ECONOMIA SERGIPANA

Cid Olival Feitosa

 Os impactos do Sistema de Incentivos Fiscais (34/18-FINOR) para a economia sergipana

Após um período de intenso crescimento da economia brasileira, decorrente da implantação do Plano de Metas (1956-1961), com taxas de crescimento anual do PIB da ordem de 8,3% e taxa real da indústria de transformação de 11,3% ao ano, o país passaria a registrar taxas bem menores, 3,7% e 3,6% ao ano para esses dois indicadores, no período 1961/1967 (GUIMARÃES NETO, 1989).
A desaceleração estava associada ao término de um conjunto muito integrado de investimentos realizados na segunda metade dos anos 1950, quando foram instaladas as principais indústrias de bens de consumo durável e de capital, como a automobilística, de construção naval, de material elétrico pesado e de máquinas e equipamentos, ao mesmo tempo em que houve ampliação considerável das indústrias básicas, como siderurgia, petróleo, materiais não-ferrosos, celulose e papel, química pesada etc.
Dessa forma, no período 1961/1967, caracterizado por um ciclo de semi-estagnação econômica, foram preparadas novas transformações na economia brasileira, com significativas repercussões para as economias periféricas (GUIMARÃES NETO, 1989). Nesse período, a economia nordestina cresceu bem mais que a economia brasileira, decorrente, sobretudo, das novas formas de atuação do Estado que se coadunavam com o processo de desenvolvimento das forças capitalistas pela qual passava o país, exigindo a conquista de novos mercados para os seus produtos1 .
Como já se fez referência, entre 1960 e 1967 a política governamental voltada para o Nordeste teve como eixos de atuação, duas linhas principais: os incentivos fiscais do Sistema 34/18 que visavam estimular a atividade privada e, de forma complementar, as inversões públicas em infra-estrutura e em setores de base.
Os incentivos fiscais, inicialmente conhecidos como Sistema 34/18, foram assim designados por referirem-se ao Artigo 34 do Decreto nº. 3.995, de 14 de dezembro de 1961, e as alterações introduzidas pelo Artigo 18, do Decreto nº. 4.239, de 27 de junho de 1963, que criaram e regulamentaram os incentivos para as inversões no Nordeste (GOODMAN & ALBUQUERQUE, 1974).
O Sistema 34/18 baseava-se na relação entre três agentes: a empresa optante (ou depositante), a empresa beneficiária (ou investidor) e a SUDENE. A empresa optante era a pessoa jurídica, situada em território nacional, que poderia deduzir do seu imposto de renda, determinada parcela a ser investida no Nordeste. A beneficiária era responsável pela elaboração, implantação e desenvolvimento dos projetos a serem implantados no Nordeste. Já a SUDENE, era responsável pela aprovação e fiscalização da aplicação dos recursos, de acordo com os planos traçados para o desenvolvimento regional (CARVALHO, 2001).
O mecanismo permitia a concessão de estímulos fiscais e financeiros a projetos industriais, agropecuários e de telecomunicações localizados na área de jurisdição da SUDENE e caracterizava-se: a) pela possibilidade de a pessoa jurídica deduzir até 50% do imposto de renda devido, desde que os recursos fossem reinvestidos em projetos industriais, considerados pela SUDENE como prioritários para o desenvolvimento do Nordeste; b) pela obrigatoriedade de contrapartida de recursos próprios e; c) pela obrigatoriedade do cumprimento dos prazos estabelecidos nos projetos, sob pena de reversão dos recursos para o Tesouro Nacional2 (GUIMARÃES NETO & GALINDO, 1992).
Muitas modificações foram feitas ao longo do tempo, seja no sentido de aperfeiçoamento, seja visando sua extensão para novos segmentos produtivos ou regiões, dados os resultados satisfatórios alcançados com o programa. Uma das mudanças mais significativas foi a instituição do sistema FINOR – Fundo de Desenvolvimento do Nordeste, através do Decreto Lei nº. 1.374, de 12 de dezembro de 1974 (GUIMARÃES NETO & GALINDO, 1992).
O FINOR tinha como objetivo principal corrigir as distorções provocadas pelo sistema 34/18, tais como a cobrança de altas taxas de captação e a demora na implantação dos projetos privados. A mudança mais significativa estava na forma pela qual eram aplicados os recursos, eliminando-se a captação direta feita por cada investidor e conferindo à SUDENE a determinação da alocação de recursos em cada projeto, cabendo ao optante apenas a aposta na rentabilidade média do Fundo (GUIMARÃES NETO E GALINDO, 1992).
Desse modo, o FINOR visava aplicar recursos através de subscrições de ações em projetos em implantação no Nordeste e garantir um modelo auto-sustentado de mobilização de poupanças para investimentos privados, fomentando o desenvolvimento econômico regional (SUDENE/BNB, 1986).
Guimarães Neto (1989) lembra que embora os incentivos fiscais e financeiros fossem um dos mais importantes estímulos à industrialização do Nordeste, outros mecanismos, como a isenção total ou parcial do imposto de renda para as empresas novas ou já existentes, o aval da SUDENE para a obtenção de empréstimos junto aos bancos oficiais (BNB, BNDE) e isenções de impostos estaduais sobre circulação de mercadorias, concedidos por prazos de até 5 anos a empresas que se localizassem em determinado estado, também completavam a gama de incentivos para inversões na região Nordeste.
No que diz respeito especificamente ao Estado de Sergipe, a aprovação de projetos pela SUDENE passou a ocorrer a partir de 1962, com 03 projetos aprovados. No entanto, o aporte de recursos provenientes do Sistema 34/18 somente foi liberado a partir de 1964, indicando a falta de agilidade na consecução dos objetivos pretendidos (ANDRADE, 1981).
Entre 1960 e 1967, Sergipe obteve aprovação para 20 projetos de natureza diversa, e não exclusivamente industrial, o que representou 2,6% do total de projetos aprovados no período, ficando à frente apenas dos estados do Maranhão e Piauí, conforme Tabela 2.1. A título de ilustração, o estado de Alagoas, que possuía estrutura produtiva semelhante à de Sergipe, conseguiu aprovação para 39 projetos, o que correspondia a 5,1% do total. Os maiores beneficiados, no entanto, foram os estados de Pernambuco (35,7%), Bahia (19,9%) e Ceará (15,2%), que, juntos, perfaziam 70,8% do total de projetos aprovados pela SUDENE.


Tabela 2.1

NORDESTE

Projetos Aprovados pela SUDENE

1960/1977

Ano

Número por Estado

Total

MA

PI

CE

RN

PB

PE

AL

SE

BA

MG*

1960

-

-

3

-

5

8

2

-

6

-

24

1961

1

1

-

-

4

10

1

-

5

-

22

1962

2

1

8

2

8

17

2

3

15

-

58

1963

1

3

13

6

11

25

4

5

13

-

81

1964

1

2

18

3

8

29

5

2

16

1

85

1965

2

4

13

4

16

38

6

2

19

-

104

1966

3

3

17

5

16

53

8

5

37

3

150

1967

3

5

47

9

30

99

11

3

45

6

258

1968

3

2

35

12

22

83

9

5

49

7

227

1969

1

4

34

20

19

78

3

4

48

11

222

1970

4

1

33

14

22

77

5

8

47

5

216

1971

2

3

30

10

21

53

2

4

35

11

171

1972

1

-

20

11

11

40

3

4

28

5

123

1973

3

3

14

9

9

25

1

4

23

11

102

1974

2

1

16

10

4

26

2

6

31

7

105

1975

1

-

11

6

8

14

1

4

14

4

63

1976

3

3

14

6

6

25

5

3

24

9

98

1977

-

-

7

7

9

16

3

1

15

11

69

Total

33

36

333

134

229

716

73

63

470

91

2178

Fonte: Andrade (1981)

* O estado de MG compreende à área do polígono das secas, atendido pela SUDENE.

Ainda que os três estados supracitados apresentassem maiores vantagens locacionais, uma importante característica do desenvolvimento industrial desse período foi o seu caráter concentrador, em termos espaciais. Assim, não obstante dispusessem de maiores vantagens aglomerativas (infra-estrutura, dotação de matérias-primas, etc.), concentrariam a maior parte dos recursos dos incentivos fiscais. No período de 1960 a 1967 eles totalizaram 84,1% dos recursos provenientes do Sistema 34/18. A participação de Sergipe ficou na ordem de 2,2% dos recursos incentivados (Tabela 2.2).


Tabela 2.2

NORDESTE

Participação Relativa do Valor Investido com Recursos do 34/18
(em %)

Estados

Período

1960/1967

1968/1973

1974/1977

Maranhão

0,7

1,4

1,2

Piauí

0,8

8,3

0,0

Ceará

5,9

7,6

5,5

Rio G. Norte

4,4

3,4

5,6

Paraíba

4,2

6,1

3,2

Pernambuco

45,5

25,4

14,9

Alagoas

1,6

2,7

5,3

Sergipe

2,2

0,5

1,2

Bahia

32,6

39,9

58,5

Minas Gerais*

2,1

4,8

4,7

Total

100,0

100,0

100,0

Fonte: Andrade (1981)

 

 

* Compreende a área do Polígono das Secas, atendida pela SUDENE

Em que pese à reiterada importância dos incentivos fiscais para o desenvolvimento regional, as mudanças que se processaram a partir do golpe militar também trouxeram implicações para o Sistema 34/18, que foi arrefecendo ao longo do tempo (BARROS & GALVÃO, 1984). Uma das explicações para que o programa de incentivos fiscais perdesse seu caráter de diferenciação e dinamicidade foi a sua extensão a outras regiões, acarretando na redução dos recursos à disposição dos investidores no Nordeste, bem como devido à criação e manutenção de outros incentivos ao desenvolvimento industrial do país como um todo.
No que se refere ao recolhimento dos incentivos, as alterações mais significativas foram as aberturas para aplicações em pesca, reflorestamento e turismo, a partir de 1968, e a criação do PIN – Programa de Integração Nacional, em 1971, e do PROTERRA – Programa de Redistribuição de Terras e de Estímulos à Agroindústria do Norte e do Nordeste, em 19723 (GALVÃO, 1987). Essas medidas tiveram como conseqüência a redução da quota de recursos destinados à SUDENE, que passou de 76% em 1967 para 56% em 1969, 32% em 1971 e 21% em 1973 (Tabela 2.3). 


Tabela 2.3

BRASIL

Distribuição Percentual dos Incentivos Fiscais, segundo as Áreas de Aplicação

1962-1984

Exercícios

Destino dos Incentivos

 

(%)

SUDENE

SUDAM

SUDEPE

Turismo

Reflorestamento

PIN

PROTERRA

1962

100,0

-

-

-

-

-

-

100,0

1963

87,5

12,5

-

-

-

-

-

100,0

1964

91,6

8,4

-

-

-

-

-

100,0

1965

92,0

8,0

-

-

-

-

-

100,0

1966

82,9

17,1

-

-

-

-

-

100,0

1967

76,0

22,0

2,0

-

-

-

-

100,0

1968

64,5

22,8

6,1

5,0

1,6

-

-

100,0

1969

56,3

23,4

12,5

4,0

3,8

-

-

100,0

1970

54,0

22,1

13,4

3,9

6,6

-

-

100,0

1971

32,7

14,6

7,0

2,9

12,8

30,0

-

100,0

1972

24,1

9,0

3,3

2,3

12,0

30,5

18,8

100,0

1973

24,7

8,4

2,3

2,5

12,4

29,9

19,8

100,0

1974

23,9

9,4

1,2

2,2

12,7

30,4

20,2

100,0

1975

27,2

8,6

1,1

1,3

9,8

31,2

20,8

100,0

1976

21,8

7,3

0,8

1,5

15,9

31,6

21,1

100,0

1977

21,1

7,4

0,6

0,9

16,5

32,1

21,4

100,0

1978

19,9

7,8

0,5

0,8

19,8

30,7

20,5

100,0

1979

19,6

8,3

0,4

1,1

20,1

30,3

20,2

100,0

1980

20,2

8,7

0,4

1,1

19,4

30,1

20,1

100,0

1981

21,6

8,5

0,4

0,9

18,6

30,0

20,0

100,0

1982

23,2

9,8

0,3

0,7

16,0

30,0

20,0

100,0

1983

23,4

9,5

0,4

0,8

15,9

30,0

20,0

100,0

1984

25,3

8,8

0,4

0,8

14,7

30,0

20,0

100,0

Fonte: SUDENE/BNB (1986)

Custeados com recursos que poderiam ser destinados ao Nordeste, o PIN e o PROTERRA reduziram ainda mais o suporte financeiro da região, proveniente dos incentivos do Imposto de Renda. Paradoxalmente, o período 1968/1973 foi o de mais intenso desembolso de recursos dos incentivos ficais em benefício de projetos do Nordeste (Holanda, 1976).
Segundo Guimarães Neto (1989, p. 143), “de fato, entre 1968 e 1973, anos do novo ciclo da expansão da economia brasileira, os investimentos fixos da indústria nordestina cresceram a 23% ao ano, ao tempo que o produto industrial expande-se a uma taxa de 9,1%, em termos anuais. Em relação aos investimentos, isto significa que eles quase triplicaram nos anos considerados, confrontando-se o nível de 1968 com o de 1973”.
O número de projetos aprovados pela SUDENE cresceu 29,3% em relação ao período anterior e o Estado de Sergipe apresentou crescimento de 45%, perfazendo 29 projetos aprovados entre 1968 e 1973. No entanto, sua participação relativa no valor investido apresentou queda no período citado, passando de 2,2%, entre 1960 e 1967, para 0,5% entre 1968 e 1973, contrariando a tendência geral da economia nordestina.
A partir de 1974, como já se fez referência, o Sistema 34/18 seria transformado em FINOR. Um fato que merece destaque é o aumento da participação da agricultura na absorção de mais recursos do programa de incentivos ficais, em detrimento da indústria, conforme Tabela 2.4.


Tabela 2.4

NORDESTE

Incentivos do Sistema 34/18 - FINOR, aprovados por Setor/Ramo

Posição em 31.07.1984

 

(Em %)

Anos

Indústria de Transformação*

Agropecuária

Outros**

Total

1963

97,5

2,0

0,5

100,0

1964

98,0

-

2,0

100,0

1965

94,4

1,2

4,4

100,0

1966

91,0

6,1

2,9

100,0

1967

91,9

6,7

1,4

100,0

1968

79,3

17,6

3,1

100,0

1969

58,0

27,3

14,7

100,0

1970

55,0

40,2

4,8

100,0

1971

45,2

48,5

6,3

100,0

1972

53,1

42,3

4,6

100,0

1973

86,8

9,1

4,1

100,0

1974

88,9

4,3

6,8

100,0

1975

76,5

21,2

0,2

100,0

1976

73,6

9,1

16,7

100,0

1977

60,5

34,2

5,3

100,0

1978

81,3

14,7

4,0

100,0

1979

74,2

25,5

0,3

100,0

1980

83,1

15,2

1,7

100,0

1981

74,7

21,8

3,5

100,0

1982

69,7

18,7

11,6

100,0

1983

74,6

17,6

7,8

100,0

1984

69,3

24,5

5,2

99,0

Total

74,9

19,0

6,1

100,0

Fonte: SUDENE/BNB (1986)

* Inclui Agroindústria

** Engloba Turismo, Serviço, Telecomunicações, Extrativa Mineral e Pesca

Ainda assim, estima-se que “para cada unidade monetária que o Governo aplicou no Nordeste (via sistema de incentivos) foi carreada, adicionalmente, 1,85 unidade monetária de investimento privado (composto, notadamente, por recursos próprios dos empresários, empréstimos do setor bancário ou de outras fontes)” (SUDENE/BNB, 1986, p. 25).
Passando de uma análise mais geral do programa de incentivos fiscais 34/18-FINOR para uma análise mais especifica do setor industrial, objeto do nosso trabalho, vejamos quais os impactos que o Sistema 34/18-FINOR promoveu no estado de Sergipe.


1 Segundo Guimarães Neto (1989), a taxa média de crescimento da economia brasileira no período citado foi de 4,5% ao ano, ao passo que a economia nordestina apresentou crescimento médio de 5,6% ao ano.

2 Para uma análise mais detalhada acerca do mecanismo de incentivos fiscais 34/18 ver, dentre outros, Goodman e Albuquerque (1974), Santos (1995), Hirschman (1967), Moreira (1979), Guimarães Neto e Galindo (1992).

3 Para uma análise mais detalhada acerca do PIN e do PROTERRA, ver Galvão (1987), Tavares (1989), Carvalho (2001).

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