Revista: CCCSS Contribuciones a las Ciencias Sociales
ISSN: 1988-7833


SOBRE ATIVISMO JUDICIAL:
O debate “substancialismo x procedimentalismo” em perspectiva

Autores e infomación del artículo

Lorena Fonseca Silva*

Felipe Fróes Couto **

Universidade Estadual de Montes Claros - Unimontes, Brasil

lorena.fonseca@outlook.com

Resumo: Tradicionalmente, questões políticas são decididas no âmbito do poder executivo ou do legislativo, por isso, a intervenção judicial nas decisões de políticas públicas ou em questões cientifica ou moralmente polêmicas recebem muitas críticas. O objetivo desta pesquisa é analisar se há legitimidade na atuação de Juízes e Tribunais que decidem questões que extrapolam a órbita do processo judicial e interferem em decisões de política legislativa ou executiva. Por meio de método descritivo de pesquisa, buscou-se descrever e compreender os fatos/teorias afetos à temática. Utilizou-se a técnica bibliográfica, bem como a pesquisa jurisprudencial. Foram examinados posicionamentos substancialistas e procedimentalistas que envolvem o tema, bem como foram explorados modelos de interpretação em casos difíceis do professor Cass Sunstein. Constatou-se, sob à luz das teorias, que a intervenção judicial em questões políticas é temerária. A interferência dos Juízes não possui legitimidade, nem dispõem do diálogo necessário com a sociedade para definir as políticas públicas que sejam convenientes para cada época. Logo, o poder judiciário deve apenas garantir o funcionamento adequado do processo democrático deliberativo e não se envolver em decisões de mérito político.
Palavras-Chave: Judicialização da política - Ativismo judicial - Poder judiciário - Legitimidade.

ABOUT JUDICIAL ACTIVISM:
the debate "substantialism x procedimentalism" in perspective

Abstract: Traditionally, political issues are decided within the framework of the executive or of the legislature, so the judicial intervention in public policy decisions or in scientific or morally controversial issues receive much criticism. The objective of this research is to analyze whether there is legitimacy in the performance of Judges and Courts who decide issues that go beyond the orbit of the judicial process and interfere in legislative or Executive policy decisions. By means of descriptive research method, it was sought to describe and understand the facts/theories related to the subject. Bibliographical technique was used, as well as the case law research. Substantialists and procedimentalists positions were examined involving the subject, as well as models of interpretation were explored in difficult cases of professor Cass Sunstein. It was noted, under the light of theories, that judicial intervention in political issues is reckless. The interference of judges does not have legitimacy, nor have the necessary dialogue with society to define the public policies that are suitable for each season. Therefore, the judiciary should only ensure the proper functioning of the democratic deliberative process and not get involved in decisions of political merit.
Key-words: Judicialization of politics – Judicial activism – Judiciary – Legitimacy

SOBRE ACTIVISMO JUDICIAL:
el debate "substancialismo x procedimentalismo" en perspectiva

Resumen: Tradicionalmente, cuestiones políticas son decididas en el marco del poder ejecutivo o del legislativo, por eso, la intervención judicial en las decisiones de política pública en temas científicos o moralmente polémicos recibe muchas críticas. El objetivo de esta investigación es analizar si existe legitimidad en el desempeño de los jueces y tribunales al decidir cuestiones que van más allá de la órbita de los procesos judiciales e interfieren en las decisiones de política legislativa o ejecutiva. Mediante el método de investigación descriptiva, se intentó describir y comprender fatos/teorías afectas al tema. Se utilizó técnica bibliográfica, así como la investigación de jurisprudencia. Fueron examinadas posiciones substancialistas y procedimentalistas que implican al tema, así como fueron explorados modelos de interpretación en casos difíciles del profesor Cass Sunstein. Se observó, a la luz de las teorías, que la intervención judicial en cuestiones políticas es imprudente. La interferencia de los jueces no tienen legitimidad, ni tienen el necesario diálogo con la sociedad para definir las políticas públicas que son adecuadas para cada temporada. Pronto, el poder judicial debe solamente garantizar el correcto funcionamiento del proceso democrático deliberativo y no involucrarse en las decisiones políticas en el mérito.

Palabras clave: Judicialización de la política – Activismo judicial – Poder judicial – Legitimidad.


Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Lorena Fonseca Silva y Felipe Fróes Couto (2016): “Sobre ativismo judicial: o debate “substancialismo x procedimentalismo” em perspectiva”, Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, (abril-junio 2016). En línea: http://www.eumed.net/rev/cccss/2016/02/legitimidade.html

http://hdl.handle.net/20.500.11763/CCCSS-2016-02-legitimidade


Introdução

 A Constituição da República Federativa do Brasil de 88 (CF/88) é um marco na mudança de um modelo de Estado Autoritário para o Estado Democrático, pois trouxe um vasto leque de direitos sociais, ampliando o assistencialismo social, os direitos dos trabalhadores e também consolidou princípios democráticos, direitos individuais e coletivos.
Trata-se de um momento pós-autoritário na história do país, que caminha para uma democracia consolidada, em que o catálogo de direitos aumentou, bem como a necessidade de cumprir o programa constitucional e de torná-lo efetivo também. Por isso, muitas demandas chegaram até o judiciário e a consequência foi o protagonismo desse poder. Até a produção de leis e de políticas públicas que tradicionalmente era do legislativo/executivo foi se encaminhando para do poder judiciário 1.
Em meio a essa interferência judicial, alguns questionamentos surgiram: há legitimidade constitucional na atuação do poder judiciário em temas políticos, historicamente de competência do poder legislativo? No contexto do Estado Democrático, o Juiz deve proferir decisões que interfiram nas decisões de políticas legislativas ou executivas?
Para responder a estes questionamentos será feita uma exposição de modelos de interpretação constitucional em casos difíceis desenvolvido pelo professor Cass Sunstein. Também serão apresentadas duas correntes que abordam a questão da intervenção judicial em temas políticos. Uma delas é conhecida como substancialista, por defender o ativismo judicial e considerar a intervenção do judiciário necessária para garantir os direitos e conter o risco da tirania da maioria. Dentre seus principais defensores estão Dworkin, Cappelletti e Agra. A outra corrente é a procedimentalista que tem como defensores Habermas, Garapon, Sunstein e Ely, os quais sustentam que o ativismo judicial é perigoso para o regime democrático, pois dificulta fortalecimento de uma cidadania ativa. Essa vertente considera que o ativismo impede que o cidadão exerça seu direito fundamental de participação e obsta, assim, que a opinião pública se converta em vontade.
Este trabalho visa contribuir e justificar o posicionamento da segunda corrente, de que a interferência do judiciário em questões políticas é ilegítima, temerária e cria um paternalismo judicial que põe em risco a democracia, além de ter o condão de esvaziar o espaço público de participação popular nas decisões políticas, de modo a tornar o poder judiciário a última esperança de efetivação das promessas democráticas.
Para fazê-lo, utilizaremos como metodologia de pesquisa o método descritivo, objetivando descrever e compreender os fatos/teorias afetos à temática. A técnica utilizada será a bibliográfica, com uso de pesquisa jurisprudencial, a fim de levantar um melhor entendimento do tema em casos específicos. É a lógica da presente pesquisa.

1. Compreender para aprofundar

Antes de responder às perguntas postas é preciso esclarecer algumas questões importantes que se encontram no entorno dessa temática. Filiamo-nos à corrente que entende que o dito protagonismo judicial faz parte de um movimento de judicialização da política que é um “processo social por meio do qual o próprio poder constituinte ou parlamentar amplia a área de atuação dos Tribunais, juridicizando setores da vida política, social e econômica que antes não estavam sujeitos à ação judicial”2 .  Entendemos que o Juiz não escolhe judicializar, não promove judicialização, ela advém da ampliação da competência dos órgãos judiciais pelo texto constitucional.
A famigerada discussão se concentra nas condutas eivadas de ativismo judicial, porque o ativismo “implica uma tomada de posição por parte do juiz no sentido de atuar de modo politicamente ativo e implementar linhas de ação destinadas a expandir o campo de decisão judicial ou amplificar o poder político do Tribunal”3 . O ativismo ocorre espontaneamente pela vontade do Juiz que adota uma postura hermenêutica flexível, buscando interpretar as leis de modo a ampliar as competências do judiciário, proferindo decisões de natureza política.
Por essas razões, muitas vozes expressam descontentamento com as decisões do judiciário que exorbitam sua área de atuação. Segundo essa vertente, isso produz e reproduz um “contexto fortemente limitador do desenvolvimento de uma cultura cívica, o mundo da opinião não encontra espaço nem meios para expressar sua vontade na esfera pública que, por conseguinte, tende a se estreitar cada vez mais” 4. Portanto, é desse ponto que exploraremos nossa pesquisa, como exposto na introdução deste trabalho.

2. Modelos de interpretação constitucional

Neste subtítulo, serão expostas brevemente quatro modelos teóricos de interpretação e decisão judiciais desenvolvidos pelo Cass Sunstein. São eles: perfeccionismo (perfeccionism), modelo majoritário ou majoritarianismo (majoritarianism), originalismo (originalism) e minimalismo (minimalism). Isso dá embasamento para observarmos a postura ativista dos Juízes em questões políticas ou moralmente complexas.
Segundo Silva 5, normalmente, são os magistrados liberais que apoiam o modelo perfeccionista de função judicial. Os julgamentos tendem a ser ambiciosos, conferem novos direitos e fazem interpretações inovadoras de princípios para tornar o texto constitucional “melhor”. Eles fazem um juízo interpretativo independente, apoiado em princípios e se embasam em teoria política, constitucional, do Estado e filosofia jurídica.
Além disso, “os discursos de magistrados perfeccionistas tende a ser fortemente prescritivos, principiológicos e marcados por uma propensão à moralização do Direito e da decisão judicial.”6 Ao julgar eles já prescrevem como questões afetas (ou não) àquele caso deverão ser decididas no futuro. O discurso é dotado de persuasão e orientação para os outros poderes e marcado por considerações axiológicas.
A leitura moral da Constituição, de Dworkin, é um dos principais exemplos do modelo perfeccionismo. Segundo o autor, “a leitura moral propõe que todos nós – Juízes, advogados e cidadãos – interpretemos e apliquemos esses dispositivos abstratos considerando que eles fazem referência a princípios morais de decência e justiça”7 .
A moralidade política estaria, então, inserida dentro da interpretação jurídica, onde há uma leitura construtivista de princípios políticos e morais fundamentais no julgamento de normas constitucionais que estabelecem direitos fundamentais controversos. Assim, a leitura moral de Dworkin é um exemplo de perfeccionismo na medida em que incorpora princípios morais e abstratos para solucionar o problema e informar a decisão.
Outro fenômeno interligado com o perfeccionismo é o neoconstitucionalismo. De maneira sucinta podemos dizer que o neoconstitucionalismo compreende o texto constitucional como uma ordem de valores, concretizada normativamente por intermédio dos princípios e regras jurídicos. A interpretação é feita de forma jurídica, mas também moral. Há uma forte propensão a extrair ao máximo a eficácia direta e irradiante dos princípios Assim, a relação fica estabelecida porque ao lerem a Constituição de forma “moralizante”, concebendo-a como uma ordem normativa responsável pela concretização de valores pré-estatais, marcada por principialismos, nota-se a manifestação de uma visão perfeccionista 8.
Por fim, importante salientar que o modelo perfeccionista recebe muitas críticas, porque com ele os Juízes recebem muito poder e na resolução de casos difíceis nem sempre há certeza quanto aos conhecimentos do magistrado sobre teoria política, ética ou moral9 .
Passemos agora para o modelo majoritário que objetiva, por um lado, reduzir a atuação dos Tribunais constitucionais nas decisões de políticas públicas e, por outro, manter as decisões de representantes eleitos democraticamente. Silva explica que desse modo nas “questões morais, políticas, ambientais, econômicas e sociais altamente controversas, a última palavra deverá ser aquela dada pelos órgãos democráticos de formação da vontade coletiva”10 .
Neste modelo é o legislativo e a sociedade civil no âmbito do espaço público que irão decidir questões que envolvam um grande impacto político, econômico, cultural. Um grande adepto do majoritarismo, Tushnete 11, defende o constitucionalismo popular e a abolição do judicial review americano.
Segundo Tushnet a interpretação da Constituição deve ser estar a cargo do Congresso, do Presidente e dos governadores de estado. As questões fundamentais em seu mérito devem por eles ser decididas, pois é um papel a ser desempenhado pelos cidadãos e pelos representantes eleitos nas democracias contemporâneas 12.
As críticas a esse modelo são que a valoração excessiva da premissa majoritária e posterior desconsideração do papel da Constituição como uma protetora de direitos fundamentais a cidadania acaba por converter o texto constitucional em um programa a serviço da premissa majoritária, não conferindo o merecido relevo ao fato de que a principal função de uma Constituição é limitar o que maiorias transitórias podem fazer13 .
O terceiro modelo a ser tratado é o originalismo. Segundo Silva14 é um modelo essencialmente aplicável somente ao debate norte-americano. O pensamento originalista defende uma leitura conservadora do texto da Constituição e uma revisão das decisões liberais da Corte. Busca-se a intenção original do texto no momento em que ele foi ratificado. O trabalho interpretativo dos defensores do originalismo é similar a de um “escavador”, pois objetiva redescobrir e resgatar a fonte essencial do texto constitucional, a intenção original.
Por fim, um quarto modelo chamado de minimalismo que se caracteriza por restringir a atuação do Juiz a questões indispensáveis para a justificação da decisão dos casos em exame. As questões normativas contíguas, profundas e controversas permanecem em aberto15 .
Como as questões polêmicas são deixadas em aberto, reduz-se a frequência de erros judiciais, pois a análise restrita e não versa sobre casos difíceis que envolvem política, economia, meio ambiente que podem gerar efeitos danosos em grande escala 16.
Algumas vertentes de minimalismo abrem espaço para o debate democrático e participação dos eleitos democraticamente, desse modo, as questões complexas são decididas por atores políticos e pela sociedade civil17 .
Além disso, o minimalismo “recomenda argumentações modestas, enfrentando o problema do desacordo razoável duradouro; enquanto ‘substância’ promove a deliberação democrática nas instituições politicamente responsáveis”18 .
Em resumo:
São adeptos do minimalismo os juízes que procuram evitar regras gerais e teorias abstratas, a adoção de posicionamentos ambiciosos em questões “profundas” e que concentram a sua atenção somente naquilo que é necessário para resolver o problema em questão. Também evitam ingressar em debates fundacionalistas sobre teoria jurídica, moral e política 19.

Portanto, os Juízes minimalistas não buscam promover reforma constitucional por meio de decisões judiciais. Não é característica deles participarem de “movimentos de juízes” de qualquer tipo. Eles levam em consideração nos julgamentos o sistema de precedentes, as decisões dos órgãos técnicos e das instituições legitimadas democraticamente20 .
Finalizamos assim a exposição dos quatro modelos teóricos de interpretação e decisão judiciais desenvolvidos pelo Cass Sunstein, o que nos permite, em seguida, observar a atuação judicial de forma atenta e crítica.

3. As correntes substancialista e procedimentalista

Como dito, a ampla abertura hermenêutica possibilitou uma crescente atuação do judiciário em temas que eram decididos pelo poder político (e não jurídico). Essa intervenção do poder judiciário na arena política, decidindo questões antes reservadas a outros poderes é defendida pelo eixo substancialista que considera que a atuação dos Juízes na política é indispensável para concretização de direitos sociais e políticos garantidos pela Constituição.
De outra banda, o eixo procedimentalista vê que a atuação sem medidas do judiciário em questões políticas pode depauperar a esfera pública democrática. Neste momento, debruçaremos sobre esta vertente que acredita que mudanças políticas devem ser discutidas por meio de um processo plural e participativo. Eles sustentam que ao efetivar as promessas da democracia por meio do judiciário, judicializa-se a política e dificulta a construção de um espaço público de debate político democrático. Os procedimentalistas entendem que o judiciário tão somente deve estabelecer regras do jogo político, assegurar igualdade de participação e garantir instrumentos de acesso à arena política.
O que preocupa os procedimentalistas é que o judiciário sobreponha os outros poderes de forma não controlada e isso traga prejuízos para a separação de poderes. Além disso, ao controlar e garantir as liberdades públicas, o judiciário pode se tornar a mais alta instância moral da sociedade. A função de intérprete da Constituição não é negada, mas a capacidade normativa do judiciário não pode se agigantar a ponto de romper com a força normativa democrática vinda das leis21 .
O judiciário ganhou um espaço tão significativo que pode se tornar a esperança para uma democracia enfraquecida. Se por um lado essa atuação busca estabilizar as esferas sociais e políticas, por outro, há um enfraquecimento do homem cívico, público e preocupado com o interesse comum. O Juiz vem se tornando a última esperança, mas “a promoção contemporânea do Juiz não se deve tanto a uma escolha deliberada, mas antes a uma reação de defesa perante o quádruplo desmoronamento: político, simbólico, psíquico e normativo”22
Segundo os procedimentalistas, o judiciário torna-se o guardião das promessas democráticas de igualdade e isso pode demonstrar a fragilidade das instituições políticas. A soberania popular se declinou, deslocando o reconhecimento do justo para a justiça e não mais para a política. Garapon ensina “o Juiz torna-se o último guardião das promessas, tanto para o indivíduo como para a comunidade política. Não tendo guardado a memória viva dos valores que os fundamentam, este últimos pediram à justiça que zelasse pelos seus juramentos”23 . Isso fica ainda mais claro se observarmos que até a linguagem na democracia se modificou: “imparcialidade, processo, transparência, contraditório, neutralidade, argumentação, etc”24. Nesse contexto de significações, os Juízes figuram como nova representação ética das ações coletivas.
Garapon e Habermas são os principais representantes da teoria procedimentalista. Eles sustentam, em resumo, que o alargamento da interferência estatal na vida social, recrudesce a cidadania e ainda potencializa a dependência da sociedade em relação ao Estado provedor.
A presença do direito na política, per si, já é um indicador de privatização da cidadania, pois transforma o cidadão em cliente do Estado e dependente dele. O direito e a lei tem se tornado as derradeiras referências de esperança, criando um agir desorientado para fins cívicos. A reparação disso seria feita por meio de uma política democrática que privilegiasse a formação de uma cidadania ativa25 .
Segundo Vianna,
Em um sistema providencial, o Estado é todo-poderoso, podendo a tudo satisfazer, remediar, atender. Daí que, diante de sua decadência, as esperanças nele depositadas se transfiram para a Justiça. Doravante é nela, e, via de consequência, fora do Estado, que se encaminha a realização da ação política. O sucesso da Justiça é inversamente proporcional ao descrédito que afeta as instituições políticas clássicas, em razão do desinteresse existente sobre elas e a perda do espírito público26 .

Esse deslocamento da democracia para os Tribunais pode afligir, porque se supervaloriza o individualismo e o conflito, enquanto na política, a busca pelo consenso é caminho necessário para o bem comum. O direito se fortalece, porém, “o excesso de direito pode desnaturar a democracia; o excesso de defesa pode bloquear a tomada de decisão; o excesso de garantias pode mergulhar a justiça numa espécie de indecisão ilimitada” 27, o mau uso do direito também pode ser um problema.
Vianna explica que Habermas defende o Procedimentalismo e busca “[...] colocar sob novo ângulo a questão do soberano e da conformação da vontade geral, concebendo a sua proposta em favor de um paradigma procedimental do direito”28 . As interconexões entre democracia deliberativa e representativa ocorrem por meio de fluxos comunicacionais de uma cidadania livre e ativa. O que se depreende da doutrina habermasiana é que a “[...] combinação universal e a mediação recíproca entre a soberania do povo institucionalizada juridicamente e a não-institucionalizada [...]” 29.
Pelo viés procedimentalista do direito de Habermas, a esfera pública é um centro de debate que gera impulsos comunicativos e que ocorre antes da produção legislativa. O efeito disso é: “a) autorização sobre o legislador, e b) de legitimação sobre a administração reguladora; ao passo que a crítica do direito, mobilizada publicamente, impõe obrigações de fundamentação mais rigorosas a uma justiça engajada no desenvolvimento do direito”30 .
Habermas sustenta que os indivíduos reconhecem-se como iguais, tornam-se autores de seus direitos e não se reduzem a receptores de políticas de bem estar. Nesse sentido, Vianna explica:
No paradigma procedimental de Habermas o cidadão não seria um simples participante de um jogo mercantil nem um cliente de burocracias de bem-estar, e sim o ator autônomo que constituiria a sua vontade e a sua opinião no âmbito da sociedade civil e da esfera pública, canalizando-a, em um fluxo comunicacional livre, para o interior do sistema político 31.

Conforme Habermas a função precípua dos Tribunais é “[...] mobilizar as razões que lhe são dadas, segundo o ‘direito e a lei’ [...]”32 e a função do legislador é interpretar e estruturar os direitos. Por isso que os Juízes devem apenas assegurar o acesso ao jogo democrático, atuando somente para garantir o funcionamento das estruturas constitucionais.
Nesse contexto, temos propostas procedimentalistas que objetivam criar uma legitimação do judiciário por procedimento que embase as decisões fora de qualquer conteúdo ontológico. Os princípios universalizantes então só poderiam ser usados com base em procedimentos que assegurem a previsibilidade da tomada de decisões33 .
Segundo a teoria de John Hart Ely34 a base da legitimação da jurisdição não está nos conteúdos constitucionais e sim nos procedimentos assecuratórios do regime democrático. Assim, a função da tutela constitucional seria corrigir os processos de representação popular e não analisar se os substratos materiais da Constituição estão sendo cumpridos35 .
A função dos Juízes seria garantir a participação dos cidadãos nas decisões políticas, verificando se as normas infraconstitucionais contrariam os mandamentos constitucionais, observando se os representantes populares foram eleitos de acordo com o regime democrático e cuidando para que as normas infraconstitucionais não cerceiem a participação da minoria. A proteção da jurisdição constitucional está na igualdade de participação, assim, os direitos fundamentais são apenas consequência do procedimento. Tanto é assim que Ely não concorda com uma legitimação substancialista nem para concretizar direitos sociais. Inclusive, o conteúdo das normas do poder legislativo poderia ter qualquer teor, desde que o processo democrático tenha sido respeitado36 .
Ely não acredita que a jurisdição constitucional tem que proteger os valores morais da sociedade, porque inexistem princípios morais neutros ou uma única moral social. Segundo o autor, é o povo, por meio dos seus representantes eleitos, quem devem estabelecer os princípios morais, pois são eles que detêm legitimidade para isso 37.
Há muitas críticas em torno da teoria de Ely, uma delas é a de que o sistema representativo está em crise e a democracia se volta para os anseios do poderio econômico, assim o povo não estaria desempenhando papel relevante nas decisões políticas. Neste sentido, Dworkin afirma:
Ely insiste em que o papel adequado do Supremo Tribunal é policiar o processo da democracia, não rever as decisões substantivas tomadas por meio desses processos. Isso poderia ser persuasivo se a democracia fosse um conceito político preciso, de modo que não pudesse haver lugar para discordância quanto a ser ou não democrático um processo. Ou se a expectativa norte-americana definisse unicamente alguma concepção particular de democracia, ou se o povo norte-americano concordasse agora com uma única concepção. Mas nada disso é verdade, como Ely reconhece 38.

A crítica de Cappelletti também é pertinente, pois ele expõe que não se pode aplicar à atividade judiciária os mesmo critérios da atividade jurídica, como Ely faz. A legitimação da jurisdição é diferente, pois depende de provocação das partes, prolação de decisão por órgão relativamente independente e imparcial39
Outro defensor da vertente procedimentalista que acredita na legitimação da jurisdição constitucional com base na democracia política é o Cass Sunstein 40. Conforme o professor, o judiciário deve se ater às suas funções contendo o ativismo para concretização de outros direitos, sendo possível a atuação extensiva em dois casos: quando o direito for relevante no processo democrático ou quando grupos minoritários não recebem tratamento isonômico no processo político. Sunstein defende a existência de direitos substanciais na Constituição, minimalism’s substance, que foram concretizados devido à formação de um amplo consenso por parte dos cidadãos nas instâncias políticas da sociedade, mas que não são direitos absolutos e sim relativos, entrelaçados à participação política dos cidadãos 41.
Nessa concepção, os direitos fundamentais não são um alicerce primordial, são produtos do processo deliberativo, sendo, portanto, mais relevante a defesa do funcionamento do regime democrático que leve em conta a participação do cidadão e a liberdade, porque a própria participação cidadã será responsável pela criação de outros direitos fundamentais42 .
Além disso, para Sunstein, os princípios dificultam a solução do caso concreto, pois são genéricos e abstratos. Por isso, a discussão sobre o conteúdo dos princípios deve ser resolvida nas instâncias do regime democrático e não nos Tribunais. Ao manter as questões polêmicas e temas controversos no espaço público de decisão, mobiliza-se o processo democrático, mantendo-o na seara política e não no Tribunal. Assim, fica claro que o autor desconsidera que o judiciário como espaço público de decisão43 .
Segundo Agra, o ponto nefrálgico do procedimentalismo é não considerar a crise de participação política da sociedade pós-moderna, é não se ater que a participação efetiva nas sociedades periféricas é da elite e que a maior parte das pessoas não participa da tomada de decisões importantes. Se a atividade jurisdicional se preocupa com os procedimentos democráticos e não com a concretização dos direitos fundamentais tende, então, a perpetuar-se o status quo dominante em detrimento das necessidades da população. Essa seria mais uma crítica às teorias de Ely e Sunstein 44.
Por isso, no lado oposto estão os autores substancialistas como Cappelletti, Dwokin e Agra que acreditam que a relação entre direito e política são favoráveis, pois realizam uma agenda igualitária, sobretudo por meio da jurisprudência, sem prejuízo da liberdade. Essa corrente sustenta que o Juiz declara o direito por meio de princípios já admitidos socialmente, que eles proferem decisões exemplares para realizar o justo.

Contudo, se o diagnóstico sobre o papel invasivo do Direito, do Poder Judiciário e de sua intelligentzia nas instituições e na sociabilidade do mundo contemporâneo é comum, são bem divergentes as avaliações quanto às repercussões desse processo sobre o tema da liberdade. Esse caminho, de "confiar ao 'terceiro poder', de modo muito mais acentuado do que em outras épocas, a responsabilidade pela evolução do Direito, para alguns, longe de significar uma indicação ingênua de seus autores, é visto como "arriscado e aventureiro", na medida em que, embora pleno de promessas, pode importar ameaças a uma cidadania ativa45 .

Ainda assim Dworkin entende “que a melhor forma de democracia é a que tiver mais probabilidade de produzir as decisões substantivas que tratem todos os membros da comunidade com igual consideração” 46. Nessa concepção, as minorias deverão ser protegidas, tratadas com consideração e respeito para sustentar o princípio democrático.
Para os substancialistas a legitimidade do judiciário não decorre do cumprimento de requisitos procedimentais e sim da concretização de direitos fundamentais. A ligação entre os direitos fundamentais e o regime democrático é evidente. Esses direitos funcionariam como amparadores do regime político.
Os direitos fundamentais seriam então como valores que amparam a democracia. Segundo Muller, “não somente as liberdades civis, mas também os direitos humanos enquanto realizados são imprescindíveis para uma democracia legítima" 47.
Para os substancialistas os direitos fundamentais são expressão maior da soberania, mais até do que quando expressado pelo princípio majoritário, por isso, as decisões podem ter uma maior densidade. Smend defende a ideia de que os direitos fundamentais são representantes de um sistema de valores concretos, que resume o sentido da vida estatal contida na Constituição. Isso significa que a ordem positiva somente será válida quando representar este sistema de valores que se torna legítimo pelos direitos fundamentais48 .
Esse é um dos motivos que faz com que os substancialistas defendam os direitos fundamentais como valores que devam ser realizados como fins teleológicos e isso demanda do judiciário a concretização hermenêutica e política para realização desses fins. Agra explica que os Direitos Fundamentais se configuram como elementos essenciais para que “o processo de globalização seja deslocado de um enfoque mercantilista, em que prepondera a lex mercatoria, para um social, em que prevaleçam o homem e seus interesses”49 .  Portanto, para atender as demandas sociais, para garantir um direito fundamental é que o judiciário intervenha na seara política.
Cappelletti, defensor do substancialismo, expõe que é uma utopia pensar que os clássicos poderes políticos podem alcançar o consenso dos governados. Segundo ele, apesar das lideranças executivas e legislativas serem representantes do povo, não é um paradigma perfeito de democracia representativa. Não há necessariamente a enunciação da vontade da maioria, mas sim se atem a lidar com interesses de grupos conflitantes50 .
Ao defender uma maior atuação do judiciário, Cappelletti explica que a função do Juiz faz com que ele se envolva todos os dias com casos concretos e problemas atuais nas vidas das pessoas, por isso, toda produção advinda do judiciário tende a ser democrática e atenta às aspirações sociais. O autor afirma ainda que o acesso ao judiciário é maior do que aos órgãos do governo, porque há uma provocação e a condução da atividade é pública 51.
Além desse aspecto, um judiciário independente pode cercear caprichos momentâneos de uma maioria, contribuindo para uma democracia que não se reduz a uma concepção majoritária. A democracia significa participação, tolerância e liberdade e um judiciário que seja ativo e dinâmico é capaz de assegurar o sistema de checks and balances52 .
Agra afirma que com a crise da soberania popular, a teoria que venha a legitimar a tutela da Constituição, não pode ser alicerçada na vontade popular. Ele defende o substancialismo e sustenta que a fundamentação dessa teoria deve estar na substancia dos direitos fundamentais53 .
A defesa do substancialismo é atenta ao fato de que os direitos fundamentais têm ampla aceitação na sociedade e, devido a isso, alcança o consenso dos cidadãos. Diferente das teorias procedimentalistas que defendem uma participação política da sociedade que se mostra insuficiente para sustentar a legitimação da expansão das atividades da jurisdição constitucional, sobretudo no Brasil que ainda não tem um histórico de participação popular dificultando que se sedimente um consenso para amparar as decisões 54.
Neste sentido, Tribe citado por Agra expõe:
Agora não é difícil mostrar que o tema constitucional das decisões governamentais amparadas pela teoria procedimentalista é radicalmente indeterminado e fundamentalmente incompleto. O processo de amparo das decisões governamentais baseadas no procedimento determina quase nada a menos que seus pressupostos sejam determinados e o seu conteúdo suplementado, através de uma completa teoria substantiva dos direitos e valores – o mesmo tipo de teoria procedimental que por tantos inconvenientes deve ser evitada55 .

Além disso, o espaço público tão defendido pelo procedimentalismo como alicerce da decisão judicial é de difícil concretização em um país em que a população não tem acesso nem aos direitos de segunda dimensão. Em um contexto de exclusão social é imperioso concretizar os direitos fundamentais contidos na Constituição e a adoção de uma teoria procedimental deixa a população relegada dessas proteções constitucionais. Ademais, em situações tão adversas resta difícil conceber o exercício da cidadania em espaços públicos se a maioria das pessoas está excluída do processo politico.
Por essas e outras razões Dworkin defende o substancialismo e lança olhares críticos ao sistema representativo, apontando a incapacidade do modelo incluir as minorias no processo democrático 56.
Dworkin coloca o Juiz em momento posterior ao legislador na cadeia democrática, exercendo uma atividade criativa. O Juiz faz uma interpretação da legislação de acordo com o contexto que a envolve. Assim, a decisão do judiciário pode estar em harmonia com o que foi debatido no Congresso, ou não, pode restar dissociada. Dworkin explica que o Juiz:
Tratará o Congresso como um autor anterior a ele na cadeia do direito, embora um autor com poderes e responsabilidades diferentes dos seus e, fundamentalmente, vai encarar seu próprio papel como o papel criativo de um colaborador que continua a desenvolver, do modo que acredita ser o melhor, o sistema legal iniciado pelo Congresso. Ele irá se perguntar qual interpretação da lei [...] mostra mais claramente o desenvolvimento político e envolve essa lei 57.

Nota-se, na perspectiva de Dworkin, que o Juiz ao aplicar a lei não precisa se submeter àquilo que o legislador queria no ato da criação. Assim, as justificativas de criação da lei do congresso são atos políticos considerados para fins de explicação do texto de lei, mas não são em si importantes, pois são reflexos do estado mental da maioria dos legisladores, formando o que Dworkin denomina de ponto de vista do locutor, ou, de interpretação conversacional e não construtiva. Desse ponto de vista do locutor as conclusões são a própria lei, mas do ponto de vista construtivista do direito, os Juízes não encontram vinculados a esse estado de espirito do legislador58 .
O Juiz ao se conduzir pela intenção do locutor precisa saber quem são os personagens históricos considerados legisladores, como descobrir suas intenções, quando a lei foi pronunciada, para ao decidir considerar as deformidades do sistema, lobbies e interesses privados59 .
A defesa de Dworkin é no sentido de um controle judicial amplo convivendo com um sistema de representação popular. Segundo o autor, há uma diferença entre a concepção majoritária e a constitucional da democracia. A primeira concepção não aceita posição contra majoritária dos Juízes, mas a segunda os Juízes podem limitar a vontade da maioria quando o legislativo deixar de considerar o cidadão com igual consideração e respeito. Essa concepção não fere a premissa majoritária, mas sim faz uma leitura moral da Constituição nos casos de quebra de isonomia60 .
Na proposta de Dworkin, o juiz leva em conta suas convicções de justiça, mas também “ideais de integridade e equidade políticas e de devido processo legal, na medida em que estes se aplicam especificamente à legislação em uma democracia” 61. A integridade pressupõe uma fundamentação ajustada a essa lei e coerente com o sistema normativo, exigindo também coerência com os princípios e políticas. Já a equidade impõe um limite à convicção pessoal e à opinião pública, alinhando a decisão ao processo legislativo que originou a lei 62.
A defesa do substancialismo de Dworkin está no fato de que a leitura dos direitos fundamentais é feita de modo a colocá-los como mecanismo de defesa contra decisões públicas estabelecidas em decisões majoritárias. Para o autor, eles são comandos imperativos e não apenas valores preferenciais numa ordem democrática63 .
Dworkin é liberal e se guia pela ideia de que os direitos fundamentais devem ser privilegiados no sistema jurídico, sobretudo, contra as vozes majoritárias contrárias ao modelo liberal. Ele toma os direitos fundamentais como concepção do direito e, além disso, considera os princípios como parte formadora do sistema normativo. Ao traduzir os princípios para uma linguagem neutra e codificada do direito, de forma a permitir a certeza e a segurança necessárias aos Juízes no momento de decidir. Nessa fórmula Dworkin apresenta a conexão possível e necessária entre moral, direito e política64 .
Portanto, Dworkin defende a atividade judicial baseada em um argumento principiológico o que deve prevalecer sobre os argumentos políticos, pois existem questões que não são sensíveis à eleição e que permitem a intervenção reguladora dos Juízes. Nesta concepção substancial de democracia, os Juízes possuem grande importância, pois será através da interpretação judicial dos princípios constitucionais que o espaço destinado a cada um dos órgãos do Estado será fixado.

Considerações finais

Este trabalho expôs modelos de interpretação judicial em casos difíceis e explorou as teorias procedimentalistas e substancialistas que tratam da legitimidade do judiciário quando intervém em questões políticas.
Em que pesem as boas razões do modelo de interpretação judicial perfeccionista, o qual fazem interpretações inovadoras de princípios, buscam tornar o texto constitucional “melhor”, consideramos o modelo minimalista mais seguro e coerente, porque a tendência perfeccionista de analisar pontos controversos de forma ampla, profunda, de modo a transcender o caso concreto é perigosa. O modelo perfeccionista aborda questões que poderiam ser discutidas oportunamente em outro momento, faz longas considerações teóricas sobre o tema e busca resolver todos os problemas entornos à temática do caso. Isso não pode ser visto com bons olhos. A postura minimalista, de modo diverso, evita extrair considerações profundas, abstratas e controversas dos princípios, principalmente porque considera que os Juízes não possuem uma particular expertise em teoria ética, moral ou política e, por isso, restringem seu posicionamento às questões indispensáveis para a decisão. Sobretudo pelo juiz não possuir o conhecimento técnico para prever as principais consequências de suas decisões, especialmente nos planos político e econômico, posicionamos a favor do minimalismo judicial.
A mesma lógica é aplicada nas teorias que tratam da legitimidade judicial nas questões políticas. Em que pese no substancialismo ser possível verificar uma participação dos Juízes no tempo e na realidade social que os circunda, contribuindo para conceder a tão almejada justiça, perquirida no processo, e possibilitando a garantia de concretização de direitos fundamentais que são verdadeiros deveres do Estado, é um viés, juridicamente, pouco seguro. Sob a ótica procedimentalista, a ampliação da atuação dos Tribunais e Juízes nas esferas políticas de decisões como verdadeira ameaça ao equilíbrio dos poderes constitucionalmente estabelecidos. Ao decidir sobre essas questões, os Juízes adentram no espaço do planejamento e da conveniência de qual política pública deverá ser implementada em cada tempo, deturpando suas funções institucionais e pondo em risco o sistema democrático.
Ainda que os substancialistas argumentem que o afastamento da população da atuação cotidiana dos parlamentares, que o descredito dos partidos, do legislativo e do executivo, enfim, que a crise de representatividade instalada leva à busca pelo judiciário para que ele salvaguarde os direitos fundamentais, filiamo-nos ao viés procedimentalista que considera que a invasão do judiciário na órbita política conduz para a construção de um cidadão-cliente, passivo diante do Estado aguardando suas concessões e que isso recrudesce o exercício da cidadania ativa.
Devido ao exposto, saímos em defesa da vertente procedimentalista que aponta para a necessidade de atores autônomos que externem sua vontade no âmbito da sociedade civil, que construam um espaço público de debate político democrático, bem como participem da formação da vontade política do Estado. Por isso, os Juízes ou Tribunais não deveriam intervir através de uma política distributiva e concretiva de direitos, porque isso acarretaria inércia e apatia sociais. Assim, é com a conquista de canais comunicativos que consagrem o poder democrático do povo é que se fortalece a cidadania. Portanto, respondendo à hipótese levantada, a interferência dos Juízes não possui legitimidade, nem dispõem do diálogo necessário com a sociedade para definir as políticas públicas que sejam convenientes para cada época. O judiciário deve apenas garantir o funcionamento adequado do processo democrático deliberativo e não resolver a decisão de mérito político.

Referências
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3 Graduada em Direito pela Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES, Advogada inscrita nos quadros da OAB/MG, Especialista em Direito Constitucional. E-mail: lorena.fonseca@outlook.com

** Professor de Educação Superior da Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES. Mestre e Doutorando em Administração pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. Especialista em Direito Tributário pelas Faculdades IBS/FGV e Fordham Law School (NY/USA). Advogado inscrito nos quadros da OAB/MG. E-mail: felipe.froes@outlook.com

1 A) Toque de recolher chega ao Paraná. Disponível em: <http://www.gazetadopovo.co ,m5m.br/vida-e-cidadania/toque-de-recolher-chega-ao-parana-bnl0wlikm5zifcqgdf4e0tgzy>. Acesso em: 06/05/ 2015 às 10h30.

B) STJ obriga governo a fornecer remédio para tratamento de linfoma. Disponível em: <http://expresso-noticia.jusbrasil.com.br/noticias/141646/stj-obriga-governo-a-fornecer-remedio-para-tratamento-de-linfoma>. Acesso em 06/05/2015 às 10h45.
C) Passe livre em transporte interestadual às pessoas carentes portadoras de necessidades especiais é mantido pelo Supremo. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=88527>. Acesso em 05/05/2015 às 11h.

D) Supremo determina aplicação da lei de greve dos trabalhadores privados aos servidores públicos. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=75355>. Acesso em 06/05/2015 às 11h.

2 LEITE, Roberto Basilone. Déficit político do poder judiciário brasileiro: A falta de efetividade no desempenho de suas funções institucionais e o ativismo judicial como interferência indevida em área de atuação própria do poder político. Tese (Doutorado em Direito). Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2011, p. 179.

3 Idem.

4 Ibidem, p. 175.

5 SILVA, Alexandre Garrido da. Minimalismo, democracia e expertise: o Supremo Tribunal Federal diante de questões políticas e científicas complexas. Revista de Direito do Estado, n. 12, 2008.

6 Ibidem, p. 4. 

7 DWORKIN, Ronald. A leitura moral e a premissa majoritária. In: DWORKIN, Ronald. A leitura moral da Constituição norte-americana. Tradução de Marcelo Brandão Cipolla. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 2.

8 SILVA, Alexandre Garrido da. Minimalismo, democracia e expertise: o Supremo Tribunal Federal diante de questões políticas e científicas complexas. Revista de Direito do Estado, n. 12, 2008.

9 Idem.

10 Ibidem, p. 6.

11 TUSHNET, Mark. Taking the Constitution away from the Courts. Princeton, New Jersey: Princeton University Press, 1999, p. 154-176.

12 SUNSTEIN, Cass. Radicals in robes: why extreme right-wing Courts are wrong for America. New York: Basic Books, 2005, p. 50.

13 ELSTER, Jon. Ulises desatado: estudios sobre racionalidad, precompromisso y restricciones. Traducción de J. Mundó. Barcelona: Gedisa, 2002, p. 111-204.

14 SILVA, Alexandre Garrido da. Minimalismo, democracia e expertise: o Supremo Tribunal Federal diante de questões políticas e científicas complexas. Revista de Direito do Estado, n. 12, 2008.

15 SUNSTEIN, Cass. One case at time: judicial minimalism on the Supreme Court. Cambridge, Massachusetts: Harvard University Press, 1999, p. 3-23.

16 SILVA, Alexandre Garrido da. Minimalismo, democracia e expertise: o Supremo Tribunal Federal diante de questões políticas e científicas complexas. Revista de Direito do Estado, n. 12, 2008.

17 Idem.

18 OLIVEIRA, Cláudio Ladeira de. Ativismo judicial, moderação e o “minimalismo judicial” de Cass Sunstein. Disponível em: <http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/campos/claudio_ladeira_de_oliveira.pdf>. Acesso em: 27/04/2015 às 07h, p. 11.

19 SILVA, Alexandre Garrido da. Minimalismo, democracia e expertise: o Supremo Tribunal Federal diante de questões políticas e científicas complexas. Revista de Direito do Estado, n. 12, 2008, p. 9.

20 SUNSTEIN, Cass. Radicals in robes: why extreme right-wing Courts are wrong for America. New York: Basic Books, 2005, p. 12-13.

21 SURGIK, Aloisio; WACHELESKI, Marcelo Paulo. O Poder Judiciário e as decisões políticas: uma crítica a partir da teoria procedimentalista. Revista Eletrônica Direito e Política. Programa de Pós Graduação Stricto Sensu em Ciência Jurídica da UNIVALI, Itajaí, v. 9, n. 3, 3º quadrimestre de 2014. Disponível em: www.univali.br/direitoepolitica. Acesso em 13/03/2015 às 08h.

22 GARAPON, Antoine. O guardador de promessas: Justiça e democracia. Lisboa: Piaget, 1996, p. 22/23.

23 Idem.

24 Ibidem, p. 42.

25 VIANNA, Luís Werneck (et. al.). A judicialização da política e das relações sociais no Brasil. Rio de Janeiro: Revan, 1999.

26 Ibidem, p. 25.

27 GARAPON, Antoine. O guardador de promessas: Justiça e democracia. Lisboa: Piaget, 1996, p. 51.

28 VIANNA, Luís Werneck (et. al.). A judicialização da política e das relações sociais no Brasil. Rio de Janeiro: Revan, 1999, p. 28.

29 Idem.

30 HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade. Vol. II. 2 ed. Tradução de Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 187.

31 VIANNA, Luís Werneck (et. al.). A judicialização da política e das relações sociais no Brasil. Rio de Janeiro: Revan, 1999, p. 29.

32 HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade. Vol. II. 2 ed. Tradução de Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 183.

33 AGRA, Walber de Moura. A Reconstrução da Legitimidade do Supremo Tribunal Federal. Densificação da Jurisdição Constitucional Brasileira. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 185.

34 ELY, John Hart. Democracy and Distrust. A Theory of Judicial Review. Cambridge: Harvard University Press, 1980.

35 AGRA, Walber de Moura. A Reconstrução da Legitimidade do Supremo Tribunal Federal. Densificação da Jurisdição Constitucional Brasileira. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 213.

36 Ibidem, p. 216-217.

37 Ibidem, p. 220.

38 DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípio. Trad. Luís Carlos Borges. 2 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2005, p. 82

39 CAPPELLETTI, Mauro. Juízes legisladores? Trad. Carlos Alberto Álvaro de Oliveira. Porto Alegre: Sergio A. Fabris Editor, 1993, p. 102.
 

40 SUNSTEIN, Cass R. One Case at a Time. Judicial Minimalism on the Supreme Court. Cambridge: Harvard University Press, 1999.

41 AGRA, Walber de Moura. A Reconstrução da Legitimidade do Supremo Tribunal Federal. Densificação da Jurisdição Constitucional Brasileira. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 222.

42 Ibidem, p. 224.

43 Ibidem, p. 225-226.

44 Ibidem, p. 228.

45 VIANNA, Luís Werneck (et. al.). A judicialização da política e das relações sociais no Brasil. Rio de Janeiro: Revan, 1999, p. 24.

46 DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípio. Trad. Luís Carlos Borges. 2 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2005, p. 256.

47 MULLER, Friedrich. Quem é o povo? A questão fundamental na democracia. São Paulo: Max Limonad, 1998, p. 76.

48 SMEND, Rudolf. Constitucion y Derecho Constitucional. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1985. p. 232.

49 AGRA, Walber de Moura. A Reconstrução da Legitimidade do Supremo Tribunal Federal. Densificação da Jurisdição Constitucional Brasileira. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 237.

50 CAPPELLETTI, Mauro. Juízes legisladores? Trad. Carlos Alberto Álvaro de Oliveira. Porto Alegre: Sergio A. Fabris Editor, 1993, p. 94/95.

51 Ibidem, p. 106.

52 Ibidem, p. 107.

53 AGRA, Walber de Moura. A Reconstrução da Legitimidade do Supremo Tribunal Federal. Densificação da Jurisdição Constitucional Brasileira. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 157.

54 Ibidem, p. 230.

55 Idem.

56 DWORKIN, Ronald. O império do direito. Trad. Jefferson Luiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 1999, p. 11 (prefácio).

57 Ibidem, p. 377.

58 Ibidem, p. 378.

59 Ibidem, p. 380.

60 DWORKIN, Ronald. Virtud soberana: la teoría y la práctica de la igualdad. Traducción de Fernando Aguiar y de Maria Julia Bertomeu. Barcelona: Paidos, 2003. p. 203

61 DWORKIN, Ronald. O império do direito. Trad. Jefferson Luiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 1999, p. 405.

62 Ibidem, p. 409.

63 CITTADINO, Gisele. Pluralismo, Direito e Justiça Distributiva: Elementos da Filosofia Constitucional Contemporânea, 3 ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2004, p. 182.

64 Ibidem, p. 188.


Recibido: 22/06/2016 Aceptado: 28/06/2016 Publicado: Junio de 2016

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