O SEGUNDO CICLO DE KONDRATIEV (1843-1896) E O SEU LIAME COM A PARTICIPAÇÃO DOS ESTADOS UNIDOS NA GUERRA DO PARAGUAI

Roberto Mauro da Silva Fernandes

Capítulo 2 - MEU AMIGO É MEU INIMIGO: AS RELAÇÕES ENTRE O IMPÉRIO DO BRASIL E GRÃ-BRETANHA NOS ANOS DE 1843-1863

 

2.1 O ÍNICIO DA EXPLICAÇÃO

As Guerras Napoleônicas marcaram uma etapa da história do mundo ocidental que fora de extrema importância para a Grã – Bretanha, depois do conflito os britânicos tornar-se-iam detentores de uma hegemonia que durou cerca de cem anos (1815 – 1914), na qual a “oficina do mundo” Inglaterra, engendrara uma política de equilíbrio entre as principais potências do planeta, garantindo assim, o domínio da balança do poder mundial. Essa política de poder consistiu em tranqüilizar e apoiar os governos absolutistas da Europa continental, organizados na Santa Aliança, de que eventuais mudanças no equilíbrio do poder somente se realizariam com o consentimento dessas grandes potências (ARRIGHI, 1996, p.68).

Pode-se incluir nessa política britânica, a inserção da França derrotada entre as grandes potências que faziam parte da Santa Aliança, classificando-a como nação de segundo escalão, com o claro objetivo de controlá-la. A Grã – Bretanha também se opôs a intenção da Santa Aliança de intervir na América Latina, na busca de um possível restabelecimento da dominação colonial, como também, posteriormente, deu respaldo aos Estados Unidos, ao que mais tarde viria ser chamado de “Doutrina Monroe” (ARRIGHI, 1996, p.69). Controlava assim, as Grandes Potências européias e suas periferias.

A partir de ações desse gabarito, os britânicos conseguiram por todo século XIX dominar militar, político e economicamente o “mundo”, e conseqüentemente conseguiram uma grande influência sobre Portugal e posteriormente, Brasil, que no auge da guerra ensejada por Bonaparte, encontrava-se na condição de colônia portuguesa.

As Guerras Napoleônicas serão de grande utilidade para o desenrolar dos processos inerentes a independência do Brasil. Até porque, o conflito europeu é a conseqüência direta para um maior estreitamento das relações entre a Grã-Bretanha e Portugal no início do século XIX. É a marinha britânica, por exemplo, que escolta a Família Real portuguesa, através do atlântico, em direção as terras brasileiras, em conseqüência do “Bloqueio Continental” de Napoleão, cujo D.João VI não aderiu, culminando assim, com a invasão Francesa a Portugal no final de 1807 (AGUIRRE, 2008, p.09). Posteriormente esse evento facilitaria o estreitamento das relações entre o Brasil independente e os britânicos durante o Império.

Dessa forma, temos a intenção de demonstrar a relação entre Brasil e Grã-Bretanha, como as suas contradições, na tentativa de esclarecer algumas questões que envolveram a participação do Brasil na Guerra do Paraguai como instrumento britânico na América do Sul. Esses “amigos-inimigos” históricos que possuíam interesses distintos para uma mesma região (Bacia Platina e a própria América do Sul), vão chegar ao ápice de sua “amiga-inimizade” no ano de 1863, quando rompem relações diplomáticas. Enfoque que contribui para se questionar a tese de que o governo Britânico no século XIX destruiu o Paraguai utilizando o império do Brasil como arma de guerra.

A idéia de que o governo Imperial do Brasil foi utilizado pelos britânicos para destruir o Paraguai distorceu alguns fatos históricos em nome de concepções ideológicas, que culpam, somente, o “imperialismo” como o eterno causador dos problemas da América do Sul. Temos que nos conscientizar que não foram (como também não são) isoladamente os interesses externos que causaram, e que supostamente, causam determinados distúrbios políticos, econômicos e sociais no continente. As forças internas da região e seus interesses também estiveram e estão em plena convergência com a deflagração de alguns acontecimentos.

Assim, não podemos pensar que o Império brasileiro aceitava com imensa prontidão as ordens da Grã-Bretanha sem contestações. O governo Imperial do Brasil, àquela época, possuía suas pretensões expansionistas e, também, empreendeu ações hegemônicas de caráter colonial e imperialista na Bacia Platina durante o século XIX, que coincidiram ou não com os interesses da Grã-Bretanha (BANDEIRA, 1985, p. 142).

Analisaremos alguns acontecimentos de ordem interna e externa,  relacionadas a esses dois Estados, cuja relação fora marcada por motivos dúbios, condicionadas, obviamente, pela situação em que cada um se encontrava na ordem econômica, política e militar do século XIX. As nuances do conturbado relacionamento entre os dois Estados no período pré-Guerra do Paraguai são significativas para verificarmos que o Brasil não protagonizou um conflito “contra” o Paraguai, simplesmente, como “arma de guerra”.

2.2 O VASSALO PORTUGUÊS

Napoleão Bonaparte no inicio do século XIX promoveu uma série de invasões na Europa continental, subjugando algumas nações européias. Evento que diretamente influenciou o andamento do Reino português, que sofreria a partir do ano de 1807, severas pressões do governo Francês para aderir a um sistema de sanções com a intenção de atingir economicamente a Grã-Bretanha, o “Bloqueio Continental”:

Sem conseguir dominar a Inglaterra pela força militar, Bonaparte tentou vencê-la pela força econômica. Para isso, em 1806 decretou o Bloqueio Continental, pelo qual os países do continente europeu deveriam fechar seus portos ao comercio inglês (AGUIRRE, 2008, p.08).

D. João VI viu-se obrigado a colocar em prática um velho plano (pensado no inicio do século XVIII), que consistia em enviar toda sua corte e administração para o Brasil. Ação realizada mediante a invasão das tropas francesas a Portugal em novembro de 1807. Assim a Família Real portuguesa, sob a proteção da esquadra inglesa, com todo seu aparato governamental partiu rumo ao Brasil (CORTEZ, 2004, p.99).

Segundo Aguirre (2008, p.09) o rei português não podia cumprir as ordens de Napoleão, devido às longas relações entre Portugal e Inglaterra, e principalmente, sobretudo, pois os comerciantes portugueses possuíam importantes relações com os mesmos. Ademais, era mais interessante para os lusos, a continuidade do protetorado político e militar com os ingleses a iniciar uma relação com Napoleão que tinha interesses explícitos de aprisionar a Família Real e substituí-la por alguém de confiança, como fizera na Espanha (CORTEZ, 2004, p.99).

O fato é que toda corte portuguesa viera para o Brasil, iniciando um novo ciclo das relações entre Inglaterra e Portugal.  O governo inglês, logicamente, tratou de tirar o máximo proveito da proteção militar que deu ao governo português, e interessado na expansão do mercado para suas indústrias, pressionou D. João VI a acabar com o monopólio do comércio colonial.

Dessa forma, em 28 de janeiro de 1808, seis dias após o desembarque no Brasil, D. João decretou a abertura dos portos ao comércio internacional, isto é, às “nações amigas”. Com essa medida, o monopólio comercial ficava extinto, os comerciantes da colônia ganhavam liberdade de comércio, abria-se então, o caminho para a futura emancipação do Brasil (AGUIRRE, 2008, p.09).
Mas, é importante ressaltar que Portugal ressentia amargamente o fato de ter que prestar vassalagem a Grã-Bretanha, de depender da proteção militar e econômica da mesma, pagando um alto preço, como se verificou no Tratado de 1810, que concedia aos comerciantes britânicos o privilégio tarifário de 15% ad valorem, bem abaixo da taxação conferida maior a Portugal (16%) e as demais nações (24%).

Dessa forma, D. João VI ao perceber as potencialidades territoriais, demográficas e políticas do Brasil, alça a ex-colônia à posição de Reino Unido, com o intuito de por fim a condição incomoda de dependência. Como também, a elevação do Brasil a Reino Unido e Algarves, está concomitante as pressões inglesas para a cessação do tráfico de escravos, que depois de 1822 recairiam sobre o Império do Brasil (BANDEIRA, 1985, p.90).

 D. João VI ao elevar o Brasil à condição de Reino, fez renascer as pretensões expansionistas do Império Português na América Latina, objetivo perseguido desde o período colonial:

A visão geopolítica portuguesa desde aquele período evidenciava-se nas tentativas de estabelecer os limites atlânticos de seu império americano, a Bacia do Amazonas ao norte e a do Prata ao sul. Perseguiam, assim, os portugueses, o domínio dos dois únicos caminhos de penetração naturais utilizáveis à época, com a ambição de controlar toda a América do Sul (ZUGAIB, 2006, p.77).

Essa Política expansionista iniciara-se com a fundação em 1680 da Colônia de Sacramento, na margem oriental do Rio da Prata, para assegurar, o domínio da navegação desse mesmo rio e de seus tributários, que representavam a chave do acesso ao interior da parte meridional do continente. Uma política que D. João V (1706-1750) deu continuidade, com a preocupação de facilitar aos navios comerciais portugueses a livre navegação do Rio da Prata, razão pela qual se impunha o controle de sua margem oriental (ZUGAIB, 2006, p.78). Observa-se que a livre navegação nos rios platinos, já nos séculos XVII e XVIII, fazia parte dos projetos geopolíticos direcionados ao comércio e expansão territorial na Bacia Platina.

De acordo com Bandeira (1985), D. João VI sonhava no início do século XIX com a possibilidade de fundar um poderoso império na América, reunindo os Estados do Brasil e as colônias espanholas, projeto que foi, totalmente, de encontro às pretensões inglesas que buscavam uma aliança com a Espanha, que insurgia contra o julgo da França (BANDEIRA, 1985, p.41/42). Não convinha aos ingleses, que Portugal aumentasse sua influência na Bacia platina, o objetivo era fazer do Brasil um grande empório para as manufaturas britânicas destinadas ao consumo de toda a América do Sul.

A cumplicidade entre Grã-Bretanha e Portugal, e depois entre aquele e o Brasil, após sua independência, aparentemente, foi ubíqua. O que foi perpetuado por inúmeros historiadores, sobre a relação passiva do Brasil frente à política britânica (que serviu como matriz ideológica para explicar a ação do Brasil na guerra contra Solano Lopez), no mínimo é superficial. D. João VI, durante o período que permanecera no Brasil (1808-1821), não estava totalmente condizente com a política inglesa, e muito menos, os Britânicos concordavam com uma autonomia maior àquela permitida ao Reino de Algarves por eles, sobretudo, quando a questão envolvia a Bacia Platina.

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