Djmes Yoshikazu de Lima Suguimoto
Maria Augusta de Castilho
Thiago Andrade Asato
Universidade Católica Dom Bosco, Brasil
djmessuguimoto@hotmail.comResumo
O homem sempre foi produto de sua época, portanto cria-se e moldam-se vontades conforme o período em que se vive. Necessitam-se respostas rápidas para as mudanças que ocorrem em um cenário de informações instantâneas acessadas por inúmeros tipos de aparelhos eletrônicos. Entretanto, ainda hoje existem pessoas sem acesso a informação, comunicação ou educação. O propósito central deste trabalho é abordar a importância da biblioteca pública como espaço integrador entre indivíduos, possibilitando o seu desenvolvimento e de seu território. Paralelo a esse objetivo, buscou-se também avaliar o trabalho social da Gibiteca-mais Espaço de Cultura como condutor de desenvolvimento local para a comunidade do Jardim Seminário, em Campo Grande – MS. Para tanto, foram realizadas visitas periódicas na referida biblioteca, além de entrevistas com os mantenedores do projeto e moradores do local.
Palavras-chave: Espaço cultural, Desenvolvimento Local, Inclusão social, Gibiteca, Território.
Abstract
Men and women have always been a product of their time, so they create and shape their wills according to the time they are living in. Quick answers are needed to the changes happening in a scenary of instantaneous information accessed by inumerous kinds of eletronic devices. However, there are still people without access to information, communication or education. The fundamental purpose of this work is to approach the importance of public libraries as integrating spaces among individuals, making their own development and the development of their territory possible. Parallel to this goal, it was also sought to evaluate the social work of the comics library- Mais Espaço de Cultura as a conductor to local development in Jardim Seminário neighborhood, in Campo Grande – M.S. Therefore, periodic visits and interviews with the maintainers of the project and with the local people were made.
Key words: Cultural space, Local development, Social inclusion, Gibiteca, Territory.
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 Djmes Yoshikazu de Lima Suguimoto, Maria Augusta de Castilho y  Thiago Andrade Asato (2015): “Gibiteca comunitária: espaço cultural como vetor de desenvolvimento local”, Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, n. 30 (octubre-diciembre 2015). En línea: http://www.eumed.net/rev/cccss/2015/04/gibiteca.html
Introdução
O processo de  alfabetização de todo indivíduo, que compreende a aprendizagem de ler, escrever  e interpretar deve ser um direito fundamental, porém nem toda criança tem  acesso ao sistema educacional e ainda há muitas delas que iniciam este processo  tardiamente, dificultando a compreensão do ensino-aprendizagem do letramento.
   Projetos sociais que  têm como valores a cultura e a educação são exemplos de ações de cidadania,  principalmente quando desperta na criança o interesse pelo saber por meio de  atividades lúdicas e culturais. 
   Aborda-se  neste trabalho a Gibiteca, espaço cultural localizado em Campo Grande – Mato  Grosso do Sul, local idealizado e administrado pelo gestor Ronilço Cruz de  Oliveira, morador do bairro, e gerenciado pela pedagoga Roseli Rodrigues de  Almeida. Ambos estão diretamente ligados as atividades oferecidas nesse  ambiente multicultural. A Gibiteca oferta aos seus frequentadores um lugar  democrático com livros, gibis, acesso à internet, atividades lúdicas, oficinas  de artesanato entre outras, que acabam convertendo-se em benefícios para a  comunidade local. 
   O  estudo foi desenvolvido por meio de método indutivo, com embasamento teórico  sobre bibliotecas públicas, e aspectos do desenvolvimento local. Para se ter um  conhecimento concreto da realidade pesquisada realizou-se observações in  loco (estudo de campo), bem como a realização de entrevistas estruturadas  com a pedagoga e com o gestor da Gibiteca. Por outro lado, foram aplicados  questionários aos usuários (comunidade local), para verificar como o espaço  atende seus frequentadores.
1. Bibliotecas públicas e desenvolvimento local
A  leitura e a reflexão são ferramentas indispensáveis para a construção de  sujeitos capazes e independentes. Desse modo têm-se pessoas pensantes  capacitadas a ter uma vida digna. Bueno et al.(2006, p.2), justifica que: “o ato de ler envolve o processo de  saber fazer uso da leitura e da escrita para as funções sociais, em que o  indivíduo tem capacidade de questionar e usar as informações que capta do mundo  nas suas práticas diárias”. 
   Da  mesma forma, Ferreira e Dias (2002, p.40) advogam que: “ao ler, o indivíduo constrói os seus próprios  significados, elabora suas próprias questões e rejeita, confirma e/ou reelabora  as suas próprias respostas”. Contribuindo ainda mais para esse raciocínio  Ferreira e Dias (2002) acreditam que somente com a leitura e a escrita o  sujeito é capaz de transformar suas relações com o mundo, adquirindo a prática  da reflexão e permitindo vislumbrar o mundo de forma diferente.
   Ambiente salubre com rico acervo tanto físico, como  tecnológico proporciona aos jovens e adultos, condições para que modifique sua  capacidade de compreensão das várias dimensões da cultura. Ademais, as bibliotecas caracterizam-se  como espaços em que as pessoas criam confiança sendo esse um dos fatores  primordiais para existir a cooperação. Contribui ainda como catalizador  necessário para aglutinar os indivíduos ocupantes no mesmo território. Alves et  al. (2014, p. 85) endossa a ideia acima empregada, afirmando que “o espaço  físico de uma biblioteca também é um fator importante, pois de nada adianta  tantas atividades em mente, sem um suporte físico que as coloque em prática.  [..] As leituras e mediações diversas precisam ser feitas em um ambiente  confortável”. 
   Percebe-se  que não só as bibliotecas públicas são necessárias, mas sim todas aquelas que  possam oferecer benefícios aos seus usuários. Côrte e Bandeira (2011,  p.8) definem bibliotecas escolares como “um espaço de estudo e construção do  conhecimento; cooperam com a dinâmica da escola, despertam o interesse  intelectual, favorecem o enriquecimento cultural e incentivam a formação do  hábito da leitura”. 
   Barreto et al. (2008,  p.31) acrescentam a seguinte afirmação sobre esses locais:
Do ponto de vista da inclusão social na sociedade da informação, as bibliotecas públicas podem dar decisiva contribuição, estando ela em posição privilegiada, tornando a informação e a cultura acessíveis a todos, independentemente de suas possibilidades financeiras e de suas capacidades.
A ideia de Bueno (2006) apresenta a importância dessas atividades para a formação cognitiva das pessoas, reforçando a relevância dos locais pouco valorizados pelo poder público e privado, e tão essencial para o espaço que ocupa em seu território. Barreto (2008, p.30) aponta para o lampejo no caminho da teoria de DL, assinalando que é preciso:
Dar ás bibliotecas a devida estrutura não é só papel dos governantes; passa também pela formação de espírito crítico por parte da comunidade, que deve exigir serviços e responsabilizar-se por eles. A ausência de espírito crítico é oriunda da falta de acesso e uso da informação, e, assim, o ciclo é vicioso e permanece.
Esta  autora aponta que a própria comunidade precisa também mobilizar-se em busca  desse patrimônio que favorecerá os atores locais, mas faz ressalvas quanto a  sua falta, uma vez que se aborda o sistema educacional brasileiro.
   As bibliotecas públicas,  uma das referências desse estudo, condicionam-se multiplicadores de  conhecimento e possuem fundamentos de DL, já que é um espaço receptível a  qualquer pessoa independente do seu status socioeconômico. Ao mesmo tempo  conforme adquirem cada vez mais a consciência de cidadão, as próprias pessoas  criam ferramentas de organização social autônomas possibilitando o próprio  desenvolvimento. Para Ávila (2012), o DL e a educação estão intimamente  ligados, pois, somente desta forma as pessoas podem se tornar livres de  qualquer dependência externa.
   Identifica-se  segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/96, artigo 22 a  importância da educação para criação de cidadãos, concebendo bases para uma  educação contínua. O homem é a única espécie geradora de cultura e conhecimento  podendo ser transmitidos por meios de códigos escritos e sem dúvida é  necessária uma educação de qualidade. Ávila (2012, p.42) exemplifica: “[...] não  se trata somente de Educação Comunitária ou de campanhas e programas educacionais  esporádicos. Também e necessariamente, requer-se permanente e fecunda Educação  Escolar [...]”. 
   Todas  as instituições são responsáveis pelo preparo pedagógico do ser humano e as  bibliotecas são espaços vitais, criando nas pessoas características na busca  constante por novos conhecimentos. Barreto et al. (2008, p. 28) ressalta  o importante papel desse espaço, mostrando que:
[...] as bibliotecas públicas e os telecentros como organismos inclusivos e até complementares. Possuem objetivos comuns, reconhecendo a informação como questão fundamental para a cidadania, para a formação de sujeitos conscientes de seus deveres e direitos.
Dessa forma a Gibiteca, nutre as pessoas com informações, cujo ambiente proporciona aos seus “clientes” uma séria de modelos organizacionais e preparação para diversas situações como: instruções de uso de leitura dos livros, conservação e uso tanto do acervo como do próprio espaço, atividades lúdicas e em alguns casos, o uso de ferramentas digitais. Tudo isso acaba por reverberar no cotidiano das pessoas, tornando-se um ato de conscientização e valorização do seu próprio território. Para Bueno (2006), outro fator importante da atividade lúdica está no fato de que ela prevalece no tempo, e se houve um significado, este será lembrado, assim como a história também ficará marcada na lembrança e vida da criança.
2. Gibiteca espaço multicultural, de inclusão social e geradora de capital social
O objeto desse estudo  localiza-se à rua Francisco Barbato nº180, no bairro Jardim Seminário, Campo  Grande-MS, atendendo frequentadores de várias partes da cidade. Percebem-se com  base nas análises teóricas a respeito de bibliotecas públicas, espaços  multiculturais, locais de inclusão e capital social e o próprio DL, que a  Gibiteca utiliza tais práticas.
   Estabelecimentos  inclusivos, libertadores, emancipatórios, acolhedores das diversidades que  trabalham na construção de sujeitos reflexivos na germinação de identidade,  empoderamento, e discussão sobre os problemas sociais devem contemplar atividades  comunitárias, objetivando a melhoria da qualidade de vida de seus habitantes.  Estes são espaços multiculturais: escolas, bibliotecas, espaços de dança,  campos de futebol, bares entre outros que têm o poder de unir diferentes  pessoas e criar laços harmônicos que reforçam o sentimento de pertença e a  solidariedade.
   Indubitavelmente os  grupos ou sociedades que conseguem trabalhar com a diversidade cultural,  possuem um nível de desenvolvimento elevado, com um processo inicial de criação  de sujeito reflexivos, que conseguem perceber-se perante seu grupo ou  comunidade. De acordo com Bampi (2011, p.228) “as pessoas que conseguem pensar  sobre sua própria realidade internalizam sentimentos, e desenvolvem atitudes  cooperativas, limitando problemas sociais como o: racismo, conflitos de classe  e atitudes discriminatórias baseadas nos gêneros sexuais”.
   Seguindo a linha de  pensamento de Hall (2005, p. 13), “[...] quanto maior for o contato e o acesso  a outras sociedades, os sistemas de significação e representação cultural se  multiplicam”. Tornando os homens mais capazes para viver em sociedade com a  diversidade, e tendo respostas rápidas para os problemas que vão surgindo ao  longo do tempo. 
   Igualmente nota-se a  inclusão de diversos tipos de pessoas na Gibiteca, como adultos, crianças e  idosos que frequentam o lugar, o qual oferece diversas atividades  socioculturais. Pessoas de outras regiões da cidade se deslocam de carro,  ônibus ou moto para poder usufruindo acervo cultural disponível à comunidade em  geral. A convivência de diferentes pessoas no mesmo espaço faz com que as  mesmas sejam mais solidárias, criem ferramentas eficientes para resoluções de  conflitos, o que pode ser empregado em outros ambientes de convivência e grupos  diferentes. Inclusão, segundo Oliveira (2004), compreende um conceito de  convidar a que se aproximem aqueles que estiverem historicamente excluídos ou  deixados de lado. 
   Portanto,  a percepção de que nenhuma manifestação humana é melhor ou pior que a outra  diminui o abismo tanto interno como externo, acima de tudo a  multiculturalidade, são os sujeitos diferentes, que estão ocupando o mesmo  território. O espaço multicultural tem o objetivo de abrigar esse conjunto de  conhecimento e criar nas pessoas maneiras para que elas possam viver em  harmonia.
   O  papel social que as bibliotecas públicas possuem é discutido por vários  estudiosos. Barreto et al.(2008) aponta que as bibliotecas públicas são  agentes de inclusão sociocultural, ou seja, esse espaço cria o  empoderamento e fortalecimento social das comunidades. A Gibiteca é um ambiente  que proporciona tanto a criação de novas fronteiras do conhecimento como  fortalece as relações dos frequentadores, e alimenta o sentimento de pertença.
   Conforme Lemos (1999),  as rápidas transformações de novos conhecimentos modificam os mercados,  emergindo novos conceitos e produtos, porém os indivíduos necessitam responder  rapidamente a essas velozes mudanças. A autora acima citada ainda que ao  contrário do que se pensam, as informações que são criadas não são difundidas  igualitariamente. 
   Ademais, as pessoas  precisam criar habilidades adequadas podendo responder de forma ágil a qualquer  problema, por isso, necessitam de um espaço onde seja possível adquirir a  informação internalizar e transformar em conhecimento. Lemos (1999, p.1-2)  justifica que: “somente os que detêm este tipo de conhecimento, podem ser  capazes de se adaptar às velozes mudanças que ocorrem nos mercados e nas  tecnologias e gerar inovações em produtos, processos e em formas  organizacionais”. 
   Em  virtude do exposto observa-se que a Gibiteca tem como meta expandir o  conhecimento das pessoas. Segundo dados da própria Gibiteca (2015), existem  livros em diversas áreas do conhecimento, de aproximadamente oitocentas obras1 .  Possui também segundo os administradores do local um total de vinte mil gibis.  O espaço ainda conta com sala de informática com acesso à internet gratuita,  aberto a toda a comunidade, com projeto de inclusão digital. Além disso,  realiza oficinas de teatro, desenho, leitura (Fig. 1), incentivando e promovendo  de forma individual e coletiva o acesso ao conhecimento.
O  grande objetivo do espaço, segundo seu criador Ronilço Cruz de Oliveira, é o de  garantir a inclusão social para as crianças por meios da leitura e resgatar sua  imaginação criativa. O lúdico faz parte da educação infantil e o gibi passa a  ser uma fonte de incentivo para a aprendizagem e inclusão social.  
   A  cultura necessita de um espaço físico ou território para poder existir. Ambos  estão intimamente relacionados, pois o homem produz sua erudição no espaço que  habita. Assim, os laços com o lugar são construídos a partir da cultura e da  geografia, das relações sociais e ambientais que nele se desenvolvem (JERONIMO;  GONÇALVES, 2008).
   Normalmente  a cultura é desenvolvida em um espaço que abriga as pessoas, que por sua vez  precisam de relacionamentos estáveis para poder confiar umas nas outras, a  partir disto elas se sentem enraizadas confiantes e com apego emocional a este  território promovendo o desenvolvimento local. Dessa forma, a Gibiteca tem  possibilitado o empoderamento do local, tornando os meios de cultura mais  acessíveis às pessoas que frequentam o local. Observa-se que os frequentadores  do espaço além de realizarem leituras no espaço cultural, também se valem de  empréstimos de livros.
   Essas pessoas são todas de certa forma  disseminadoras do espaço e ao mesmo tempo são elas que mantêm o projeto vivo,  por preservar o empoderamento e sentir-se ligados ao acervo cultural,
   A  Gibiteca possibilita também o fortalecimento do tecido social, nutrindo  parcerias com instituições públicas e ONG’s, oferecendo ainda espaço físico  para atividades de atendimento à saúde do idoso.
   Além  das parcerias, os gestores do local criaram novos planos para capitalização de  leitores. Algumas figuras públicas auxiliam o atendimento em outras regiões de  Campo Grande, tornando a Gibiteca presente não só no local onde habita, mas  ramificando sua atuação. Tais parcerias mencionadas são: bibliotecas nos  terminais de ônibus com livros e gibis a disposição dos usuários do transporte  coletivo da cidade. (Fig. 2). 
Igualmente,  este trabalho apresenta até o momento que as bibliotecas públicas como espaços  de inclusão social, multiculturais e promotoras do capital social reforçam  primordialmente a dinâmica cultural em lugares diversificados.   Pol (1996) reforça essa perspectiva, afirmando que a lição  afetiva está associada a duas principais características, sentimento de  proteção e identificação ao lugar.
   Portanto,  toda ação que gera bons resultados nas pessoas cria segurança, e capacidade de  perceber-se aceita naquele lugar, tornando a trama do tecido social evidente.
   Bampi  (2011, p.226) dimensiona que: “Todos são iguais, todos são diferentes” - este é um “lema multicultural”[...]”. De fato os  lugares precisam acolher as pessoas de forma justa. A dinâmica da Gibiteca  oferece um espaço multicultural e dessa  forma tem gerado a inclusão social, e contribuindo para a formação de uma  consciência crítica do cidadão campo-grandense.
3. Resultados e discussões
A pesquisa in loco, baseou-se em visitas frequentes à Gibiteca nos meses de julho á setembro de 2015, nos períodos matutino e vespertino, em horário de funcionamento da mesma. Foram realizadas entrevistas com o gestor/mantenedor do espaço cultural, Ronilço Cruz de Oliveira, com a pedagoga responsável, Roseli Almeida, com os frequentadores do espaço e com alguns moradores do bairro.
3.1 Entrevistas com Gestor e Pedagoga da Gibiteca
Com intuito  exploratório, foram realizadas perguntas abertas aos mantenedores do local, no  caso o gestor Ronilço Cruz de Oliveira, popularmente chamado de “Guerreiro”, e  a pedagoga responsável pelo atendimento diário no local, Roseli Rodrigues de  Almeida, chamada por todos de “Dona Rosa”. 
   Ronilço e a Gibiteca se  confundem como criador e criatura tamanho, o envolvimento do “Guerreiro” com  sua obra. Psicólogo de formação, com 47 anos de idade, sendo 17 deles de  envolvimento com o projeto social, o gestor e sua família atuam com  representatividade nas ações da comunidade do bairro Jardim Seminário (também  chamado de Alto de São Francisco).
   As ações na região vão  desde a criação da Associação de Moradores do Bairro, a coordenação da  Comunidade Santa Clara (igreja vizinha ao projeto social), até a criação de uma  creche, que desativada posteriormente foi transformada na Gibiteca, e com ela  nasceram outros tantos projetos, como a Gibicicleta e a Mototeca, todas com  objetivo de levar a leitura a crianças e adultos da cidade morena.
   A paixão por gibis, em  especial á “Turma da Mônica”, de Maurício de Souza, faz parte do seu hábito  diário de leitura. A preferência, segundo ele, é pelo fato “dos valores de  família serem transmitidos a partir dos gibis da Turma da Mônica”. 
   A missão do projeto é  provocar o incentivo á leitura de crianças e adolescentes. A visão, ao médio  prazo, é tornar-se referência nacional de projeto de incentivo á leitura. Os  valores mais difundidos são a ética e a cidadania. O projeto teve o apoio do  artista Fábio Porchat (Fig. 3) que financiou a Gibicicleta, a qual percorre os  bairros da cidade oferecendo Gibis e livros para população que não só lê no  local, mas que também pode levar o material para ler em casa e depois devolver,  inclusive podendo fazer doações de obras para serem doadas a outras comunidades  que necessitam da aquisição de conhecimento via leitura. 
O espaço é mantido com  recursos do idealizador do projeto, por meio de palestras que o mesmo ministra  e aulas que ele leciona no SENAI, além de doações e ajuda de voluntários. A  pedagoga Roseli Rodrigues de Almeida que  atua na área pedagógica do local é disponibilizada por meio de convênio que a  prefeitura de Campo Grande possui com outra instituição a Organização Mundial  para a Educação Pré-escolar (OMEP).
   A coordenadora e  pedagoga “Dona Rosa”, de 52 anos, e há 4 atuando no projeto, possui um grande  sentimento de pertença, por ser moradora no bairro há mais de 40 anos e ter  acompanhado todo o processo de mudança, antes mesmo do projeto acontecer. A  região era conhecida por ter um grande aterro, o “lixão”, e pela força da  comunidade, se (re) territorializou em forma de projeto social, como mencionado  anteriormente, por meio de uma creche e depois em forma de espaço de cultura.
   Segundo ela, a Gibiteca provoca na comunidade  um “sentimento de participação e de inclusão social, principalmente na leitura  durante a semana (segunda a quinta) e nas atividades lúdicas na sexta-feira (partilha  do lanche, futebol e bingo)”. O alto desempenho nas atividades (potencial  criativo) que o projeto aflorou nessas crianças, além do espírito de trabalhar  em equipe, são fundamentos citados com intensidade pela pedagoga sobre o  conhecimento via leitura.
3.2 Pesquisas com os frequentadores da Gibiteca
Conforme as palavras do  fundador, o projeto social é um espaço aberto onde às crianças, seu  público-alvo, participa quando bem entenderem, sem nenhuma obrigatoriedade.  Observou-se, ao longo das visitas, um grupo seleto de aproximadamente 30  crianças que visitam o projeto quase que diariamente. As entrevistas foram  feitas com 27 dessas crianças e adolescentes. 
   A única regra  fundamental, que é um dos princípios do projeto social, diz respeito ao uso dos  computadores. Para fazer uso da sala de computação, a criança deve ler, no  mínimo, 3 gibis. 
   A faixa estaria dos  freqüentadores é de 9 á 10 anos (26% e 22% respectivamente), seguidos da faixa  de 6 e 11 anos (13%), 12 anos (9%) e, por último, quase que se equivalem ao  público das crianças de 5 anos (5%), 13, 14 e 19 anos (4%). 
   Vale ressaltar que, por  questões de profissionais disponíveis, a Gibiteca procura atender crianças a  partir de 7 anos, com alguma exceção de crianças menores, desde que venham  acompanhadas de irmãos mais velhos ou pais. 
   Quanto á escolaridade, avaliou-se que 89% das  crianças que frequentam o projeto estão no ensino fundamental e 11% no ensino  médio. Em relação ao bairro de origem, 65% vem da comunidade local, no caso o  São Francisco, seguido pelo bairro Portal da Lagoa (10%), e o restante com 5%  distribuído entre os bairros Parque das Laranjeiras, Nova Lima, Vila Nasser,  Jardim Noroeste e Santa Luzia.
   Tratando-se das  atividades do projeto, em uma ordem por preferência, de acordo com gráfico 1 a seguir, nota-se com  desenvoltura, o gosto pela leitura de gibis (47%), seguido por brincar (28%),  leitura de livros (16%) e atividades lúdicas de cultura (9%). 
   Vale mencionar, que mesmo com a sala de  computação completa, não foi citada uma única vez pelos frequentadores como  parte de sua preferência. 
   Com relação à frequência  ao local, predomina-se visitas quase que diárias, sendo de 3 a 4 vezes a mais representativa  (26% e 33% respectivamente), 1 dia (19%), 2 e 5 dias (11%), conforme aponta o gráfico  2 a seguir.
Constatada o sentimento  de pertença da comunidade do bairro, seguido da amplitude de frequência das  crianças, além da preferência pela leitura, de gibis e livros diversos,  notou-se um bom tempo de permanência no local por visita. Pela ordem crescente,  41% ficam 3 horas no projeto, 37% (4 horas), seguido por 2 e 5 horas (11%).
   Os freqüentadores  assinalaram que pela proximidade do projeto, se deslocam a pé para o local  (85%). Os outros meios de transporte mencionados foram à bicicleta (7%), ônibus  e moto (4%). O projeto passou a ser conhecido pela iniciativa do seu criador  Ronilço, em suas atividades no bairro e no SENAI (32%), o que se tornou uma  espécie de corrente, já que as outras motivações de visitas ao local partiram  da iniciativa de amigos (25%), irmãos (15%), pais e vizinhança (14%). 
   Avaliou-se também uma  grande fidelidade ao projeto social, já que a maioria das crianças  entrevistadas já participam há 4 anos do projeto (30%), seguido de 2 anos  (29%), acima de 5 anos (15%), 3 anos (11%), 1 ano (7%), 5 anos (4%) e menos de  um ano (4%). Pouco menos da metade dessas crianças participam de outros  projetos em bairros vizinhos (44%), com ênfase para a prática de esportes  (natação, judô e capoeira). 
3.3 Entrevistas com moradores do Bairro São Francisco
Reforçando o objetivo  desse trabalho, foram entrevistados três moradores do Bairro, com o intuito de  relacionar o que pensam acerca da Gibiteca; frequência de visitas ao projeto e  o que, de fato, representa o projeto social para esses moradores.
   A visão geral dos  entrevistados foi de que a Gibiteca desenvolve melhor as crianças e tira as  mesmas das ruas, fortalecendo o sentimento de pertença e a participação á ações  comunitárias. O incentivo à leitura e o fato da inclusão social e digital feita  pela regra da instituição de ler antes de usar os computadores também foi  mencionado.
   Uma das entrevistadas  acompanhou todo o processo da abertura do projeto social, sendo funcionária da  creche que funcionava antes do projeto e, posteriormente, com a abertura da  Gibiteca, acompanhou o fundador Ronilço pedindo doações no bairro e falando “de  porta em porta” dos valores do projeto em si. A relação da mesma com o espaço  cultural já está na terceira geração, pois atualmente, a neta é frequentadora  assídua do projeto, que contou com a participação da moradora e da filha. 
   Os outros dois  entrevistados se tornaram voluntários do projeto. Uma ou duas vezes por semana  recolhem livros doados na sede da instituição e levam aos terminais de ônibus  da cidade associados ao projeto. 
   Este projeto social  representa para a comunidade, segundo a visão desses moradores do bairro  entrevistados, um condutor de incentivo à leitura e socialização, além do  fortalecimento da família, pois as crianças levam essas histórias dos livros e  gibis para casa e dividem as atividades lúdicas e culturais com seus pais. 
Considerações Finais
Este trabalho abriu a  possibilidade de analisar a Gibiteca - Mais Espaço de Cultura como vetor de  desenvolvimento local para a comunidade do bairro Jardim Seminário e Alto do  Bairro São Francisco e, em suas devidas proporções, levar a amplitude do  projeto como exemplo para outros bairros.
   A origem do projeto,  nas proximidades de um lixão, e o que o mesmo veio a se transformar, 17 anos  depois, no nosso entendimento, merece um estudo mais aprofundado. 
   Historicamente, o  objeto de estudo da pesquisa sempre foi o de analisar o espaço agregador, seja  no formato de creche e, depois, como ponto de cultura. A visão do seu criador,  Ronilço Cruz de Oliveira, e o seu potencial criativo, é o que dão vida ao  projeto, além do fato das crianças frequentarem o espaço por livre e espontânea  vontade. 
   Diante desse contexto,  nas visitas ao projeto, notou-se a disseminação de valores como respeito,  partilha, generosidade, cidadania e amor. As crianças e adolescentes, em sua  maioria, vêm ao espaço cultural para ler e se divertir. Ficou claro ainda, que  após a chegada da pré-adolescência, esses frequentadores vão mudando os hábitos  e passam a deixar de ir ao projeto, gradativamente, trocando as atividades do  espaço por outras, tais como: academia e esportes em geral. 
   Ressalta-se, em segundo  plano, o valor imensurável da biblioteca regional anexa ao projeto, pela  quantidade de obras raras. Com a relativa proximidade á UCDB e o acolhimento  dos que trabalham no local, no caso o Ronilço, nas poucas horas que o mesmo  disponibiliza e da “Dona Rosa”, em tempo integral, observou-se a existência de  um ambiente propício para o estudo e para a pesquisa. Seria bem profícua, a  realização de convênio com instituições de ensino, que possam beneficiar ambos  os parceiros. O fato algum órgão ou IES em ceder ao projeto mais algum  profissional especializado seria de grande valia, pois a partir do momento que  o público-alvo do espaço aumente, aumenta também a responsabilidade para com a  comunidade.
   A Gibiteca, e os demais  projetos do seu gestor Ronilço, são vetores para o desenvolvimento local de sua  comunidade. O fato de o projeto ser mantido exclusivamente pelo seu criador,  sem incentivos de outros órgãos, públicos2  e privados, gera um ponto de reflexão para ser trabalhado em um outro momento. 
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2 Com exceção da cadencia de Dona Rosa pela Prefeitura Municipal de Campo Grande - MS.
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