Revista: CCCSS Contribuciones a las Ciencias Sociales
ISSN: 1988-7833


CONSTRUÇÃO DA UHE BELO MONTE E A COMUNIDADE RIBEIRINHA DE SANTO ANTÔNIO EM VITÓRIA DO XINGU/PARÁ

Autores e infomación del artículo

José Antônio Herrera

Rodolfo Pragana Moreira

Nelivaldo Cardoso Santana

Universidade Federal do Pará, Brasil

herrera@ufpa.br

RESUMO
O ensaio decorre de reflexões e pesquisas do Grupo de Estudo Desenvolvimento e Dinâmicas Territoriais na Amazônia (GEDTAM), o qual tem procurado compreender o território cultural e a noção de frente pioneira, em especial, o caso da expansão da fronteira capitalista a partir da construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Sudoeste paraense. O grande projeto tem expropriado as populações tradicionais dos seus territórios, por isso tenta-se, por meio de narrativas orais, demonstrar a desterritorialização de famílias ribeirinhas às margens do rio Xingu, ao mesmo tempo em que acontece expansão e valorização do capital na Amazônia. As narrativas foram coletadas em pesquisa de campo, com o intento de apreender acerca da história e memória das populações e divulgar o que muitas vezes é esquecido e/ou considerado irrelevante pelo grande capital e por grande parte da mídia. Com as entrevistas, o mote é representar a memória coletiva da comunidade Santo Antônio, no município de Vitória do Xingu/Pará, mormente pela compreensão de que o avanço do capital no território não se preocupa ou tampouco segue propostas para o desenvolvimento social e a preservação das memórias coletivas.
Palavras Chave: Amazônia, Desenvolvimento, Grandes Projetos, Território, Comunidades tradicionais.
JEL: O13 - Agriculture; Natural Resources; Energy; Environment; Other Primary Products
JEL: O18 - Regional, Urban, and Rural Analyses

ABSTRACT
The test results from reflection and research Study Group Development and Territorial Dynamics in Amazonia (GEDTAM), which has sought to understand the cultural notion of territory and pioneer front, specifically the case of the expansion of capitalist frontier from the construction of the plant Belo Monte hydroelectric dam in Para Southwest. Great design has expropriated the traditional peoples of their territories, so we try to, through oral narratives, demonstrate the deterritorialization of riverine families on the banks of the Xingu river, while what happens expansion and capital appreciation in the Amazon. The narratives were collected in field research with the intent of learning about the history and memory of the people and disseminate what is often overlooked and / or considered irrelevant by big capital and much of the news. With the interviews, the motto is to represent the collective memory of the community Santo Antonio, in Vitória do Xingu / Pará, especially by understanding that the advance of capital in the territory does not care either follows or proposals for social development and preservation of collective memories.
Key words: Amazon. Development. Large projects. Territory. Traditional communities.

RESUMEN
Los resultados de la prueba de la reflexión y de la investigación del Grupo de Estudio de Desarrollo y Dinámicas Territoriales en la Amazonía ( GEDTAM ), que ha tratado de comprender la noción cultural de territorio y el frente pionero, en particular , el caso de la expansión de la frontera capitalista desde la construcción de central hidroeléctrica de Belo Monte, en Pará Southwest . Gran diseño ha expropiado a los pueblos tradicionales de sus territorios , por lo que tratar de , a través de las narraciones orales , demostrar la desterritorialización de las familias ribereñas en las orillas del río Xingu , mientras que lo que sucede expansión y revalorización del capital en la Amazonía. Los relatos fueron recogidos en una investigación de campo con la intención de aprender sobre la historia y la memoria de la gente y difundir lo que a menudo se pasa por alto y / o considerada irrelevante por el gran capital y gran parte de los medios de comunicación. Con las entrevistas , el lema es representar la memoria colectiva de la comunidad de Santo Antonio, en Vitória do Xingu / Pará , en especial mediante la comprensión de que el avance del capital en el territorio no le importa , ya sea corriente o propuestas para el desarrollo social y la preservación del memorias colectivas .
Palabras clave: Amazonas. Desarrollo. Los grandes proyectos. Territorio. Las comunidades tradicionales



Para citar este artículo puede uitlizar el siguiente formato:

José Antônio Herrera, Rodolfo Pragana Moreira y Nelivaldo Cardoso Santana (2016): “Construção da UHE Belo Monte e a comunidade ribeirinha de Santo Antônio em Vitória do Xingu/Pará”, Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, (abril-junio 2016). En línea: http://www.eumed.net/rev/cccss/2016/02/xingu.html

http://hdl.handle.net/20.500.11763/CCCSS-2016-02-xingu


1. INTRODUÇÃO

Sugerir um artigo que subsidie reflexões teórico-práticas sobre território, identidade e história das populações tradicionais é conceber uma geografia que tende ao rompimento com as teorias do grande capital e as ideologias atomizantes do progresso a todo custo. Na Amazônia, notadamente, a história de expropriação dos povos acontece, praticamente, desde o primeiro contato com o colonizador do século XVII, até o colonizador do século XX-XXI, responsáveis pela artificialização da natureza e pelos grandes projetos da globalização e do capitalismo financeiro.
Conceitos potenciais às reflexões referem-se a identidade e a memória coletiva, Chelotti (2010) destaca que a identidade é construída por subjetividades individuais e coletivas e pode estar relacionada a grupos sociais ou ao pertencimento territorial. Percebe-se que a incorporação da dimensão simbólica, do imaterial no discurso geográfico, tem possibilitado uma enorme riqueza nas análises sobre a produção do espaço, das paisagens, das territorialidades.
Por isso, no ensaio, identifica-se trechos de entrevistas que explicitam a desterritorialização de uma comunidade tradicional ribeirinha, estabelecendo que a identidade dos sujeitos representa majoritariamente a história e memória dos seus pares, de suas personalidades e representações históricas quanto indivíduos e quanto grupo. O método fenomenológico e etnográfico como formas de apreender o imaterial, as lembranças e a interioridade dos fenômenos são substanciais na análise.
Quanto a referência dos conceitos de identidade, memória, território e representações simbólicas pretende-se com a geografia cultural, discuti perspectivas que transpassem referenciais fixos de determinismos econômicos e possibilite a apreensão das subjetivações e simbologias da comunidade ribeirinha. Especialmente, após as abruptas transformações causadas pela construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte (UHE Belo Monte) após o ano de 2010.
A UHE Belo Monte, localizada, espacialmente, no município de Vitória do Xingu/Pará, e aproximadamente 45km da sede do município de Altamira, redimensiona as problemáticas sociais. Uma das estratégias do governo e das empresas foi socializar com a população local o discurso do desenvolvimento e da modernização do território. No entanto, pesquisas e observações empíricas explicitam o elevado índice de desigualdades causadas e intensificadas a partir da operacionalização do projeto, especialmente para as populações mais pobres, as mais afetadas pela obra.
Nesse sentido, desterritorializar constitui o início do processo de ressignificação de hábitos, crenças, valores e ideologias para os afetados, sobretudo na Amazônia. Pois, a desterritorialização é um processo relacional, que envolve sujeitos e interesses em torno do domínio e da apropriação territorial, no qual os sujeitos hegemônicos sobrepõem-se aos sujeitos não-hegemônicos e edificam seus projetos que muitas vezes contrariam e dissipam conflitos no seio da alteridade territorial, designando-a como ponto de encontro entre diversificados sujeitos.
Nas ponderações, tenta-se fugir dos referenciais norteados pelos determinismos econômicos e procura-se compreender a realidade a partir do movimento, sobretudo sociocultural, a partir da percepção do conceito de sujeitos, que Moraes (2005) evidencia na produção do espaço, a saber: “as formas espaciais são produto de intervenções teleológicas, materialização de projetos elaborados por sujeitos históricos e sociais” (MORAES, 2005, p.16).
Nestes termos, o trabalho intenta esclarecer quanto as populações ribeirinhas padecem com a desterritorialização edificada por um projeto de “desenvolvimento”, que não agrega melhorias sociais e equidade para os diferentes extratos da sociedade. Com o trabalho, pretende-se pontuar uma leitura que transpasse os interesses do capital e priorize valores humanos, equidade social e democracia.
O estudo base das reflexões delimita o trajeto que o Grupo de Estudo Desenvolvimento e Dinâmicas Territoriais na Amazônia (GEDTAM) tem realizado em suas ações. Nestas, procura-se verificar como que a UHE Belo Monte, as margens do rio Xingu, nas proximidades de Altamira tem desterritorializado a população ribeirinha da comunidade Santo Antônio, entendendo-a não pela localização física, estanque, mas especialmente pela dinâmica conectada ao rio e as suas benesses. A sistematização feita neste ensaio decorre de uma atividade especifica dos membros do GEDTAM. A visita realizada na comunidade Santo Antônio, no mês de maio de 2012, para acompanhar e compreender, os atos de reinvindicação dos direitos dos povos do Xingu, no encontro denominado “Xingu + 23”, e o acompanhamento sucessivo entre os anos 2012/2013.

2. CARACTERIZAÇÃO EMPÍRICA DA COMUNIDADE SANTO ANTÔNIO
Antes das notas teóricas e epistemológicas sobre a geografia cultural e os conceitos de identidade, memória coletiva, território e desterritorialização entende-se a necessidade de tentar caracterizar a comunidade Santo Antônio a partir de fatores geográficos e da realidade vivenciada em pesquisas de campo in loco.
A comunidade Santo Antônio pertencente ao município de Vitória do Xingu, à margem esquerda da Rodovia Transamazônica, distante 60km da sede de Altamira (figura 1). A comunidade surgiu a partir das família assentadas, após a abertura da Transamazônica, e de famílias oriundas da região do Xingu. Ao longo das décadas, os grupos de famílias formaram a comunidade: ergueram as igrejas, o barracão de festa, o campo de futebol, a escola, o posto de saúde, etc. Com o advento de Belo Monte, a comunidade passou a vivenciar diversas transformações nas relações sociais: nos modos de ser, ver e viver no/o espaço.
Quando ratifica-se que a comunidade ribeirinha de Santo Antônio é caracterizada pelo vínculo com a dinâmica do rio e suas benesses, mostra-se, outrora, que ela aloca-se geograficamente próximo à Rodovia Transamazônica (BR-230), conforme o mapa e as coordenadas S 03º 06’ 57.3’’ e W 51º 47’ 28.6’ evidenciam.

A comunidade, com cerca de 40 anos de existência (notas levantadas em 2012), passou por transformações irreversíveis em sua estrutura territorial, demográfica e nos modos de vida da população, a saber:
Em 2011 começaram às primeiras mudanças que desencadearam na desterritorialização da comunidade. A chegada de novos moradores atraídos pela possibilidade de abertura de novas vagas de emprego e por possíveis indenizações de lotes ocupados, as transformações produtivas e o desordenamento das atividades primeiras da comunidade levaram a deterioração socioespacial.

  1. De acordo com levantamentos realizados em 2012, as famílias da comunidade praticavam a pesca como principal base econômica, e de modo secundário, a agricultura de subsistência em pequenos lotes ou em fazendas circunvizinhas à comunidade. Com as transformações causadas pelo empreendimento, parte da população passou a procurar emprego e outras condições de vida noutros lugares, especialmente no núcleo urbano de Altamira, centro enormemente influenciado pelas dinâmicas da Hidrelétrica.
  2.  Nesse sentido, o irreversível processo de desestruturação da população da comunidade ribeirinha aconteceu gradativamente: os moradores se deslocaram para outras áreas, mormente para trabalhar na construção civil, e os que ainda insistiram em permanecer na comunidade foram paulatinamente expropriados de suas terras, histórias e identidades.
  3. Lefebvre (2001) já mencionava que a população tende inevitavelmente a se moldar em uma sociedade urbana, pois os seus conteúdos envolvem a sociedade e refletem suas dinâmicas. O fenômeno urbano manifesta sua enormidade, desconcertante para a reflexão teórica, para a ação prática e mesmo para a imaginação.
  4. Com o processo de perda do território as famílias, acredita-se, perderam também suas relações sociais (aquelas vividas na igreja, nos bares, no campo de futebol, etc.), parte de suas identidades, restando apenas as memórias. Nesse sentido, inicia-se a reflexão sobre a memória, ou como refere-se, como um fenômeno coletivo e social, ou seja, um fenômeno construído coletivamente e submetido a flutuações, transformações e mudanças constantes.  
  5. Compreensão essa presente nas ideias de Pollak (1992), a partir dos estudos das propostas de Halbwachs (1990), para quem a memória coletiva encontra sua força e duração no fato de ser sustentada por um conjunto de indivíduos cuja lembrança do passado é referida a condição/representação de membros do grupo.
  6. Por isso a necessidade por ponderar temas sobre a geografia cultural, antes mesmo de aprofundar sobre memória e história das populações ribeirinhas atingidas pelo grande projeto, por entender que a Amazônia contém grande potencialidade de estudo, mas grandes desafios de explicação por parte dos teóricos dessa porção do país.
  7.  

3. GEOGRAFIAS CULTURAIS: DESAFIOS E POTENCIALIDADES NA E PARA AMAZÔNIA
Há crescente necessidade pelo avanço de expertises sobre a geografia cultural na Amazônia, território cuja estruturação foi pensada e repensada a partir de presunções exógenas, especialmente pelo olhar do outro, do colonizador/civilizador ocidental. Salientar a diversidade sociocultural dessa parcela do país é respeitar construções histórico-sociais ricas de significados e simbologias tradicionais e territoriais.
O objetivo da abordagem cultural é entender a experiência dos homens no meio ambiente e social, compreender a significação que estes impõem ao meio ambiente e o sentido dado às suas vidas. A abordagem cultural integra as representações mentais e as reações subjetivas no campo da pesquisa geográfica. (CLAVAL, 2002, p.20).
A maneira como o homem se relaciona com o espaço apropriando-o e/ou dominando-o constrói subjetividades espaço-temporais múltiplas, as constantes territorializações deixam marcas tanto no espaço quanto nas memórias e histórias de cada população. Pode-se afirmar, em certa medida, os sujeitos territoriais divergem seus anseios ao mesmo tempo que suas construções histórico sociais diferenciam-se, como um par dialético.
Abordagens difundidas pela sociologia e antropologia são representadas pelos escritos de José de Souza Martins, que relata que “a concepção de frente pioneira não leva em conta os índios e tem como referência o empresário, o fazendeiro, o comerciante e o pequeno agricultor moderno e empreendedor” (MARTINS, 1996, p.28). Dessa forma, a diversidade historicamente construída na Amazônia mostrou-se quebrada, especialmente pela sobreposição de poder entre os diferentes sujeitos do território.
Não é por esse motivo, que a geografia na Amazônia pode/deve esquecer de pesquisar/refletir sobre a questão cultural no e do território, especialmente pela multiplicidade de sujeitos, simbologias, identidades e colonizações aos quais envolvem-se no emaranhado de sociabilidades produzidas e reproduzidas em diferentes contextos espaço-temporais in loco.
A epistemologia das Ciências Humanas e Sociais começou a mudar nos anos 1970 (Claval, 2001-a). Graças à fenomenologia, o interesse pela experiência direita dos lugares e pelo sentido de morar (para quem e não para que, hoje e não ontem) se desenvolveu (CLAVAL, 2002, p.20).
A renovação da geografia, dos métodos e olhares sobre o ser e o viver no espaço, pressupõe a necessidade de introdução do método fenomenológico como uma maneira de buscar a realidade subjetiva dos fenômenos, a partir da realidade dos sujeitos e dos seus sentidos mais íntimos, sem necessariamente recorrer às questões obsoletas para explicar a dinâmica de um objeto.
Não se separa totalmente a fenomenologia do materialismo, pois acredita-se que as subjetivações são construídas sobre bases históricas, materiais e dialéticas. No entanto, não se utiliza elementos econômicos, ou financeiros, diretamente para explicar os objetos sugeridos, por entender que muitas vezes determinismos econômicos não abrangem a complexidade de se explicitar significações culturais, identidades e memórias de sujeitos territoriais.
Sposito (2004) caracteriza a fenomenologia como estudo que observa a volta dos sujeitos a sua essência, ou, como coloca, é volta às coisas mesmas. A fenomenologia sendo uma manifestação plena dos sentidos e da intencionalidade da consciência, da subjetividade em relação ao que pode ser representado no, ou do, espaço vivido. Enquanto para o mesmo autor, a dialética materialista, proposta por Marx, faz uma análise do movimento da história para compreender as relações contraditórias existentes na humanidade.
Neste caso, estudar as comunidades tradicionais na Amazônia, envolve o fenômeno e o retorno dos sujeitos as coisas mesmas. Sobretudo pelo entendimento de que a identidade cultural é construída a partir de descontinuidades “fixadas” no passado mais “relativizadas” na memória dos indivíduos, arquitetando uma teia de lembranças e significações intencionais que produziram, produzem, e continuarão a produzir o espaço. Corrobora-se com Berdoulay quando relata que:
A noção de espaço permite ao pensamento geográfico um esclarecimento original em torno das questões às quais nos referimos frequentemente sob o termo cultura. Embora esse termo seja altamente polissêmico, ele releva uma percepção da diversidade dos modos de vida, dos costumes, dos símbolos ou das práticas que os seres humanos utilizam nas diversas esferas de sua vida pessoal ou coletiva. O olhar geográfico nos indica que essas práticas têm uma dimensão espacial, que requerem uma organização de territórios ou uma interação com o meio ambiente, levando a uma adaptação deste ou à sua transformação (BERDOULAY, 2012, p.101).
Independentemente da acepção sobre o que é a cultura, para os diferentes autores, há certa convergência com a proposta de que as práticas culturais produzem o espaço geográfico e organizam o território, a partir de díspares funções, muitas vezes contraditórias, produzindo e tecendo uma teia conflituosa de territorializações das diferentes populações.
Como o trabalho objetiva, entre outros, desvelar características sobre a produção do espaço a partir das práticas culturais, ratificadas a partir da fenomenologia, apresenta-se de modo convergente:
A Etnografia como uma ferramenta metodológica que consiste no exercício do olhar (ver) e do escutar (ouvir) impõe ao pesquisador ou a pesquisadora um deslocamento de sua própria cultura para se situar no interior do fenômeno por ele ou por ela observado através da sua participação efetiva nas formas de sociabilidade por meio das quais a realidade investigada se lhe apresenta (ROCHA e ECKERT apud CARNEIRO; ITABORAHY; GABRIEL, 2013, p.90).
Desse modo, olhar o fenômeno em um território tão dessemelhante como a Amazônia, pressupõe olhar e valorizar as micro histórias que são edificadas pelos sujeitos tradicionais ou colonos que compõem aquele espaço, sobremaneira na tentativa de desmitificar as concepções construídas ao longo do tempo. É, precariamente comum, que construam-se histórias marginais (colocando-se de lado) a vivência e as significações dos povos que diferenciam-se daqueles ditos civilizados e ocidentais, especialmente pelo imediatismo e soberba de classe social no país, conceito/reflexões aos quais não se pretende aprofundar neste ensaio.

4. DESTERRITORIALIZAÇÃO, POPULAÇÕES TRADICIONAIS E OS CONFLITOS NO TERRITÓRIO
Haesbaert (1994) marca que a desterritorialização molda não apenas a paisagem notada pelo olhar, mas também aquilo que não se vê diretamente. Defendendo que a perda ou o desaparecimento de territórios é “mais do que uma desterritorialização desenraizadora, (pois a partir dela) manifesta-se um processo de reterritorialização espacialmente descontínuo e extremamente complexo” (HAESBAERT, 1994, p. 214).
A luz dessa linha teórica, no qual a desterritorialização transpassa o visível, e atinge a subjetividade individual e coletiva, construindo e desconstruindo marcas e conflitos territoriais de populações que distinguem suas dinâmicas e tempos de vida. A instabilização social é difundida pelo grupo, causando a fragmentação de elos que interligam os membros das comunidades e suas histórias.
Os ciclos econômicos e sociais, na Amazônia, serão entendidos neste texto como processos, assim se denomina por entende-los como ações dinâmicas e contraditórias que relacionam passado e presente em um teia de sociabilidade conflituosa. Pois causam a sobreposição de interesses e o choque cultural arraigado nas relações pretéritas e presentes provocados, especificamente por duas variáveis: o descaso por parte dos que vem de fora; e pela lógica do diminuto cuidado e a não afeição com o ambiente, mormente pelos sujeitos externos ao lugar. Nesse caso, há constantes ressignificações das relações socioculturais e da conexão com o lugar de morada, que segundo as interpretações, mostram-se com intensa desterritorialização, por isso:
O processo de identificação funciona como um veículo inconsciente de tomada de consciência, por meio do qual se tende a desenvolver um assemelhamento com aquilo que está externo a si, sendo que se toma o algo externo, de certa forma, como se fosse parte de si mesmo (SANTOS, 1994 apud RODRIGUES; OLIVEIRA; AMOEDO, 2010, p.54).
Santos (1994), estritamente, acredita que a identificação com a terra só acontece quando o lugar em que se vive é assimilado como componente primordial do hábito cotidiano. Por isso, os sujeitos hegemônicos não se preocupam com a realidade das populações ribeirinhas tampouco com o ambiente.
Ao tratar sobre a identidade e o espaço urbano na Amazônia, Souza (2010) mostra o espaço desarticulado. Esse aspecto social implica no arrefecimento, ou na perda, das relações sociais mais orgânicas motivadas pelo cerceamento e/ou pelo distanciamento dos relacionamentos. As elucubrações de Souza (idem), por sua vez, se atualizam na experiência vivida pelas famílias ribeirinhas na comunidade Santo Antônio: as observações são de que o distanciamento das relações acontece, sobretudo após as transformações socioeconômicas e na estrutura demográfica das localidades motivada com o início das obras na Usina de Belo Monte.
Isso posto, transformam-se os modos de vida das populações e disseminam-se crises e conflitos sociais, especialmente pelo rompimento com o lugar de vivência, de produção histórica e das lembranças do passado. Alguns autores corroboram com a ideia de não-lugar ao observarem a perda total, ou parcial, das relações materiais e/ou simbólicas com o espaço, passando a ocorrer apropriação e domínio por parte de outros sujeitos.
Dessa forma, seria “um novo espaço baseado na não-identidade e no não-reconhecimento; que é o que estamos caracterizando como ‘não-lugar’.” (CARLOS, 2007, p.61). Importante frisar que este texto não delimita rural ou urbano, mas fala-se de território quanto construto social e simbólico do espaço. Noutros termos, as diferentes formas de usar, apropriar ou dominar o espaço constroem diversas significações, na análise do lugar e das múltiplas territorializações que se configuram no emaranhado de relações materiais e simbólicas na produção do espaço.
E, ainda, o conceito de não-lugar convém ao desígnio de perda do vínculo das populações tradicionais com o lugar, espaço ou território vivido, produzido e personificado como ente de grande representação simbólica e sentimental da vida. No caso das famílias ribeirinhas, refere-se ao lugar de morada próximo ao rio, aos modos de vida, aos tempos e as dinâmicas próprias do lugar.
É por isso que Herrera e Moreira (2013), sobre esses processos, destacam:
O território é consolidado por interesses, culturas e objetivos distintos, que evidenciam nos embates entre os novos sujeitos e as populações tradicionais, tornando-se propício às ações coletivas, corroborando para o surgimento de diversas organizações que reivindicam interesses particulares (HERRERA; MOREIRA, 2013, p.139).
Por esse viés, empreende-se a questão da alteridade, que Martins (1996) destaca ser o lugar de encontro de diferentes sujeitos, com díspares dinâmicas e tempos sociais. O conceito é importante, pois, o trabalho arquiteta interpretações sobre os sujeitos territoriais em um espaço impactado (desterritorializado) por uma iniciativa de produção energética, que visa o lucro e a expansão do capital em si mesmo. Ratifica-se o fato de que os sujeitos não convergem entre si, mas outrora dissipam seus anseios de um núcleo central, especialmente pela diversidade cultural que compõem as populações ribeirinhas e não ribeirinhas na Amazônia, em grande parte influenciada por diásporas de migrantes de toda parte do país.
As consequências geradas com a UHE Belo Monte mostram que a Amazônia ainda é cerceada por desigualdades, expropriações socioculturais e ambientais tal como trinta (30) ou quarenta (40) anos atrás, conforme afirma-se:
Ao longo de sua história, a Amazônia tem gerado sempre mais recursos para fora (metrópole e Federação) do que tem recebido como retorno; tem sido, permanentemente, um lugar de exploração, abuso e extração de riquezas em favor de outros povos. Mesmo nos últimos trinta anos, quando grandes investimentos foram feitos em infra-estrutura, estes visaram possibilitar a exploração de riquezas favor da Federação (LOUREIRO, 2002, p.108).
Dessa maneira, há o entendimento sobre a importância de uma compreensão apurada do contexto histórico de exploração dos sujeitos não-hegemônicos, ou como aborda-se, saberes sujeitados, que Dozena (2012) já trabalhou a partir de reflexões de Foucault, examinando a concepção de contra-discursos, evidenciando a relevância dos “saberes sujeitados” locais, das microhistórias e dos registros cotidianos banais capazes de fortalecer os sujeitos na coletividade, que comumente é depreciada diante da prevalência das narrativas oficiais legitimadoras do poder instituído.
Noções essas, que justificam e estruturam o escopo do trabalho, que se segue com amostras empíricas sobre a comunidade Santo Antônio, no qual tenta-se explicitar a desterritorialização a partir de trechos de entrevistas, imagens e notas teóricas que emolduram o contexto.

5. HISTÓRIA E MEMÓRIA DA COMUNIDADE SANTO ANTÔNIO
Concorda-se com Rodrigues e Fredrych (2013) quando relatam que a inserção em uma comunidade tem o objetivo primordial de “apreender” a visão de mundo do outro.  Sob esse viés, a intenção é elucidar a desterritorialização das populações ribeirinhas na comunidade Santo Antônio, a qual tem parte de suas dinâmicas envolvidas pelo tempo e pelas benesses do rio Xingu e afluentes. Busca-se discutir a respeito da história de exploração e da memória que, gradualmente, é usurpada em detrimento de um projeto de acumulação capitalista, com grandes impactos ambientais e a, consequente, saída daquelas pessoas do lugar de morada. Sobre isso, Aranha Silva (2010), expõe:
A saída forçada das populações ribeirinhas, promovida pelas obras de instalação de usinas, é acompanhada por compensações financeiras que se volatizam em pouco tempo. O processo de reassentamento, seja ele rural ou urbano, rompe com as tradições culturais, o elo familiar e não assegura a manutenção das condições anteriores de vida (ARANHA SILVA, 2010, p.197).
Os compensamentos financeiros, ou o reassentamento das famílias atingidas pela hidrelétrica, não são suficientes para estruturar as vidas, tampouco para (re)caracterizar a história e a memória edificada ao longo das gerações. A constante reterritorialização dos sujeitos impactados, na Amazônia, significa, em certa medida, o esforço de os sujeitos reescreverem a própria história e ressignificarem a memória em um “não-lugar” que não traz lembrança alguma.
Na comunidade Santo Antônio, a entrevistada 1 (56 anos, dona de casa) relata que após o início das obras na hidrelétrica houve um rompimento com as práticas pretéritas em detrimento as novas dinâmicas socioeconômicas e ambientais, “hoje não, hoje a gente num pode fazer mais nada, porque aqui isso aqui num é mais nosso né é deles, então eu só tô aqui mais porque tenho uma neta que ta estudando e num pode sair daqui agora, eu num consegui vaga em Altamira” (ENTREVISTADA 1, 2012). Nota-se, inicialmente, que o projeto de construção da usina, manteve as famílias na comunidade, o qual tem, gradualmente, o rompimento dos sujeitos com o lugar. O que significa dizer “isso aqui num é mais nosso né é deles”? Noutros termos, o relato ratifica a perda do contato com o lugar, o rompimento com a história e a desterritorialização com o desgaste socioespacial1 .
Sobre as desapropriações, ou deslocamentos, compulsórios em um cenário macro, evidencia-se:
Estima-se que as usinas hidrelétricas construídas no Brasil inundaram 34.000 km² de terras para a formação dos reservatórios e provocaram a expulsão – ou ‘deslocamento compulsório’ – de aproximadamente 200 mil famílias ribeirinhas (WWF BRASIL apud ARANHA SILVA, 2010, p.203).
Quando a entrevistada 1 (líder comunitária, dona de casa) relata sobre o tempo de vida e as transformações no cotidiano das populações ribeirinhas após a UHE Belo Monte, destaca que “a mudança pra nós é assim né porque a gente, como já falei, nós vivia numa vida tranquila, num tinha porque ta correndo, agora a gente tem que ta saindo correndo. Aí a gente num faz mais nada mesmo, aí tem que sair correndo por causa deles” (ENTREVISTADA 1, 2012). Assim, desvela-se que as transformações nas dinâmicas sociais e os choques com os diferentes tempos sociais provocaram a precarização da alteridade territorial a favor do modelo de desenvolvimento, considerado hegemônico, que visa determinar os papeis político-econômicos exercidos pelas diferentes classes.
Assim, corrobora-se com Berdoulay (2012) quando afirma que o papel ocupado pelas imagens, sobretudo simbólicas e imateriais é central. São elas que midiatizam de maneira sensível a relação do sujeito com o espaço. Elas têm, em níveis diversos, uma materialidade que lhes permite funcionar como veículos de símbolos e entrar nos processos complexos de simbolização de elementos do ambiente.
A entrevistada 1 (56 anos, dona de casa) afirma que a indenização paga pela empresa construtora não comprou a vida e as histórias daquele lugar. O capital, neste caso sob o amparo do Estado, nas fronteiras, consideradas de expansão e desenvolvimento, não estipula o valor dos aspectos imateriais da vida da população, transformando-os em mercadorias. Segundo a entrevistada: “o que elas pagaram pra nós num vale a pena, num paga nossa vida aqui né, eles deram mixaria pra gente. [Eles já pagaram] já pagaram [estabeleceram prazo pra sair] deram o prazo de trinta dias pro povo sair”. A vida, no sentido lato da palavra, em Santo Antônio, em prazo breve teve que dar lugar aos trabalhadores, aos roncos de vai e vem das máquinas, às escavações e a insegurança sobre o futuro.
Os caminhões de abastecimento de água para as obras na usina, que são levados do igarapé Limão nas proximidades da comunidade Santo Antônio até os canteiros de obras, demonstram as transformações sociais e a dinâmicas exógenas com as quais a comunidade teve que coexistir. Historicamente, na Amazônia, a vida humana tem sido alijada de seus espaços de subsistência e sociabilidade para dar lugar aos grandes projetos, os quais são marcas da instabilidade territorial e do contato de diferentes sujeitos sociais.
Sobre a implantação dos grandes projetos que afetam diretamente os modos de vida de dada população, neste caso em Santo Antônio, ocorre uma espécie de rompimento com a história pessoal e os modos de vida em comunidade, o entrevistado 2 (presidente da comunidade, pescador) relata que as suas lembranças recaem sobre a saudade dos tempos em que a comunidade vivia sem a ameaça da desterritorialização:
Cara, tudo! tudo! Tudo eu tenho saudade de tudo! eu tenho saudade das nossas festas, eu tenho saudade da minha amizade que eu tenho aqui dentro, eu tenho saudade da confiança que o pessoal tinha em mim, eu tenho saudade do futebol que a gente tinha aqui, eu tenho saudade do rio, eu tenho saudade das praia, eu tenho saudade de tudo, sabe, tudo cara (ENTREVISTADO 2, 2012).

  1. Halbwachs (1990: 71) afirma que a lembrança é “a reconstrução do passado com dados emprestados do presente”. Acima, o entrevistado recorre a plataforma da “saudade” para demonstrar do que sente falta, ele reconstruiu as lembranças individuais e coletiva a partir das imagens que ele tem de si e dos demais indivíduos em sociedade. A memória coletiva é referida a condição/representação de membros do grupo.
  2. Nesse viés, a teia de sociabilidade construída proporciona a formatação de uma identidade territorial, territorializações, a medida que o enfrentamento entre os sujeitos hegemônicos e não hegemônicos sobrepõem-se em uma base territorial. Não obstante, o conflito pelo poder marca a deterioração das histórias dos saberes sujeitados, não hegemônicos e a superposição por parte dos sujeitos hegemônicos (agentes do capital) sobre aqueles, mormente após a construção da UHE Belo Monte.

O barramento do rio para viabilizar a construção da UHE Belo Monte e a materialização do poder das elites e também a insurgência dos manifestantes, em maio de 2012, ocupando um dos canteiros da obra. Ratifica, a instabilidade territorial e o rompimento com a alteridade dos modos de vida passados, das comunidades ribeirinhas tradicionais.
Com o barramento do rio e, também, do Igarapé Limão, diretamente vinculado a comunidade, inviabilizou-se a pesca (como principal atividade) e a reprodução de muitas espécies de peixes. A mudança no modo de adquirir o alimento tem fortes implicações socais e econômicas para as famílias desterritorializadas de Santo Antônio, dois aspectos são possíveis de serem apontados: o alimento (peixe) que antes era obtido no rio, por meio da pesca, passou a ser comprado nas feiras ou em supermercados na cidade de Altamira; o resultado das pescas, geralmente, era socializado entre os vizinhos. A desterritorialização provocou a quebra da partilha, hábito comum em pequenos vilarejos ou comunidades.
Retomando as ponderações sobre a resistência, a tentativa de manter a luta social viva em um território com tantos conflitos e desgastes, como se evidencia, faz parte da preocupação do entrevistado 2 ao registrar a força e persistência dos movimentos sociais/ativistas na busca por direitos socioambientais e pelo embargo das construções na Usina. Quando relata que:
Sinceramente, pra mim é muito doído isso, e eu quero dizer pra vocês que: eu não sei se a nossa história acabou aqui, o que eu quero dizer pra vocês... Não, não quero dizer que essa história acabou, não, tem gente aqui e tem gente do meu lado, então vamos lutar... (ENTREVISTADO 2, 2013).

Nesse sentido, o evento “Xingu + 23” buscou reafirmar os problemas relacionados a construção da UHE Belo Monte, como o não cumprimento das contrapartidas sociais, chamadas de condicionantes, garantidas no Plano Básico Ambiental – PBA e o respeito a cidadania que cada um dos sujeitos territoriais poderiam exercer.
Os eventos e reinvindicações públicas são indicadores de problemas estruturais nas construções da hidrelétricas na Amazônia. O fragmento de entrevista citada, anteriormente, proporciona a vivência e a emoção das populações tradicionais na pele, onde os simbolismos edificam uma áurea de vida e morte, luz e trevas, poder e fraqueza que emolduram as dinâmicas das relações entre os sujeitos territoriais. Importante a reflexão, como coloca-se:
Não menos graves são os problemas sociais, particularmente com relação às populações ribeirinhas atingidas pelas obras das usinas. Os registros em documentos, como os EIA/RIMA (Estudos de Impacto Ambiental/Relatório de Impacto do Meio Ambiente) apontam que a formação do reservatório determina uma perspectiva de perda irreversível das condições de produção e reprodução social das comunidades atingidas (ARANHA SILVA, 2010, p.198).
As perdas simbólicas e sociais, como indicadas no escopo do texto, são inerentes às grandes obras de exploração energética. No entanto, não seria justificável deixar de identificar os sujeitos responsáveis por essas mazelas, por entender como potencial à superação do status quo que envolve a sociedade amazônida. Para tanto, não responsabiliza-se o Estado ou o Capital como únicos e invariáveis sujeitos com dolo, pois, ponderar a responsabilidade de diferentes formas na totalidade da vida social e dos micro grupos que compõem a estrutura sociocultural de um povo é basilar à materialização dos valores sociais e da democracia.
Em termos atuais, colonos e não colonos sofrem com a desterritorialização causada pela UHE Belo Monte, visto que essa área sofre influência dos impactos da usina. Por isso, desterritorializar, portanto, antes de significar desmaterialização, dissolução das distâncias, deslocalização de firmas ou debilitação dos controles fronteiriços é um processo de exclusão social, ou melhor, de exclusão socioespacial, Haesbaert (2007).
Na Amazônia, não resta dúvida de que o processo de “exclusão”, ou melhor, de precarização socioespacial promovido por um sistema econômico altamente concentrador é o principal responsável pela desterritorialização das famílias.

6. PARA NÃO CONCLUIR
O estudo sobre a desterritorialização das populações tradicionais possibilita a acepção do descaso que os setores sociais hegemônicos têm com o território daqueles sujeitos. Para tanto, ultrapassar o status quo é romper com as relações de dominação que historicamente fazem parte da realidade amazônica, na tentativa de erigir parâmetros sociais justos e alicerçar a cidadania “que deveria existir” em um sistema democrático.
No entanto, o que se materializa é a constituição de uma inversão de valores e da ineficiente formação dos setores sociais básicos. Nesse sentido, transformar o cenário de desgaste das populações ribeirinhas deve necessariamente passar pelo respeito e por políticas públicas e privadas que compreendam e respondam às demandas das populações atingidas por grandes empreendimentos.  
Assim, discute-se a práxis invertida, pois ao invés de haver políticas que funcionem como ação orientada para a construção livre e autônoma do território, essas se apegam aos mandamentos de uma lógica corporativa que promove a expansão e o fortalecimento dos nexos capitalistas, capazes de erigir uma configuração territorial que lhe dá suporte, Pereira (2011).
Com as ideias elencadas, importante frisar o que o autor anterior destaca em uma perspectiva macro, contextualizando a Amazônia, a saber:
É de uma alienação territorial que se trata, quando especializações regionais/territoriais impõem nexos externos comandados por um mercado distante, [...]quando os usos do território se dão muito em função de propósitos alheios ao cotidiano da nação, quando as atividades se invertem visando atender apenas demandas distantes cujo controle é remoto e, sobretudo hoje, quando o território nacional se torna alvo e refém de um capital financeiro globalizado que, por princípio, não tem compromisso moral com lugar algum (PEREIRA,2011, p.100).
É importante às interpretações, pois grande parte do uso e domínio do território impactado pela UHE Belo Monte acontece em função dos sujeitos exógenos, descaracterizando as marcas territoriais das famílias ribeirinhas. De todo modo, propõe-se que o desenvolvimento de projetos políticos, de qualquer natureza, abarque a diversidade e a necessidade das populações de acordo com suas representações socioculturais, no sentido de amenizar a desterritorialização e engrandecer os saberes que foram sujeitados à ideia de progresso, nessa porção da Amazônia.

7. BIBLIOGRAFIA
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1 A comunidade Santo Antônio foi completamente desabitada entre 2012 e 2013, por isso se coloca, no texto, que as transformações foram irreversíveis.

Recibido: 13/02/2016 Aceptado: 26/04/2016 Publicado: Abril de 2016

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