BIODIESEL NO BRASIL EM TRÊS HIATOS: SELO COMBUSTÍVEL SOCIAL, EMPRESAS E LEILÕES. 2005 A 2012.

Hugo Rivas de Oliveira
José Eustáquio Canguçu Leal
Yolanda Vieira de Abreu

Referencial Teórico sobre o Desenvolvimento Endógeno, Fontes de Energia e Meio Ambiente e do Papel do Estado na Definição de Políticas Energéticas.


Este texto descreve e discute conceitos sobre desenvolvimento endógeno como base para a implantação, pelo Governo Federal, do SCS relacionado ao biodiesel. Discorrerá sobre algumas das fontes de energia e seus efeitos sobre o meio ambiente e encerrará descrevendo e contextualizando o atual papel do Estado na indústria de energia.

2.1. Desenvolvimento Endógeno


Nas últimas décadas o conceito do desenvolvimento local passou por transformações e as explicações para tal fato podem ter suas raízes na crise Fiscal do Estado, no esgotamento do paradigma de políticas centralizadoras e neoliberais excludentes e as transformações nos modos e meios de produção. E, também, pelo crescimento do conceito de federação, entre os Estados que compõem o país.
Em decorrência desses acontecimentos surge um novo paradigma de desenvolvimento, construído “de baixo para cima”, tendo ficado conhecido como endógeno ou local. Explica-se que neste trabalho o desenvolvimento endógeno e local foi tratado como fazendo parte de um mesmo conceito. Dentre os principais defensores e representantes deste paradigma podem-se citar os seguintes autores: Sergio Boisier, Cristovam Buarque, Vásquez Barquero, Amaral Filho, e outros.
A princípio, faz-se necessário conhecer os vários tipos e significados de desenvolvimento. Para Mioto e Barbosa (2007), o conceito de desenvolvimento tem sua gênese nas discussões efetuadas no pós-guerra e foi difundido e defendido como bandeira pela Organização das Nações Unidas (ONU), com a Carta do Atlântico (1941) e a Carta das Nações Unidas (1945). De início o conceito de desenvolvimento foi atrelado ao crescimento econômico e teve como principais representantes: Furtado, Sunkel, Paz e Echeverría. Tal fato levou à utilização intensiva do crescimento do PIB total e per capita como medida de desenvolvimento entre os países.
Assim, Celso Furtado, na década de 60, definiu desenvolvimento sob o prisma econômico. Para ele “desenvolvimento é, basicamente, aumento do fluxo de renda real, isto é, incremento na quantidade de bens e serviços por unidade de tempo à disposição de determinada coletividade” (FURTADO, 1961, p.115). Esse mesmo autor reconhece que o desenvolvimento só ocorre quando beneficia toda a sociedade. Nesse sentido, o Brasil ainda está longe de alcançá-lo.
O progresso do conceito de desenvolvimento foi gradativo e nas últimas décadas ganhou outras dimensões. Boisier, um dos autores que contribuiu para este avanço do conceito de desenvolvimento, afirma: “Entender el desarrollo requiere de enfoques holísticos, sistémicos y recursivos” (BOISIER, 2001a, p.157).
Entendendo a dinâmica do desenvolvimento como uma questão global, situa-se a esfera local como palco legítimo para a construção do desenvolvimento. Neste sentido, a evolução dos processos democráticos e a descentralização figuram como estratégias básicas de envolvimento dos atores na negociação e planejamento das ações estratégicas para o desenvolvimento local, resultando em melhor equilíbrio de poder e transparência, focando o interesse coletivo, primando pela equidade e sustentabilidade (GONÇALVES, 2008). Porém, quando associado somente à economia no sistema capitalista, o desenvolvimento é atrelado ao progresso material e de modernização tecnológica (MARTINS, 2002).
O desenvolvimento atualmente é estudado e discutido com muitas adjetivações, no entanto, o mais importante é considerar as grandes variáveis econômicas, socioculturais e ambientais, refletindo sobre a necessidade de equilíbrio e reparação histórica. A meta deve ser buscar igualdade, participação, direito e cidadania para inclusão na sociedade, estabelecendo sistemas democráticos efetivos que respeitem as potencialidades produtivas e os valores da cultura local (GONÇALVES, 2008).
Desse modo, considerando essa evolução do conceito, pode-se verificar um encadeamento sobre os tipos de desenvolvimento. Assim, Mioto e Barbosa (2007) listam alguns tipos de desenvolvimento como:

Dos tipos de desenvolvimento citados, o desenvolvimento endógeno absorve os conceitos dos demais. Este é a expressão chave da convergência e da interação. É um processo no qual o território – no sentido amplo do termo – atua ativamente na formação de estratégias que influenciam sua dinâmica econômica. Ele não é apenas um receptor passivo das determinações exógenas ao processo local e territorial.
O território pode ser considerado a partir de três possíveis dimensões e características de complexidade – território natural; território intervindo e território organizado. Porém, somente a última dimensão é passível de intervenções promotoras do desenvolvimento. O território organizado tem uma comunidade em que se reconhece a partir dele, apresenta um tecido político, administrativo e institucional. "Así que la expresión ´desarrollo territorial` se refiere a la escala geográfica de un proceso y no a su sustância" (BOISIER, 2001a, p.159). Pode-se considerar como território um país, um estado, uma Região, um município ou uma comunidade. Por exemplo, segundo Boisier (2001a), uma Região pode ser definida como um território organizado que tem em si os fatores, reais ou potenciais, de seu próprio desenvolvimento.
O importante é observar a complexidade do processo de desenvolvimento que se quer estudar. Nesse trabalho o território espacial foi o Brasil, a comunidade foi representada por todos os agricultores familiares e o propulsor do desenvolvimento foi a cadeia do biodiesel e o SCS. O desenvolvimento deve então, à transformação do território em sujeito coletivo, um processo de fortalecimento da sociedade civil, entendida como comunidade, indivíduos e Região.
A instituição do SCS ligado aos agricultores familiares mostra a interação entre os atores públicos e privados, fundamental para gerar a sinergia necessária para o processo de desenvolvimento. Juntamente com isso, o papel dos atores locais e as formas de capital intangível1 , também, têm importância relevante. É um projeto coletivo de desenvolvimento, que se articula dentro de um território, daí a ideia de endógena.
O conceito do desenvolvimento endógeno, na visão de Barquero, é o desenvolvimento da comunidade local através da sua organização. Segundo ele:
O desenvolvimento endógeno 2 propõe-se a atender às necessidades e demandas da população local através da participação ativa da comunidade envolvida. Mais do que obter ganhos em termos da posição ocupada pelo sistema produtivo local na divisão internacional ou nacional do trabalho, o objetivo é buscar o bem-estar econômico, social e cultural da comunidade local em seu conjunto. Além de influenciar os aspectos produtivos (agrícolas, industriais e de serviços), a estratégia de desenvolvimento procura atuar sobre as dimensões sociais e culturais que afetam o bem-estar da sociedade. Isto leva a diferentes caminhos de desenvolvimento, conforme as características e as capacidades de cada economia e sociedade locais (BARQUERO, 2001, p. 39).
Assim, o desenvolvimento local parte-se de iniciativas e da mobilização da comunidade abrangida com o propósito de buscar melhor condição de vida para seus membros. Nesta linha de pensamento, Barquero afirma que para haver desenvolvimento endógeno a comunidade deve ampliar seus horizontes estabelecendo ações estratégicas e desenvolvendo seus potenciais. Ele coloca que:
O desenvolvimento endógeno é, antes de mais nada, uma estratégia para ação. As comunidades locais têm uma identidade própria, que as leva a tomarem iniciativas visando assegurar o seu desenvolvimento. Quando conseguem fortalecer sua capacidade organizacional, têm condições de evitar que empresas e organizações externas limitem suas potencialidades de atuação. É a capacidade de liderar o próprio processo, aliada à mobilização do seu potencial, que torna possível falar de desenvolvimento endógeno (BARQUERO, 2001, p.39).
Para Buarque 3, assim como Barquero, o desenvolvimento local ocorre de dentro para fora na comunidade. É através do desenvolvimento das potencialidades e da organização da sociedade local que ocorrerão transformações necessárias a tal desenvolvimento. É necessário também que as ações da comunidade sejam sólidas e convertam a um objetivo comum. Desse modo, Buarque conceitua desenvolvimento local como:
um processo endógeno de mudança, que leva ao dinamismo econômico e à melhoria da qualidade de vida da população em pequenas unidades territoriais e agrupamentos humanos. Para ser consistente e sustentável, o desenvolvimento local deve mobilizar e explorar as potencialidades locais e contribuir para elevar as oportunidades sociais e a viabilidade e competitividade da economia local; ao mesmo tempo, deve assegurar a conservação dos recursos naturais locais, que são a base mesma das suas potencialidades e condições para a qualidade de vida da população local. Esse empreendimento endógeno demanda, normalmente, um movimento de organização e mobilização da sociedade local, explorando suas capacidades e potencialidades próprias, de modo a criar raízes efetivas na matriz socioeconômica e cultural da localidade (BUARQUE, 2006, p. 25).
Nesse contexto, Buarque entende que a conservação dos recursos naturais e dos ecossistemas como sendo o fundamento das potencialidades da comunidade local e essencial para o seu desenvolvimento. Assim, o meio ambiente ganha relevância nesse discurso, pois concretiza-se como uma reserva de desenvolvimento para a sociedade local e, portanto, deve ser explorado cuidadosamente para que não seja desperdiçadas as oportunidades decorrentes e que não sofra com as consequências ambientais advindas.
No que tange as dimensões do conceito do desenvolvimento endógeno, Barquero levanta três:
uma econômica, caracterizada por um sistema específico de produção capaz de assegurar aos empresários locais o uso eficiente dos fatores produtivos e a melhoria dos níveis de produtividade que lhes garantem competitividade; uma outra sociocultural, na qual os atores econômicos e sociais se integram às instituições locais e formam um denso sistema de relações, que incorpora os valores da sociedade ao processo de desenvolvimento; e uma terceira, que é política e se materializa em iniciativas locais, possibilitando a criação de um entorno local que incentiva a produção e favorece o desenvolvimento sustentável (BARQUERO, 2001, p. 42).
A dimensão dita como econômica é imprescindível em todos os processos de desenvolvimento local. Dessa forma, com a promoção do desenvolvimento local, Buarque assegura que sociedade local consegue ter sua independência econômica, superando o subdesenvolvimento. Ele afirma que:

O desenvolvimento local é o resultado de múltiplas ações convergentes e complementares, capaz de quebrar a dependência e a inércia do subdesenvolvimento e do atraso em localidades periféricas e de promover uma mudança social no território. (...) Em municípios pobres, deve perseguir com rigor o aumento da renda e da riqueza locais, por meio de atividades econômicas viáveis e competitivas, vale dizer, com capacidade de concorrer nos mercados locais, regionais e, no limite, nos mercados globais. Apenas com economia eficiente e competitiva gerando riqueza local sustentável pode-se falar, efetivamente em desenvolvimento local, reduzindo a dependência histórica de transferências de rendas geradas em outros espaços. (BUARQUE, 2006, p. 26).
Para se alcançar o desenvolvimento endógeno deve-se desenvolver estratégias de desenvolvimento objetivando melhorar a eficiência na alocação dos recursos públicos, fomentar a equidade na distribuição de riqueza e do emprego e satisfazer as necessidades presentes e futuras da população, mediante o uso adequado dos recursos naturais e do meio ambiente. Podem ser observado na Figura 2.1, os objetivos múltiplos que devem ser alcançados para um desenvolvimento duradouro: eficiência que traz competitividade; ecologia que remete à conservação dos recursos naturais e equidade que resulta na coesão social e as três dimensões juntas na sustentabilidade do processo (BARQUERO, 2001).
Portanto, desenvolvimento local sustentável pode também ser considerado processo de transformação social e elevação das oportunidades da sociedade, ajustando, no tempo e no espaço, o crescimento e a eficiência econômica, a conservação ambiental, a qualidade de vida e a equidade social, partindo de um claro compromisso com o futuro e a solidariedade entre as gerações (BUARQUE, 2006). Assim, é necessário que haja um planejamento e suas ações devem ser estruturadas levando em consideração a construção de um novo estilo de desenvolvimento a médio e longo prazo. Nesse sentido, Buarque conceitua planejamento local como um:
processo de decisão – tecnicamente fundamentada e politicamente sustentada – sobre as ações necessárias e adequadas à promoção do desenvolvimento sustentável em pequenas unidades político-administrativas com relativa homogeneidade socioeconômica e ambiental. Como um processo social, o planejamento do desenvolvimento local deve contribuir para a construção de um projeto da sociedade local, que mobilize os atores sociais e organize as ações convergentes dos diversos agentes de modo a implementar as transformações na realidade que preparam o futuro desejado (BUARQUE, 2006, p. 83).
A conceituação de desenvolvimento endógeno é multidisciplinar, porém a esfera econômica é muito presente e forte, pois é imprescindível para tal tipo de desenvolvimento haver crescimento econômico. Amaral Filho de forma contundente alia essas duas premissas discorrendo que:
o conceito de desenvolvimento endógeno4 pode ser entendido como um processo de crescimento econômico que implica uma contínua ampliação da capacidade de agregação de valor sobre a produção, bem como da capacidade de absorção da Região, cujo desdobramento é a retenção do excedente econômico gerado na economia local e/ou a atração de excedentes provenientes de outras regiões. Esse processo tem como resultado a ampliação do emprego, do produto e da renda do local ou da Região (AMARAL FILHO, 2001, p. 262).
Nesse sentido, pode-se afirmar que não há desenvolvimento endógeno, sem que haja crescimento econômico, no entanto, a relação contrária pode ocorrer, ou seja, poderá haver crescimento econômico sem que necessariamente haja esse tipo de desenvolvimento. Buarque explica essa questão de modo claro:
o desenvolvimento local não pode ser confundido com movimento econômico gerado por grandes investimentos de capital externo, que não se internalizam e não se irradiam na economia local, enclaves que não se traduzem em mudanças efetivas na organização social e econômica local, com seus desdobramentos na capacidade de investimento endógeno (BUARQUE, 2006, p. 26).
Nesse contexto, Boisier mostra que a esfera econômica é um dos quatro princípios de endogeneidade do desenvolvimento local, princípios estes que, segundo ele, devem se cruzar nos quatro planos que são: político, econômico, cientifica e tecnológico e cultural. No entanto, para que ocorra um impulso de crescimento através destes planos faz-se necessário uma organização do território (entendido como espaço abstrato que compreende a comunidade e os atores sociais). Contudo, para haver o desenvolvimento endógeno em uma sociedade local é necessário que haja grandes mudanças de atitudes nos atores sociais envolvidos, mas, principalmente, na administração pública que coordena recursos, pessoal e ações. Boisier explica esta idéia da seguinte forma:
Primero, la endogeneidad se refiere o se manifiesta en el plano político, en el cual se Le identifica como una creciente capacidad regional para tomar las decisiones relevantes em relación a diferentes opciones de desarrollo, diferentes estilos de desarrollo, y en relación al uso de los instrumentos correspondientes, o sea, la capacidad de diseñar y ejecutar políticas de desarrollo, y sobre todo, la capacidad de negociar. En segundo lugar, la endogeneidad se manifiesta en el plano económico, y se refiere em este caso a la apropiación y reinversión regional de parte del excedente a fin de diversificar La economía regional, dándole al mismo tiempo una base permanente de sustentación en el largo plazo. En tercer lugar, la endogeneidad es también interpretada en el plano científico y tecnológico, es decir, la vemos como la capacidad interna de un sistema –en este de um territorio organizado—para generar sus propios impulsos tecnológicos de cambio, capaces de provocar modificaciones cualitativas en el sistema. En cuarto lugar, la endogeneidad se plantea en el plano de la cultura, como una suerte de matriz generadora de la identidad socioterritorial (BOISIER, 2001a, p. 14).
Os atores sociais precisam ampliar o domínio do conhecimento e da informação para que tenham a capacidade de inovar e responder aos desafios contemporâneos. O desenvolvimento local, considerando a intensidade e a velocidade das transformações globais, depende da capacidade dos atores locais de compreender e responder a estas de forma apropriada, com suas próprias forças, num processo permanente de aprendizagem (BUARQUE, 2006).
As inovações tecnológicas são imprescindíveis para o desenvolvimento local. São as ferramentas necessárias para propiciar crescimento rompendo a inércia do atraso de comunidades diretamente dependentes de ajudas financeiras. Ao tratar da importância do domínio da tecnologia, Barquero salienta:
o desenvolvimento econômico e a dinâmica produtiva dependem da introdução e difusão das inovações e do conhecimento, que impulsionam a transformação e a renovação do sistema produtivo, uma vez que, em última análise, a acumulação de capital se traduz por acumulação de tecnologia e conhecimento (BARQUERO, 2001, p. 21).
A modernização tecnológica está diretamente relacionada com o aumento da produtividade e acompanha a dinamização da economia e o aumento dos excedentes econômicos (BUARQUE, 2006). Esse ambiente de inovação para Amaral Filho é:
um conjunto territorializado e aberto para o exterior que integra conhecimentos, regras e um capital relacional. Ele é ligado a um coletivo de atores, bem como de recursos humanos e materiais (AMARAL FILHO, 2001, p. 274).
Desse modo, o ambiente conseguido pela modernização tecnológica estimula a uma boa relação entre os atores sociais e possibilita não só minimizar os problemas internos como aproveitar as oportunidades exteriores em função do desenvolvimento da sociedade local.
Segundo Boisier (2007), a inovação tecnológica (dita como revolução científica e tecnológica) promove uma eficácia na produtividade, porém cada território tem suas características próprias e para esse processo ocorrer é necessário observar cuidadosamente as características de cada lugar. Segundo ele,
Uno de los efectos más importantes de la Revolución Científica y Tecnológica es, vía micro-electrónica y otros mecanismos, permitir la segmentación funcional y territorial de los procesos productivos sin perdida de eficacia ni de rentabilidad. Esta es una cuestión clave ya que al ser posible desagregar un proceso tecno-productivo en partes componentes, para localizar dichas partes en diferentes lugares discontinuos en el globo, la firma (ahora casi un “holding”) debe examinar cuidadosamente las características de cada lugar para que la “apuesta” tenga un resultado positivo (BOISIER, 2007, p. 10).
Enfim, as interações entre mudança tecnológica e amplitude das operações das empresas e a introdução e difusão das inovações permite que todas e cada uma das empresas do sistema trabalhem com economias internas e externas, de escala e de diversidade. Sendo assim, a introdução de inovações (que são sempre resultado coletivo da cooperação tácita entre as empresas) leva à elevação da produtividade e da competitividade das economias locais (BARQUERO, 2001).
A competitividade constitui um importante item do desenvolvimento local. Para Barquero (2001), as empresas tomam suas decisões em matéria de inovação em um entorno cada vez mais competitivo e globalizado. Segundo ele,
A globalização faz com que os sistemas empresariais e as instituições e organizações das diferentes sociedades se relacionem umas com as outras e se adaptem as condições de cada entorno5 . O aumento da concorrência dos mercados implica que, cada vez mais, a competitividade das empresas depende do funcionamento da rede de instituições que estruturam o entorno na qual as primeiras estão radicadas (BARQUERO, 2001, p. 24).
Para Barquero (2001), o próprio fator de competitividade se encontra na própria organização da produção. A organização das empresas, formando redes de empresas especializadas, faz com que seja possível trabalhar com economias de escala externa às mesmas, ainda que internas ao sistema produtivo local, diminuindo, assim, os custos de transação.
Para Amaral Filho, a competitividade é uma questão de suma importância para o desenvolvimento local. Segundo ele,
A questão da competitividade, pouco relevante, aliás, na teoria econômica regional tradicional, é hoje um ponto estratégico de máxima importância para a sustentabilidade do desenvolvimento endógeno. Ela deixou de pertencer apenas ao mundo das empresas para pertencer também ao mundo das regiões (AMARAL FILHO, 2001, p. 279).
A competitividade traduz-se então como sendo essencial para não só para o desenvolvimento do processo produtivo, mas também para o crescimento econômico. Está intrinsecamente ligada a questões que envolvem, através da concorrência, a busca para sobressair dentro de demais competidores do mesmo ramo. Esse fator leva a um resultado positivo da interação dos atores sociais que almejam sempre estarem desenvolvendo, criando novas alternativas que acabam por disseminar beneficamente por toda a comunidade local.
Neste sentido, Boisier evidencia a competitividade como sendo um instrumento de vantagens. Ele salienta que:
Unificado el mercado, el comercio de bienes y servicios homólogos dependerá estrictamente de las competitividades relativas, en parte basadas en ventajas comparativas estáticas y en parte en ventajas comparativas dinâmicas (BOISIER, 2007, p. 25).
Segundo Buarque (2006), com a globalização, surge um novo paradigma de desenvolvimento, e assim, diferentes ritmos e velocidades. Nesse sentido, a base da competitividade das nações e espaços econômicos é alterada radicalmente. A educação e a capacitação dos recursos humanos passam a ser um diferencial na competitividade. Assim,
De uma vantagem locacional marcada pela abundância de recursos naturais, baixos salários e reduzidas exigências ambientais, a competitividade se desloca para as vantagens em conhecimento e informação (tecnologia e recursos humanos) e para a qualidade e excelência do produto ou serviço. Adicionalmente, a qualidade emerge como uma referencia importante de disputa competitiva, incluindo a qualidade do meio ambiente e os processos sustentáveis de produção como diferencial de competitividade, refletindo os avanços tecnológicos e o crescimento da consciência ambiental (BUARQUE, 2006, p. 21).
Neste contexto segundo Barquero (2001), a globalização criou um novo cenário para as regiões e cidades que competem para a manutenção e atração de investimentos. Para esse autor,
A globalização gera novas necessidades e demandas de serviços que tornam possível o desenvolvimento das empresas, dos sistemas produtivos e das economias locais. As novas tecnologias introduzem novos produtos (BARQUERO, 2001, p. 250). (...) Os tempos de globalização são também tempos de intensificação das relações sociais, econômicas, tecnológicas e comerciais; são igualmente tempos de fortalecimento das relações entre as empresas, organizações, cidades e territórios (BARQUERO, 2001, p. 247).
As transformações advindas com a globalização exigem um planejamento constante. Este planejamento remete a análise de contextos (Figura 2.2), o interno e o externo. O interno, parte das potencialidades e dos problemas da realidade local. Já o externo, parte da identificação das oportunidades e os fatores exógenos que podem constituir ameaças ao desenvolvimento. (BUARQUE, 2006). O processo de globalização, segundo Boisier (2007), produz importantes modificações na geografia de produção, e completa:
La libre circulación del capital en nuevos espacios ampliados de comercio y los procesos de reconversión a los que se ven empujados los territorios sumados a las innovaciones tecnológicas generan nuevos mapas productivos, con sus inevitables balances de pérdidas y ganancias (BOISIER, 2007, p. 35).

Com o advento da globalização e o avanço da política neoliberal, o Estado entra em um período de reestruturação, redefinindo suas ações (privatização, terceirização e introdução da administração gerencial), em grande parte como uma necessidade de adaptação às novas condições estruturais da economia mundial e da sociedade. Com a reestruturação neoliberal o Estado já não possui mais verbas ou orçamento suficiente para conduzir ou impulsionar os investimentos necessários e já não pode mais assumir as mesmas responsabilidades econômicas e sociais que antes (BUARQUE, 2006).

O Estado passa a promover políticas descentralizadoras de responsabilidade quanto ao desenvolvimento e essa atitude leva as regiões, municípios e comunidades a decidirem seus próprios destinos. Para Barquero,
(...) as iniciativas locais precisam conjugar a eficiência na alocação dos recursos públicos e privados, a equidade na distribuição da riqueza e do emprego e o equilíbrio em termos de meio ambiente (BARQUERO, 2001, p. 53).
Para entender os processos e as dinâmicas do desenvolvimento local é necessária a compreensão de território. No contexto do desenvolvimento local, território não é um limite geográfico, pode ser mais bem delimitado através das características e densidade relacional, nos aspectos da atividade econômica, cultura e interesses políticos (GONÇALVES, 2008). Esse autor certifica que,
Os territórios têm normalmente atividades e interesses particulares que devem ser preservados, e justamente a compreensão destas prioridades, com a possibilidade do envolvimento dos diversos atores na definição de estratégias que faz do território uma realidade particular, devendo os atores cooperar para a superação dos desafios da coletividade local (GONÇALVES, 2008, p. 24).
Nesse sentido Barquero (2001), comenta que território pode ser visto como um emaranhado de interesses de uma comunidade territorial, o que permite defini-lo como um agente de desenvolvimento local, sempre ocupado em conservar e proteger a integridade e os interesses territoriais nos processos de desenvolvimento e mudança estrutural.
Segundo Boisier (2001b), todo território, ou quase todo, tem certo potencial endógeno que compreende os recursos físicos e ecológicos, as amplitudes naturais e a energia de sua população, a estrutura urbana e capital acumulado, etc. Ainda Boisier (2001a) cria a expressão “territorio organizado”. Para ele, utiliza-se essa expressão para:
(...) denotar la existencia de actividades de mayor complejidad, de sistemas de asentamientos humanos, de redes de transporte, pero sobre todo, de la existência de una comunidad que se reconoce y que tiene como auto referencia primaria el próprio territorio y que está regulada mediante un dispositivo político-administrativo que define las competencias de ese territorio y su ubicación y papel en el rdenamiento jurídico nacional, es decir, un territorio organizado tiene una estructura de administración y, en algunos casos, también de gobierno. Estos territorios pasan a ser sujetos de intervenciones promotoras del desarrollo (BOISIER, 2001a, p. 06).
Para Barquero (2001), cada território requer um tratamento particular, bem como o uso de ferramentas para eliminar as restrições ao bom funcionamento da economia local incrementando a competitividade das empresas. Nesse sentido, Boisier aborda questões já discutidas no decorrer deste capítulo, mas que são de fundamental importância para aprendizagem do contexto de território para o desenvolvimento local. Assim,
Por cierto, no todos los territorios se encuentran en buenas condiciones desde el punto de vista de la situación inicial de su potencial de innovación territorial. Las dificultades de ciertos territorios para participar del movimiento actual de innovación y transformación estructural provienen, en parte, de carencias en sus estructuras económicas en relación a: la recolección y tratamiento de la información; los procesos de planificación o gestión y, en general, de toma de decisiones; el desarrollo tecnológico; la investigación de mercados y marketing; la administración empresarial y la gestión financiera (BOISIER, 2001b, p. 08).
Contudo, no desenvolvimento local as vantagens competitivas são criadas e construídas com investimentos e aproveitamento das potencialidades e diversidades de cada localidade, os atores sociais têm um encargo basilar para a promoção do desenvolvimento local. E se esta for, efetivamente a pretensão dominante entre os atores sociais, o setor público tende a aumentar sua importância no desenvolvimento local. Assim, para assegurar tal desenvolvimento dentro da globalização, é necessário que os atores e a sociedade local esteja estruturada e mobilizada para definir e explorar suas prioridades e especificidades. Agindo como territórios organizados, os atores sociais definem prioridades e articulam iniciativas e ações internas e externas, utilizando, para tanto, os instrumentos de regulação do Estado (BUARQUE, 2006).
Neste trabalho o desenvolvimento endógeno será atrelado ao SCS que tem como um dos seus objetivos desenvolver a agricultura familiar, dotando de tecnologia de produção de oleaginosas destinada a produção de biodiesel. Verificar se o SCS está mesmo cumprindo o seu papel de propulsor do desenvolvimento e assim beneficiando toda sociedade brasileira e diminuindo a utilização de combustíveis fósseis.


1 Entenda-se por capital intangível todas as formas de capital imaterial.

2 Barquero usa a terminologia de desenvolvimento endógeno, que neste estudo é sinônimo de desenvolvimento local.

3 Buarque usa a terminologia de desenvolvimento local que neste estudo é sinônimo de desenvolvimento endógeno.

4 Amaral Filho usa a terminologia de desenvolvimento endógeno que neste estudo é sinônimo de desenvolvimento local.

5 Entorno, segundo Barquero (2001, p. 20) pode ser compreendido como sistema de empresa, instituições, atores econômicos e sociais.

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