, seja pelo sofrimento, por sequelas psicológicas sofridas.
Dano moral é o que atinge o ofendido como pessoa, não lesando seu patrimônio. É lesão de bem que integra os direitos da personalidade, como a honra, a dignidade, a intimidade, a imagem, o bom nome, etc., como se infere dos arts. 1, III e 5, V e X, da Constituição Federal, e que acarreta ao lesado dor, sofrimento, tristeza, vexame e humilhação. (GONÇALVES, 2010, p. 357)

O dano moral se refere aos atos que ferem a integridade moral do indivíduo, a sua imagem, transtornos psicológicos, danos físicos e perda de ente querido, sem que isso implique necessariamente na diminuição do seu patrimônio.

Maria Celina Bodin de Moraes (2004, p. 168), levando em consideração a cláusula geral de tutela da pessoa humana, afirma que 
[...] a unidade do ordenamento é dada pela tutela à pessoa humana e à sua dignidade, como já exposto; portanto, em sede de responsabilidade civil, e, mais especificamente, de dano moral, o objetivo a ser perseguido é oferecer a máxima garantia à pessoa humana, com prioridade, em toda e qualquer situação da vida social em que algum aspecto de sua personalidade esteja sob ameaça ou tenha sido lesado.

O dano moral apresenta conceituação mais desafiadora, pois enquanto parte da doutrina atrela o mesmo à experiências de dor, angústia e sofrimento, outros equivalem a sua ocorrência à lesão aos direitos da personalidade ou encontram o seu fundamento na violação da dignidade da pessoa humana, conforme inserida na cláusula geral de tutela da personalidade, inscrita nos seguintes artigos da Constituição Federal: (i) art. 1º, III (dignidade da pessoa humana como valor fundamental da República); (ii) art. 3º, III (igualdade substancial); e art. 5º, §2º (possibilidade de reconhecimento de novos direitos que não os previamente elencados na Constituição).

            O novo Código Civil Argentino traz a previsão expressa do dano moral em seu artigo 1.741 quando menciona sobre danos não patrimoniais:

ARTICULO 1741.- Indemnización de las consecuencias no patrimoniales. Está legitimado para reclamar la indemnización de las consecuencias no patrimoniales el damnificado directo. Si del hecho resulta su muerte o sufre gran discapacidad también tienen legitimación a título personal, según las circunstancias, los ascendientes, los descendientes, el cónyuge y quienes convivían con aquél recibiendo trato familiar ostensible.
La acción sólo se transmite a los sucesores universales del legitimado si es interpuesta por éste.
El monto de la indemnización debe fijarse ponderando las satisfacciones sustitutivas y compensatorias que pueden procurar las sumas reconocidas. (ARGENTINA, 2014)

            Resta claro e inequívoco que tanto a legislação civil brasileira como a argentina trazem a previsão da possibilidade de indenização do dano moral, aquele decorrente da dor e sofrimento oriundos do ilícito, sem que isso represente necessariamente diminuição do patrimônio da vitima.

  1. O DANO MORAL OCASIONADO CONTRA O NASCITURO: ANÁLISE DE CASO REAL

 

Passa-se a análise de situação real ocorrida no Brasil em 19 de setembro de 2011, quando em programa de televisão, apresentador teria se referido ao nascituro de determinada cantora com palavras de baixo calão.
Quando era apresentador do programa CQC, da rede Bandeirantes, Rafinha Bastos, ao ouvir o nome da cantora Wanessa Camargo, disse que "comeria ela e o bebê". Wanessa, na época, estava grávida. Ela, o bebê e o marido, o empresário Marco Buaiz, entraram com uma ação de dano moral com o objetivo de "punir o ofensor.
O Juiz, na Comarca de São Paulo, e posteriormente o Tribunal de Justiça de São Paulo julgou pela procedência da ação estabelecendo uma indenização de R$ 450 mil reais, R$ 150 mil reais para cada autor. O Tribunal de Justiça manteve a indenização, mas reduziu o valor em R$ 50 mil para cada impetrante.
Não concordando com a condenação o apresentador do programa, Rafinha Bastos, recorreu ao Superior Tribunal de Justiça, onde questionava a obrigação de indenizar e argumentava que não houve dano moral, já que Wanessa afirmou que não buscava compensação moral, mas apenas a "punição do ofensor". Caso não fosse aceito esse pleito, o humorista pedia a redução do valor fixado. 
Em julgamento pela 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, manteve-se a obrigação do humorista Rafinha Bastos de indenizar a cantora Wanessa Camargo por conta de uma piada. O Tribunal manteve a quantia em R$ 150 mil por considerar o comentário feito por Bastos "agressivo e grosseiro". O relator, ministro Marco Buzzi, considerou o comentário “reprovável, agressivo e grosseiro, sendo efetivamente causador de abalo moral”.
Outra questão que fora amplamente discutida pelo Superior Tribunal de Justiça diz respeito a ter ou não o nascituro legitimidade para estar em juízo pleiteando a indenização e em consequência possuir direito em receber tal indenização.
Para esclarecer a celeuma existente mostra-se de relevância fundamental citar voto de Desembargador que participou do julgamento do recurso de Apelação do presente caso:

Como se vê, trata-se de tema intimamente ligado ao momento em que um ser humano adquire personalidade jurídica, tornando-se uma pessoa para a ordem jurídica. Esta é, sem dúvida, uma das questões mais intrigantes do direito civil, que ainda está longe de atingir um consenso na doutrina e na jurisprudência.
Segundo Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (Novo Curso de Direito Civil, v. I: parte geral. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 83), existem três teorias fundamentais no Brasil sobre o momento de aquisição da personalidade jurídica. Pela teoria natalista, um ser humano só passa a ser considerado pessoa para a ordem jurídica a partir do nascimento com vida, de tal arte que o nascituro goza de mera expectativa de direito. Pela teoria da personalidade condicional, o nascituro possui direitos que ficam sob condição suspensiva, que só se consolidam em caso de nascimento com vida. E, pela teoria concepcionista, a personalidade jurídica é adquirida com a concepção, de modo que o nascituro já deve ser considerado pessoa.
Em sua primeira parte, o artigo 2º do CC leva a crer que foi adotada a teoria natalista (A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida…). Por outro lado, a segunda parte denota influência da teoria concepcionista, na medida em que a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.
Até aqui, podemos afirmar que a legislação dotou o nascituro, no mínimo, de capacidade de direito, que é a aptidão para ser sujeito em relações jurídicas de cunho patrimonial. Nessa toada, ele seria, pelo menos, um ente despersonalizado, como o condomínio e o espólio. Por conseguinte, teria capacidade de ser parte em processos.
Indo um pouco mais longe, dentro do que a ocasião permite, entendo que seria incoerente a lei considerar um ser humano ainda não nascido a um conjunto de bens como a herança jacente, deixando-o em situação mais desvantajosa do que as pessoas jurídicas, que gozam de direitos da personalidade compatíveis com a falta de estrutura biopsicológica (artigo 52 do CC). Nessa senda e levando-se em conta a Súmula nº 227/STJ, questiono: uma pessoa jurídica pode sofrer dano moral, mas um nascituro não?
A meu ver, essa discriminação não se coaduna com o que rezam a Constituição Federal, o Código Civil e outras normas legais contemporâneas, todas voltadas à valorização da pessoa humana. Além disso, como o artigo 2º do Código Reale dá espaço para mais de uma interpretação, não vejo motivo para adotar aquela que confere menos direitos a um ser humano, sendo oportuno lembrar o adágio benigna amplianda, odiosa restringenda e também a clássica lição de Carlos Maximiliano (Hermenêutica e aplicação do direito. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 136) vazada nos seguintes termos: Deve o Direito ser interpretado inteligentemente: não de modo que a ordem legal envolva um absurdo, prescreva inconveniências, vá ter a conclusões inconsistentes ou impossíveis.
Prosseguindo, se o nascituro só tivesse expectativa de direito, apenas direitos patrimoniais ou somente direitos existenciais, não seria possível dar uma explicação coerente para inúmeras situações como as mencionadas a seguir. Primeira, a proteção do Código Penal à vida do nascituro, no contexto dos crimes contra a pessoa, que tipifica diversas modalidades de aborto (artigos 124 a 128). Segunda, o disposto no artigo 7º do ECA (A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência) e no artigo 26, parágrafo único, da mesma lei (O reconhecimento [de filho havido fora do matrimônio] pode preceder o nascimento do filho ou suceder-lhe ao falecimento, se deixar descendentes). Terceira, os alimentos gravídicos, pagos pelo suposto pai para o bom desenvolvimento do bebê no ventre materno, conforme disciplinado na Lei nº 11.804/2008.
Mais e ainda, deve ser invocado o artigo 1º, item 2, da Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), que diz: Para efeitos desta Convenção, pessoa é todo ser humano. Apesar de este tratado não integrar o bloco de constitucionalidade, por não ter sido introduzido no direito brasileiro pelo procedimento do artigo 5º, § 3º, da CF, versa sobre direitos humanos, gozando, assim, de status supralegal. Ora, se uma mulher grávida carrega dentro de si um ente que já tem natureza humana e apenas se desenvolve ao longo da gestação, é inequívoco que ele é pessoa, ou seja, além de capacidade de direito, também tem personalidade jurídica, sendo apto a figurar tanto em relações de cunho patrimonial, quanto em relações de caráter existencial.
Diante disso, não resta dúvida de que o pequeno filho dos demais autores, que veio ao mundo durante o trâmite da lide, pode figurar no polo ativo processual desde sua vida intrauterina, ficando afastada a preliminar arguida pelo réu. Ademais, noto que o fato de o referido menor ter ou não sofrido dano moral é questão de mérito e somente oportunamente será analisada.( Brasil, Tribunal de Justiça de São Paulo, APELAÇÃO CÍVEL nº 0201838-05.2011.8.26.0100)

Para analisar a decisão dos Tribunais necessário discorrer sobre a dignidade da pessoa humana.A palavra dignidade, derivada do latim dignitas (virtude, honra, consideração) em regra se entende as qualidades morais, que, possuída por uma pessoa, serve de base ao próprio respeito em que é tida; compreende-se também como o procedimento próprio da pessoa, que merece tal conceito. (SANTOS, 1999)
A Constituição da República Federativa do Brasil, em seu artigo 1º, estabeleceu a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos para seu sistema constitucional. A preocupação com a promoção dos direitos humanos e da justiça social levou o constituinte a consagrar a dignidade da pessoa humana como valor nuclear da ordem constitucional. Sua essência é difícil de ser reduzida a palavras, mas tem incidência sobre uma infinidade de situações que não podem se elencar de antemão. (SARMENTO, 2000)
Já na República da Argentina, o respeito à dignidade da pessoa humana vêm tutelado no preâmbulo da Constituição Federal, na parte em que expressamente resguarda e assegura a todos os cidadãos nacionais o exercício pleno de suas liberdades enquanto cidadãos.
No ordenamento jurídico brasileiro, tamanha é a força deste princípio, que todas as decisões proferidas devem estar submetidas e em consonância com o princípio que tutela a dignidade da pessoa humana.
Pode ser identificado como sendo o principio de manifestação primeira dos valores constitucionais, por ser carregado de sentimentos e emoções. A doutrina diz ser impossível compreender esse principio apenas na esfera intelectual, pois como todos os outros princípios, este é vivenciado e experimentado no plano dos sentidos. (ROTHENBURG, 1999)
A dignidade da pessoa humana refere-se a um valor espiritual e moral de cada ser humano, manifestando-se na autodeterminação consciente e responsável da própria vida, devendo ser respeitado pelas demais pessoas. Nesse sentido esclarece Ingo Wolfgang Sarlet que em primeiro lugar, merece ser encarada de modo especial à luz do direito constitucional positivo, de que se revela no mínimo possível de discussão a qualificação do principio da dignidade da pessoa humana, considerando em si mesmo, como um autêntico direito fundamental autônomo, em que pese sua importante função, seja como elemento referencial para a aplicação e interpretação dos direitos fundamentais, seja na condição de fundamento, seja na condição de fundamento para a dedução de direitos fundamentais decorrentes.( SARLET, 2003)
            Do caso em análise verifica-se que tanto o Tribunal de Justiça como o Superior Tribunal de Justiça entendem cabível a fixação de indenização em favor do nascituro, amparados pelo princípio da dignidade da pessoa humana que reveste a pessoa com seu manto de proteção desde o momento de sua concepção, embora o Código Civil Brasileiro prevê em seu artigo 2º que a personalidade civil do homem inicia com o nascimento com vida, é claro que a lei resguarda desde a concepção os direitos do nascituro.
Não seria diferente na legislação Argentina, pois o novo Código Civil Argentino prevê em seu artigo 1.741 que a indenização decorrente de danos não patrimoniais deve ser requerida pela pessoa que sofreu diretamente o dano, no caso em tela resta claro e inequívoco o dano sofrido também pelo nascituro que deve ser reparado de forma plena.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pode-se afirmar sem sombra de dúvidas que a vida é o bem maior, tutelado e protegido desde a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, proteção que se manteve ou mesmo ampliou-se através da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, conhecido como Pacto de San José de Costa Rica, do qual o Brasil foi signatário e incorporou referida convenção em sua legislação interna através do Decreto nº 678 de 1992. Sem a vida nenhum outro direito poderia ser mencionado, discutido, tutelado, requerido, pois não haveria razão de existir.
O direito à vida é direito que se garante desde o momento da concepção, estando então o nascituro assegurado e garantido quanto a este direito nas legislações de todos os Estados Soberanos signatários dos tratados anteriormente citados. O que difere em regra é o início da personalidade jurídica do nascituro.
No que tange o início da personalidade jurídica do nascituro constatou-se a existência de três teorias que podem ser aplicadas, a teoria natalista que prevê que o nascituro somente é titular de direitos com o nascimento com vida, dentre os adeptos desta postura está o Brasil. Já a teoria da personalidade condicionada a qual considera que a personalidade começa a partir da concepção, mediante a condição suspensiva do nascimento com vida. Por fim a teoria concepcionista que prevê que o nascituro possui todos os direitos resguardados desde o momento de sua concepção possui como adepto o Estado da Argentina. Independente da teoria que adotam vislumbra-se a preocupação de resguardar direitos ao nascituro desde o momento da concepção, mesmo que tais direitos somente venham a se consumar após o nascimento com vida. Essa preocupação encontra guarida no princípio da dignidade da pessoa humana.
As diversas sociedades passaram a disciplinar e regulamentar a vida em sociedade, distinguindo os atos lícitos dos ilícitos. Os atos ilícitos podem ser praticados em decorrência da vontade do agente e por isso são chamados de atos dolosos, ou ainda podem ocorrer em decorrência da imprudência, negligência ou imperícia, chamando-se então de atos culposos. Em ambas as situações os atos praticados e que da relação de causalidade ocasionem danos à vítima geram a possibilidade de requerer indenização. A reparação do dano pode ocorrer nos casos de danos materiais onde o que fora atingido fere-se ao patrimônio da vitima, que possui seu patrimônio reduzido, ou ainda, a indenização pela dor, sofrimento, angústias, gerando assim o dano moral.
O dano moral busca reparar o sofrimento que atingiu a vitima, que teve seu psicológico abalado, sua personalidade, sua própria dignidade. E a dignidade de uma pessoa não inicia apenas com seu nascimento com vida, mas sim desde o momento de sua concepção.
O princípio da dignidade da pessoa humana ao qual se liga a ideia de democracia, como um dos fundamentos do Estado de Direito Democrático, torna-se o elemento essencial para a interpretação e aplicação das normas jurídicas. O ser humano não pode ser tratado como simples objeto, principalmente na condição de nascituro, momento em que se encontra mais debilitado e impossibilitado de exercer sua autodeterminação, de expressar sua própria vontade.
Desta forma verifica-se como positiva a decisão do Superior Tribunal de Justiça ao manter a indenização por danos morais em favor do nascituro, de forma a resguardar sua dignidade. O valor da dignidade da pessoa humana, o qual é resultado da distinção entre objeto e ser humano, o qual é dotado de razão e consciência, vincula-se às tradições passadas, na importância do próprio ser, devendo ser resguardado ao nascituro tal dignidade para que tenha o direito de nascer e adquirir todos os direitos que lhe são inerentes.

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* Doutoranda do Doutorado em Ciências Jurídicas da Pontificia Universidad Catolica da Argetina (Buenos Aires). Possui graduação em Direito pela Universidade do Oeste de Santa Catarina (1999) e Master em Direito Economia e Política - Università degli Studi di Padova (2000). Possui Pós Graduação em Direito Processual Civil pela Universidade do Contestado (2005). Atualmente é Coordenadora do Curso de Direito da UNIARP - Universidade Alto Vale do Rio do Peixe, professor titular da Universidade Alto Vale do Rio do Peixe- Caçador. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Internacional e Direito das Famílias e Sucessões. Advogada devidamente inscrita na OAB/SC militante nas áreas de Direito Internacional e Direito Civil. Email: direito@uniarp.edu.br.
** Doutorando em Ciência Jurídica pela Universidade do Vale do Itajaí- UNIVALI - SC, na área de concentração em Constitucionalismo, Transnacionalidade e Produção do Direito. Mestre em Ciência Jurídica pela UNIVALI. Graduado Bacharel em Direito pela Fundação Universidade Regional de Blumenau FURB (2010) e graduado em História pela Fundação Universidade Regional de Blumenau FURB (2006). Advogado com a OAB/SC 31.986. Professor na Universidade do Alto Vale do Rio do Peixe - UNIARP e na Universidade do Oeste de Santa Catarina - UNOESC. Editor da Revista Ponto de Vista Jurídico - UNIARP. Email: levi@uniarp.edu.br.
*** Doutor em Engenharia e Gestão do Conhecimento (UFSC). Docente e Pesquisador da Universidade Alto Vale do Rio do Peixe (Uniarp), nos Programas “Stricto Sensu” em Desenvolvimento e Sociedade e em Educação Básica. Advogado (OAB/SC nº 4912). Endereço: rua Prof. Egídio Ferreira, nº 271, Bloco “E”, Apto. 303 – 88090-699, Florianópolis (SC) Brasil. E-mail: adelciomachado@gmail.com

Recibido: 11/12/2017 Aceptado: 15/12/2017 Publicado: Diciembre de 2017

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