Revista: CCCSS Contribuciones a las Ciencias Sociales
ISSN: 1988-7833


O ACESSO AS POLÍTICAS PÚBLICAS POR POPULAÇÕES TRADICIONAIS NA GESTÃO DE UNIDADE DE CONSERVAÇÃO DE USO SUSTENTÁVEL: O CASO DAS RESERVAS EXTRATIVISTAS DA TERRA DO MEIO ALTAMIRA - PA

Autores e infomación del artículo

Francinaldo Ferreira de Lima*

Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia

naldobio@hotmail.com

RESUMO
A implementação de políticas públicas para comunidades tradicionais, que vivem em áreas geograficamente isoladas, tem sido um grande desafio na gestão de unidades de conservação de uso sustentável. Neste contexto, o objetivo desse trabalho é descrever como tem ocorrido processo de acesso às políticas públicas de educação e saúde, tendo como foco privilegiado a efetivação em duas Reservas Extrativistas da Terra do Meio, tendo como protagonistas os próprios moradores. Pretende-se com esse trabalho contribuir para o tema do envolvimento direto e protagonista dos moradores das Unidades de Conservação na gestão de seus territórios e de seus projetos de futuro, e de como devem ser constituídas políticas públicas adequadas à realidade tão complexas como essas. Essa descrição e análise serão baseadas em minha própria experiência como um dos atores desse processo e de outros atores diretamente envolvidos, a saber: a) - Lideranças moradoras das Resex, b) - representantes de organizações não governamentais, c) - gestores das unidades em questão; d) - representantes dos órgãos dos governos diretamente envolvidos com os processos em questão; e) - profissionais da saúde e educação que têm trabalhado nas Resex. Além disso, utilizam-se dados secundários e bibliografia pertinente com o tema. Observou-se que a ideia de criação das Reservas Extrativistas, além de garantir o reconhecimento do território tradicionalmente ocupado, gerou expectativa, de que imediatamente, aconteceria a melhoria da qualidade de vida dos moradores com a implantação de políticas públicas, como saúde e educação. A materialização dessas políticas não se deu de forma imediata nem espontânea. De forma que um processo de gestão do desenvolvimento da qualidade de vida dos moradores e do território, obviamente implicados, envolveu uma série de pequenas conquistas, desde os primeiros documentos, passando pela alfabetização de alguns, pelo processo de entendimento e de vivência do que significa e de como passa a existir de fato uma associação, da constituição de alianças e parcerias com diferentes atores, da conquista e aprendizado de gestão dos primeiros recursos e projetos, do gerenciamento e resolução dos conflitos internos da comunidade e de suas expectativas com a criação da Resex e da concomitante e vinculada chegada do Estado. Apesar dessas conquistas, nota-se que o grande desafio agora é moldar as políticas existentes para uma realidade local, valorizando o conjunto de conhecimentos tradicionais existentes e respeitando os modos de vida das populações. Portanto, o momento atual requer de todos os autores envolvidos, com a implementação dessas políticas, um cuidado especial para que não ocorra, ao contrário da expectativa inicial de melhoria das condições de saúde e educação, uma desintegração da cultura tradicional desses povos.
Palavras Chaves: Políticas Públicas, Unidades de conservação, Gestão.

 


Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Francinaldo Ferreira de Lima (2017): “O acesso as Políticas públicas por populações tradicionais na gestão de unidade de conservação de uso sustentável: o caso das Reservas Extrativistas da terra do meio Altamira - PA”, Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, (julio-septiembre 2017). En línea:
http://www.eumed.net/rev/cccss/2017/03/reservas-extrativistas.html

http://hdl.handle.net/20.500.11763/cccss1703reservas-extrativistas


 

1          INTRODUÇÃO
Num pais onde a diversidade étnica, racial e cultural é extremamente marcante, torna-se um enorme desafio estabelecer e implementar políticas públicas para melhoria da qualidade de vida da população, sobretudo das comunidades tradicionais, onde a grande maioria vive a margem da exclusão social. (Rodrigues et al, 2013).
Não diferente, os Beiradeiros da região conhecida como Terra do Meio, no interflúvio dos rios Xingu e Iriri, que atualmente vivem no interior dos limites das Resex do Iriri e Riozinho do Anfrísio, experimentaram, até a primeira metade da década de 2000, uma total ausência do Estado e tudo que isso implica. Ou seja, eles não existiam para o Estado brasileiro e o Estado brasileiro não existia para eles.
No início de 2000, a crescente invasão de madeireiros e grileiros em seu território, os levaram a procurar ajuda em movimentos sociais da região.
Assim, quando da criação das Reservas Extrativistas, marco inicial da presença do Estado, os moradores ansiavam pela garantia à permanência em seus territórios tradicionais, mas também por educação, saúde, comunicação, documentação, etc., sendo este um dos desafios da gestão das Unidades de Conservação de uso direto no Brasil, que é garantir as comunidades tradicionais, os seus direitos constitucionais e o acesso às políticas públicas diferenciadas.
Pretende-se, com esse artigo, contribuir para o tema do envolvimento direto e protagonista dos moradores das Unidades de Conservação na gestão de seus territórios, de seus projetos de futuro e de como são constituídas políticas públicas adequadas às realidades das Resex pesquisadas.
Das práticas metodológicas usadas neste estudo destacam-se: Primeiro a pesquisa documental, na forma de análise da documentação produzida no período temporal estudado, tendo como finalidade descrever e analisar como se deu o processo de conquista de políticas no campo da educação e saúde, pois são elementos que ajudam a esclarecer e detalhar esse processo. Em segundo lugar, utiliza-se a memória, enquanto pesquisador que tem envolvimento direto com o objeto da pesquisa. Para efeitos da análise, o recorte temporal compreende o início do ano 2008, momento em que essas políticas começam a chegar nas Resex, estendendo-se até o ano de 2014. Em terceiro lugar, utilizam-se as entrevistas abertas, sem uso de um questionário pré-elaborado, mas orientadas pelas questões que perpassam essa pesquisa, com o objetivo de descrever a percepção desses atores sobre os desafios para a implementação dessas políticas.
Os critérios de inclusão das Resex estudadas levaram em consideração o tempo de criação das mesmas, pois foram as duas primeiras criadas no mosaico de áreas protegidas da Terra do Meio. Além disso, escolheu-se a educação e a saúde como objeto de análise deste artigo por constituírem desde o primeiro momento pauta de reivindicação dos moradores. Num total foram entrevistadas 31 pessoas dos diferentes grupos de interesses.
2          AS RESEX DO IRIRI E DO RIOZINHO DO ANFRÍSIO
As duas Reservas Extrativistas alvo desta pesquisa são: A Resex Riozinho do Anfrísio (criada em 2004) e a Reserva Extrativista Rio Iriri (criada em 2006). Ambas estão localizadas no município de Altamira –PA, num mosaico de áreas protegidas, numa região denominada de Terra do Meio, conforme figura a seguir. Essa região recebe a denominação “Terra do Meio” devido sua localização está no interflúvio dos rios Xingu e Iriri.

A Terra do Meio é uma das regiões mais importantes para a conservação da sociobiodiversidade da Amazônia e foi palco de um dos maiores conflitos fundiários do Brasil. Pontes (2004) diz que a criação de unidades de conservação, na Terra do Meio, tem um papel de contribuir para melhor dimensionar a capacidade do Poder Público e da sociedade como um todo para promover ações de desenvolvimento sustentável e proteção da floresta amazônica.

2.1       A RESERVA EXTRATIVISTA RIOZINHO DO ANFRÍSIO

A Resex do Riozinho do Anfrísio foi criada por decreto presidencial, em 9 de Novembro de 2004, com base na Lei No 9.985, de 18 de julho de 2000. A Resex tem aproximadamente 736.340 ha.
Limita-se com o município de Rurópolis ao norte, com a Terra Indígena Cachoeira Seca a nordeste, com a Floresta Nacional do Trairão e Parque Nacional do Jamanxim (municípios de Itaituba e Trairão) a oeste, com o Rio Iriri e a Resex do Rio Iriri a leste, a Terra Indígena Xipaya a sudeste, e com a Floresta Nacional de Altamira ao sul.
A foz do Riozinho do Anfrísio fica a aproximadamente 400 km de distância da sede do município de Altamira.  A partir de Altamira, chega-se ao Riozinho por via fluvial subindo Rio Xingu e depois seu afluente Iriri até o Riozinho do Anfrísio.  No período chuvoso, a viagem dura aproximadamente quatro dias e na estiagem de seis a 12 dias em barco motor.

2.2       A RESERVA EXTRATIVISTA RIO IRIRI

Criada em 05 de junho de 2006 a Resex do Rio Iriri foi a segunda reserva extrativista a ser criada na região da Terra do Meio, através de decreto presidencial (ICMBio, 2011).
Trata-se de uma faixa de terra de aproximadamente 398.938 há, que acompanha um trecho do percurso do Rio Iriri, sendo limitada por ele a norte e a oeste. Faz divisa com a Resex do Riozinho do Anfrísio e com a Terra Indígena Xipaya a oeste, com a Terra Indígena Cachoeira Seca do Rio Iriri ao norte, com a ESEC Terra do Meio a leste e ao sul.  Da sede do município de Altamira chega-se à Resex por via fluvial subindo Rio Xingu até o Rio Iriri, afluente daquele.
3          RESERVAS EXTRATIVISTA NA AMAZÔNIA
            O modelo de territorialização da Amazônia, em meados do século XX, tinha como base o conceito de propriedades privadas que objetivava integrar a região à economia nacional, através de grandes projetos. Isso gerou vários conflitos, pois a Amazônia não era um vazio demográfico e os grupos resistiam as invasões territoriais que esse modelo causava.
Sendo assim, no final da década de 80, o modelo de territorialização desenvolvimentista, impulsionados, sobretudo, por projetos agropecuários, sofria a resistência dos seringueiros, liderados por pessoas como Chico Mendes em Xapuri, no Acre e começou a contar com o apoio de algumas organizações ambientalistas que ganhavam força política no cenário internacional. Nesse mesmo período como alternativa concreta de utilização sustentável da terra e dos recursos naturais florestais (exceto madeireiro), frente ao modelo de desenvolvimento implantado na região, completamente em dissonância da realidade social e ambiental amazônica, surge a proposta de criação das Reservas Extrativistas (Almeida, 2004).
De modo geral, a Resex foi uma contribuição “genuinamente brasileira ao conceito de áreas protegidas”, oriunda dos empates, uma luta dos movimentos sociais e das populações tradicionais realizadas no Acre. (DIEGUES, 2001).
Assim, em plano institucional, a Reserva Extrativista passa a fazer parte do Programa Nacional do Meio Ambiente, que mais tarde tornou-se o Sistema Nacional de Unidade de Conservação (SNUC), conforme lei 7.804, de 18 de julho de 1989, e Decreto 98.897, regulamentado em 30 de janeiro de 1990, como uma unidade de manejo sustentável dos recursos naturais.
A criação, implantação e gestão de espaços territoriais especialmente protegidos são baseadas na Lei Federal n° 9.985, de 18 de julho de 2000, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC e define as diretrizes, objetivos e categorias de Unidade de Conservação (UC), que serão criadas em todo o território nacional, regulamentada pelo Decreto Federal n° 4.340, de 22 de agosto de 2002.
A criação de UC, sobretudo as que preveem a permanência das populações existentes, também chamadas de Unidades de Conservação de Uso Sustentável, é, em grande parte, fruto das reivindicações de seus habitantes, que visam à garantia e o acesso aos recursos existentes, bem como a preservação do seu modo de vida (Schweickardt, 2010).
4          A CRIAÇÃO DE RESEX NA TERRA DO MEIO
No sudoeste do Estado do Pará, localiza-se a região denominada de Terra do Meio, uma vasta área com cerca de 7,9 milhões de hectares encoberta em grande parte pela floresta amazônica, compõe cerca de 6 % do território do estado do Pará e abrange grande parte dos municípios de Altamira, São Félix do Xingu e uma pequena parte do município de Trairão.  A Terra do Meio é irrigada pelo rio Xingu (Médio Xingu) e inúmeros igarapés que formam alguns dos seus afluentes, como o Riozinho do Anfrísio, e rios Curuá, Rio Iriri e Rio Novo.
“A Terra do Meio encontra-se inserida no bioma Amazônico e na ecorregião Xingu. Sabe-se que o bioma Amazônico abriga grande diversidade de espécies a qual se deve, em parte, ao clima quente e úmido com uma certa estabilidade; à grande disponibilidade de corpos d’água; à complexidade de ambientes que oferecem condições favoráveis à ocorrência de uma infinidade de formas e modos de vida e; aos fatores histórico-culturais. Apesar do conhecimento sobre Amazônia remontar à época do descobrimento do Brasil, há grandes extensões de áreas naturais – como a Terra do Meio - ainda carentes de levantamentos da diversidade biológica e que são totalmente desconhecidas quanto à composição florística e faunística. Mais grave que a inexistência de estudos é a devastação dessas áreas naturais ainda desconhecidas pela Ciência, sobretudo quando situadas em regiões de fronteira agrícola.” (Villas-Bôas, 2003).
Esta região passou por vários picos econômicos, podendo-se destacar entre eles o da Borracha, que teve os 2 ciclos com bastante atividades. Por volta de 1910 a economia da borracha entrou em uma grande crise fazendo com que alguns dos grandes patrões quebrassem e abandonassem os seringais, porém isso não levou as famílias de seringueiros a irem embora. Muitos permaneceram na floresta e focaram em outras atividades como a exploração da castanha, na caça, a colocação de roças para obtenção de mandioca, para produção de farinha, aprimoraram o conhecimento da mata e dos rios.
Almeida (2004) descreve assim:
“um seringueiro com família trabalhava no “setor exportador”, isto é, nas estradas de seringa, em jornadas médias de quatro dias por semana. Formalmente, ele trabalhava como um trabalhador autônomo em estradas de seringa pelas quais pagava renda em produto-borracha; no restante da semana, trabalhava como caçador ou em seus roçados. Esse regime durava cerca de nove meses; nos demais meses do ano, a família dedicava-se a cultivar os roçados, ou a outras atividades” (Almeida, 2004).
Por volta de 1940 houve um novo boom da borracha provocado pela necessidade do produto durante a 2ª guerra mundial. Como descrito por Almeida (2004), neste segundo ciclo da borracha, o Estado passa a ser o grande aviador, fortalecendo novamente os patrões (seringalistas), recrutando pessoas das regiões mais pobre do país e submetendo-os em regime em de forte escravidão.
Na década de 1980 os patrões deixaram de vez os seringais e os antigos seringueiros permaneceram, engrossando um novo segmento conhecido como “campesinato florestal”. (ALMEIDA 2004).
As rodovias construídas nas décadas de 1970 e 1980 impuseram uma nova fase de ocupação da região - “integrar para não entregar” - uma política nacional estratégica para integrar as regiões consideradas “isoladas” do cenário econômico nacional àquelas industrializadas do Sul e Sudeste do país. Essa política transformou as rodovias Transamazônica e a BR-162 em símbolos de desenvolvimento, ocupação e soberania sobre a Amazônia brasileira.
Concomitantemente com essas ações governamentais desenvolvimentistas, intensificava-se a grilagem na Terra do Meio. O maior desses grileiros foi o empreiteiro Paranaense Cecilio Rego Almeida, qualificado pela revista Veja, em 1999, como "o maior latifundiário do mundo", justamente pelas terras que dizia ter na região da Terra do Meio com bases espalhadas pelo Rio Xingu, Iriri e Curuá.
Porém, a iniciativa de proteção da Terra do Meio também fazia parte da agenda do movimento social da recém-instalada Transamazônica. Pois a região era considerada por Ademir Federicci (Dema), assassinado em 1999, líder do Movimento pelo Desenvolvimento da Transamazônica e Xingu (MDTX), como os dois "pulmões verdes" do Pará, regiões que iriam garantir a água e o clima para as propriedades de milhares de colonos que se instalaram no eixo da rodovia. Nesse ponto os interesses de movimentos da agricultura familiar e a luta dos Beiradeiros se unem contra a ofensiva predatória de grileiros e madeireiros.
Dada essa situação, de cunho emergencial, um conjunto de ações paralelas foram disparadas a partir de um grupo de instituições que se sensibilizaram com a situação de avançada degradação de florestas e expropriação de populações tradicionais, principalmente os beiradeiros que estavam em “terras devolutas” que o Estado ainda não havia dado destinação.
Dessa forma, várias ações foram realizadas pelo governo federal, atendendo o apelo do movimento social organizado e de setores, como o Instituto Socioambiental (ISA) e a Comissão Pastoral da Terra (CPT), que aceitaram o desafio.
Fruto de todo esse processo de organização e trabalho unificado entre as instituições e os beiradeiros, é criada a Reserva Extrativista Riozinho do Anfrísio. A área estava sob pressão intensa e os grileiros estavam cortando terras em toda a extensão do riozinho se apropriando de castanhais e demais áreas vitais para a sobrevivência da população.
Pouco menos de dois anos mais tarde, em fevereiro de 2006, foi lançado o “Pacote Verde”, editado pelo Palácio do Planalto em reação à morte da freira americana Dorothy Stang, em 12 de fevereiro, em Anapu, no Pará. De uma só vez foram decretadas o Parque Nacional (PARNA) da Serra do Pardo, com 445.407,99 ha de extensão, e a Estação Ecológica (ESEC) Terra do Meio, com área total de 3.373.133,89 ha, que se somaram à Resex Riozinho do Anfrísio. Nos anos subsequentes, seriam estabelecidas as demais Unidades de Conservação (UC) previstas. (ALARCON, 2014).

4.1       A MARGEM DA EXCLUSÃO

O passivo social encontrado nessas Resex era descomunal. Pouquíssimas famílias tinham documentação cidadã (certidão de nascimento, RG, CPF), o índice de analfabetismo passava de 80%, o atendimento a emergências médicas e malária só era possível com o uso de plantas medicinais através do conhecimento tradicional e no atendimento nos postos de saúde das áreas indígenas vizinhas. A comunicação com o Estado e o mercado era realizada por intermédio de raros regatões (comerciantes fluviais) - os quais proviam também os meios de transporte das pessoas e a troca de produtos industrializados por produtos extrativistas (ICMBio, 2011).
Com a criação das Unidades de Conservação, um novo ciclo foi iniciado. Agora com amparo da lei, com o Estado ao seu lado e um conjunto de organizações da sociedade civil, os beiradeiros continuaram a luta, não mais para a garantia da terra, mas pelo acesso a direitos básicos que pudessem assegurar condições de vida digna e estabilidade fundiária. Porém o Estado chegava com promessas, com os direitos, mas também com regras, com leis e deveres que deveriam cumprir para permanecer na terra que haviam conquistado, pois a conquista não foi pela terra em si, esta continuava a ser do governo, esse povo tem o direito de usufruto da terra e dos recursos naturais, determinado por um contrato assinado entre a associação e governo.
Durante o trabalho da consultoria contratada pelo IBAMA ficou gritante a principal demanda da população que ISA, FVPP e CPT já haviam diagnosticado desde 2002: a população estava sedenta por conhecer as letras, por conseguir dialogar com um mundo novo, e dessa vez sem o intermédio dos patrões. Quase perderam suas áreas para grileiros que chegavam com títulos de propriedade dados pelo governo escrito em letras que não conseguiam ler.
Assim, com a chegada do governo falava-se em planos de manejo, planos de uso, plano de saúde, planos de educação, plano pra tudo. Era carta pra cá e pra lá, e cerca de 80% da população não sabia escrever nem o próprio nome. A oralidade, base da reprodução cultural e sobrevivência, não dava conta desse novo mundo.

4.2       AS NOVAS FORMAS DE ORGANIZAÇÕES - ASSOCIAÇÕES

A primeira dessas formas foi a Associação de moradores, uma pessoa jurídica que representasse os moradores, para que fosse demandada a criação da reserva extrativista e assim possibilitar a garantiria a permanência deles na Terra, conforme determina o Sistema Nacional de Unidades de Conservação.
Por possuir documentação, seu Herculano foi escolhido pela comunidade, para ser o primeiro presidente da Associação dos Moradores do Riozinho do Anfrísio, que após a criação da Resex passou a ser a Associação dos Moradores da Reserva Extrativista Riozinho do Anfrísio – AMORA, fundada em 28 de março de 2004.
Com a associação criada vieram às primeiras parcerias para implementação de projetos de desenvolvimentos. As instituições parceiras da época aproximaram outras organizações do país e também de fora, e através dos projetos, foram adquirindo estruturas de comunicação e transportes, como barcos e rádios amadores, para as comunidades.
Em função da pouca experiência da associação em gestão, os primeiros projetos não foram bem sucedidos, necessitando um apoio mais forte de parceiros externos na execução dos mesmos. É o caso de uma experiência de um projeto que a AMORA geriu com recursos públicos através do Ministério do Meio Ambiente, 2006, onde a falta de experiências com os novos processos do que eles chamam “da cidade”, deixou a AMORA em situação de inadimplência. Isso veio ser resolvido em 2009, com apoio das instituições como ISA e FVPP, que ajudaram na organização das prestações de conta do projeto.
Associação dos Moradores do Rio Iriri, que após a criação da Resex passou a ser a Associação dos Moradores da Reserva Extrativista Rio Iriri – AMORERI, criada em 25 de julho de 2006, teve como o primeiro presidente, o seu Paulo Cambuí, o qual não era morador nato da região, ele comprou um pedaço de terra dentro da Resex pouco antes do decreto de criação da área e foi morar lá. Transitava bem na cidade, falava muito bem, sabia ler e escrever um pouco – figura perfeita para assumir a associação, entendida pelos extrativistas como uma organização mais da cidade do que deles.
A estrutura funcional de cada associação é formada por um presidente, um secretário e tesoureiro e seus respectivos vices. Tem um conselho fiscal com quatro membros, e todos os cargos são preenchidos, em votação durante as assembleias gerais, por maioria simples de voto.
A partir de 2009, as associações, com apoio das instituições parceiras começam a pressionar o Estado para o desenvolvimento das políticas públicas, de educação e saúde, para as comunidades das Resex da Terra do Terra do Meio, que desencadeou processos muito importantes, ainda em fase de implementação.

4.3       OS PLANOS DE MANEJO ou “PLANOS DE GESTÃO”

O Plano de Manejo (PM) é um documento base para a gestão da Resex pelo governo está previsto no SNUC e contem: diagnósticos que caracterizam desde o meio físico, biológico e socioeconômico das Unidades, as normas e restrições para o uso dos recursos naturais,regras de convivência,  “Plano de Uso”, plano de futuro, ações a serem desenvolvidas e manejo dos recursos naturais da UC e seu entorno. O Plano de Manejo pode prever a implantação de estruturas físicas dentro da UC, visando minimizar os impactos negativos causados pelas pressões existentes garantindo a proteção dos recursos e das comunidades tradicionais, quando for o caso (ICMBio, 2014).
O Plano de Manejo constitui-se como um guia para a gestão, administração e para elaboração dos projetos produtivos que visam o desenvolvimento socioambiental na Unidade de Conservação. Assim o PM deve servir como instrumentos de políticas públicas e gestão ambiental (ICMBio, 2010).
Todo Plano de Manejo deve ser elaborado em no máximo 05 anos, a partir da criação da Unidade. Com a aprovação do Sistema Nacional de Unidade de Conservação (SNUC), é obrigatório que toda UC ter um Plano de Manejo, que é construído com a participação das comunidades residentes, fundamentado nos objetivos pelos quais a UC foi criada.

4.3.1     O Plano de anejo da Resex Riozinho do Anfrísio

            O Plano de Manejo da Resex Riozinho do Anfrísio, conforme orienta a Instrução Normativa nº 01, de 18 de Setembro de 2007, que disciplina as diretrizes, normas e procedimentos para criação de Planos de Manejo das UCs de uso sustentável, nas categorias Resex e Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS). As etapas de construção do Plano de Manejo iniciaram em 2006, com o cadastramento das famílias, e se estenderam até 2009 com a entrega da versão preliminar do PM, para avaliação do conselho (ICMBio, 2011).
            Durante a fase de finalização do PM da Resex Riozinho do Anfrísio, o acesso educação era algo muito recente e muito frágil.  Só havia uma escola em toda a Resex. O PM faz recomendações de que a s ações da Secretaria Municipal de Educação até as ações cotidianas de sala de aula deve se dar a partir do rico cotidiano de saberes das comunidades, de todas as ciências que estão presentes nos diversos ofícios que ali se dão, como o cultivo da roça, o extrativismo, a confecção de diversos utensílios, em diálogo com os conhecimentos sistematizados pelas ciências (ICMBio, 2011). No campo da saúde, não havia posto de atendimento, apenas 2 Agentes de Saúde (ACS) e 1 Microscopista. Ainda de acordo com o PM, os problemas de saúde mais comuns e menos complicados eram tratados com base no conhecimento tradicional dos mais experientes, os veteranos.
            O Plano de Manejo da Resex Riozinho do Anfrísio foi aprovado pela portaria nº 41, de 30 de junho de 2011. Apesar das etapas de elaboração do PM serem concluídas em 2009, apenas em 2011 o Plano foi aprovado e publicado, ou seja, mais de 6 anos após sua criação.

4.3.2     O Plano de Manejo da Resex Rio Iriri

            O Plano de Manejo da Resex Rio Iriri foi elaborado concomitantemente ao do Riozinho do Anfrísio, orientado também pela Instrução Normativa nº 01, de 18 de Setembro de 2007. As etapas de construção do Plano de Manejo iniciaram em 2006, com o cadastramento das famílias, e se estenderam até 2009 com a entrega da versão preliminar do PM, para avaliação do conselho (ICMBio, 2011).
            O Plano de Manejo da Resex Rio Iriri foi aprovado pela portaria nº 09, de 03 de Fevereiro de 2011, meses antes da aprovação do PM da Resex Riozinho do Anfrísio, e dentro do prazo determinado pela legislação.
            Na Resex Rio Iriri, os temas de saúde é educação também foram apontados pelas comunidades como prioridades dentre as principais demandas apresentadas. Estes temas são apresentados no programa qualidade de vida e cidadania do Plano de Manejo.
5          A LUTA PELO DIREITO A EDUCAÇÃO E SAÚDE
            A audiência pública, convocada pelo Ministério Público Federal (MPF) de Altamira para tratar especificamente de saúde e educação nas Resex foi o ápice do processo de conquista desses direitos básicos. Para o entendimento do Leitor, apresenta-se também o Plano de Desenvolvimento regional Sustentável do Xingu que surgiu como uma oportunidade para implementação de algumas ações de educação e saúde nas Resex.
            O MPF realizou na cidade de Altamira, uma audiência pública para discutir a prestação de serviços de educação e saúde às populações ribeirinhas e tradicionais da região da Terra do Meio, em outubro de 2013. O MPF sempre foi um aliado das populações que tem seus direitos constitucionais negados e sempre foi informado das dificuldades e da falta de assistência em saúde para os extrativistas da Terra do Meio.
            Foram convocados para esta audiência representantes das secretarias municipais de saúde (SESMA) e educação (SEMEC), Secretarias estaduais de saúde (SESPA) e educação (SEDUC), Ministério da Saúde (MS) e Ministério da Educação, além do órgão gestor das Unidades de Conservação (UC) da Terra do Meio, ICMBio. No edital de convocação da audiência, a procuradora da República, Thais Santi, ressalta que a omissão estatal em fornecer às populações ribeirinhas o acesso a essas políticas tem gerado o deslocamento compulsório dessas populações aos núcleos urbanos, o que provoca a expropriação forçada de seus territórios tradicionais, e a exposição desses grupos a uma situação de vulnerabilidade extrema (MPF, 2013).
            Com base em informações das associações de moradores das Resex, do ICMBio e das instituições não governamentais, que atuam na Terra do Meio, o MPF apresentou dados alarmantes como a completa ausência de estrutura de atendimento de saúde nessas áreas.
            No final da audiência, as instituições presentes firmaram o compromisso com as seguintes ações de educação:
MEC: financiar o curso de formação de professores extrativistas elaborado pela UFPA;
SEDUC: ofertar turmas de EJA (Educação de Jovens e Adultos), de acordo com o levantamento a ser realizado pela Semed.
SEMED: realizar a matrícula de todos os alunos em idade escolar, além de levantar a demanda de educação de jovens e adultos e estruturar as escolas de educação básica;
Prefeitura de Altamira: apresentar ao Legislativo proposta para criação de adicional aos salários dos professores que tenham exercício em áreas ribeirinhas isoladas.
            Com relação à saúde, as instituições competentes se comprometeram especialmente com os seguintes pontos:
Ministério da Saúde: viabilizar recursos diferenciados para a construção e implementação de unidades básicas de saúde conforme proposta da Prefeitura de Altamira e do Instituto Socioambiental.
Prefeitura: já apresentou Projeto de Lei à Câmara de Vereadores para instituir adicional aos salários dos técnicos de enfermagem das unidades básicas de saúde em áreas isoladas, realizar os resgates de saúde até a implementação do Samu pelo Estado do Pará e elaborar fluxo de atendimento para atendimento de urgência e emergência nas Resex.
            Ficou definido que o MPF acompanharia de perto o cumprimentos desses acordos, e que outra audiência pública seria realizada nos próximos meses para avaliação das ações implementadas.

5.1       A PARTICIPAÇÃO NO PDRS XINGU

Com a implantação do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Xingu1 – PDRS Xingu, em 2011, o movimento social incentivou e apoiou a participação de uma representação dos extrativistas da Terra do Meio no Comitê Gestor do PDRS, composto por 15 instituições da esfera governamental e 15 instituições da sociedade civil organizada. O PDRS é composto pelo Comitê Gestor e pelas Câmaras Técnicas (CT) divididas por eixos temáticos. 
Após reuniões entre as lideranças da Resex ficou a acordado que a AMORA seria a representante das populações extrativistas no PDRS Xingu. A AMORA assumiu uma vaga como instituição titular no Comitê Gestor do PDRS Xingu, e faz parte da Câmara Técnica – CT de Povos e Comunidades Tradicionais.
Como apoio a política pública de saúde, em 2011, o projeto apresentado no PDRS pelos extrativistas viabilizou a compra de uma voadeira completa com motor de popa 90 hp, por Resex, para ser utilizada exclusivamente na remoção de pacientes com necessidades de atendimento médico na cidade. O projeto também possibilitou a abertura de uma pista de pouso na Resex Riozinho do Anfrísio e outra na Resex Rio Iriri. Essas pistas são fundamentais para garantir remoções necessárias e assim diminuir a mortalidade por causas evitáveis com atendimento hospitalar de urgência.
Em 2012, outro projeto, das associações da Terra do Meio, aprovado no PDRS Xingu possibilitou a aquisição de um carro para remoção de pacientes a partir da comunidade da Maribel, diminuindo o tempo de espera do resgate. Além do carro, uma pista de pouso será aberta na comunidade Lageado, que fica na porção mais isolada da Resex Riozinho do Anfrísio. A pista de pouso está em fase de inicialização.
No mesmo ano as associações apoiaram, como parceiros, um projeto da secretaria municipal de saúde, na CT de Saúde do PDRS Xingu, com foco na assistência à saúde as populações ribeirinhas das Resex da Terra do Meio. Este projeto viabilizou a construção posto de saúde no subpolo da Resex Rio Iriri, comunidade São Francisco e outro no subpolo da Resex Riozinho do Anfrísio, comunidade Lageado, que ainda está em fase de construção.
A comunicação também assume papel fundamental para o funcionamento e qualificação do sistema local de atenção básica à saúde, possibilitando um pedido imediato remoção em casos de emergências e o apoio à distância para o técnico de enfermagem em área. Neste sentido, os projetos nos projetos aprovados no PDRS as associações tem investido na aquisição de rádios amadores para ampliar a cobertura em toda extensão das Resex. Além dos rádios serão implantados sistemas de internet via satélite, que poderá contribuir num pré-diagnóstico de pacientes a distância. Essa experiência foi realizada em 2011, na Resex Riozinho do Anfrísio, quando um paciente foi pré-avaliado através de uma teleconferência com um médico em São Paulo.

5.2       PROCESSO DE CONQUISTA DA EDUCAÇÃO

Como visto anteriormente, as populações das Resex Riozinho do Anfrísio e Rio Iriri, viveram na margem da exclusão social, sem o acesso aos serviços básicos de educação e saúde por um longo tempo. De acordo com o relatório de um diagnóstico encomendado pelo IBAMA, em 2007, os altos índices de analfabetismo chegavam em 82% na Resex do Riozinho do Anfrísio e 80% na Resex Rio Iriri. De acordo com Viera (2006) o analfabetismo é um dos indicadores mais significativos da desigualdade econômica, política e social, limitando o valor essencial da dignidade humana:
“A causa da pobreza não é o analfabetismo, o efeito da pobreza é o analfabetismo, pois a pobreza inviabiliza inclusive a busca por direitos não apenas de acesso à educação, mas aos bens culturais, sociais e políticos, o que inclui o acesso aos bens produzidos e não distribuídos socialmente (Vieira, 2006)”.
As primeiras ações relacionadas à educação nas Resex do Riozinho do Anfrísio e Rio Iriri foram realizadas no inicio de 2007, quando o ICMBio contratou um grupo de consultores para desenvolver um trabalho voltado para a alfabetização de jovens e adultos.
O acesso à educação promove acesso à informação e contribui para autonomia dos indivíduos. Em meio aos processos iniciais de alfabetização dos moradores das Resex Riozinho do Anfrísio e Rio Iriri, foram realizadas ações de alfabetização complementar, a formação dos conselhos, junto a população das Resex, promovidas pelo Instituto Socioambiental, sendo contratados o educador Cristiano Tierno de Siqueira e a educadora Valéria de Oliveira Vasconcelos, visando a construção de uma proposta de formação das famílias da Resex e, que ao mesmo tempo, propiciasse subsídios para a construção de uma proposta de educação escolar para as Resex.
Pedro Pereira de Castro, um dos moradores da Resex Riozinho do Anfrísio que participou do processo de alfabetização, coordena processos produtivos na Resex. Em uma das atividades pela cidade ele relatou a vontade de trocar sua identidade, pois mesmo sabendo ler e escrever, a sua identidade constava como não alfabetizado, e de certa forma, isso limitava-o. Com a nova identidade era notória a satisfação dele em ver sua a assinatura, onde antes era caracterizado com não alfabetizado.
Através deste processo deu-se uma ação crescente de reivindicação junto ao poder público de escolas por parte da população das Resex. Os moradores demandavam pela criação de escolas nas Resex para que as crianças pudessem estudar. Muitas famílias, na ânsia de ver seus filhos estudando se mudaram para as cidades mais próximas, muitas vezes vivendo em condições de pobreza e insegurança.
As inúmeras denúncias das lideranças comunitárias das Resex do Riozinho do Anfrísio e Rio Iriri, com apoio do movimento social local, pela falta de políticas politicas públicas nessas áreas, provocou a interferência do Ministério público federal e estadual, que instaurou processos contra a gestão municipal. O que resultou, em 2006, Num Termo de Ajustamento de Conduta entre o Ministério Público Estadual do Pará e a Prefeitura Municipal de Altamira, para a construção de um projeto integrado de escolas de ensino fundamental e Unidades Básicas de Saúde (UBS), nas Resex Rio Iriri e Riozinho do Anfrísio e atendimento médico periódico para a população ribeirinha.
No início, as condições de trabalho eram muito precárias. Não tinha estrutura adequada para funcionar a escola, não havia moradia adequada para o professor, a merenda escolar era insuficiente e não condizia com o hábito alimentar dos alunos, faltava material didático e não havia transporte escolar. Como as comunidades eram distantes umas das outras e não havia escolas suficientes para atender a demanda, muitos alunos moravam com os professores, pois não havia a possibilidade de voltar para casa todos os dias, após o termino da aula. 
A secretaria de educação também não disponibilizava transporte aos professores, eles ficavam sujeitos a pegar carona com regatões e peixeiros, viajando até 07 dias, em barcos lotados de mercadorias e caixas de isopor cheias de gelo, ou às vezes, no caso das professoras da Resex Iriri, era possível pegar carona na estrutura disponível para educação indígena.
As escolas existentes até 2009, não atendiam as demandas por educação básica nas Resex. Nesse mesmo ano foi realizada uma viagem para as Resex, denominada de “Expedição Terra do Meio: Educação, saúde, produção e cidadania”. Esta expedição, realizada através de uma parceria das associações com as instituições parceiras, oportunizou a presença de diversas organizações governamentais e não governamental e teve como objetivo desenvolver uma série de ações, como emissão de documentos (como certidão de nascimento, identidade, CPF e Carteira de pesca), e discutir alternativas para promoção de políticas públicas para as Resex da Terra do Meio. Dentre as instituições participantes estavam o Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública do Estado do Pará (DP), na oportunidade as comunidades puderam apresentar a realidade local, tirar dúvidas e fazer reivindicações sobre a falta de políticas públicas na região da Terra do Meio. A perspectiva gerada a partir da expedição era bastante positiva, como podemos ver em um trecho do relatório da expedição:
“A convivência com esse grande conjunto de instituições e profissionais tão diversos durante o planejamento e execução das atividades deu luzes a novas perspectivas para o atendimento mais integrado das demandas dessas comunidades. Foi uma experiência muito intensa e esperamos que ela tenha gerado mais comprometimento do poder público com comunidades por tanto tempo esquecidas pelo estado Brasileiro” (Relatório Expedição Terra do Meio, 2009, p. 16).
O acesso à educação para as Resex da Terra do Meio exigiu muito esforço das lideranças comunitárias, que constantemente saiam de suas casas, e deixando seus trabalhos e enfrentado dias de viagem até Altamira para realizarem reuniões com a secretaria de educação, levando as reivindicações das comunidades e demandas para melhoria da educação, nas Resex da Terra do Meio.
            Após as reivindicações das comunidades, em 2010, a secretaria de educação contratou mais sete professores (todos da cidade), além das três remanescentes da primeira contratação, para atender demandas de educação reivindicada pelos moradores.
Neste mesmo ano, através de uma demanda apresentada pelos moradores, de um local onde pudesse ter não só funcionamento do ensino do básico, e também séries mais avançadas, o Instituto Socioambiental, através de projetos, captou recurso para iniciar a construção de um conjunto de infraestrutura, que contemplava a construção de uma escola polo (maior, com mais salas de aula, cozinha e refeitório) e uma casa para o professor, posto de saúde e casa de enfermeiro. O projeto do ISA disponibiliza de recursos para construção de uma infraestrutura desse tipo para cada Resex.
Antes de iniciar as construções, o Instituto Socioambiental propôs a Secretaria de Educação à celebração de um termo de cooperação técnica, onde as partes tinham responsabilidades especificas. O termo previa que o ISA seria o responsável pelo desembolso das despesas referente às obras, e que ao término das construções, a secretaria de educação se comprometeria em contratar/realocar professores para escolas, além de recursos para manutenção e funcionamento da mesma. O termo foi assinado, mas nem todos os compromissos foram assumidos. 
Além das demandas por escolas, a formação de professores também passou ser apresentada como uma necessidade, pois as maiorias dos professores contratados eram da cidade e nem sempre tinham experiência de trabalho com populações com características tão peculiares, como as do Riozinho do Anfrísio e Rio Iriri.  A Fundação Viver Produzir e Preservar (FVPP), o Instituto Socioambiental e a Secretaria Municipal de Educação promoveu uma formação para os professores das Resex, realizada na comunidade Lageado, Resex Riozinho do Anfrísio, a partir de temas que abordaram a realidade das comunidades. 
Porém, em 2011, as três escolas da Resex Riozinho do Anfrísio tiveram suas atividades paralisadas, isso fez com que as lideranças das duas Resex se unissem mais uma vez para fazer cobrança à secretaria de educação. Em março de 2012 eles entregaram uma carta de reivindicação à nova secretária de educação, onde cobravam imediatamente a contratação de professores para as escolas que estão paralisadas, para que as crianças, jovens e adultos não ficassem prejudicados com a falta de aula. Interessante que, nesta carta começam a aparecer novas demandas como, por exemplo, transporte escolar para as escolas em funcionamento, além de melhoria da merenda e contratação de merendeira, salários diferenciados para os professores para que pudessem permanecer nas comunidades e a visita técnica e acompanhamento pedagógico pela secretaria de educação. Apesar da reivindicação poucas demandas foram atendidas.
Com a construção da escola polo da Resex Rio Iriri, em 2012, os alunos da escola que funcionava na Resex Riozinho do Anfrísio, e que também atendia alunos da Resex Rio Iriri, passaram a estudar no Polo.
Alguns acontecimentos, em 2012, tiverem reflexo no funcionamento da educação nas Resex. Dentre eles, o mais importante foi a mudança na adminstração municipal, pois todo o processo que vinha sendo construído teve q ser refeito.
Por isso, em 2013, o MPF realizou nova audiência pública, onde alguns compromissos foram firmados pelos representantes dos órgãos de educação, tendo como um dos resultados concretizados, em novembro de 2013, a criação da lei municipal que garante salário diferenciando para os professores que atuarem nas Unidades de Conservação da Terra do Meio. Esse fato foi considerado tanto pelas lideranças comunitárias, quanto pelos representantes de organizações parceiras, como o começo de um atendimento diferenciado para essas áreas, já que a lei determina salário com gratificações especificas a quem atua nessas áreas. O valor de um professor da Resex chega a ser três vezes mais que um professor da cidade.  Além disso, a prefeitura municipal se comprometeu em garantir transporte escolar para as escolas com necessidade do serviços, agente operacional para escolas com mais de 25 alunos, formação de professores e visitas pedagógicas periódicas às escolas das Resex.
Os compromissos assumidos já haviam sido reivindicados desde 2012 pelas lideranças das Resex, em reunião com a secretaria de educação. Em 2014, pela primeira vez o transporte escolar da área das Reservas Extrativistas entrou como item no pregão presencial, realizado pela prefeitura do município para contratação do serviço.  Os próprios moradores se organizaram para participar do pregão, e hoje são remunerados pela prestação dos serviços nas escolas das comunidades, todas as escolas com necessidade do serviço foram atendidas em 2014. Além disso, foram contratadas merendeiras para escolas com número de alunos acima de 25. Neste mesmo ano foram atendidas demandas de abertura de mais três escolas, sendo duas na Resex Riozinho do Anfrísio e uma na Resex Rio Iriri. Assim, o ano de 2014 foi finalizado com seis escolas funcionando na Resex Rio Iriri e seis escolas na Resex Riozinho do Anfrísio (Tabela 3).

6.3       PROCESSO DE CONQUISTA DE SAÚDE

Para comunidades ribeirinhas localizadas as margens dos rios que dão nome as duas Reservas Extrativistas, os conhecimentos tradicionais sempre foram essenciais para o cuidado com a saúde, como o conhecimento dos elementos da floresta e dos rios, como também as rezas e simpatias que curam por meio do conhecimento tradicional e da fé. São conhecimentos que foram herdados da convivência de várias gerações com a floresta, os animais e as pessoas que nela habitam. Por muitos anos este foi único meio de cuidar da saúde, os mais experientes, muitas vezes fazendo o papel do profissional de saúde, e a floresta a farmácia.
Os primeiros profissionais de saúde que se aproximaram das comunidades extrativistas foram os agentes da Superintendência de Campanha em Saúde Pública (SUCAM), atualmente a Fundação Nacional de Saúde (FUNASA), que subiam os rios fazendo o controle ou erradicação das grandes endemias do Brasil, como por exemplo, a malária. Segundo a Funasa isso acontecia uma vez por ano, e às vezes ficavam mais de 2 anos sem fazer por falta de medicamentos ou transporte.
Durante os processos de criação da Reserva extrativista Riozinho do Anfrísio, em 2004, na comunidade Bom Jardim, havia um comando de saúde acompanhando as ações dos órgãos que trabalhavam pela criação da Resex. Durante uma reunião a comunidade demandou, como ação imediata, a necessidade de se ter pelos menos agentes de saúde e que fossem morador local. Assim foi realizada uma seleção com quatro pessoas da comunidade, que minimamente sabiam ler e escrever, e desses, dois foram selecionados para ocupar o cargo de Agente Comunitário de Saúde (ACS).
Os dois agentes comunitários de saúde, foram distribuídos na Resex Riozinho do Anfrísio de forma a atender todas as comunidades.
Essa pode ser considerada a primeira conquista relacionada a saúde que moradores da Resex Riozinho do Anfrísio tiveram após anos na invisibilidade. E apesar de ser uma conquista importante ainda não era suficiente para amenizar a situação de saúde da população.
A malária sempre foi um dos principais agravos à saúde da população ribeirinha. Os casos de malária nas Resex eram altíssimos. Diante desta situação, em 2005, a comunidade demandou da secretaria a contratação de um microscopista, pessoa responsável por diagnosticar e orientar a medicação de pacientes com malária. A secretaria de saúde, através do setor de endemias, acatou a indicação da comunidade e contratou uma moradora da Resex que foi treinada e passou a exercer a função de microscopistas na comunidade. Essa pode ser considerada a segunda conquista importante, mas que também era muito limitada.
Em 2008, uma ação conjunta do Ministério da Defesa – Comando da Aeronáutica, Ministério da Saúde, Nível Central da SESPA – Departamento de Epidemiologia/Imunização, de Altamira, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente - IBAMA e Movimentos Sociais que atuavam nas comunidades ribeirinhas e extrativistas da Terra do Meio realizaram uma campanha de vacinação denominada de Operação Gota, que teve como objetivo realizar imunização, através de vacinação.
“Atualmente a diversidade das paisagens e dos muitos “Brasis”, historicamente constituídos, não está reconhecida e é pouco captada pela ótica de uma parcela expressiva da sociedade civil e estatal. A Operação Gota representa um grande avanço na garantia dos direitos destas populações, em situação de vulnerabilidade social, principalmente Beiradeiros, assistidos com política de baixa resolubilidade e/ou excluídos de qualquer processo de atenção à saúde” (Relatório da operação gota, 2008, p. 55).
            Em 2009, durante a “Expedição Terra do Meio: Educação, saúde, produção e cidadania”, um comando médico da secretaria municipal de saúde realizou ações relacionadas à saúde como multivacinação de suscetíveis, atendimento odontológico, palestras educativas sobre higiene bucal e consultas médicas.
            Em 2010, o Instituto Socioambiental ambiental, em parceria com a secretaria de educação, lançou um Termo de Referência (TDR) para contratação de uma consultoria para realização de um diagnóstico da saúde nas Resex da Terra do Meio. O consultor contratado foi um médico sanitarista da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP, Douglas Rodrigues.
            Para o desenvolvimento do diagnóstico foram realizadas reuniões com representantes da secretaria de saúde para entender sobre a estrutura de atendimento de saúde municipal e a realização de viagem à Resex Riozinho do Anfrísio e Iriri com o objetivo de fazer um diagnóstico inicial da situação de saúde das comunidades ribeirinhas extrativistas, e estabelecer parâmetros, princípios e diretrizes que possam colaborar na implementação de um modelo de atenção básica à saúde para as comunidades das Reservas Extrativistas da Terra do Meio.
            Os resultados do diagnóstico serviram para traçar um perfil epidemiológico mais aproximado das populações das Resex da Terra do Meio. De acordo com dados do relatório da consultoria, entre os principais agravos a saúde das populações está à hipertensão arterial sistêmica, ira e a malária. Ainda de acordo com os dados do relatório o grande número de queixas abdominais e de eliminação de vermes pelas fezes, especialmente em crianças em idade pré-escolar e escolar é reflexo da falta de saneamento básico nas comunidades. Além da gestação precoce, a maioria das mulheres entre 25 e 35 anos tem pelo menos 5 filhos, que na maioria são partos feitos na própria casa e assistido por parteiras locais, não havendo um acompanhamento médico através do pré-natal.
            O município sempre chega na região, através dos comandos médicos de saúde. O modelo dos comandos de saúde consiste em ações de campanhas de assistência em saúde muito importante e que merece reconhecimento, dadas às dificuldades enfrentadas pela secretaria de saúde. Entretanto, isoladamente tem pouca resolutividade e não resolve o déficit de saúde nas Resex.
            Um seminário técnico sobre planejamento em saúde para populações extrativistas da Terra do Meio foi realizado com o objetivo de apresentar os resultados da consultoria contratada em 2010, avaliar e validar a proposta de um plano de atendimento integral à saúde das populações extrativistas da Terra do Meio.
            Desta maneira, o plano foi consolidado em 2013 e tem embasado a adequação de políticas públicas para áreas ribeirinhas em escala nacional. De acordo com a notícia publicada no site do Instituto Socioambiental (2014), o Ministério da Saúde publicou a portaria nº 835/2014 que amplia em 80% os recursos para equipes Saúde das Famílias Ribeirinhas e Fluviais. A medida permite maior acesso das populações ribeirinhas à rede pública de saúde e foi elaborada a partir da proposta de modelo de atenção integral a saúde, realizado nas Reservas Extrativistas da Terra do Meio.
Os Beiradeiros da Terra do Meio, quando em Altamira, são atendidos pela rede pública de saúde, especialmente por serviços hospitalares e de pronto atendimento. Essa rede de saúde de Altamira em geral têm dificuldades para oferecer boa cobertura de serviços até mesmo aos munícipes urbanos e da zona rural mais próxima da sede do município, agravado ainda mais pela atração de pessoas em função de Belo Monte, imagine para populações que vivem geograficamente isoladas, que para chegar até um pronto atendimento, em Altamira, viajam dias em barcos, enfrentando bastantes dificuldades de locomoção.
Não existe um fluxograma de atendimento especializado na rede municipal de saúde que contemple toda essa complexidade operacional de atendimento a saúde de Beiradeiros, na cidade. Quando em Altamira, essas pessoas não conseguem se direcionar sozinhos para serem atendidas nos moldes operantes do sistema de saúde, sobretudo em situações de alta complexidade, que exigem tratamento especializado, muitas vezes realizados fora do domicilio, na capital do estado.
Em uma de suas matérias, a jornalista Eliane Brum, da revista época, destaca que há repasse de responsabilidades, por um lado à prefeitura diz que não tem recurso para melhorar o salário do técnico para atuar nas Resex, por vez o estado diz que a responsabilidade é da prefeitura e o governo federal diz que repassa o recurso para prefeitura. Ela conclui dizendo que quem protege a floresta não é protegido, nem tem assegurado seus direitos constitucionais (BRUM, 2008). 
Durante uma audiência pública, em 2013, o prefeito de Altamira, Domingos Juvenil, apresentou uma proposta para um projeto de Lei que criava cargos e incentivos para profissionais das áreas de saúde e educação, que se dispuser a atuar nas Reservas Extrativistas. Então, em 05 de dezembro de 2013, o prefeito sancionou a lei nº 3.187/13, que garantiu a criação de cargos para técnicos de enfermagem e enfermeiros, que atuarão nessas áreas, com remuneração diferenciada em relação aos mesmos profissionais que trabalham em outras áreas vizinhas. A remuneração desses técnicos é a maior entre os profissionais do mesmo nível, superando inclusive os vencimentos pagos a um técnico que atua nas áreas indígenas, que detinham a melhor remuneração até então.
A criação da lei municipal reviveu as expectativas dos moradores das Resex em ver o tão esperado atendimento de saúde acontecer nos postos construídos nas Resex.
Em 2014, por indicação das lideranças comunitárias, a secretaria contratou três técnicos para atuarem nos posto de saúde das Resex. Adquiriu-se equipamentos e medicamentos, e desde então os postos estão em funcionamento.
6          CONSIDERAÇÕES FINAIS
            As reservas extrativistas historicamente foram idealizadas pelo movimento dos seringueiros para garantir o direito ao território tradicional e em seu desenvolvimento significar a conquista de direitos sociais diferenciados, adequados à realidade e cultura locais em um processo protagonizado pelos moradores dessas áreas. No entanto, também por sua história e contexto de criação das primeiras dessas unidades no Acre no início da década de 1990, o reconhecimento desses direitos na figura das Reservas Extrativistas ficou vinculado também a um objetivo ambiental, que em parte coincidia com a visão do movimento dos seringueiros que pretendia garantir os recursos de que dispunham para suas gerações futuras.
No decorrer dos anos essa invenção dos seringueiros do Acre passou a fazer parte do Sistema Nacional de Unidades de Conservação, incorporando obrigatoriamente, e com muitos percalços e resistências de diversas ordens, as conquistas de direitos sociais e de melhoria de qualidade de vida dessas populações na agenda da gestão dessas unidades.
Os moradores de Resex, como as da Terra do Meio, permanecem nessa luta. Nesse estudo procuramos descrever como essas conquistas vêm ocorrendo nas Resex Rio Iriri e Riozinho do Anfrísio. Procuramos acentuar com a narrativa que esses processos são complexos e, especialmente para os moradores, implicam em um longo aprendizado de, como eles dizem “as coisas da cidade”. De forma que um processo de gestão do desenvolvimento da qualidade de vida dos moradores e do território, obviamente implicados, envolve uma série de pequenas conquistas, desde os primeiros documentos, passando pela alfabetização de alguns, pelo processo de entendimento e de vivência do que significa e de como passa a existir de fato uma associação, da constituição de alianças e parcerias com diferentes atores, da conquista e aprendizado de gestão dos primeiros recursos e projetos, do gerenciamento e resolução dos conflitos internos da comunidade e de suas expectativas com a criação da Resex e da concomitante e vinculada chegada do Estado.
Sobretudo, a apresentação de detalhes desse processo nessas duas unidades deixa claro que a gestão de unidades, que são antes de tudo territórios tradicionais, não se faz com teorias e propostas formuladas em gabinetes e escritórios, mas no enfrentamento cotidiano das dificuldades com todas as influências dos contextos, idiossincrasias e sobressaltos a que a vida dessas pessoas está sujeita nessa nova forma de se relacionar com a sociedade envolvente, como protagonistas na conquista de dias melhores para suas famílias e consequentemente na gestão de uma unidade de conservação que em tese interessa a toda a sociedade brasileira.
Considerando o contexto histórico das Resex Riozinho do Anfrísio e Rio Iriri, onde até inicio da década 2000 viveram a margem do Estado, é importante destacar as conquistas no campo da educação e saúde para os moradores destas áreas, sobretudo por ter sido um processo, que em boa parte foi conduzido por eles próprios, contando com apoio de instituições parceiras. Na concepção dos sujeitos objeto dessas políticas torna-se evidente que, sair de uma situação onde não havia políticas públicas, para uma situação onde se tem uma Unidade Básica de Saúde e escolas funcionando com técnicos de enfermagem e professores, merenda e transporte escolar, são avanços importantíssimos.
No entanto, o momento atual requer muita atenção e esforço redobrado das lideranças, famílias, instituições parceiras e governo, pois essa 1ª fase de implantação das escolas e Unidades Básicas de Saúde, apesar de atenderem as demandas inicialmente solicitadas pelos extrativistas e mesmo as ações previstas nos Planos de Manejos das Resex do Iriri e Anfrísio, da forma como foram implementadas, não são um fim em si. Podem, ao contrário da expectativa inicial de melhoria das condições de saúde e educação, causar uma desintegração da cultura tradicional desses povos se não forem moldadas de forma mais fina ao conjunto de conhecimentos e regras de convivência que fazem desses povos únicos.
Nesse sentido, na saúde ainda são conquistas necessárias para completar o atendimento de direitos básicos do Sistema Único de Saúde: a) estabelecer um fluxograma de atendimento de urgência; b) Criar condições de atendimentos prioritários para os beiradeiros das Resex, na cidade, para que os mesmos não permaneçam muito tempo fora de suas casas.
Para valorização dos conhecimentos tradicionais na área da saúde conectando com as ações do SUS, são necessários ainda: a) organização do conhecimento tradicional de cura, prevenção de doenças, bem viver e integração desses conhecimentos com os conhecimentos da medicina moderna; (b) ampliação da rede de Agentes Comunitários de Saúde composta por beiradeiros das Resex com formação e acompanhamento próximo para visitas domiciliares;(c) incentivo a parteiras tradicionais para que mais possam acontecer nas Resex; (d) implantação de projeto de “farmácia verde” com remédios produzidos nas Resex, com produtos locais para compor as prateleiras da UBS ao lado de remédios industrializados; (e) formação de técnicos de enfermagem de dentro das Resex e formação direcionada para técnicos de enfermagem e equipes de saúde no contexto das Resex (prevalências, o que são essas populações);
No âmbito educacional algumas ações são fundamentais para completar o atendimento do sistema de ensino básico o funcionamento do ensino fundamental maior, que compreende do 6º ao 9º. Pensando numa educação voltada para a realidade local, respeitando os modos de vida dessas populações tradicionais é fundamental que se desenvolva: a) material didático diferenciado que valorize os conhecimentos da floresta; b) a construção de um calendário diferenciado que contemple os modos de vida das famílias, que seja compatível com o calendários produtivo e que considere as limitações e dificuldades dos períodos mais seco dos rios; C) Formação de professores da Resex, como forma de valorizar a cultura local e fixar a permanecia do professor na comunidade.
Se essa dissertação pode dar uma ideia da complexidade dessa luta e das dificuldades dessa gestão ela cumpriu humildemente com a temática da gestão em unidades de conservação de interesse de povos tradicionais e registrou uma visão que se pretendeu minimamente polifônica de um processo que tem obtido relativo sucesso ao menos na visão de seus protagonistas e de um de seus participantes.
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* Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia Programa de Pós Graduação do INPA Mestrado Profissional em Gestão de Áreas Protegidas na Amazônia


1 O Plano de Desenvolvimento Sustentável do Xingu foi criado pelo decreto presidencial nº 7.340, de 21 de outubro de 2010, com a finalidade de promover políticas públicas que resultem na melhoria da qualidade de vida da população que habita sua área de abrangência.

Recibido: 08/06/2017 Aceptado: 21/08/2017 Publicado: Agosto de 2017

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