BIBLIOTECA VIRTUAL de Derecho, Economía y Ciencias Sociales

LA CIENCIA Y TECNOLOGÍA EN EL DESARROLLO
UNA VISIÓN DESDE AMÉRICA LATINA

Silvana Andrea Figueroa Delgado y otros


 

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O GOVERNO VARGAS E A REGULAÇÃO DO TRABALHO: CIÊNCIA E TECNOLOGIA NA FORMAÇÃO DO TRABALHADOR IDEAL

Gabriela Carames Beskow* Maria Sarita Mota**

Introdução

Há uma longa tradição intelectual que compreende a ciência e a tecnologia como motoras do desenvolvimento econômico e social. Neste aspecto, a transformação do conhecimento em valor econômico, pelo qual se assentou os países industrializados, tornou-se um desafio contemporâneo dos países periféricos exportadores de matéria prima (sobretudo no pós-2ª Guerra Mundial) para alcançar seus objetivos de desenvolvimento. A condição de subdesenvolvimento impedia que a ciência e a tecnologia estivessem no centro de um processo de desenvolvimento nos países periféricos. Porém, o panorama atual da inovação em C&T nos países emergentes como o Brasil tem mudado muito rapidamente, não obstante o fato de ainda sermos consumidores de tecnologias e estarmos sob o cerco internacional do capitalismo globalizado que impõe barreiras para o acesso aos conhecimentos na área industrial e militar de importância estratégica para o crescimento econômico do país. Para Carneiro (2002) "desde o final do século XIX que a união entre a ciência e a indústria constituiu um sistema integrado de produção científica que abrange o sistema industrial empenhado na produção de inovações técnicas e as universidades e institutos de pesquisa tornando a ciência e a tecnologia indissociáveis e reciprocamente estimulantes de novos desenvolvimentos". Diz ainda o autor que a aliança do Estado com esses institutos de pesquisas permitiu "a integração de ciência pura e aplicada, produzindo resultados palpáveis e rápidos capazes de transformar condições de vida das populações e de produzir produtos úteis e rentáveis". De fato, essas mudanças foram mais sensíveis na área da saúde e continuam assim até os dias de hoje. Há que se destacar que, no Brasil, esta estratégia de intervenção do Estado na economia teve seu marco histórico no primeiro governo do presidente Getúlio Vargas (1930-1945). Trata-se de um período da história do Brasil que deixou uma herança política e social extensa e duradoura. A política econômica, baseada na intervenção estatal, bem como as instituições criadas para implantá-la, teve prosseguimento no fim da década de 1950 e início na de 1960 e, depois, no regime militar. Sob a bandeira do nacionalismo, os diferentes governos, democráticos ou autoritários, perseguiram o desenvolvimento. E é neste lastro histórico que situamos a gênese das políticas de C&T no Brasil. O Estado brasileiro, dentro dos parâmetros políticos da época (início da década de 1930), reconheceu a importância da C&T para o desenvolvimento econômico do país, isto é, do conhecimento tecnológico para a indústria. O Estado promoveu a criação de conselhos científicos, conselhos técnicos com a participação de empresários, institutos de pesquisa aplicada e agiu, sobretudo, na capacitação do trabalhador nacional para atender a nova indústria emergente no país. O efeito prático da qualificação do trabalhador era desejado no contexto dos novos processos econômicos mundiais e, internamente, no momento em que se consolidava uma sociedade urbana e burguesa no Brasil. Se a modernização do país passava pela urbanização e industrialização compreendidas como processos integrados e interdependentes do desenvolvimento científico e tecnológico (Carneiro, 2002), a regulamentação do trabalho foi uma proposta absolutamente nova no quadro político-social brasileiro, até então marcado pela representação da oligarquia rural, pelo clientelismo e ainda pela falta de uma legislação trabalhista. A intervenção do Estado na economia fomentou o desenvolvimento industrial e a proteção à indústria nascente; em termos políticos, absorveu uma burguesia urbana disponível e promoveu a incorporação do proletariado à sociedade moderna. A inovação social da década de 1930 era a proposta de uma tecnologia para a indústria e a formação do trabalhador ideal, nos moldes da nova subordinação do trabalho ao capital. Por outro lado, podemos citar como marco desta estratégia intervencionista do governo Vargas, a criação do Instituto Nacional de Tecnologia (1933) a partir da antiga Estação Experimental de Combustíveis e Minérios, no âmbito do Ministério da Agricultura, com o objetivo de "estudar o melhor aproveitamento das matérias-primas nacionais e de promover cursos de especializações para técnicos brasileiros", e a sua posterior subordinação ao Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio (MTIC). A vinculação do Instituto de Tecnologia ao MTIC revela o caráter da política econômica da época e pode nos dizer muito a respeito das ações de planejamento centralizado empreendidas para o desenvolvimento da C&T no Brasil. Não obstante as deficiências do setor, o Brasil tem uma rica história de construção da ciência e tecnologia cujo primórdio remonta ao início do século XIX, porém impossível de relatar nos limites deste trabalho1. Contudo, neste percurso, podemos destacar momentos chaves que nos permitem compreender o atual perfil do empreendimento científico-tecnológico brasileiro. Uma volta ao passado talvez possibilitasse entender algumas questões: por que a política científica quase sempre foi marcada pelo apoio restrito a determinada área? Por que os investimentos em C&T são arcados, majoritariamente, pelo setor público que mantêm a política nefasta de redução dos recursos disponíveis em P&D, dificultando a inovação e incorporação de novas tecnologias e mantendo o atraso em relação ao progresso técnico da economia mundial? Ressaltaremos, no âmbito deste trabalho, que o avanço da industrialização brasileira na década de 1930 foi um elemento dinamizador do desenvolvimento da ciência e da tecnologia no Brasil. Se a produção da riqueza requer aumento da produtividade, que se vincula, por sua vez, a qualificação do trabalhador, qual teria sido o papel que a ciência desempenhou no governo Vargas, no período de 1930-45, e os impactos tecnológicos sobre o mundo do trabalho?

O contexto da modernização econômica do Brasil (1930-1945)

a ciência e a tecnologia podem desempenhar um papel estratégico no Brasil, dada a necessidade de melhorar a produtividade da economia, enfrentar os problemas de pobreza, educação, saúde e deterioração ambiental e participar da maneira mais plena em um mundo cada vez mais integrado social e economicamente (Schwartzman, 1995: VII).

O período do primeiro governo de Getúlio Vargas (1930-1945) é considerado pela historiografia como um momento chave no processo de modernização econômica do Brasil. As crises internacionais e o momento de reconstrução ideológica pelo qual passavam diversos países latino-americanos, optando por uma maior intervenção do Estado nos diversos ramos da vida do país e da sociedade, favoreciam a mudança de direcionamento político e econômico. Tornou-se necessário que o Estado brasileiro elaborasse projetos de desenvolvimento para o país, sustentados em novas bases, sobretudo tecnológicas. Com o esgotamento do modelo agrário exportador, era preciso promover o desenvolvimento do país sobre novas diretrizes econômicas com fins de diminuir o grau de dependência diante das dinâmicas do mercado internacional. Entre esas novas diretrizes, é importante destacar o impulso à industrialização (visando principalmente à substituição de certos produtos importados); a diversificação da agricultura brasileira e a consolidação de um mercado interno forte. Outro ponto fundamental era a modernização das relações capitalistas de produção com a qualificação e a regulação da mão-de-obra nacional. Assim, se produziu no Brasil a primeira ruptura no que diz respeito ao avanço da acumulação capitalista do país, com a superação do capitalismo de base agrária e comercial, voltando-se, gradualmente, para a implantação de um núcleo básico de indústrias de bens de produção e o fomento ao mercado interno. As atividades exportadoras continuaram a desempenhar um importante papel como geradora de divisas fundamentais para garantir a continuidade das importações necessárias ao crescimento industrial, porém sem manter sua posição de variável essencial para a manutenção da renda interna do país (Fonseca, 1989: 184). Para consolidar essas mudanças em prol do desenvolvimento do país, sobretudo buscando alternativas para os problemas gerados pela guerra mundial, paralelamente à necessidade de aumentar a produção ou constituir novas bases de atividades, ocorreu uma redefinição do papel do Estado em matéria econômica e política. Em discurso, Vargas afirmava a necessidade de o Estado assumir uma postura interventora:

Na época em que os fins sociais são preponderantemente econômicos, em que se organiza de maneira científica a produção e o pragmatismo industrial é levado a limites extremos, assinala-se a função do Estado, antes, e acima de tudo, como elemento coordenador destes múltiplos esforços, devendo sofrer, por isso, modificações decisivas... A época é de assembléias especializadas, dos conselhos técnicos integrados à administração. O Estado, puramente político, no sentido antigo do termo, podemos considerá-lo, atualmente, entidade amorfa, que, aos poucos, vão perdendo o valor e a significação (Vargas, s.d.: 119-120).

Fonseca (1989) afirma que o intervencionismo era justificado nos discursos varguistas principalmente pela eficiência e impessoalidade. Eficiente, pois se baseava em critérios científicos para a tomada de decisões; e impessoal, pois envolvia a construção de um Estado que estava acima dos interesses de classes, governando em prol do interesse da sociedade como um todo. Ainda segundo o autor, muitas vezes no discurso do Estado se atribuía ao intervencionismo o objetivo de alcançar o desenvolvimento econômico.

O que mais tarde seria vagamente chamado de 'ideologia desenvolvimentista' -e que reflete, em várias formas, o compromisso dos diversos governos com o desenvolvimento das forças produtivas e, mais especificamente, com a industrialização do país- teve seu aparecimento durante o Estado Novo (Fonseca, 1989: 256).

As transformações capitalistas ocorridas após a crise de 1929 que tiveram reflexos em todo o cenário mundial, na realidade, resultaram de um processo de mudanças que teve início anteriormente. Observa-se, desde o fim da Primeira Guerra Mundial, a transferência da hegemonia inglesa (tradicionalmente ligada à importação de matérias primas e bens de consumo de origem agrícola) para a norte-americana (que possuía um setor primário mais sólido e diversificado). É importante também destacar que nesse período ocorreu uma complexificação das indústrias européias e norte-americanas, que eram direcionadas para atividades de ponta assentadas na pesquisa tecnológica (Fonseca, 1989: 185). Neste contexto, crescia a importância da ciência e da tecnologia para o desenvolvimento econômico e social dos países latino-americanos, que ganharia força principalmente no período do pós-guerra, ainda que não se possa falar em uma política científica e tecnológica da maneira como a concebemos atualmente, isto é, efetivamente implementada com recursos voltados para a melhoria do sistema produtivo como um todo2. Schwartzman, um dos principais autores a tratar do assunto na historiografia brasileira, afirmou que:

no período anterior à Segunda Guerra, a atividade tecnológica e a pesquisa científica tinham uma área de intersecção relativamente pequena. Havia a tecnologia da indústria tradicional... que era um tipo de conhecimento que havia se desenvolvido e permanecia restrito no setor industrial; e havia uma ciência que era predominantemente acadêmica... organizada nas Academias de Ciências ou nas Universidades. Em algumas áreas havia uma superposição, uma interpretação da ciência e da atividade aplicada... Essa situação muda dramaticamente com a Segunda Guerra Mundial. Na realidade, ela começa a mudar já antes, numa discussão que começa a haver na Europa a respeito do relacionamento entre a atividade científica e o Estado (Schwartzman, 1989).

Essa discussão apontada pelo autor, originária da União Soviética e que influenciou também os debates em países como a Inglaterra e a França, girava em torno da idéia de que a ciência era uma atividade que deveria estar fundamentalmente ligada à atividade produtiva, como fator de produção, sendo colocada a serviço do esforço do desenvolvimento econômico e social. Assim, a questão da intervenção ou não do Estado no processo de desenvolvimento, como fomentador da ciência e da tecnologia, assumia posição central nesta discussão. O cenário brasileiro apareceu de forma diferenciada nas discussões internacionais sobre a questão da ciência e tecnologia no período Vargas. O discurso do presidente mostra conhecimento sobre as ações de outros países em investimentos científicos para o desenvolvimento do processo produtivo. Porém, Schwartzman (1989) ressalta a inexistência, no Brasil, de um aprofundamento das discussões em torno de qual seria os espaços da atividade acadêmica, da autonomia do cientista e da autonomia da pesquisa, ou seja, das políticas de ciência e tecnologia no país e o grau de interferência que caberia ao Estado sobre a atividade científica. Apesar da dificuldade de se falar de uma política varguista para a ciência e tecnologia no período abordado, é possível a percepção de que os aportes científicos da época faziam parte das medidas econômicas e transformações institucionais que marcaram, a partir de então, uma nova etapa nas relações entre Estado e sistema político-econômico. Essa nova etapa pode ser caracterizada a partir de dois aspectos principais: a criação de instituições científicas e uma capacidade de governança que permitiram a formação de um contexto institucional favorável aos novos projetos de desenvolvimento propostos, e que envolviam o investimento em ciência e tecnologia. Segundo as proposições da Economia Institucional, o desenvolvimento econômico de um país estaria profundamente ligado às características das suas instituições econômicas, políticas e jurídicas. Estas teriam a capacidade de influenciar o comportamento das pessoas e das organizações, assim como os mecanismos de alocação de recursos, a partir do sistema de incentivos que estabeleceram para a sociedade ao cumprir seu papel maior, que era o de reduzir as incertezas presentes nas relações entre os diversos atores sociais. Na visão clássica de Schumpeter, o desenvolvimento econômico teria como ingrediente básico a existência de um conjunto de instituições e órgãos com características impessoais, integradas e pragmáticas, capazes de sustentar a dinâmica de desenvolvimento requerida pelo sistema capitalista. Deste modo, o papel principal assumido pelo Estado no período estudado será a "criação de órgãos e institutos que incentivem o investimento industrial ao contribuir com a indústria privada na tarefa de planejar, estimular e promover, de forma organizada, o desenvolvimento econômico nacional" (Carraro & Fonseca, 2003: 6-7). A burocratização, a racionalização e a centralização de decisões funcionaram como eixos da ação interventora do Estado brasileiro em diversos aspectos, entre os quais destacaremos aqui a questão econômica e, especialmente, a questão produtiva. A racionalização do processo produtivo tornava-se questão central para as propostas de desenvolvimento econômico. Fonseca (1989:201) destaca que a racionalidade como manifestação e exigência da ordem capitalista foi amplamente explorada por Max Weber. Para este pensador, a racionalidade estaria ligada também à noção de modernidade e a aliança entre capitalismo/racionalismo/modernização apareceu configurada na própria ideologia burguesa, como buscou demonstrar em A ética protestante e o espírito do capitalismo. No Brasil, a tríade burocratização/racionalização/centralização refletiu-se, principalmente, na valorização do saber técnico, que teve como expressão a criação de diversos órgãos técnicos, conselhos consultivos, agências, institutos, entre outros, onde se deu a canalização de demandas dos diversos setores sociais para dentro do próprio Estado, que podia desta forma administrar os conflitos existentes. Todas estas instâncias criadas seriam formadas por técnicos capacitados a impulsionar as diversas atividades necessárias para a promoção do desenvolvimento. Em resumo, Eliz Diniz constatou que, a partir de 1930,

instaura-se uma arquitetura político-institucional, que vai combinar a centralização do poder à ampliação da autonomia e da capacidade de intervenção do Estado brasileiro, expandindo também a capacidade de incorporação do sistema político e quebrando a rigidez da estrutura de poder pré-existente (Diniz, 2004: s.p.).

Entre os órgão e conselhos criados entre 1930 e 1937 e ligados diretamente à atividade industrial, destacamos o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio (1930), o Departamento Nacional do Trabalho (1931), o Conselho Federal do Comércio Exterior, o Plano Geral de Viação Nacional e a Comissão de Similares (1934) e o Conselho Técnico de Economia e Finanças(1937). Outro órgão técnico criado no período e que merece destaque é o Instituto Nacional de Tecnologia (1933). Esta instituição tinha como finalidade "estudar o melhor aproveitamento das matérias-primas nacionais e de promover cursos de especializações para técnicos brasileiros" (Schwartzman, 1989). Essas medidas se tornavam fundamentais em um contexto de crise internacional, quando o país passou a empreender uma política de substituição das importações. Atrelado primeiramente ao Ministério da Agricultura, e depois ao do Trabalho, Indústria e Comércio, o Instituto atuou principalmente nos estudos técnicos para o conhecimento e aprimoramento do uso de matérias-primas, podendo-se destacar o caso das pesquisas sobre o álcool combustível e sobre o petróleo. É possível perceber a presença que o saber técnico adquire neste período, e como ele será utilizado para legitimar as ações políticas do Estado. A força do técnico advém, segundo Draibe

de um lado, da incapacidade dos interesses econômicos se imporem antes e previamente ao nível das forças reguladoras do mercado. Trazidos para dentro do Estado, esta incapacidade se renova; os distintos interesses se defrontarão em cada uma das arenas, e as alianças que se estabelecem em cada órgão são efêmeras, pois se constroem em torno de projetos ou medidas isoladas. Este é o espaço da atuação mais 'independente' e politizada da burocracia. Dada a interpenetração das políticas e seu grau de complexidade, o conhecimento especializado e, principalmente, o domínio pelo técnico sobre o conteúdo das decisões e de suas repercussões, capacitam-no a operar como pivot nos sistemas de forças e nas alianças entre grupos de interesse e nas articulações interburocráticas em torno de alvos comuns (apud Fonseca, 1989: 267).

Apesar de não podermos falar da existência de uma política de Ciência e Tecnologia durante o primeiro governo Vargas nos moldes que a concebemos na atualidade, a análise de fontes do período nos permite identificar a existência de políticas pontuais. Tais procedimentos buscavam promover a racionalização do processo industrial como forma de garantir aumento da produtividade e adaptar a economia do país à nova fase do desenvolvimento capitalista mundial. No campo econômico evidenciava-se a necessidade de um aparato técnico e enfatizava-se a necessidade de investimento em pesquisa como base para a ação política.


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