“As  relações entre Património e Turismo merecem sem dúvida uma reflexão contínua e  cada vez mais aprofundada”.
  José Manuel PEREIRA  DE OLIVEIRA, 1992: 87.
Apesar  de as práticas turísticas remontarem a tempos recuados, apenas nas últimas  décadas se verifica uma verdadeira organização e sistematização do turismo, de  tal forma que o turismo moderno, na perspectiva das facetas que hoje se  reconhecem, tem pouco mais de cinco décadas. Em particular é a segunda metade  do século passado que marca o enraizamento e uma fase de grande crescimento e  diversificação da actividade turística no plano internacional.
  Com  efeito, desde o início dos anos 50 até aos nossos dias, o número de turistas  internacionais cresceu de forma espectacular: 25 milhões (1950), 170 milhões  (1970); 500 milhões (1990), 698 milhões (2000) e 842 milhões (2006). As  previsões da Organização Mundial do Turismo apontam para cerca de 1000 milhões  em 2010, e 1500 milhões em 2025. Neste contexto de globalização e massificação  da actividade turística, Portugal recebeu em 2003 quase 12 milhões de turistas,  valor que corresponde a 1.7% do total e ao 16º lugar no ranking mundial  (CRAVIDÃO, 2006). No entanto, o nosso país, segundo a perspectiva do “Plano  Estratégico Nacional do Turismo” (2007), “(…) perdeu quota de mercado a nível  internacional e está muito dependente de quatro mercados emissores e do  desempenho de três regiões – Algarve, Lisboa e Madeira –, sendo ainda afectado  por uma elevada sazonalidade e limitações nas ligações aéreas”.
  No  período em análise, o turismo assumiu, de modo crescente, a importância de uma  das principais e mais promissoras actividades económicas a nível mundial. Em  Portugal, como reconhece o referido “Plano Estratégico Nacional do Turismo”  (publicado no Diário da República, 1ª série, nº 67, de 4 de Abril de 2007), o  turismo é um dos principais sectores da economia nacional, “tendo o seu peso na  economia vindo a crescer nos últimos anos (11% do PIB em 2004)”, empregando  cerca de 11% da população activa. 
  Esta  trajectória ascendente, justificada pela conjugação de diversos factores de  progresso e bem-estar material e imaterial, suscitou o interesse crescente dos  lugares no sentido de captar fluxos turísticos e conduziu a importantes  preocupações designadamente no que ao planeamento do turismo diz respeito. 
  Contudo  os sinais mais evidentes e a percepção moderna da importância do turismo como  fileira económica emergente remonta às últimas décadas do século XIX e alvor do  século XX, quando o lançamento da viação moderna, designadamente o caminho de  ferro, aproximou e abriu os territórios, estimulou as deslocações internas e  permitiu pensar a integração de muitos lugares no quadro do lazer turístico. 
  Partilhamos  a ideia de MIOSSEC (1970), citada por CRAVIDÃO e CUNHA (1991: 202) de que “O espaço  turístico é antes de tudo uma imagem”. “Imagem complexa, sonhada, adormecida,  algumas vezes realizada e que reflecte livros, filmes, pinturas, roteiros,  odores, sons, sensações, enfim as experiências e o imaginário de cada  indivíduo. Imagens diferentes que se sobrepõem ou não, mas que têm um papel  fundamental na escolha deste ou daquele lugar” (Ibidem). 
  “Nesta  linha de pensamento destaca-se o desafio de construir imagens atractivas e  diferenciadas num contexto de crescente competição entre lugares. O objectivo é  criar novos hábitos de procura e preferências dos turistas, bem como  multiplicar os destinos (alternativos aos convencionais) e as formas de  turismo. Por outras palavras, a ambição está centrada na tentativa de  diversificar a oferta turística e dos respectivos interesses turísticos,  procurando criar uma imagem turística de qualidade que identifique e promova os  territórios no panorama turístico nacional e internacional” (CARVALHO, 2007:  2). 
  Como  reconhece CAVACO (2005: 415), a década de 30 é um marco muito importante na promoção  turística de Portugal “com base no património histórico-cultural, na paisagem,  no clima e na cultura popular”. 
  A  estratégia do Secretariado Nacional de Informação, Cultura Popular e Turismo  envolveu dois objectivos principais: por um lado, captar turistas de elevado  poder económico, nomeadamente estrangeiros, relacionados com os grandes hotéis  modernos, clubes, casinos, teatros e outros importantes equipamentos de lazer;  por outro lado, valorizar o turismo interno, uma vez que este representava uma  procura mais regular, estável e difusa pelo território (CAVACO, op. cit.).
  A  acção dos municípios no âmbito da construção dos espaços turísticos internos (e  alternativos como o campo e a montanha) foi de grande relevância, designadamente  a iniciativa das Comissões Municipais de Turismo e de destacadas figuras da  cultura na promoção cultural e turística de Portugal (CARVALHO, op. cit.).
  Este  movimento pioneiro, centrado nos recursos eco-culturais, conhecerá um amplo  desenvolvimento e renovação nos últimos anos, no âmbito da emergência de uma  nova fase do turismo. A flexibilização e a segmentação da actividade turística  influenciaram muitos lugares a valorizar os seus recursos ecológicos e  culturais com o intuito de aumentar o seu perfil competitivo. 
  O  património, conceito multidimensional e de crescente amplitude e plasticidade  temática (no amplo espectro das dimensões tangíveis e intangíveis), destaca-se  como recurso diferenciador dos territórios e pode ser utilizado para obter vantagem  no quadro da competição entre os lugares, por via de estratégias inovadoras que  tendem a envolver agentes/operadores públicos e privados (cada vez mais em  regime de parceria e segundo uma lógica de rede), no desenho de novos produtos  de turismo (como, por exemplo, nas vertentes ecológica e cultural) destinados a  captar segmentos específicos da procura turística (CARVALHO, op. cit.). 
  Ao  mesmo tempo, a evolução recente do comportamento dos turistas indica também o  crescimento das preocupações patrimonialistas e a valorização de experiências  únicas e do contexto dialéctico da paisagem, segundo uma perspectiva de maior  participação, envolvimento e exigência no que concerne aos lugares e aos  patrimónios. 
  O  quadro evolutivo que acabámos de traçar merece de seguida uma análise mais  aprofundada e detalhada a partir do exemplo da Lousã e da Serra homónima. Esta  subunidade morfo-estrutural, no limite ocidental da Cordilheira Central  portuguesa, funciona como linha divisória das bacias hidrográficas do Mondego e  Zêzere. Do ponto de vista administrativo, a Serra da Lousã reparte-se pelos  municípios de Penela, Miranda do Corvo, Lousã e Góis, no distrito de Coimbra, e  Figueiró dos Vinhos, Castanheira de Pêra e Pedrógão Grande, no distrito de  Leiria. O levantamento vigoroso da Serra da Lousã e o contraste com as terras  baixas da bacia sedimentar de Miranda do Corvo-Lousã-Góis-Arganil, assim como a  transição brusca dos quadros urbanos para o domínio de uma certa ruralidade,  faz da montanha um símbolo marcante da paisagem. Pedindo de empréstimo uma  ideia original de TORGA (1950), a respeito da paisagem duriense captada em São  Leonardo de Galafura, podemos referir que os pontos culminantes da Serra da  Lousã (Trevim e Santo António da Neve, a 1205 e 1193 metros de altitude,  respectivamente) configuram os mastros de um navio de penedos telúricos a  navegar na extremidade ocidental das cumeadas que separam o Mondego e o Zêzere.  
 “A Serra que domina a paisagem e que tem sido  a principal e grande característica da Lousã, será ainda no futuro o seu  principal cartaz de Turismo e talvez um grande factor de progresso e de  renome”. 
                Álvaro VIANA de LEMOS, 1951: 157.
A  inclusão e afirmação dos territórios no fenómeno turístico supõem um processo  de construção e difusão da imagem que, em princípio, acompanha a dotação de  infra-estruturas e equipamentos turísticos. Como já se referiu, o propósito da  presente reflexão, que retoma e amplia uma temática da investigação realizada  no âmbito do nosso doutoramento (em Geografia), é analisar a participação da  Lousã no fenómeno turístico a partir da interpretação de diversos suportes e  acções diversas para construir e projectar uma imagem de destino turístico.  Assim, por via de descrições corográficas, livros de viagens, textos  literários, relatos, pinturas, fotografias e materiais específicos de promoção,  entre outros, destinados a difundir o conhecimento de um espaço geográfico  concreto, procuramos compreender o modo como se construiu e divulgou a Lousã  turística. 
  A  prossecução deste objectivo tem subjacente a ideia de que a Serra é o principal  eixo de vertebração turística da Lousã.
  A Serra da Lousã como paisagem de fruição é um  fenómeno relativamente moderno, que podemos reportar aos meados do século XIX.  A descoberta da montanha deve muito ao excursionismo e aos seus cultores  (homens de letras, artes e ciências). Os depoimentos e as impressões que  legaram correspondem para algumas áreas do país, sobretudo do interior, como é  a Serra da Lousã, aos primeiros textos publicados. Contudo, não induziu aí  qualquer processo de apropriação da paisagem, ao contrário do que aconteceu na  segunda metade de Oitocentos, em outras regiões, após a redescoberta dos  valores terapêuticos das águas termais e das águas salgadas, quando o  termalismo e o turismo balnear, impulsionados pelas classes de elite e apoiados  no lançamento do caminho-de-ferro, conheceram importante fase de afirmação  (CAVACO, op. cit.; CRAVIDÃO, 1989).
  A  Serra da Lousã no decurso do século XIX foi palco para as primeiras viagens  turísticas, culturais e científicas, e através dos registos desses viajantes de  antanho foi possível fixar para a posteridade os traços fundamentais da sua  organização espacial, tal como permitiu lançar os alicerces da construção de  uma certa imagem de montanha, a partir da sugestão dos textos literários e  científicos. De igual modo exerceu grande influência no imaginário de todos  aqueles que não a conhecendo deambularam pelos seus recantos guiados pela magia  das palavras e das imagens publicadas. Antes, conhecemos alguns relatos como,  por exemplo, BALBI (1822) e CORNIDE (1800), citados por CARVALHO (2005), embora  sem grande expressão literária e científica, pois o espírito das viagens tardou  a afirmar-se em Portugal, e a Serra não tinha motivos de especial interesse,  nem era ponto de passagem em qualquer itinerário importante. 
  A  montanha é, pela sua imponência, a imagem mais marcante da paisagem e foi o  fascínio pelo desconhecido que alimentou a curiosidade dos primeiros viajantes. 
  No  mês de Julho do longínquo ano de 1838, o Professor Adrião Pereira Forjaz de  Sampaio e um grupo de personalidades de Coimbra, a convite do proprietário do  Engenho do Papel do Penedo (Lousã), realizaram uma digressão à Lousã. Esta  efeméride, considerada como a primeira viagem de índole turística e cultural à  Serra da Lousã, teve uma enorme relevância na construção e divulgação de uma  certa imagem de beleza e grandiosidade da Serra da Lousã.
  As  impressões colhidas durante a viagem e a estada na Lousã foram narradas de  forma pormenorizada e em bom estilo literário pelo jovem Lente da Universidade  de Coimbra, em opúsculo, sob o título “Uma Viagem à Serra da Lousã no mês de  Julho de 1938”. Forjaz de Sampaio justifica a iniciativa, com a necessidade de  conhecer o território e as gentes que o animam, como se depreende da expressão:  “Cruzar o terreno em todas as direcções; largar as estradas reais e trepar pelo  carreiro íngreme e tortuoso do pastor; subir dos vales aos cumes mais erguidos  das montanhas; examinar e estudar os monumentos, que topamos; embriagar a nossa  alma com todas delícias, que o aspeito da natureza liberaliza neste país  abençoado, eis o nosso maior prazer. Voltamos com mais ideias no espírito e  ardor no coração” (SAMPAIO, 1938: 30).
  Os  apontamentos que tomou, religiosamente conservados, serviram de base ao  lançamento do referido registo, organizado em cinco capítulos: 1. Da serra e  dos campos da Lousã; 2. O altar do Trevim; 3. A fábrica do papel; 4. O Castelo;  5. O Penhasco das Ermidas, que correspondem aos motivos de maior interesse da  visita (CARVALHO, op. cit.).
  Desde  logo, é o contraste paisagístico entre a bacia e a montanha que prende a  atenção do autor: “Compõe-se toda esta formosa serrania de montes levantados  sobre montes, e cortados de infinitas gargantas e valeiros. Diferentes rios de  aí trazem a origem, os quais nas suas faldas vão regando veigas aprazíveis e  campos fertilíssimos. Grandes povoações, e um sem número de aldeias e casais  povoam as abas das montanhas; e ainda mesmo pelo centro se divisam muitas  searas de trigo e lugarejos habitados de lavradores e pastores, que ali vivem  quase à lei da natureza”. 
  “Nas  pausas, que éramos forçados a fazer de quando em quando, deleitava-se-nos a  vista e o pensamento, olhando os formosos campos da Lousã, (…) salpicados de  muitos e diferentes lugarejos, que juntos aos edifícios da vila, grandes muros,  e pilares de propriedades nobres avivam a beleza do painel.
  São  as fazendas umas das outras separadas, as secas por uma linha de oliveiras, e  as de regas por loureiros, choupos, e figueiras coroados e enlaçados de  videiras. É como um jardim continuado, que em muitos lugares sobe um pouco  pelas abas da montanha. Cruzam-se por aí muitas estradas, que oferecem passeios  agradáveis” (SAMPAIO, op. cit., 38).
  O  Trevim, um dos grandes mirantes do Centro de Portugal, foi paragem obrigatória  do seu roteiro de viagem. Deixemo-nos envolver pelas palavras de SAMPAIO (op.  cit., 23) fixadas na contemplação da paisagem:
  “Levantado  de todos os lados, e como figurando um altar da natureza (...), a 2500 pés  (...) acima do nível do mar, e não tendo por toda aquela redondeza alguns  competidores, apenas nos confins do horizonte o excediam a serra da Gata, ao  Nascente, na Espanha, e ao Nordeste o Malhão, na Estrela. (…)
  Espessa  névoa nos tolhia a vista dos belos campos do Ribatejo, e planícies do Alentejo,  que por esta extremidade haveríamos de avistar”.
  Também  os poços para guardar a neve, no planalto sobranceiro ao Trevim, junto da  Capela de Santo António, foram assinalados pelo autor. 
  Três  outros elementos completam a descrição: o engenho do papel, o castelo e as  ermidas, na ribeira de São João (limiar da montanha).
   “Se a amenidade dos campos e a alteza das  serras ostentam junto da Lousã as suas graças naturais, o economista folga de  ver estas formosas searas e aqueles numerosos rebanhos a par de uma fábrica em  sensível progresso. Se o filósofo pode ofertar ao Eterno no altar do Trevim o  incenso das mais nobres ideias e pensamentos, o romancista e o poeta encontram  aqui um vale tão original e curioso, tão rico da natureza, e de arte de outras  eras, que nos parece, que por ele trocariam de bom grado os campos, a fábrica e  o Trevim” (SAMPAIO, op. cit.).
  O  enquadramento cenográfico da fábrica (o engenho do papel) encantou Forjaz de  Sampaio: “As árvores, os penhascos, as águas do rio e da levada, as ladeiras  empinadas e altíssimas da serra, o céu toldando este recinto, eis os únicos  objectos que se divisam e que lançam na alma uma doce melancolia». Na  contemplação da paisagem de sonho que o absorveu totalmente, Forjaz de Sampaio  escolheu a levada como o seu passeio favorito: «Uma elegante latada sobre  formosos pilares cobre o dique ao sair do edifício, quase até meia distância da  casa das massas. Sucedem-lhe choupos abraçados com videiras e outras árvores,  que sobem a assombrar o passeio. Mais ao diante, da banda da serra, trocam-se  as rochas por um pequeno souto, cujos compridos ramos e largas folhas vêm  dependurar-se sobre as claras águas da levada” (SAMPAIO, op. cit.).
  A  Serra da Lousã, tal como foi descrita por Adrião Forjaz de Sampaio, corresponde  ao primeiro relato circunstanciado a partir de uma observação atenta e cuidada;  o seu estilo literário, eloquente e entusiástico, é também um convite para que  outros, guiados pela sugestão da escrita, viessem à descoberta das suas  paisagens (CARVALHO, op. cit.). De certa forma, assim aconteceu oito anos  depois (em 1846), com José Isidoro Viana a realizar uma digressão à Lousã, para  visitar familiares da Casa e Engenho do Penedo. Durante dois meses, o jovem de  21 anos, deambulou pela Lousã e arredores, e dessas excursões deu conta no  manuscrito, publicado em 1960 por Eugénio de Lemos. Contudo, naquilo que diz  respeito à Serra da Lousã, as ideias expostas acompanham de perto o texto de Adrião  Forjaz de Sampaio, sem mais nada acrescentar.
  Depois,  na segunda metade de oitocentos, sucedem-se outras notícias, assinadas por  figuras relevantes do panorama científico, que deambularam pela Serra da Lousã,  sobretudo fazendo escala no roteiro de outras caminhadas: Alexandre HERCULANO  (1853), J. RIVOLI e Bernardino de BARROS GOMES (1873), Júlio HENRIQUES (1887).  O interesse dos viajantes contínua a ser o coração da montanha, sobretudo o  Trevim e o Planalto da Neve, e a Lousã aparece como ponto de apoio na travessia  do sector setentrional da montanha. Os textos dão conta da degradação  paisagística da Serra, relacionada com o processo de desarborização e os intensos  efeitos erosivos (CARVALHO, op. cit.).
  De  igual modo importa sublinhar a importância dos artigos escritos por  jornalistas, como, por exemplo, BRITO ARANHA (1871). As gravuras que acompanham  alguns textos configuram as primeiras representações de símbolos patrimoniais e  paisagens da Lousã. 
  Em  todo este processo a elite local teve um papel muito relevante, designadamente  no que concerne ao acolhimento dos viajantes. Os proprietários do Engenho do  Penedo (família Lemos), o académico Vicente Ferrer Neto de Paiva (lente da  Faculdade de Direito de Coimbra; reitor da mesma Universidade; conselheiro de  Estado) e o comendador João Elisário de Carvalho Montenegro (filantropo;  iniciador da emigração lousanense para o Brasil), entre outros, souberam  acolher nomes destacados da sociedade portuguesa de então, com quem partilhavam  interesses e relações de amizade. Contudo, a ideia moderna do turismo e a  propaganda turística apenas assumem expressão na Lousã no alvor do século XX.
  O folheto “O Viajante na Lousã”, publicado por ocasião  da inauguração do caminho-de-ferro de Coimbra à Lousã (no dia 16 de Dezembro de  1906), assume em definitivo o objectivo de divulgar as paisagens e informar os  viandantes sobre os motivos de interesse da Lousã. O autor do primeiro suporte  de informação e divulgação turística da Lousã é Álvaro Viana de Lemos  (1881-1972). Este lousanense erudito, que desde muito cedo percebeu a  importância do turismo como actividade económica emergente e a necessidade de  auxiliar o viajante nas suas excursões pelo país, iniciava assim uma  colaboração dedicada e profícua de largas décadas com a Lousã, como explicamos  (de modo detalhado) no decurso do presente artigo. 
  O  “Viajante na Lousã” reflecte a ambição de incluir a Lousã no mapa turístico de  Portugal, no momento em que a vila foi “chamada à convivência do mundo,  achando-se ligada pela mais cómoda e fácil comunicação com todos os centros da  actividade humana” (LEMOS, 1906: 4). Com efeito, “A sua excepcional situação e  belezas naturais dão-lhe porém, desde hoje, direito de ambicionar um lugar  entre os pontos obrigatórios da visita ao excursionista estrangeiro.
  Assim  como o estrangeiro que passa por Lisboa não deixa de ir a Sintra ou Cascais,  assim o que passar por Coimbra não deixará um dia de visitar o Buçaco e a Lousã”  (LEMOS, op. cit., 4).
  Este  fascículo, estruturado em sete pontos, retoma os tópicos delineados por Forjaz  de Sampaio, enfatiza a “Serra” e acrescenta dois campos novos: “A Lousã antiga”  e “Passeios e pontos de vista”. Nos “Aspectos gerais” descreve-se a paisagem  captada do comboio, vindo de Coimbra, ao entrar na bacia da Lousã. Destaca-se “(…)  em toda a sua extensão o casario branco da vila emoldurada, na frente, por uma  viçosa e bem cuidada lavoura, e detrás pelo verde-negro dos pinheiros, pelos  cinzentos olivedos e pelos contrafortes da gigantesca serra da Lousã. 
  A  rua principal da vila, embora estreita e irregular (…) apresenta alguns  edifícios notáveis, como várias casas brasonadas, bons tipos de casa  portuguesa, o pequeno hospital, a capela da misericórdia e o Palácio Salazar.
  A  vila em si nada mais tem que ver: os arredores por… os passeios, tendo como  ponto central a vila, é que são tudo” (LEMOS, op. cit. : 5).
  “Faltando-lhe  unicamente os aspectos marítimos, poucas terras se poderão ufanar de poder  proporcionar às exigências do moderno touriste (em tão curtas distâncias)  satisfação nos mais variados apetites do admirador da natureza.
  Boas  estradas para trem, automóvel ou bicicleta, variadíssimos caminhos e terrenos  próprios para passeios a cavalo ou a pé, terrenos acidentados, apropriadíssimos  para comodamente exercitar o alpinismo, esplêndidos pontos de vista, puríssimo  ar, altitudes, óptima água brotando da rocha, uma população hospitaleira e  laboriosa; tudo enfim concorre para um excursionista de bom gosto poder em 3 ou  4 dias vir aqui retemperar-se e desentorpecer-se d’essa spleen que nasce no  artificialismo dos grandes centros” (LEMOS, op. cit., 6). 
  Mas  a Serra “É o que certamente mais deslumbra quem pela primeira vez (…) visita a  Lousã. Não existe no nosso país outra altitude (1.200 m acima do nível do mar)  que como esta diste unicamente só 3 ou 4 horas de viagem duma povoação  importante, servida por tão boas vias de comunicação como a Lousã. (…)
  A  estrada em construção para a Castanheira de Pêra e Pedrógão, dará logo que  dobre a linha de cumeada, uma esplêndida, cómoda e rápida comunicação da vila  ao Trevim. (…)
  Ainda  próximo do Trevim, em Santo António da Neve, existem os antigos poços onde se  recolhia o gelo que era transportado para Lisboa, nos tempos em que a indústria  o não sabia ainda produzir, não obstante os meios de transporte serem  dificílimos” (LEMOS, op. cit., 11-12).
  No  remate do livrinho, Álvaro Viana de Lemos apresenta as sugestões de “passeios  aprazíveis, variados, satisfazendo a todos os gostos, ao artista, ao fotógrafo,  e ao amador do sport, etc.”, que incluem a serra, o Trevim, e as povoações  serranas, “tanto percorrendo grandes distâncias como observando os costumes  característicos dos habitantes da Serra e o seu viver simples e primitivo, as  suas choupanas, etc…” (LEMOS, op. cit., 15).
  Sete  anos mais tarde, encontrando-se esgotada a 1ª edição de o “Viajante na Lousã”,  foi impressa uma 2.ª edição (“Roteiro Ilustrado do Viajante na Lousã”),  aumentada com ilustrações, plantas e cartas cujos direitos de propriedade o  autor cedeu à Comissão promotora da construção de uma casa para a Escola de  Cova do Lobo (Lousã).
  Será preciso esperar quase duas décadas para encontrar  novos suportes de divulgação turística da Lousã, desta vez no quadro da  instituição da Comissão Municipal de Turismo (CARVALHO, 2005). A acção do Dr.  José Maria Cardoso (1885-1959), presidente do município da Lousã entre 1926 e  1929, foi, também, a esse nível muito relevante. Entusiasta e grande apaixonado  pela Serra da Lousã, regionalista convicto, personalidade de craveira  intelectual, devem-se aos seus cuidados e influências a conclusão da Estrada da  Serra (Lousã - Castanheira de Pêra), a abertura do ramal para o Trevim e Santo  António da Neve, o embelezamento de vários recantos turísticos, a criação da  Comissão de Turismo e a classificação da Lousã como “Estância de Repouso e  Turismo” (1929).
  A  montanha, até então sinónimo de atraso, de lugares e territórios recônditos,  inacessíveis e repulsivos, começa a ser interpretada como um recurso, um trunfo  para afirmar a Lousã no universo emergente do turismo (CARVALHO, op. cit.). As  obras de conclusão da Estrada da Serra e o embelezamento daquilo a que hoje  chamamos estrada panorâmica – com mirantes (varanda de Gevim e miradouro de  Nossa Senhora da Piedade, na Lousã; e mirante do Cabeço do Pião, em Castanheira  de Pêra) e pequenas áreas de lazer –, a abertura de caminhos, estradas  florestais e ramais de ligação aos lugares serranos, bem como a arborização  pelos Serviços Florestais, tornaram mais acessível e aliciante a descoberta da  montanha e o contacto com aqueles que nela viviam. Daí a inclusão desses  trechos nos suportes de informação e divulgação turística no esteio da  consolidação de uma imagem de grandiosidade que não podia excluir (e esconder)  as aldeias e os serranos. 
  De  facto, a Lousã procurou apropriar a Serra e empenhou-se profundamente em  incorporá-la na imagem que pretendia construir, de estância de repouso e  turismo. 
  A  propósito da primeira ideia, apresentamos alguns extractos de texto muito significativos: 
  – “É  esta a filha dilecta da Serra, que a olha protectoramente dos seus 1200 metros  de altitude, com orgulho e carinho” (ALMEIDA, 1940-a).
  – “A  Lousã, recolhida nas faldas da Serra é, e não cremos que a cegueira filial nos  iluda, uma das mais lindas vilas do centro do país. Tudo nela está disposto com  tal encanto, com tal harmonia, que difícil, senão impossível, se tornaria  qualquer amputação, qualquer troca de ornamentos, sem prejudicar o soberbo  quadro que o viajante observa, quer venha da Serra para a Vila, quer se dirija  desta para aquela” (ALMEIDA, 1940-b).
  – “Por  todos os lados a serra, original e diferente das outras serras portuguesas,  porque é verdejante e em grande parte habitada e cultivada, vendo-se no alto as  povoações, e prolongando-se sempre em graciosas linhas arredondadas sem uma  aresta ou fraguedo áspero que recorde a vizinha Serra da Estrela” (segundo o  registo de um autor desconhecido, em meados do século XX).
  Este  processo de apropriação da montanha, e de uma certa valorização das paisagens  de maior interesse, incluídas no termo da Lousã, transparece no espectro de  folhetos e cartazes de divulgação e propaganda turística, sob impulso da  Comissão Municipal de Turismo e o apoio da Câmara Municipal, desde o final dos  anos 20. O número de exemplares que chegaram aos nossos dias, apesar de  limitado, é de grande importância para a leitura da imagem do território, em  função dos símbolos e dos conteúdos divulgados nesses suportes de informação.  Azulejos, bilhetes-postais ilustrados, selos publicitários, cartazes,  desdobráveis, fotografias e selos publicitários são alguns dos materiais mais  utilizados para a propaganda turística da Lousã e da sua Serra. O próprio selo  da referida Comissão, da autoria de Álvaro Viana de Lemos, assumiu a Serra como  temática de inspiração, com o Trevim, o Castelo de Arouce e a Senhora da  Piedade, ícones que não mais deixaram os suportes de informação e divulgação  turística da Lousã (CARVALHO, op. cit.).
  A  leitura dos títulos principais dos suportes de propaganda turística, permite  recuperar o essencial da mensagem que se pretendeu projectar para o exterior:
  – “Lousã,  Beira Litoral – a 28 quilómetros de Coimbra, Zona de Turismo, Centro de  excursões, Puríssimos ares, Encantadores passeios, Óptimas águas” (1938).
  – “Vinde  visitar a Lousã, vila interessante pela grande beleza e originalidade das suas  paisagens” (1939) 
  – “Na  mais luminosa quadra do ano, Visitai a Lousã, Centro de Turismo, Hospitaleiro e  Progressivo” (1939).
  – “Estância  de Repouso e Turismo, Rainha da Serra e da Planície no coração de Portugal”  (1940).
  – “Não  esqueçam de visitar a Lousã e a sua Serra, que é sem favor a mais linda e  pitoresca Serra de Portugal” (1940).
  – “Lousã,  a 28 quilómetros de Coimbra, está situada no coração de Portugal. Uma região  genuinamente portuguesa e beirã. É fácil visitá-la porque está ligada por todo  o país por caminho-de-ferro e boas estradas. Também possui um campo de aviação”  (1950).
  Dentro  do quadro de afirmação das qualidades da montanha – a partir dos anos 30 defende-se  que tudo o que a Serra tem é positivo, é bom – a água é uma referência  incontornável, também por via da sua utilização industrial: os refrigerantes  “Serranita” (produzidos na Lousã) não dispensavam a “Água maravilhosa da Serra  da Lousã”, expressão estampada em letra de forma num rótulo dos anos 40. A  “Serra da Lousan” é igualmente referenciada na identificação territorial da  área de produção do “Licor Beirão”. A originalidade e a inovação dos seus  suportes publicitários, espalhados pelo país, representam também um contributo  extraordinário na divulgação da imagem da Serra da Lousã. 
  Por  outro lado, importa sublinhar que os suportes cartográficos com indicações  úteis para os visitantes são relativamente tardios. No decurso da investigação  não encontrámos cartografia anterior aos meados do século XX, quando aparece o  mapa do concelho da Lousã, com indicação dos lugares, vias de comunicação e  principais linhas de água, da autoria de Álvaro Viana de Lemos (peça que  ilustra a contra-capa da sua monografia sobre a Lousã) e uma outra peça  cartográfica com referências ao que se pode visitar na Lousã.
  A  representação do concelho em exposições e certames de actividades, como a  “Exposição Regional de Coimbra”, em 1950, assume o turismo (e a indústria) como  actividades primordiais para os interesses da Lousã e do seu concelho.
  “Com  as boas comunicações e com a sua proximidade dum centro como Coimbra, cada vez  mais comercial e mais frequentado por nacionais e estrangeiros, começou a Lousã  a ser muito visitada; e a serem, portanto, apreciadas devidamente as suas  paisagens e a sua Serra grandiosa e de múltiplos aspectos. Os artistas foram  fascinados pela magia da sua luz, pela variedade e pitoresco da sua natureza e  pelo bom acolhimento das populações, que, no entanto, até então, não tinham  compreendido nem apreciado um valor que desfrutavam sem interesse de maior”  (CML, 1950: 4-5).
  “Assim  nasceu o Turismo da Lousã e da sua Serra, que já hoje os amigos da Lousã e a  maior parte dos lousanenses consideram de grandes possibilidades futuras e como  uma grande e legítima esperança de futura prosperidade para a região.
  O  Turismo, esse, tem aberto vasto campo a iniciativas e para todas as modalidades  e gostos; assim se vá, pouco a pouco, intensificando a corrente de visitantes e  dos veraneantes que procuram altitudes, o ar puro e uma natureza simples, calma  e acolhedora, para repouso da vida intensa e agitada que levam nas cidades  modernas, onde labutam todo o ano (…)
  Aos  lousanenses e amigos da Lousã compete, pois, numa coisa relativamente nova e  sem grandes tradições, como é o Turismo, aumentar a respectiva propaganda e  preparar tudo para que visitem a região, cada vez mais, e que todos daqui vão  bem impressionados e… com o desejo, não só de voltar, mas de induzir as pessoas  das suas relações a virem também…” (CML, op. cit., 6-7).
  Na  rubrica “Aspectos de carácter turístico”, incluída na monografia sobre a Lousã,  Álvaro Viana de Lemos (1951: 137) explica muito bem aquilo que se pretendia  para o turismo na Lousã: “Não se trata aqui dum turismo geral muito  movimentado, com todas as modalidades do grande turismo, de hotéis e casinos,  ou dos grandes pretextos turísticos, de termas ou de praias. É simplesmente um  turismo especial de Serra, de natureza calma; e, portanto, um turismo de  repouso e de bons ares, sem grandes pretensões. O Decreto nº 17.259, de 1929,  classifica a Lousã de Estância de Repouso e Turismo. Está certo; nada mais  pretendemos; é isso que a Lousã pode e quer ser. Mas, entre o querer e o poder  locais, há um factor com que se tem de contar: é o do concurso regular e  estimulante dos bons e numerosos turistas, que permitam constantes  melhoramentos e instalações dispendiosas, e é o aperfeiçoamento dos processos  de captar simpatias e de saber receber estranhos…”.
  Para  concretizar o “turismo de estágio” seria necessário, segundo o autor, “quando  se montarem pensões só para esse efeito ou quando se preparem, pelas encostas  da Serra e pelos diferentes lugares, pequenas casas em condições que se possam  alugar; ou quando, mesmo em casas particulares, se possam receber em pensão (à  antiga moda inglesa) pessoas recomendadas para viverem em família. Há ainda  outro problema para o turismo da Serra é a falta de abrigos, nos pontos mais  afastados do povoado, onde não haja acidentes naturais que possam proteger  excursionistas em caso de temporal” (LEMOS, op. cit., 138).
  Os  textos coevos que acabámos de citar, na amplitude do discurso institucional  (Câmara Municipal da Lousã) ao pensamento de Álvaro Viana de Lemos, revelam  duas preocupações a respeito do turismo na Lousã: a necessidade de intensificar  a propaganda turística e de dotar a região de condições de atracção turística,  designadamente ao nível do alojamento. Esta última preocupação não é nova, e  será retomada nas décadas seguintes, em especial no período de 1970-2000, como  se explica em momento oportuno. Com efeito, já em 1906 o “Viajante na Lousã”  reconhecia que “Não está ainda a Lousã devidamente preparada para receber com  todos os requisitos de comodidade, exigidos pela civilização, os forasteiros e  viajantes que demandem estas paragens” (LEMOS, 1906: 4). Nos primeiros lustros  do século XX, apesar de algum investimento realizado neste domínio, a oferta de  alojamento foi direccionada em particular para os visitantes relacionados com  as actividades económicas, da Lousã e do seu quadro de relação (sobretudo  Coimbra e Castanheira de Pêra). A componente de alojamento turístico, mais  exigente, relacionada com o incremento do turismo interno, teve na Pousada de  Alfocheira uma referência incontornável. 
  A  Quinta de Alfocheira, situada na encosta sobranceira à vila da Lousã, junto da  estrada da Serra, transformada em estância de repouso, nos anos 30, revelou-se  fundamental enquanto estrutura de apoio ao turismo na Lousã. Acolheu milhares de  visitantes em quase meio século de actividade regular que foram outros tantos  anos de publicidade ao melhor da Serra e da Lousã (CARVALHO, op. cit.).
  “Sobranceira  à Lousã, ao casario branco e moderno da nossa Vila, ergue-se – no meio das  sombras da velhinha mata do mesmo nome – o antigo solar de Alfocheira (…).
  Naquela  profusão de árvores frondosas, longe do bulício das estradas poeirentas, a meia  encosta, debruçada sobre o vale ubérrimo desta linda terra, é o velho solar um  recanto recomendável, a todos os que querem descansar longe do barulho da vida  moderna, cheio de ar puro e de panoramas soberbos. (…)
  A  Pousada de Alfocheira oferece todas as comodidades e conforto aos veraneantes e  tem sido ao mesmo tempo escolhida para estação de dezenas de excursões que  durante o verão visitam a Lousã.
  Distando  apenas 3 quilómetros da vila e situada na estrada da Castanheira, dá ensejo a  que os nossos visitantes possam facilmente visitar os locais mais lindos da  Serra da Lousã: o Trevim, o Mirante, Varanda de Alfocheira, Ermidas, Gevim,  Candal, Santo António da Neve, Secção Florestal e Central Eléctrica, ou seja, a  graça e poesia que encerra a Lousã, Rainha do Vale e da Serra” (CRAVEIRO,  1940).
  Como  informa um folheto de propaganda editado pela Estância de Repouso da Quinta de  Alfocheira (impresso em Lisboa, nos anos 40), trata-se de “um pequeno paraíso,  dádiva generosa da natureza aos que desejam passar suas férias de verão em  sossego (…). 
  “Não  admira, pois, que a instância seja frequentada por artistas, escritores, famílias  da melhor sociedade que, em cativante convívio, aqui passam a estação calmosa»,  pois «oferece o melhor conforto, óptimo serviço de mesa, tendo quartos para  trinta pessoas, água quente e fria, luz, telefone, parque para recreio, capela,  casa de banho, garagem, ficando apenas a cinco minutos da estação de caminho de  ferro. Está aberta de Maio a Outubro (…)”.
  Mas  também a sociedade lousanense foi tocada pelo espírito de viajar, conhecer o  país, “e ao mesmo tempo, espalhar por toda a parte o nome da Lousã e das suas  incomparáveis paisagens», como escreve Mário Mariano, em 1940. Assim aconteceu  com o grupo excursionista “Os gafanhotos da Lousã”, «composto por um punhado de  rapazes comerciantes, empregados do comércio, industriais e artistas que se  reuniram para conhecer um pouco da nossa terra [Portugal], se recrearem e, ao  mesmo tempo, fazer propaganda da sua Lousã e da serra do mesmo nome, a  majestosa e inesquecível serra da Lousã, a de beleza eterna e nunca demais  elogiada por aqueles que tiveram uma vez a ventura de a ver com a sua verde  veste garrida, ou como alvinitente manto com que a neve a cobre em pleno  Inverno», segundo as palavras de António Vítor de Almeida, apensas ao folheto  de propaganda do “4º Passeio Anual”, realizado pelo Grupo em Agosto de 1941.
  A  Serra é uma referência cada vez mais presente na imagem turística da Lousã.  Como se referiu anteriormente, o papel desempenhado pelos Serviços Florestais  foi relevante neste domínio, desde logo pelas novas possibilidades de acesso  após a abertura de estradas florestais: do Sobral (em Serpins), da Silveira  (Estoirão), e das Hortas (de Cacilhas à Catraia, onde entronca na Estrada Nova  da Serra). Nos anos 60 e 70 abriram-se os modernos ramais de ligação às aldeias  serranas. Como escreveu LEMOS (1951: 88), “Desde 1908 que, com a entrega da  mata do Sobral (…) se instalaram, e estão em constante progresso os Serviços  Florestais neste concelho e tendo a sua sede na Lousã. As áreas repovoadas de  arvoredo têm aumentado muitíssimo e vai desaparecendo o antigo aspecto  desolador da serra escalvada. Além das plantações e sementeira de árvores,  predominando o pinheiro, têm os Serviços construído estradas (do autêntico  interesse turístico), casas, fontes e linhas telefónicas; sendo assim os  melhores cooperadores do turismo da Lousã, por tornarem a sua Serra, de feia,  hostil e selvagem, como era outrora, em pitoresca, acessível e acolhedora”.  Contudo, o processo de arborização foi acompanhado de externalidades negativas  (decorrentes da redução drástica da área de pastoreio e de livre recolha de  produtos florestais), nomeadamente para as populações das aldeias serranas.  Este é mais um factor que explica o declínio e o abandono da montanha, em  particular no período de 1940 a 1981. E, quando se descobrem as aldeias e as  novas funções da paisagem, em meados dos anos 70, a disponibilidade de imóveis  para recuperar e utilizar como residência secundária é um elemento decisivo de  atracção da população urbana. 
  Durante  quase todo o século XX a apropriação da Serra e a divulgação da imagem  turística foi assumida como estratégica pelo poder municipal, e toda a acção  desenvolvida nesse sentido decorreu no interior das suas fronteiras sem ligação  e articulação com os municípios vizinhos, aqueles que, afinal, também partilham  a montanha! A afirmação da diferença como trunfo para atrair turistas decorria  segundo a velha máxima de “cada um por si”. Raras vezes a informação disponível  tem alcance superior a essa perspectiva reducionista, que encerrava no termo do  concelho as belezas divulgadas, como se a unidade física e cultural da montanha  fosse definida em função de fronteiras administrativas (ou outras artificiais)! 
  Ainda  com base no material de promoção turística recuperámos dois extractos de texto  muito significativos, que sugerem circuitos e a centralidade da Lousã: 
  – “A  Lousã pode considerar-se um centro de excursões, devido ás óptimas estradas que  a ligam às vilas de Miranda do Corvo, Góis, Arganil, Castanheira de Pêra e  Pampilhosa da Serra, podendo-se realizar interessantes circuitos turísticos”  (1939).
  – “O  percurso: Coimbra, Ceira, Foz de Arouce, Lousã, Candal (Estrada da Serra),  Castanheira de Pêra, Pedrógão Grande, Figueiró dos Vinhos, Penela, Condeixa,  Coimbra, foi considerado Percurso Turístico, aconselhado para visita durante as  Comemorações Centenárias de 1940” (1942).
  A divulgação das paisagens (e da imagem turística) da  Serra da Lousã, nas primeiras décadas do século XX, reflecte igualmente a  influência da pintura e da literatura, em particular através de personalidades  de dimensão nacional. No primeiro caso, destacam-se dois nomes: José Malhoa e  Carlos Reis. 
  José  Malhoa (1855-1933), um dos expoentes máximos da primeira geração da pintura  naturalista em Portugal, escolheu a vila de Figueiró dos Vinhos para edificar  uma residência secundária (o “casulo” Malhoa). Aí, inspirado em atmosferas  campestres singulares, passou largas temporadas e criou algumas das mais  conhecidas telas da sua longa e reconhecida carreira artística. 
  Carlos  Reis (1863-1940) apaixonou-se pela Lousã onde instalou o seu atelier de  trabalho (no casal da Lagartixa). A vila e a montanha serviram de inspiração às  suas telas e estão muito ligadas ao período mais fecundo da carreira artística  desta figura destacada da segunda geração da pintura naturalista portuguesa. 
  A  estes dois vultos da pintura nacional deve-se um notável legado artístico, a  atracção de outros cultores da pintura (no caso da Lousã esse fluxo foi de tal maneira  relevante que a Câmara Municipal disponibilizou uma casa aos artistas  interessados na paisagem lousanense) e o envolvimento com a sociedade e as  realizações da sua época (edifícios públicos, espaços públicos e imóveis  particulares). 
  No  campo da literatura destaca-se a obra e o percurso de Miguel Torga (pseudónimo  literário de Adolfo Correia da Rocha). Torga (1907-1995) viveu algum tempo em  Vila Nova (Miranda do Corvo) onde exerceu medicina e aprofundou a carreira  literária. O caminho de ferro (Coimbra-Lousã) foi decisivo para a presença de  Torga em Vila Nova: permitiu manter o contacto com a tertúlia de amigos, a  atmosfera intelectual e cultural de Coimbra e os equipamentos de saúde da  cidade. O comboio simboliza uma pendularidade assumida em alguns anos entre a  cidade e a serra, entre o urbano e o rural. 
  Como  escreveu Miguel Torga em o “Terceiro Dia da Criação do Mundo”: «Com a febre da  criação, vinha a sede da cidade. Apesar de tudo, era nela que havia cinemas e  convívio. E aos sábados, depois de o último doente auscultado e medicado, não  andava, voava através dos pinhais e dos lameiros que me separavam da estação.
  –  Corra, senhor doutor! Tem cinco minutos…
  Os  resineiros, acostumados àquelas passagens semanais e meteóricas, guiavam-se os  passos consoante as horas e o atraso dos comboios» (TORGA, 1970: 137).
  Durante  a presença em Sendim (topónimo que o autor utiliza para designar Vila Nova) e  nos anos seguintes, Torga percorreu vezes sem conta as serranias de xisto da  Cordilheira Central, deixando inúmeros registos sobretudo no “Diário”.  Contemporâneo das grandes transformações sociais e paisagísticas do seu tempo,  como a florestação estatal dos baldios, os empreendimentos hidro-eléctricos, a  mobilidade (interna e externa) crescente das populações serranas, a decadência  e a desagregação do mundo rural, o isolamento e o esquecimento sem remédio, o  despovoamento acelerado e o abandono dos lugares, o escritor, através de uma  leitura apurada e comprometida, legou um vasto património literário que é, ao mesmo  tempo, um documento essencial para compreender o país no período dos anos 30  até quase ao final do século XX. Muitos dos seus textos são, de igual modo, um  convite para a descoberta de lugares e paisagens remotas e recônditas de um  Portugal rural, esquecido e marginalizado. Ler Torga é olhar o passado e,  frequentemente, perspectivar o presente!
  Ainda  no âmbito literário, e na sua relação com a intervenção pública municipal até  meados do século XX, é importante destacar um conjunto de publicações alusivas  ao tema do turismo. 
  A  comemoração do primeiro centenário da viagem realizada em 1838 pelo Lente da  Universidade de Coimbra, Adrião Forjaz de Sampaio, foi também um momento de  grande significado na afirmação da Lousã como destino turístico. Com o empenho e  a sabedoria de Álvaro Viana de Lemos, o município da Lousã organizou uma grande  jornada comemorativa e de propaganda das suas potencialidades turísticas, com  ampla divulgação na imprensa regional e nacional, e editou dois documentos  essenciais ao melhor conhecimento e divulgação turística da Serra da Lousã. Por  um lado, a reedição do texto original (intitulado “Uma Viagem à Serra da Lousã  no mês de Julho de 1838”) escrito por Adrião Forjaz de Sampaio, muito  valorizado com a inclusão de imagens e o preâmbulo assinado por Álvaro Viana de  Lemos. Por outro lado, a publicação dos textos das palestras relacionadas com  este evento (sob o título “O Centenário Turístico da Serra da Lousã”, 1939),  proferidas por conceituados académicos como Aristides de Amorim Girão, Virgílio  Correia, Raúl de Miranda e o próprio Álvaro Viana de Lemos, nos locais do  Trevim, Castelo de Arouce e Fábrica do Papel, perante os que tomaram parte na  excursão de 17 de Julho de 1938. 
  Poucos  anos depois, em meados do século, são publicados mais dois trabalhos de grande  importância para o turismo da Lousã: o livro de António Nogueira Gonçalves  (Professor do Seminário e da Faculdade de  Letras de Coimbra), sob o título “A Lousã e o Turismo. Casas Nobres do século  XVIII” (1950), editado pela Comissão Municipal de Turismo da Lousã, e a  monografia “A Lousã e o seu Concelho” (1951) de Álvaro Viana de Lemos. A  primeira publicação, de 38 páginas, é uma abordagem de história da arte que  caracteriza os traços arquitectónicos e a evolução das casas nobres oitocentistas,  mostrando, ainda, pela primeira vez, a importância patrimonial e a necessidade  de definir mecanismos normativos de protecção e valorização desse conjunto  singular. A segunda publicação , editada também pela Comissão Municipal de  Turismo da Lousã , é uma obra referencial para o conhecimento  histórico-geográfico da Lousã e um contributo inovador para a divulgação das  potencialidades turísticas da Lousã e da sua Serra, na sequência de trabalhos  anteriores e teses defendidas em eventos como, por exemplo, o Congresso  Regional das Beiras. A ideia amadurecida sobre o turismo levou Álvaro Viana de  Lemos a incluir nesta obra um capítulo intitulado “Aspectos de carácter  turístico” (com duas dezenas de páginas), em que o autor explica os objectivos  para o turismo na Lousã – como já se referiu. 
  De  igual modo, do período em análise, merece referência uma publicação de dimensão  nacional: o “Guia de Portugal”. Este missal editado pela Biblioteca Nacional,  destinado a “fazer uma descrição tranquila, completa, sistematizada e modesta  das belezas do (…) nosso país” (DIONÍSIO, 1944: LIII), considerado também um  instrumento (inovador) de propaganda turística de Portugal, foi concebido por  Raúl Proença. O terceiro volume (Beira Litoral, Beira Baixa e Beira Alta), dado  à estampa em 1944 (a quase duas décadas de distância do 1º e 2º), já depois da  morte do seu fundador, com coordenação de Sant’Anna Dionísio (e a participação  de dezenas de figuras do mundo literário e académico) consagra diversas páginas  à Serra da Lousã, em especial ao município da Lousã – as notícias sobre os  concelhos da aba sul da Serra, incluídos na província da Estremadura, foram  apresentadas no 2º volume. 
  As  primeiras referências circunstanciadas sobre a Lousã decorrem da descrição  paisagística de uma excursão de Coimbra à Lousã, por caminho de ferro. Retemos  a ideia de uma “Paisagem movimentada, de sucessivos alcantis arborizados, cuja  grandeza tem por vezes feição pirenaica” (DIONÍSIO, op. cit., 376). Após o  Arneiro, desvenda-se, “em frente, através das últimas clareiras dos pinheirais,  como um dom surpreendente, a veiga da ribeira de Arouce, rica de pomares,  relvados, vinhas enquanto sobre o azul, se projecta a majestosa face redonda e  verde da montanha. A linha férrea descreve uma larga curva, transpõe a ribeira  e aproxima-se da Lousã” (DIONÍSIO, op. cit., 382). 
  Através  da pena do autor, desprende-se a opinião de que “A fisionomia da vila é  sossegada e agradável em extremo. Sobra-lhe a água, que desce da montanha, com  os bons ares, para reverdecer as culturas dos socalcos e as árvores de boa  fruta e sombra. Faltam-lhe, porém, os valores de arte. O grande monumento, por  assim dizer, da Lousã, é a Serra com os seus contornos macios, cheia de  florestas novas” (DIONÍSIO, op. cit., 383-384). Contudo, o património cultural  urbano não deixa de ser abordado no “Guia de Portugal” quando Sant’Anna  Dionísio faz alusão a algumas edificações civis, de tipo solarengo, à igreja da  misericórdia e ao quadro “Lenda da Fundação da Lousã” de Carlos Reis. As residências  particulares na vila e na estrada da serra, pelo seu traço arquitectónico,  merecem nota destacada no texto, por comparação com a “lembrança do aspecto  humilde e escuro dos aglomerados existentes nas alturas: Candal, Catarredor,  Sardeira, Vaqueirinho, Talasnal, etc.” (Idem, ibidem).
  Em  jeito de preâmbulo de uma excursão à Serra, indica-se, da Lousã, o incomparável  passeio às Ermidas e ao Castelo de Arouce. Aí, na entrada do limiar da montanha  é o deslumbramento da sua grandeza e sugestão que mais impressiona Sant’Anna  Dionísio. No âmbito das excursões à Serra da Lousã, faz-se uma boa descrição da  imponente paisagem serrana, a partir do traçado serpenteante e enigmático da  estrada, acompanhando as curvas as ondulações da montanha. As linhas de cumeada  da montanha merecem amplo destaque no texto, em particular o Altar do Trevim e  o planalto da Neve (com a capela de Santo António da Neve e os poços nos quais  se recolhia outrora o gelo que era transportado para Lisboa). A arborização dos  baldios serranos pelos Serviços Florestais e as estradas florestais (das Hortas  e das Silveiras) que rasgaram a montanha, pelos magníficos panoramas que  permitem aceder, foram notadas também pelo autor. 
  Em  síntese, os pontos de interesse da Lousã (e da Serra com o mesmo nome) e o  traçado das excursões enfatizados no “Guia de Portugal”, aparecem alinhados em  torno das grandes imagens que temos vindo a referir e confirmam o valor  crescente da paisagem como recurso turístico diferenciador dos territórios. 
  As diversas publicações que acabámos de indicar, com  alguns traços comuns apresentam, de igual modo, um outro mérito/contributo  inovador: introduziram na agenda da temática turística a dimensão patrimonial:  por um lado, o património construído civil da vila e arredores; por outro lado,  a arquitectura militar e religiosa da Lousã. 
  O  referido trabalho de António Nogueira Gonçalves (1950) é muito importante para  o conhecimento e divulgação do património edificado civil da Lousã. “As casas  nobres que se encontram na vila da Lousã, ou nas suas proximidades, como em  Fiscal e Foz de Arouce, constituem um grupo homogéneo, o que torna o seu  conjunto raro no país” (GONÇALVES, 1950: 7). Ao mesmo tempo, a monografia de  Álvaro Viana de Lemos (1951) é também um magnífico contributo para o melhor  conhecimento do património edificado da Lousã, nas suas diferentes  manifestações. Os folhetos de propaganda turística reflectem também os valores  patrimoniais. A título de exemplo, deixamos a transcrição do conteúdo de um  desses documentos: “Nota-se que o desenvolvimento da Lousã data dos séculos XVI  a XVIII. É interessante, do século XVI, o portal e alpendre da Capela da  Misericórdia; do século XVIII, as frontarias do Palácio Salazar, Casa da Rua  Nova, e outros belos exemplares de casas antigas” (1950). A própria traça  arquitectónica mais marcante do concelho (século XVIII) foi utilizada como  referencial do novo edifício dos paços do concelho (inaugurado nos anos 30 do  século XX), da autoria de João de Moura Coutinho, e do jardim implantado na sua  frontaria.
  Porém,  será preciso esperar mais de duas décadas para incluir esses bens no quadro  jurídico de protecção do património edificado, no âmbito da classificação de um  grupo numeroso de imóveis na categoria de valor concelhio. Ao mesmo tempo, o  ritmo sempre crescente de urbanização da vila, por via de alguns desequilíbrios  urbanísticos, sensibilizou mais os cidadãos para os valores do património  construído da Lousã e o seu contexto paisagístico. 
  Em  relação ao património militar e religioso, cruzam-se intervenções públicas e  privadas de grande envergadura centradas no Castelo de Arouce e nas Ermidas. A  pequena fortificação militar, classificada como monumento nacional (Decreto de  16 de Junho de 1910), chegou ao século XX muito arruinada, por diversos  motivos, nomeadamente o facto de constituir uma óptima pedreira que forneceu,  por muito tempo, material para as construções dos arredores. “O Turismo e o  Município chegaram a realizar nele algumas obras de limpeza e conservação”  (DGEMN, 1956: 29). Contudo, a renovação da imagem do castelo, edificado no  promontório serpenteado pelo rio Arouce, deve muito às obras de restauro,  realizadas nos anos 40, pela Direcção Geral de Edifícios e Monumentos Nacionais,  que restituíram ao secular edifício a sua fácies mais imponente (século XIV).  Foi um período de culto político dos monumentos e vivia-se intensamente o plano  de comemorações da fundação da nacionalidade.
  Ao  mesmo tempo, importa referir a recomposição das Ermidas (anos 30-50), com a  implantação de áreas de lazer, e a construção da piscina fluvial (anos 60) e  equipamentos complementares (complexo turístico da Azenha). Na primeira metade  dos anos 80, transformou-se a antiga casa do moleiro em bar e restaurante,  entretanto ampliado e dotado de oferta gastronómica de excelente qualidade,  como tem sido reconhecido em certames nacionais e internacionais da  especialidade. 
  Deste  modo, a utilização de linhas de água e a requalificação da envolvente para fins  lúdicos contribuiu para reforçar e diversificar a imagem de um espaço turístico  alternativo. 
  A  sedimentação da imagem turística da Lousã emerge, mais uma vez, em ligação à  montanha, no contexto de renovação acentuada de usos e funções da paisagem, e  na atmosfera económica, social e cultural da designada “nova era do lazer  turístico”. Com efeito, as décadas de 70 e 80 marcam a afirmação e a projecção  nacional e internacional da Serra da Lousã no âmbito de dois acontecimentos:  por um lado, as provas do campeonato nacional e mundial de rali, e por outro  lado, a reabilitação (conversão de uso das estruturas edificadas) das aldeias  serranas relacionada com a residência secundária e a neo-ruralidade. 
       No primeiro caso, reconhecemos que as  provas do campeonato do mundo de rali atraíram milhares de espectadores às  especiais de classificação da Lousã. As estradas florestais da Mata do Sobral e  das Hortas, e a E. N. nº 236 estiveram integradas nos troços daquele que,  durante alguns anos, foi considerado o melhor rali do mundo. 
  Coincidindo  com a exclusão do Rali de Portugal do calendário internacional e o fim de um  ciclo de grande divulgação da região no plano nacional e internacional, emergem  as provas de Todo-o-Terreno, Trial e Down Hill, sobretudo através do Montanha  Clube (da Lousã), com a realização na Serra da Lousã, e em especial na área  administrativa do concelho da Lousã, de importantes e conceituadas competições  nacionais e mundiais. O acompanhamento e a cobertura destas modalidades de  desporto aventura, através dos meios de comunicação social, resultou em dezenas  de notícias e artigos publicados em jornais, revistas e suportes digitais.           
  Por  outro lado, assume relevante expressão o fenómeno da residência secundária e a  patrimonialização das aldeias serranas da Lousã. Tal como outros lugares  serranos do Centro, do Norte e do Algarve (como, por exemplo, a Serra do Caldeirão),  despovoados e (semi)abandonados, a sua redescoberta é indissociável de  populações urbanas que reabilitaram e utilizaram as antigas estruturas  edificadas como residência secundária (e também para fixar residência  principal, como acontece com os neo-rurais), alguns dias por ano, mesmo em  condições de acessibilidade e infra-estruturas básicas muito deficitárias.  Casal Novo e Talasnal, em meados dos anos 70, foram a porta de entrada da  residência secundária na Serra da Lousã. Nos anos 90, Candal e Gondramaz (entre  outros exemplos que ocorreram também em lugares da bacia sedimentar,  nomeadamente na freguesia de Rio de Vide – Miranda do Corvo) conheceram  dinâmicas de reocupação e reabilitação influenciadas por este fenómeno  (CARVALHO, 2005; 2006-a). 
  No  âmbito da investigação que realizámos recentemente, envolvendo inquéritos por  questionário aos proprietários e utilizadores de imóveis de ou para residência  secundária em Casal Novo, Talasnal e Candal, destacamos alguns elementos  essenciais para compreender a evolução da residência secundária e os seus  efeitos territoriais e patrimoniais. Desde logo, impressiona a distribuição  geográfica dos inquiridos : mais de três dezenas de municípios foram  assinalados como local de residência principal, destacando-se Coimbra (35%),  Lousã (25%) e Lisboa (quase 10%). Estes três municípios perfazem quase 70% do  total apurado . 
  A  aquisição de imóveis para residência secundária é praticamente contínua, entre  1977 e 2003. A análise segundo períodos, permite destacar o reduzido número de  aquisições no período anterior a 1980, apenas 7%, e que os períodos de  aquisição mais importantes são 1980-1984 (26%), 1995-1999 (23%) e 1990-1994  (20%). No plano dos lugares serranos, o processo de aquisição tem origem no  Casal Novo e Talasnal, onde a década de 80 tem ainda grande expressão, e só  mais tarde, nos anos 90, assume relevo no Candal – como já se referiu.
  O  processo de recuperação dos imóveis revela que apenas 24% dos inquiridos  recuperaram a sua casa no ano de aquisição; para a grande maioria (76%) foi  necessário mais de quatro anos para realizar as obras. Este processo decorreu  através de administração directa (40%), empreitada (25%) e com a participação  dos proprietários (12%). 
  Por  sua vez, a frequência de utilização da residência secundária revela que cerca  de 60% dos inquiridos afirmam utilizar a habitação na Serra, ao longo de todo o  ano, embora em especial aos fins-de-semana. Por outro lado, os resultados do  inquérito mostram que mais de 40% de proprietários de imóveis na Serra são  igualmente titulares de outras residências secundárias, repartidas por três  dezenas de municípios em Portugal, valores que cresceram face a 1989 (de 26  para 40%, em 2003). O cruzamento do ano de aquisição desses imóveis com a data  de aquisição de casa nas aldeias serranas, permite afirmar que a aquisição de  imóveis nas aldeias serranas é, em 75% dos casos, anterior ao processo de  aquisição da “segunda” residência secundária (CARVALHO, 2005).
  Em  síntese, Casal Novo, Talasnal e Candal reflectem a patrimonialização de  paisagens culturais de matriz vernacular, a partir da reabilitação de antigas  estruturas edificadas abandonadas, processo espontâneo, sem qualquer tipo de  apoio público, iniciado em meados dos anos 70. 
  O  município da Lousã percebeu a importância da reabilitação das aldeias  serranas  e o seu contributo para uma  estratégia de desenvolvimento sustentável da Serra da Lousã alicerçada no  turismo alternativo (ambiental e cultural), e com o apoio de uma equipa técnica  (Gabinete Técnico Local), empenhou-se nas tarefas de análise, inventário,  diagnóstico e definição de linhas orientadoras de uma intervenção integrada a  submeter a concurso para financiamento público. 
  O  programa comemorativo do 150º aniversário da 1ª viagem turística e cultural à  Serra da Lousã (1838-1988) foi um marco importante de reafirmação das  potencialidades turísticas da Lousã e das ambições da Câmara Municipal da  Lousã, nomeadamente os projectos que acabámos de referir. A publicação alusiva  ao evento, intitulada “Jornadas de Cultura e Turismo (16-17 de Julho de 1988)”,  reuniu um conjunto notável de textos, na amplitude dos discursos das entidades  oficiais participantes, às comunicações de autores como Suzanne Daveau, Eugénio  de Castro Caldas e Jorge Paiva, entre outros. A efeméride serviu de pretexto  para a reedição da obra “A Lousã e o seu Concelho”, de Álvaro Viana de Lemos, e  marca um período de intensa publicação apoiada pelo município , com destaque,  na perspectiva turística e cultural, para a revista “Arunce” (lançada, pela Câmara  Municipal da Lousã, em 1989), o trabalho “Residência secundária e espaço rural:  duas aldeias na Serra da Lousã, Casal Novo e Talasnal” de Fernanda Cravidão  (inserido na “Colecção Estudos” da Faculdade de Letras de Coimbra) e o “Guia da  Rede de Percursos da Serra da Lousã (Castanheira de Pêra – Góis – Lousã)”, de  Armando Carvalho e Pedro Amaro (editado pela QUERCUS em 1996). 
  De  outro modo, importa referir o trabalho “Entre a Serra e o Rio… os trilhos  ELOZ”, publicado, em 2000, pela Dueceira (Associação de Desenvolvimento do  Ceira e Dueça). Este guia, financiado pela Iniciativa Comunitária LEADER II  (1994-2000), fornece um conjunto de informações úteis para a descoberta das  terras de entre Lousã e Zêzere (concelhos de Lousã, Miranda do Corvo, Vila Nova  de Poiares, Castanheira de Pêra, Figueiró dos Vinhos e Pedrógão Grande, no  âmbito do Programa LEADER/ELOZ) designadamente registos do passado, usos e  costumes, natureza em verde (aldeias e paisagens serranas, fauna e flora),  natureza em azul (linhas de água, albufeiras e barragens, praias fluviais e  pesca) e informação sobre serviços e equipamentos culturais e recreativos.
  Em  síntese, o turismo configura uma espécie de alavanca para afirmar e dinamizar a  nova vocação (função) territorial da montanha, e as aldeias serranas, enquanto  expressão mais visível e dinâmica desse sistema, são uma âncora fundamental da  estratégia delineada (CARVALHO, op. cit.).
  Contudo,  as políticas públicas de desenvolvimento, e de turismo em particular, não foram  favoráveis aos desígnios do município da Lousã. Sem financiamento externo as  intervenções programadas não avançaram. De outro modo, reconhecemos algumas  acções parcelares apoiadas por programas nacionais e comunitários (como, por  exemplo, o LEADER II e o LIFE Natureza), na área do alojamento turístico (nas  modalidades de turismo em espaço rural) e da salvaguarda e valorização do  ambiente e do património cultural e natural. 
  O  início do terceiro milénio, com um novo quadro de programação das políticas e  instrumentos de desenvolvimento, marca um período de grande visibilidade  externa da Lousã que decorre de importantes intervenções em duas áreas  estratégicas para o município: o alojamento turístico e a requalificação das  aldeias serranas.
  Como  temos vindo a referir, o turismo, como actividade que se pretendia fomentar, é  uma preocupação sedimentada do poder político e da sociedade local. Todavia,  algumas limitações, muito sentidas em particular desde os anos 70, acompanharam  a afirmação da imagem turística da Lousã, nomeadamente a reduzida capacidade de  alojamento, quando a utilização dos tempos livres começava a generalizar-se na  sociedade portuguesa. Como notou a geógrafa Fernanda Cravidão, no seu artigo sobre  o turismo no distrito de Coimbra (1980-1987), publicado no número inaugural da  revista “Arunce” (1989), a estrutura do equipamento turístico na hotelaria e a  capacidade de alojamento eram deficitárias neste distrito. A evolução da  capacidade de alojamento demonstrava a reduzida expressão de municípios como a  Lousã: apenas 54 quartos (repartidos por duas pensões), em 1987, quando o  distrito perfazia 4061 (dos quais 2266 situavam-se na Figueira da Foz, e 1243  em Coimbra). No caso da Lousã, CRAVIDÃO (op. cit., 52) reconhece que é “uma das  áreas onde o investimento devia ser consideravelmente aumentado (…)”, uma vez  que possui “um conjunto de potencialidades, nomeadamente a Serra, que deviam  ser exploradas, quer instalando equipamentos hoteleiros quer desenvolvendo o  Turismo Rural”. 
  Efectivamente  o problema não era novo e conheceu algumas propostas originais em meados do  século XX: “Hoje, com as estradas da Serra (nacional e florestais) já a muitos  pontos, antes inacessíveis, se pode ir de carro; por isso já se pode encarar a  possibilidade de lugares como o Candal e a Silveira, ambos a cerca de 700 m de  altitude e os mais abrigados da Serra dos ventos frios, virem a ser de futuro  escolhidos para aí se estabelecerem Pousadas de Turismo, ou então ajeitadas, casas  já existentes, que possam ser utilizadas por turistas.
  A  primeira Pousada oficial da Serra embora não convenha estabelecê-la, por ser o  sítio muito desabrigado, na própria Catraia, ao nome da velha Ti Joaquina da  Catraia deve ficar ligada; o Turismo e a Serra devem-lhe essa homenagem, para  que não caiam no esquecimento os serviços que ela prestou, de modesto abrigo e  agasalho, aos antigos viajantes da serra inóspita, aos raros turistas de outros  tempos” (LEMOS, op. cit., 156). 
  De  igual modo, esteve prevista (embora não concretizada) a construção de um centro  de férias da FNAT (Frente Nacional para a Alegria no Trabalho), próximo de  Alfocheira (portanto na encosta sobranceira à vila da Lousã). 
  Porém,  a resolução deste problema passou nos últimos anos pela definição e  implementação de um conjunto articulado de acções na amplitude da instalação de  novas infra-estruturas às tarefas de animação e promoção turística. A  concretização desta estratégia, centrada na intervenção directa do município e  na captação de investimento público e privado, contou com o apoio financeiro  dos novos instrumentos territorializados de desenvolvimento, designadamente a  Acção Integrada de Base Territorial do Pinhal Interior (componente FEDER) do  Programa Operacional da Região Centro (2000-2006) e alguns programas nacionais  de âmbito sectorial (turismo e desenvolvimento rural).
  Assim,  a nova fácies turística da Lousã é indissociável de alguns investimentos  (concretizados) que aumentaram e diversificaram a oferta local de alojamento  turístico. O mais importante decorre da requalificação e refuncionalização do  antigo Palácio da Viscondessa do Espinhal (ou dos Salazares), imóvel do início  do século XIX, classificado pelo IPPAR, no centro histórico da Lousã.  Inaugurado em Abril de 2005, o Meliá Palácio da Lousã, de quatro estrelas,  oferece quase cinco dezenas de quartos, repartidos por duas alas (nova e  antiga) do edifício. A unidade hoteleira, o primeiro Mélia Boutique Hotel  a abrir em Portugal, oferece ainda serviços  de bar e restauração, abertos a toda a população, e dispõe de um auditório  (para eventos culturais e científicos). Este empreendimento de qualidade,  semelhante à Quinta das Lágrimas (Coimbra), direccionado para a classe média  alta e alta, é propriedade da empresa “A Serra da Lousã. Actividades Turísticas  e Hoteleiras, S.A.” que inclui como accionistas a Câmara Municipal da Lousã, a  Bascol SGPS, a Torre Brasil S.A. e membros da família Mexia Santos. Em 2006,  quinze a vinte mil pessoas – por diferentes motivos: dormida, restauração e  participação em congressos – frequentaram as instalações do Meliá Palácio da  Lousã. Outros elementos estatísticos, como a taxa de ocupação (42%), a  proveniência dos clientes (70%, portugueses; 15-20%, espanhóis), revelados no  âmbito de uma entrevista concedida pelo administrador do Hotel ao jornal TREVIM  (edição de 26 de Abril de 2006), revelam a margem de crescimento desta unidade  de alojamento (pouco marcada pela sazonalidade da ocupação). Ainda de acordo  com a mesma fonte, a estratégia do hotel para os próximos anos passa pela  conquista dos mercados inglês, alemão e americano, uma vez que apresentam  sensibilidade e propensão em relação às modalidades de turismo cultural e  ambiental 
  Ao  mesmo tempo, o Meliá Palácio da Lousã gera importantes sinergias no âmbito da  animação turística (envolvendo empresas locais e regionais) e promove a região  ao receber eventos sociais e científicos relevantes, como tem acontecido na  área do turismo (envolvendo por exemplo a Universidade de Aveiro e o Instituto  Politécnico de Coimbra).
  Portanto,  esta unidade hoteleira, a par de outra oferta de alojamento de qualidade  entretanto criada no âmbito do TER (Ceira dos Vales e Serpins) e da Pousada de  Juventude da Lousã (empreendimento público, com capacidade para 62 camas, inaugurado  em Abril de 2007), aumentou e qualificou bastante a oferta de alojamento da  Lousã.
  Mas  o contributo da Câmara Municipal da Lousã para a construção sustentável de um  destino turístico atractivo, privilegiando modalidades de baixa densidade e  recursos eco-culturais, envolve também um significativo esforço de  investimento, no âmbito da AIBT do Pinhal Interior, em dois projectos de grande  visibilidade: a requalificação das aldeias serranas da Lousã e o Ecomuseu da  Serra da Lousã. 
  O  primeiro exemplo reflecte a ambição de constituir uma rede de aldeias de matriz  xistosa, representativas da arquitectura serrana tradicional, e estruturar um  novo produto turístico no Centro de Portugal destinado em particular a um  segmento de população jovem, exigente e de elevado poder aquisitivo. Com o  suporte financeiro do QCA III (2000-2006), e o envolvimento de actores públicos  e privados, realizaram-se investimentos em infra-estruturas básicas, espaços  públicos, imóveis particulares e públicos, que perfaziam cerca de 10.6 milhões  de euros (no início de 2006), incentivaram-se algumas actividades económicas  (restauração, alojamento turístico e comércio de produtos endógenos e  artesanato) e apoiaram-se acções de animação e promoção turística e cultural  dos lugares serranos. 
  Cerca  de metade das quase duas dezenas e meia de lugares seleccionados ao abrigo  do Programa das Aldeias do Xisto (PAX),  localizam-se no interior ou na bordadura da Serra da Lousã. O concelho da Lousã  tem cinco aldeias (Casal Novo, Talasnal, Candal, Cerdeira e Chiqueiro)  integradas no PAX, onde foram intervencionados setenta e um imóveis  particulares (17% do total do PAX) e um imóvel público, e realizadas onze  acções no domínio das infra-estruturas básicas (abastecimento de água,  saneamento, águas pluviais, electricidade, telecomunicações). O total de  investimento elegível aprovado na Lousã, em Janeiro de 2006, era de 1.193.460  euros, dos quais 835.422 euros resultam do apoio do FEDER (cerca de 70%). A  repartição do montante global de investimento elegível aprovado por categorias  de intervenção, revela que 708.968 euros, isto é, 59.4 % do montante de  investimento, está relacionado com a recuperação (fachadas e coberturas) de  imóveis particulares, portanto é da responsabilidade dos respectivos  proprietários e conta com o apoio do Estado (que comparticipa cerca de 2/3 do  referido investimento). A restante verba, cerca de 485 mil euros, corresponde a  investimento da autarquia (também comparticipado, embora segundo taxas mais  reduzidas) no âmbito das intervenções em espaços públicos, imóveis públicos e  redes de infra-estruturas. Para perceber o esforço financeiro global do  município da Lousã no PAX é preciso referir ainda o investimento não elegível:  463.567 euros (correspondente a 56.2% do total desta componente no PAX), que  aparece relacionado com as redes de infra-estruturas básicas (CARVALHO,  2006-b).
  Por  sua vez, o Ecomuseu da Serra da Lousã corresponde a um projecto do município da  Lousã integrado em outra importante linha de acção da AIBT do Pinhal Interior  (FEDER). Esta, no seu conjunto, apoia diversas iniciativas de valorização do  património natural e cultural, e projectos no campo das acessibilidades,  perfazendo cerca de 12,4 milhões de euros de investimento elegível aprovado  (52% do total de investimento da referida AIBT). A amplitude dos projectos  aprovados (em número superior a três dezenas) é significativa, como se  depreende dos seguintes exemplos: estrada panorâmica do Alto Ceira (Arganil);  parque de campismo de Foz de Alge (Figueiró dos Vinhos); praia fluvial do Casal  da Lapa (Pampilhosa da Serra); museu da geodesia (Vila de Rei); museu do azeite  de Sarnadas do Ródão (Vila Velha de Ródão) e praia das Rocas (Castanheira de  Pêra). 
  A  versão actual do Ecomuseu da Serra da Lousã, traduzindo uma ideia que tem  evoluído segundo critérios de cada vez maior exigência técnica e financeira da  parte da Autarquia e da CCDRC (CARVALHO, 2001; 2002; 2005), configura uma  estrutura polinucleada, com o núcleo de investigação (museu etnográfico Dr.  Manuel Louzã Henriques), o núcleo sede (instalado em edifício no centro  histórico da Lousã, a inaugurar brevemente), o núcleo de gastronomia e doçaria  regional associado ao lagar Mirita Sales e o núcleo a consagrar ao pintor  Carlos Reis (1863-1940) que decorre da reconstrução e ampliação (em curso) da  antiga casa-atelier deste vulto da 2ª geração da pintura naturalista  portuguesa. Os três primeiros núcleos tinham, em Janeiro de 2006, um  investimento elegível aprovado ligeiramente superior a 1.400.000 euros. De  forma paralela, contam-se outros investimentos relacionados (leia-se  identificados em relatórios oficiais) com o Ecomuseu da Serra da Lousã, como um  núcleo de educação ambiental e um posto de apoio à rede de percursos no  Chiqueiro (imóveis públicos a recuperar com o apoio do PAX).
  Em síntese, a vertente eco-cultural mereceu nos  últimos anos particular atenção no contexto das políticas e instrumentos de  gestão territorial. O caso concreto da AIBT do Pinhal Interior (Programa  Operacional da Região Centro, 2000-2006) é muito expressivo da vontade de criar  e partilhar uma abordagem estruturada de matriz intermunicipal, capaz de guiar  o investimento público e privado, em torno dos recursos de maior potencial. A  requalificação territorial, ancorada ao património, serviu de pretexto a uma  ambição maior: criar e projectar novos produtos turísticos e inserir lugares  (renovados e refuncionalizados) na esfera do mercado turístico nacional e  internacional. 
  O  município da Lousã não ficou (nem foi) arredado desta estratégia comum de  salvaguarda e valorização do património e da plataforma de novas oportunidades  que se abriu em 2000-2006. Ao invés, demonstrou visão, ambição e mérito ao  apresentar projectos de qualidade e comprometer investimentos avultados neste  domínio. Depois de muitos anos de projectos e sonhos por concretizar, o  município teve, finalmente, oportunidade (por via de um novo quadro de  políticas e instrumentos de promoção pública do desenvolvimento territorial) de  realizar e captar investimentos estratégicos para a Lousã, designadamente no  que ao turismo diz respeito. 
  Hoje,  o grande desafio para o turismo da Lousã, com legítimas ambições nas  modalidades eco-culturais, aparece relacionado com a (transição para um patamar  de) conquista efectiva de turistas na sequência das infra-estruturas e  equipamentos lançados no início deste novo milénio, que, por sua vez, depende  muito da escala e da visibilidade exterior (nacional e internacional) da sua  oferta turística. Neste particular o marketing turístico é um instrumento  estruturante. Mas, depende igualmente da sua integração em redes funcionais de  matriz intermunicipal, explorando temáticas patrimoniais e turísticas originais  e inovadoras. Os cervídeos (veados e corços) reintroduzidos na Serra em meados  dos anos 90, aproveitando uma diversidade vegetal considerável no contexto  nacional (FONSECA, 2004), são um exemplo bem elucidativo.
  A  promoção eficaz da Lousã junto do mercado turístico nacional e internacional,  como meta prioritária, envolve investimentos avultados cuja concretização é  possível apenas num quadro alargado de promoção turística regional, mas também  pequenos investimentos como são os folhetos e os suportes digitais interactivos  (e apelativos ao sentido de descoberta e fruição da paisagem). A melhoria  significativa da informação nos locais de interesse/a visitar é outra  prioridade (urgência), com leitores de paisagem e acompanhamento através de  suportes adequados distribuídos em pontos estratégicos. O pior sinal para os  turistas é a ausência de informação e a falta de pontos de apoio. Certos  imóveis recuperados na Serra da Lousã, ao abrigo de diversos programas  nacionais e comunitários (desde meados dos anos 90), sob pretexto de um  objectivo que justificou a aprovação dos respectivos projectos mas que nunca se  concretizou, merecem uma reflexão profunda e, melhor, justificam uma função  adequada aos ventos que sopram na e da montanha.
  Uma  vez que o mercado turístico é cada vez mais exigente e competitivo, e em face  das mudanças qualitativas que se desenham ao nível do comportamento dos  turistas (estes são cada vez mais exigentes, informados, esclarecidos e  selectivos, e os seus interesses são mais diversificados e segmentados) importa  orientar de forma atempada, original e sustentada a acção futura, e aproveitar  a conjuntura das políticas públicas de desenvolvimento, com a colaboração  imprescindível dos centros de ensino e investigação, ou seja, elaborar e  implementar um verdadeiro plano estratégico local e regional para o turismo (na  sequência da aprovação do “Plano Estratégico Nacional do Turismo”). 
  Apesar  do atraso no âmbito da aprovação dos grandes documentos orientadores do  investimento público para 2007-2103, em diferentes escalas territoriais e  patamares temáticos, vislumbra-se nos diversos programas em  estruturação/aprovação a valorização da intermunicipalidade, das redes e das  parcerias no desenho de projectos cada vez mais ambiciosos e exigentes. A  Serra, na sua dimensão geográfica maior, será uma configuração territorial  estruturante na renovação arquitectónica e consolidação de uma ambição  centenária: a Lousã turística. 
  Neste  contexto, o projecto “Lousã: destino turístico acessível”, materializado em  candidaturas no âmbito do Programa Operacional do Potencial Humano e do  Programa INTERREG, entre outras, configura uma dimensão inovadora no plano  nacional, na perspectiva da promoção da inclusão e de um turismo acessível para  todos (através de intervenções nos equipamentos turísticos, nos espaços  públicos, transportes e diversos serviços sociais), e valoriza uma dinâmica de  rede no turismo.
  A  concluir, sublinhamos a necessidade urgente de planear a actividade turística e  estruturar o ordenamento turístico da Serra da Lousã. Esta ferramenta é nuclear  para preservar os recursos, minimizar as externalidades negativas e optimizar  os benefícios. De facto, a valorização de recursos eco-culturais, como a Rede  Natura 2000, a paisagem cultural serrana, o artesanato e os produtos endógenos  de qualidade, entre outros, depende em larga escala das condicionantes de  utilização e das medidas de protecção e valorização a introduzir e a fazer  respeitar. 
  Que  a tectónica (simbolizada pela força das novas ideias e oportunidades) consiga  fracturar o isolamento secular das diferentes partes que compõem a Serra da  Lousã e permita finalmente, através de cooperação, parceria e redes, ganhar  escala e nova visibilidade! E que a Lousã tenha ambição para constituir a pedra  angular da paisagem cultural serrana e de uma sub-região rica de potencialidades  turísticas (culturais e naturais). 
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|  1647 - Investigaciones socioambientales, educativas y humanísticas para el medio rural Por: Miguel Ángel Sámano Rentería y Ramón Rivera Espinosa. (Coordinadores)  Este  libro  es  producto del  trabajo desarrollado por un grupo interdisciplinario de investigadores integrantes del Instituto de Investigaciones Socioambientales, Educativas y Humanísticas para el Medio Rural (IISEHMER).  Libro gratis | 
| 15 al 28 de febrero  | |
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