Revista: CCCSS Contribuciones a las Ciencias Sociales
ISSN: 1988-7833


A DITADURA POLÍTICA PARAGUAIA ATRAVÉS DA OBRA DE AUGUSTO ROA BASTOS

Autores e infomación del artículo

Ariane Dias Teixeira Leite Defassi

Eliane Dávilla Sávio

Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Brasil

ariane.texleite@hotmail.com

Resumo: O escritor Augusto Roa Bastos é um dos mais importantes representantes da literatura Paraguaia e sua obra guarda relação com a questão da ditadura imposta no país durante muitos anos, possivelmente, tal temática em seus escritos tenha sido em razão de ter sido vitimado pela ditadura que impôs-lhe o exílio durante muitos anos. Suas obras, em especial o romance Yo El Supremo, se relaciona diretamente com a história e a literatura latino-americana, e em muitos momentos é possível constatar as vozes dos ditadores, especialmente de José Gaspar Rodriguez de Francia, pessoa que, por ter exercido um governo autoritário nos primeiros anos do país, é na visão de muitos, o responsável pelas barreiras sociais e econômicas que o país sofre ainda nos dias atuais. Foram governos ditatoriais e tirânicos que dominaram o país até o último, Alfredo Stroessner, que teve sua derrocada através de um golpe político em 1989. A partir disso, a importância do presente estudo é comprovar que a literatura mantém uma estreita relação com a política na revisão da história de um país.
Palavras-chave: Ditadura, História, Literatura, Paraguai, Política.

Resumen: El escritor Augusto Roa Bastos es uno de los representantes más importantes de la literatura paraguaya y su trabajo está relacionado con la cuestión de la dictadura impuesta en el país desde hace muchos años, posiblemente este tema en sus escritos se debió haber sido víctima de la dictadura que impuso exilio durante muchos años. Sus obras, especialmente la novela Yo el Supremo, se relaciona directamente con la historia y la literatura latinoamericana, y en muchos casos, se pueden ver las voces de los dictadores, especialmente de José Gaspar Rodríguez de Francia, que, ejercio un gobierno autoritario en los primeros años del país, es, en opinión de muchos, el responsable de las barreras sociales y económicas que el país aún sufre hoy. Fueron los gobiernos dictatoriales y tiránicos que gobernaron el país hasta el último, Alfredo Stroessner, quien tuvo su caída a través de un golpe político en 1989. A partir de esto, la importancia de este estudio es demostrar que la literatura mantiene una estrecha relación con la política en revisión de la historia de un país.
Palabras clave: Dictadura. Historia. Literatura. Paraguay. Politica.



Para citar este artículo puede uitlizar el siguiente formato:

Ariane Dias Teixeira Leite Defassi y Eliane Dávilla Sávio (2016): “A ditadura política Paraguaia através da obra de Augusto Roa Bastos”, Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, (enero-marzo 2016). En línea: http://www.eumed.net/rev/cccss/2016/01/paraguai.html


Introdução

O Paraguai é, definitivamente, um país construído a partir de histórias que se entrecruzam, as quais, ao serem lidas e estudadas, provocam no leitor um misto de admiração e compadecimento, pois ao longo dos seus jovens 205 anos – contados desde sua independência em 1811, foi partícipe de eventos, que por algumas vezes, quase devastou sua população, como é o caso da Guerra da Tríplice Aliança, um dos momentos de maior extermínio.
Foram lutas hercúleas para defender a terra, a cultura, o povo, lutas que por vezes, exigiu que se derramasse até a última gota de sangue de seus guerreiros. Uma terra, que apesar de não ser agraciada por belezas naturais é, por certo, habitada por um povo alegre, vivaz e merecedores de respeito.
Acerca da alegria do povo paraguaio, em uma pesquisa feita em maio de 2014 o Paraguai1 , pelo terceiro ano consecutivo, ficou em primeiro lugar no ranking mundial por ter o povo mais feliz e essa alegria é um dos motores da necessidade de conhecê-los sob todos os ângulos.
Augusto Roa Bastos foi um escritor nascido nesse bravo país, em Assunção no ano de 1917. Em sua trajetória pessoal participou de alguns desses momentos históricos em que seu país era personagem, o que emprestou à sua obra uma marca significativa deixada pelo signo do exílio em plena era do autoritarismo na América Latina.
Em razão das perseguições impingidas pelo governo paraguaio, buscou refúgio na Argentina em 1947, cujo país também era dominado pela ditadura, tornando necessária uma mudança para a França, o que de todo não lhe foi ruim, pois passou a lecionar aulas de literatura hispano-americana as quais o capacitaram cada vez mais e contribuíram para torná-lo o escritor paraguaio mais conhecido no mundo e uma das figuras mais destacadas na narrativa latino-americana na segunda metade do século XX, na fase do chamado boom da literatura contemporânea, e vencedor do prêmio Miguel de Cervantes em 1989.
Lamentavelmente nos deixou em 2005, não sem antes legar um tesouro literário necessário de ser descoberto em todos os níveis educacionais, e principalmente ao se trabalhar no processo ensino/aprendizagem o tema aqui proposto, a ditadura política de tal país.
No caso desse estudo, far-se-á a partir de uma releitura da história pela ficção de suas obras, a fim de demonstrar que a Literatura é um campo de estudo que guarda relação com a História que por sua vez, baseia-se na construção, na elaboração e na interpretação dos fatos ocorridos ao longo do tempo, dentre esses fatos, o poder exercido através da ditadura, quer seja política com José Gaspar Rodríguez de Francia, quer seja militar, exercida por Alfredo Stroessner.
Diante disso, usando como corpus a narrativa escrita por Roa Bastos, Yo el supremo, através da edição traduzida para a Língua Portuguesa, Eu o supremo, tradução de Galeno de Freitas, 1977, basear-se-ão os estudos aqui apresentados sobre a ditadura paraguaia e os reflexos causados na atualidade. Utilizar-se-á também a edição da obra elaborada por Milagros Ezquerro, 1987, e outras fontes bibliográficas, quando necessário, para comprovar a importância e a necessidade de tal estudo.
Sendo assim, pretende-se abordar por intermédio da releitura da ficção de Roa Bastos, especificamente a obra nominada, a ditadura política paraguaia e os reflexos na atualidade, circunstancialmente no Paraguai, dada a amplitude do tema que é de extrema relevância nos dias atuais, pois se está falando de um país de pouca representação política no cenário internacional, razão pela qual, fica relegado a um segundo plano em diversos aspectos, em especial o literário, ainda que seja um campo um fértil de estudos e berço de personagens como o que aqui se destaca e também outros, a exemplo de Mario Halley Mora, Luiz María Martinez, Augusto Casola.
Esta proposta de pesquisa é fruto, portanto, de elaboração teórica fundamentada no campo da teoria da literatura e da literatura comparada e da biografia do autor que justifica o interesse e a relevância para propor este estudo.

Yo el supremo e seu autor
            Para adentar ao cerne da obra é preciso antes conhecer o seu criador e, no presente caso, conhecer ainda que minimamente Augusto Roa Bastos. Não se aterá a sua biografia, uma vez que sua história de vida já se encontra estampada em muitos escritos. É preciso sim saber como tornou-se um dos escritores paraguaios de maior destaque no cenário nacional e internacional e, para tanto, deve-se por certo falar do exílio.
            Comum era que os intelectuais fossem banidos de sua pátria quando, através de suas obras tentavam libertar seu povo da opressão de determinado governo, ou então, colocar-se diretamente contra esse governo. Nos tempos idos, o exílio para os artistas e escritores era como uma lâmina de duplo corte, pois “se por um lado o exílio significou para alguns escritores uma experiência positiva como enriquecimento cultural, com a descoberta de novos mundos, novas pessoas e países e também divulgar suas obras, outros fracassaram, desistiram e provaram o gosto amargo de ser estrangeiro”. (Brancher e Souza, 2008:205-220).
            O exílio provocou mudanças na produção literária e foi uma das armas na luta política contra a ditadura. Entre aqueles que experimentaram o gosto amargo do exílio esteve Roa Bastos que na visão de Giacon era

um escritor sem fronteiras, sejam espaciais ou mesmo literárias não importava saber qual era o limite da disciplina histórica ou literária, mas sim responder ao anseio de seu tempo: a falta de liberdade e democracia, para isso, busca na literatura um espaço para responder essas questões que se colocavam na sua história e de seu país. Entrelaçou História e Literatura formando um grande novelo para entender uma sociedade complexa, dual formada pela língua guarani e o espanhol, cortada pela miséria e pela violência (Giacon, 2011:10).

            A história intelectual e pessoal do autor, que nasceu em 1917 e faleceu em 2005, é recheada de escritos que criticavam a realidade vivenciada pelo povo paraguaio, o que fez produzindo inúmeros romances, contos, roteiros e textos jornalísticos, a grande parte enquanto estava exílio durante o período 1947 a 1996, mas que não o calou, tanto é que sob o “governo de Higino Moríngio, teceu críticas ao regime autoritário instalado no Paraguai em favor da democracia e da liberdade que resultou na sua entrada na lista de inimigos do Estado”, e, “diante dessa situação, podendo ser preso a qualquer momento, o escritor exila-se na Argentina e mais uma vez em 1976 é o obrigado a sair deste país em direção a França diante do decreto de sua prisão pelo governo argentino com o apoio da Ditadura Stroessner, pois foi considerado subversivo e suas obras foram confiscadas naquele país e entraram para a lista de livros proibidos pela ditadura” (Giacon, 2011:10).
Em suas obras, insistiu que a escrita deve combater o abuso de poder por meio da imaginação e em sua trajetória construiu e deixou um legado literário que conta um pouco da sua história, da ditadura militar que comandou seu país durantes anos e especialmente das privações que sofreu, pois mesmo não se afiliando a partidos políticos, sempre lutou ao lado das classes oprimidas do Paraguai.
Assim sendo, destaque especial merece os apontamentos feitos por Pacheco, 2006, que em sua dissertação de mestrado assim escreveu:

Desde Buenos Aires, através de jornais e cartas, Roa Bastos acompanha entristecido o lúgubre panorama político paraguaio. Ele participa de diversas ações clandestinas pela causa libertadora, como recolher contribuições financeiras dos exilados para ajudar os movimentos guerrilheiros, por exemplo. [...] Constitui um retrato histórico de seu país, abarcando a época de Francia, a Guerra contra a Tríplice Aliança e a Guerra do Chaco, sem esquecer a vida miserável do homem do campo. [...]. (Pacheco, 2006:32).

            Como se vê ao estudar a biografia de Roa Bastos, descobre-se que durante seu exílio criticava os regimes autoritários vigentes no país, o qual amava e se preocupava, apesar de ter sido, em alguns momentos considerado um comunista, conforme consta do trecho a seguir,

Do seu exílio em Toulouse, França, Augusto Roa Bastos dirigiu Carta aberta ao povo paraguaio, que se converteu imediatamente num documento político indispensável para aqueles que enfrentam a ditadura de Alfredo Stroessner e também o próprio regime. O embaixador do Paraguai em Buenos Aires, Luis González Arias, acusou no mês passado o autor de Yo, el Supremo, de servir ao comunismo e “propugnar o emprego da violência e da força...”; mas também atribuiu a funcionários do governo argentino a intenção de fomentar uma campanha subversiva em terra guarani através das caixas de Plano de Alimentação Nacional (PAN).2

            Nessa mesma publicação, encontra-se transcrita a carta mencionada e em muitos momentos do texto é possível confirmar tal argumento e demonstram a preocupação que tinha com seu povo,

É a partir destes fatos e reflexões que me animo a dirigir a meu povo esta mensagem distante e próxima ao mesmo tempo. Do mesmo modo, minha vida e meu trabalho foram sustentados no tempo e na distância por sua presença e proximidade, por suas verdades profundas, por seus infortúnios e preteridas aspirações. Ao longo destes quarenta anos de exílio, não me separei um único dia de seu pulso distante, de sua realidade cotidiana, de suas velhas aspirações, de suas novas vicissitudes e esperanças. [...] Tal é meu único e irrevocável compromisso com a literatura e com a vida, com meu país e com o mundo. É somente isso que devo pagar, e pago como posso. (Roa Bastos, 1986).

Roa Bastos era um escritor que com suas grandes narrações baseadas nos momentos mais importantes da história paraguaia, como, por exemplo, a Guerra da Tríplice Aliança do século XIX através da obra O livro da grande guerra, 2002, escrita conjuntamente com Alejandro Maciel, Omar Prego e Eric Nepomuceno, os interesses obscuros que levaram a deflagração da Guerra do Chaco em El trueno entre las hojas e a ditadura no século XX, em Hijo del hombre e El Fiscal, entre outras, grafou seu nome entre literatos renomados no cenário internacional e se tornou o escritor paraguaio mais conhecido no mundo e uma das figuras mais destacadas na narrativa latino-americana na segunda metade do século XX, que lhe rendeu o prêmio Miguel Cervantes em 1989.
No entanto, ante um rol extenso de obras, optou-se em estudar o emblemático romance Yo el supremo, que narra de forma ficcional a vida do ditador que governou o país com mãos de ferro durante vinte e sete anos e inseriu toda a nação paraguaia no isolacionismo frente ao mundo. Situação que, de certa forma, perdura ainda nos dias atuais em que basta uma rápida análise, até mesmo por leigos, nos números populacionais, da economia, da educação e de representatividade no cenário mundial para se confirmar a herança histórica ditatorial que governou o país e iniciada por dito governante.
Sob esse prisma é possível encaixar a obra, que utiliza a história de seu país como principal matéria prima para suas criações, abordando o papel secundário que o povo exerce diante de uma política ditatorial que por anos dominou a nação. Desta forma, ao buscar material bibliográfico para sustentar essa pesquisa fartos serão os elogios, os comentários respeitosos que tornam a obra uma estrela brilhante no céu da Literatura, é o caso de Milagros Ezquerro na introdução à edição crítica da obra Yo, el supremo,

esto explica quizá que el escritor paraguayo sienta la necesidad de suplir esa carencia, de reapropiarse de una vez un tiempo alienado por una de las historias más cruentas y desastrosas del continente americano. Se comprende mejor, desde esta perspectiva, que la obra roabastiana sea un continuo reconstruir, reinventar la historia total del pueblo paraguayo, y que, para conseguirlo, convoque en una polifonía cada vez más compleja, el coro de la tradición oral donde se fue sedimentado todo aquello que no llegó a hacerse literatura, pero que tampoco se perdió. Así la obra de Roa Bastos ha puesto la narrativa paraguaya al nivel de la narrativa hispano-americana, en el momento en el que ésta se ponía al nivel de la literatura universal. (Ezquerro, 1987:70)

Yo el supremo, foi escrito durante o governo ditatorial de Alfredo Stroessner, que perdurou de 1954 a 1989, e publicado em um período em que a repressão era o mote do governo stronista, o que provocou maior perseguição ao autor, ainda que fosse uma narrativa do governante José Gaspar Rodríguez Francia e se inicia a partir de um bilhete encontrado na porta da Catedral de Encarnacíon cujo texto era o seguinte,

Eu o Supremo Ditador da República, ordeno que ao suceder minha morte meu cadáver seja decapitado, a cabeça posta em um mastro por três dias na Praça da República, para onde se convocará o povo ao som incessante dos sinos. Todos os meus servidores civis e militares sofrerão pena de enforcamento. Seus cadáveres serão enterrados em baldios fora da cidade sem cruz nem marca que memore seus nomes. Ao término do dito prazo, mando que meus restos sejam queimados e as cinzas lançadas ao rio... (Eu o supremo, tradução de Galeno de Freitas, 1977:9)

A partir da aparição desse bilhete, que com o diálogo do ditador e seus subalternos, nas linhas a seguir do romance, se conclui ser falso, o protagonista começa a buscar ao autor para puni-lo. Nesse horizonte, apesar de ser o centro da narrativa, outras histórias vão surgindo ao longo do enredo e há, como aponta Giacon, uma “divisão do personagem Francia El e Yo que se configura como um personagem real e outro mítico. Por meio desses dois personagens, em dado momento, romance se divide em dois como se houve um romance central e outro escrito a margens nas notas de rodapé da obra”.
Ao que pese ser uma obra de notório conteúdo, pois considerada pela crítica como um dos maiores romances da América Latina nunca é demais trazer à tona sua narrativa, ao que pese, no presente estudo, não nos atermos ao seu conteúdo como um todo, mas sim, em analisar a ditadura política do Paraguai a partir de seu enredo, que diz respeito ao ditador supremo do Paraguai, José Gaspar Rodríguez de Francia, uma figura que, segundo Cezar, 2011, “chamou para si próprio, num impulso quase místico e megalômano, a responsabilidade de conduzir seu povo para um futuro de glória, redenção, independência e orgulho pátrio, mesmo ao custo de passar as armas os opositores do regime”.
            Esse poderio do ditador, também conhecido como o Dr Francia – como será chamado no presente trabalho a partir desse momento - ou Karai Guasú, 3 iniciou antes mesmo da independência do país, uma vez que participou ativamente para alcançar seu intento, qual seja, governar o país, e assim o fez de 1814 a 1840, uma longevidade política incomum, (Santos, 2011). Usou de todo o conhecimento que dispunha adquirido através de sua formação em filosofia, teologia e direito – era advogado - e da leitura de obras de Rousseau, Voltaire, Montesquieu, Maquiavel e outros. Manejava com facilidade as palavras e, quando necessário discursava de maneira a cativar os seus oponentes, como, por exemplo, o que cita Ramos, 2011, quando o ditador fez uma exposição à Junta Geral, em julho de 1811, nos seguintes termos:

[...] A Província do Paraguai, saindo da letargia da escravidão, recuperou seus direitos para cuidar e dispor por si mesma de sua própria felicidade. O tempo da ilusão e do engano é passado [...] Novas ideias, que estão ligadas ao interesse geral, foram adquiridas e propagadas. Desenvolveram-se os princípios fundamentais das sociedades políticas; homens de talento analisaram todos os direitos, todas as obrigações, todos os interesses da espécie humana [...] Aproveitemos tão feliz situação - e que a lembrança das desditas, aflições e abatimentos passados nos sirvam de lição e experiência a evitar no futuro - para formar uma barreira inexpugnável contra os abusos do Poder [...] A natureza não criou os homens sujeitos ao jugo perpétuo de nenhuma autoridade civil - pelo contrário, os fez a todos iguais e livres de pleno direito [...] São urgentes as circunstâncias em que nos encontramos. A soberania desapareceu em nossa nação [...] e nessa incerteza e situação que pressagiam uma convulsão quase geral, essa Junta saberá refletir sobre a maneira mais oportuna de prover a nossa defesa, segurança e felicidade.

            A figura do Dr Francia foi de suma importância durante o processo de independência do Paraguai, e participava de um círculo minimalista dotado de saber intelectual adquirido nas universidade da Argentina e Espanha. Conhecimentos estes passados a grupos que não dispunham de condições para tanto, especialmente os negros e os índios, assim como, em escala menor, as mulheres. Isso não era feito por sentimentos nobres como a vontade em fazer o bem ao próximo, mas sim visando aumentar o contingente de civis quando chegado o momento de buscar a independência, para o que era necessário apoio vindo de todas as classes, logo, não media esforços nessa empreitada.
            Nesse tempo, com as lutas travadas, iniciava-se a ascensão da carreira política daquele que se tornaria o Supremo e Ditador Perpétuo, perpétuo porque exerceu o papel até sua morte em 1840. Lutou bravamente para libertar o Paraguai do poderio hispânico, acredita-se que por duas razões, o desejo de exercer o poder supremo sobre a província e torná-la um país independente e por não aceitar mais a interferência das grandes potencias sobre o mesmo, isso pode ser constatado em suas palavras, colacionadas por Ramos e extraídas por este da obra de Ashwell, 2005,

[...] ainda que um deles seja o rei da Espanha, o que nos importa? Nenhum deles é o rei do Paraguai. O Paraguai não é patrimônio da Espanha nem província de Buenos Aires. O Paraguai é uma república independente. A única questão que essa Assembleia deve discutir é como devemos defender e conservar nossa independência contra a Espanha, contra Lima, contra Buenos Aires e contra o Brasil [...].

            Como se vê, o Dr Francia lutou e conseguiu seu intento, alcançou a independência do país e tomou o poder, exercendo-o de forma tirana por um período de quase três décadas e que só se findou quando de sua morte em setembro de 1840. Porém, após a leitura da obra de Roa Bastos algumas dúvidas surgem, foi realmente o Dr Francia um ditador ou era um visionário político que buscava o bem de seu povo?
            Durante alguns momento da obra o leitor se deparará com essa dúvida, assim como ao se estudar a história real do Paraguai, pois durante o seu poderio, o ditador proporcionou ao seu povo benesses admiráveis. Foi sob o seu comando que o país cresceu economicamente de forma jamais imaginada, dada à sua pequena extensão territorial e a falta de acesso via mar. Além disso, acabou com os “privilégios da aristocracia, distribuiu terras para os camponeses, incentivou a agricultura e a industrialização, tornou obrigatório o ensino médio, conseguindo acabar com o analfabetismo em seu país, – isso no começo do Século 19 – perseguiu os jesuítas e proibiu a Inquisição”. (Cesar 2011).
            Suas ideias de reformas econômicas e administrativas, dotadas de certo futurismo, ainda segundo Cesar, “transformaram o Paraguai na grande potência latino-americana de sua época, resguardada por um poderoso exército”. E, não é demais trazer à baila o que diz Veiga, 2006, sobre o ditador,

Historicamente é um personagem controverso proporcionador de debates apaixonados em torno de seu nome. Seus áulicos o consideram além do personagem central na construção do Paraguai moderno, autor do mais ousado projeto de autonomia nacional na América do Sul. Fundamentam sua assertiva nas realizações administrativas da ditadura: a construção da primeira linha ferroviária no Continente (1826), o desenvolvimento da indústria naval manter um ousado plano de distribuição de terras e um programa de ensino público gratuito que, em 1820, registrou índice de analfabetismo zero em crianças até catorze anos de idade.

            Voltando ao conteúdo da narrativa de Roa Bastos, esta retrata de forma tão peculiar o ditador que alguns críticos e estudiosos, a exemplo de Callado, a definem como “uma autobiografia escrita por outra pessoa4 ”, para tanto, vale transcrever parcialmente suas observações feitas na orelha da edição ao colacionar as palavras de Galeno de Freitas, tradutor da mesma, “Roa Bastos consegue, através da palavra, penetrar na pele e alma do ditador José Gaspar Francia para autobiografá-lo” e prossegue dizendo “Aí está. Temos, de um lado, o grande Francia, e de outro lado um escritor que o estudou e o recriou na imaginação com tanto empenho e amor que o trabalho resultante é um raro livro. Uma autobiografia escrita por outra pessoa”.
            Ao longo da narrativa, momentos verídicos se misturam a outros ficcionais, mas não se pode afirmar categoricamente que tal tenha ocorrido por vontade própria do escritor ou pela dificuldade em buscar fontes legítimas, uma vez que, como aduz Santos, “muitas são as lendas” sobre o período em que Dr Francia governou o Paraguai e prossegue a escritora, “Já foi dito que nesta América tão cheia de contradições e contrastes, um dos grandes problemas de quem quer se disponha a escrever sobre ela é tornar acreditável sua realidade, que por vezes se mostra muito mais delirante do que qualquer criação literária”.
            Acredita-se, portanto, que Roa Bastos, baseou-se em documentos disponíveis sobre o período, os quais, compõem-se de escritos do próprio ditador e seus subalternos, que por óbvio só escreviam o que lhes era determinado, mas não se pode dissociar a História da ficção na obra, como aduz Ezquerro, 1987,

Las relaciones entre Historia y ficción en Yo el Supremo ha sido uno de los temas predilectos de la crítica, lo que no cabe extrañar ya que la novela ostenta notablemente sus lazos con la Historia paraguaya. Recordaremos primero las declaraciones de A. Roa Bastos en numerosas entrevistas (…) y su empeño en afirmar que Yo el Supremo no es una narración histórica, ni menos uma biografía novelada; remitimos también a su artículo fundamental: Algunos núcleos generadores de un texto narrativo ya citado. Para resumir sintéticamente esas relaciones podemos decir que Yo el Supremo es una ficción que utiliza la Historia paraguaya como materia narrativa, entre otros muchos materiales. Que la Historia evocada no se limita a la historia de la Dictadura Perpetua, sino que, gracias a diversos procedimientos narrativos, integra la totalidad de la Historia paraguaya, antes de la independencia (…) y después de la muerte de Francia. (…) Esta peculiar visión histórica implica que el Supremo ficcional no pueda ser confundido con la figura de José Gaspar Rodríguez de Francia: un detalle que cabe subrayar es que el personaje nunca recibe ese nombre en la novela.

Como se pode observar, a narrativa de fato é uma mescla do real proporcionado por documentos e relatos históricos e ficcional, a partir da capacidade literária do autor que, em entrevista concedida em 1995 ao escritor e jornalista Ariel Palácios e republicada no jornal Estadão 5, em que ao ser questionado sobre suas obras diz: “A literatura sempre se apresentou para mim como uma forma de viver literariamente a realidade da História. A realidade dos mitos e das formas históricas penetram profundamente na superfície do destino humano”.
Também deixa dúvidas quando ao ser questionado em um debate em 1986 na cidade de Madrid, momento em que responde “Eu não quis em nenhum momento escrever um romance biográfico do Doutor Francia. No meu caso, eu simplesmente quis fazer um romance, no qual todos os elementos da realidade paraguaia pudessem ganhar a dimensão de universalidade, que eu sempre desejei para a literatura, sem trair nem minhas raízes, nem minha essência os elementos da realidade paraguaia pudessem ganhar a dimensão de universalidade”. (Barnuevo, 1986).
A par disso, o fato é que ao ler a obra, conclui-se que o ditador aparece, de acordo com Cesar, como um “Moisés na Terra Prometida do Novo Mundo, que chamou para si próprio, num impulso quase místico e megalômano, a responsabilidade de conduzir seu povo para um futuro de glória, redenção, independência e orgulho pátrio, mesmo ao custo de passar as armas os opositores do regime” e que “Ao contrário do Brasil, da Argentina e do Uruguai, subservientes aos interesses da Inglaterra (a maior potência mundial do período), desafiou as nações poderosas, chegando ao ponto de proibir as imigrações. Por tal ousadia, pagou deliberadamente o preço do isolacionismo. Quase três décadas após a morte do ditador, o país seria literalmente arrasado pela Tríplice Aliança, na guerra genocida que uniu brasileiros, argentinos e uruguaios contra os paraguaios” (Cesar, 2011). Agora, resta saber, conseguiu seu intento? Quais as consequências de seus atos perduram até a atualidade?
            Esse totalitarismo que transcende na obra e centrado na figura do Dr Francia foi real, independente se Roa Bastos, para escrevê-la atrelou sua história imaginada a uma mescla de fatos e atitudes pessoais do ditador, isso afirmado por muitos estudiosos da história das nações latinoamericanas, que descrevem a repressão sofrida pelos povos e no Paraguai não foi diferente.
            Importante frisar que o autor ao se utilizar da literatura faz denúncias sobre o poderio ditatorial a fim de resistir contra a opressão e assim, libertar o povo paraguaio. Lembrando que o país teve, por muitos anos e em um tempo mais contemporâneo, como já citado em linhas acima, outro ditador, Alfredo Stroessner que o perseguiu e via sua obra como uma crítica ao seu governo dadas as similitudes daquele com este, é o que se pode constatar nas palavras de Veiga, 2006, quando afirma que “Yo el Supremo parte de um referente do século XIX, a ditadura de Francia, para atingir o referido, que é a segunda metade do século XX com as ditaduras militares no Continente, em particular a ditadura do general Alfredo Stroessner no Paraguai (1957-1989). No estudo, trato da questão da relação entre a narrativa e o discurso com o Poder, a mistificação das massas, a repressão, as prisões e a tortura”.
            Era (e é) o ditador uma figura, mítica e ao mesmo tempo real, que impressionou ao longo dos anos e ainda hoje quando estudado deixa-nos duvidosos sobre sua atuação. Thomas Carlyle é uma dessas pessoas que ficou impressionado pela atuação do estadista, tanto, que em 1844, escreveu o ensaio “Dr. Francia”, no qual deixa muito clara a admiração que nutre por ele, defendendo que possui especial admiração e o aponta como aquele que corajosamente enfrentou a poderosa Inglaterra. Essa admiração também é expressada por Callado, já referenciado anteriormente,

Francia, fundador do Paraguai, é realmente uma figura de estadista de molde tão incomum que, se imaginássemos outros Francias em mais três ou quatro de ‘nuestros países’, poderíamos imaginar uma América Latina bem diferente do que é, bem mais forte a seu modo, bem mais inventiva e original. Francia não queria que o Paraguai se parecesse com a Espanha, ou com a França, ou com a Inglaterra. Ele queria criar uma outra espécie de civilização nestas plagas. O Paraguai dos seus sonhos – e das suas realizações – era auto-suficiente, desconfiado em relação às grandes potências, altivo, acreditando firmemente na sua capacidade de criar ‘algo nuevo’.

            Como se vê, a obra, para alguns é o retrato fiel do ditador Dr Francia, para outros uma mescla de real e ficcional, cuja confusão é causada também pelo próprio autor, como apontado anteriormente quando citou-se a entrevista concedida em 1995, na qual aduz ser para si a literatura uma forma real de vivenciar a História. E, para findar, não é demais transcrever os apontamentos feitos na capa da edição de Ezquerro, 1987,

En lo que casi es un género dentro de la narrativa hispanoamericana, la novela del Dictador (…), Yo el Supremo del paraguayo Roa Bastos, destaca con fuerza propia. Obra de expansión, tejida con materiales verbales de mil fuentes, flotante en un juego maestro de intertextualidad, sostiene increíblemente la tensión narrativa de la primera a la última página. La conjunción del componente indígena guaraní con el castellano, junto con la asimilación de los recursos de la narrativa más moderna, están en la raíz de la singularidad de esta quizá-novela, que Alejo Carpentier calificó de obra maestra.

As consequências no século XXI de um governo tirano em séculos passados

            Feitos os apontamentos sobre a obra e seu autor e, com isso, constatando-se que o Dr Francia foi o governante que deu início aos anos que o Paraguai enfrentaria de uma cruenta e dura ditadura a qual retirou do povo a vivencia de uma representatividade democrática e que perdurou até a queda de Alfredo Stroessner em 1989.
            Anos de desmandos ditatoriais políticos e militares provocaram no país privações de toda ordem, ao que pese não retirar das faces cansadas o sorriso largo e fácil. Trata-se de um povo que lutou para preservar não só seus desígnios territoriais, mas também e, principalmente, sua cultura e o idioma guarani.
Porém, um país praticamente isolado, cujo isolamento iniciou ainda nas primeiras décadas do século XIX, quando Assunção já se encontrava distante e “ocupava a posição de um assentamento isolado no coração do continente, com produção agrícola limitada à subsistência de seus habitantes e as exportações de erva mate, fumo e madeiras reduzidas a quantidades inexpressivas. Contava apenas com algumas escolas primárias e um único colégio jesuíta” (Ramos, 2011).
            Questionados por alguns críticos o Dr Francia é uma figura que causa misto, pois de um lado exercia com tirania o poder e por outro causou admiração pela coragem de enfrentar as potências mundiais, em especial a Inglaterra, diante da qual se negou a curvar-se. Sobre a tiraria é de bom alvitre trazer os esclarecimentos abaixo,

[…] A tirania, que é a última e pior forma de governo, começa muitas vezes por apoderar-se do poder a viva força, e tendo origem boa ou ruim, pesa sempre de maneira cruel sobre a fronte de seus súditos. Ainda que partindo de bons princípios, cai em todo gênero de vícios, principalmente na cobiça, na ferocidade e na avareza [...] O maior poder (do tirano) consiste em poder entregar-se desenfreadamente às suas paixões, matar os bons e tendo cometido todo gênero de crime, chegar ao fim de sua vida sem que haja uma única ação vil à qual não tenha se entregado. (Mariana, apud nota de rodapé In Ramos, 2011)

            Dr Francia foi um provocador de opiniões divergentes uma vez que “para unos es el constructor del Paraguay independiente, para otros es un déspota sombrío, un hijo del infierno, responsable de los males que hasta hoy laceran el alma y la carne de la nacionalidad guaraní” e

“Surge sombrío en un marco dramático, como el primer dictador en el sentido moderno de la palabra, y provoca juicios contradictorios, polémicas apasionadas. El sistema totalitario de gobierno, el aislamiento, el ensayo autárquico, el mantenimiento de la paz interna en medio de la anarquía americana, la política de no intervención, son facetas que atraen el resplandor de las baterías. José Gaspar de Francia es uno de los pocos americanos que impresiona el espíritu europeo. Carlyle le dedica un libro, y Augusto Comte en su calendario designa un día con su nombre” (Chaves, 1985).

            Ainda, segundo o autor acima citado, Dr Francia é um personagem único em seus atos, em suas obras e em suas expressões e não costumava imitar ninguém e também não se podia imitá-lo. Era um pacifista, uma contradição com a figura de um ditador que usualmente é amigo de guerras e, como já apontado, aparece na história de forma ambígua, é o que afirma Fernandes, 2009

O primeiro ditador da República no Paraguai se apresenta na memória histórica paraguaia de forma ambígua. Por um lado é visto como o criador e preservador do Paraguai e de sua nacionalidade, e por outro como um tirano que governou com extrema intolerância a qualquer oposição ao regime e que se valeu de confiscos, prisões e execuções aos opositores, situação que levou o país a uma atrofia mental. No entanto, o autor ao fazer a narrativa vale-se de uma neutralidade, deixando que o ditador se apresente por si só, levando o leitor a tirar suas conclusões; mas reconhece os malefícios causados pela longa ditadura. O Supremo Ditador da República se via como o árbitro, a única pessoa capaz de saber o que era bom ou não para a nação.

            Diante de todos esses apontamentos acerca da figura do ditador, resta agora verificar como o país se encontra no século XXI e quais os resquícios daquilo que iniciou no século XIX. Logo, é preciso saber que se trata de um dos países de menor extensão territorial na América do Sul e, apesar de fazer parte do bloco do MERCOSUL, enfrenta grandes dificuldades e barreiras comerciais também com os países membros.
            Outra dificuldade encontrada pela economia e que impede um desenvolvimento a contento é o fato de ser um país mediterrâneo – sem saída direta para o mar -, de pouca superfície e com uma população pequena e, também, pela pouca importância no panorama internacional. É um país de poucas belezas naturais, logo, não se destaca pelo turismo, como é o caso do Brasil e da Argentina. Seu maior potencial econômico é baseado em grande parte na produção agropecuária e florestal, uma vez que possui uma industrialização deficiente.
            No campo da agricultura tem se destacado modestamente na produção de soja e na exportação de carne, que certamente são os produtos que possibilitam sua inserção econômica global, mas que, diante da imagem negativa que se tem pelo comércio ilícito de produtos eletrônicos, de drogas e de armas acaba por aparecer no cenário mundial como um paraíso para os que desejam a impunidade.
            Ao se buscar material bibliográfico sobre o Paraguai, descobre-se um acervo infindável sobre seu povo e sua história e, cada vez mais pesquisadores buscam saber sobre todos os aspectos aquilo que hoje compõe o país. Como aponta Figueiredo, 2005, em seu estudo sobre a inserção econômica do Paraguai no MERCOSUL através da produção de soja,

Mediante este trabalho se pôde registrar uma breve evolução da economia do Paraguai, sempre ligada ao setor primário. Desde sua formação como colônia espanhola, a exportação de produtos primários para as metrópoles foi importante, já que o país não possuía recursos minerais a serem explorados. Depois de sua independência, seguiram-se governos que impediram a expansão do pensamento liberal nascente na metade do século XIX. Contudo se criaria uma guerra (1864-1870) que aniquilaria o (emergente) estado de independência política e socioeconômica do Paraguai. Assim, depois de alcançar um desenvolvimento adequado, o país submerge em um processo de "latifundização" de suas terras aliado a uma notável dependência socioeconômica internacional.

            Interessante que tal pesquisador aponta o ditador Alfredo Stroessner como figura importante no crescimento econômico do país, confira-se,

Um grande estadista, produto da conjuntura nacional e internacional que emerge como figura predominante e de amplo destaque desde a metade do século XX é o General Stroessner. Realiza profundas alterações na estrutura política, socioeconômica e ambiental, com resultados que perduram ainda até os dias atuais. Estimulando a agricultura como ‘motor da economia’ e investindo na construção civil, o Paraguai alcançou níveis de crescimento satisfatórios, mas que pela estrutura social e política que imperava não atingiu resultados sustentáveis.

            Mas, de certa forma, o pesquisador tem razão, uma vez que no campo econômico o Paraguai que assistiu durante a ditadura militar de Stroessner, comparado por Roa Bastos ao Dr Francia, também experimentou um intenso crescimento, ao que pese os grandes capitais concentrarem-se nas mãos de uma mínima parcela da população, da qual, grande parte não é paraguaio, mas sim de outras nacionalidades, como chineses, árabes e até mesmo brasileiros, é o que diz Borges, 2012,

Os agropecuários se fortaleceram com o aumento de fluxo de capitais estrangeiros, com a isenção de impostos e créditos a juros baixos. Da mesma maneira que o setor industrial também tirou suas vantagens, principalmente com a construção da Usina Hidrelétrica de Itaipu, que teve um investimento de 18 bilhões de dólares e fez surgir uma nova classe de ricos, chamados barões de Itaipu. Esse crescimento certamente não alcançou a maioria da população, dados apontam que 1% da população detinha 80% de toda a riqueza nacional.

            É preciso que se tenha uma nova visão nesse século a respeito do Paraguai especialmente pelas riquezas culturais que detém, quer seja em relação ao seu povo, quer seja em relação ao idioma guarani, que precisa ser preservado. Já não se pode mais aceitar que o país é o retrato da marginalidade. E na busca por essa nova visão Augusto Roa Bastos, através de suas obras, é um caminho a ser percorrido, pois proporciona uma imersão na história do seu povo, apresenta as grandezas e misérias, os ideais e os fracassos, sempre buscando analisar o recaimento da ditadura, criticando-a de forma individual, coletiva e nacional.
Foi assim, por intermédio do esforço desse escritor, vindo de um país tão pequeno e tornando-se um grandeza para a literatura, que é possível desvendar o Paraguai. Utilizando-se de seu acervo literário, composto para mostrar ao público paraguaio e ao mundo a história do país, sobreposta com a história nacional os elementos próprios de uma ficção, porém com personagens fictícios (e reais).
Para finalizar, não é demais colacionar as palavras de Fernandes, 2009 que com muita propriedade destaca a importância de reler a história pela ficção,

Apesar de suas aparentes distinções, a literatura e a história se trabalhadas juntas constituem num importante campo para o conhecimento mais amplo de determinadas realidades históricas. Portanto, os romances históricos do paraguaio Augusto Roa Bastos, por meio de sua imersão dentro da história de seu país buscando desvelar a incidência do poder e das ditaduras na população paraguaia, a reação da mesma e até mesmo sua conivência, permite-nos conhecer um pouco mais desse país e desse povo tão sofredor e valente, com suas lutas e misérias.

REFERÊNCIAS

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1 - Business Insider e Gallup.com., divulgado em http://noticias.terra.com.br/mundo/estudo-10-dos-11-paises-mais-felizes-sao-da-america-latina,c37200cdd0426410VgnVCM3000009af154d0RCRD.html, acessado em 11/01/2016.

2 - Revista América latina, 500 anos de conquista, N°2, Editora Ícone. Paraguai, transição à dignidade, p. 17.

3 - Denominação em guarani de José Gaspar Rodríguez de Francia. (Santos, Claudia Regina Ferreira, 2000).

4 - CALLADO, Antônio (anotações feitas na orelha da edição brasileira de Eu o Supremo – Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977. Trad. Galeno de Freitas).

5 - Disponível na íntegra em http://blogs.estadao.com.br/ariel-palacios/para-celebrar-o-bicentenario-do-paraguai-uma-velha-entrevista-com-roa-bastos-o-escritor-que-dissecou-as-ditaduras-de-seu-pais/. Consultado em 19/10/2014.


Recibido: 12/01/2016 Aceptado: 14/01/2015 Publicado: Enero de 2016

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