CARLOS GOMES
PRODUZIR PARA QUÊ ?
Naturalmente os produtos destinam-se a satisfazer necessidades individuais dos membros duma sociedade ou necessidades colectivas provenientes duma vida agrupada, estas também denominadas necessidades sociais.
Entre a produção e a satisfação das necessidades estabelece-se uma estreita interdependência. O desenvolvimento da produção dá origem ao aparecimento de novas necessidades e, por sua vez, estas suscitam a aparição de outras que acabam por influir na própria produção.
As necessidades consideradas primordiais devem ser satisfeitas de forma contínua e, quando atendidas, os indivíduos empenham-se em satisfazer as restantes. A fronteira entre umas e outras depende do género de vida e do nível de civilização. O progresso da sociedade tende a diversificar e a multiplicar as necessidades e os desejos.
Numa determinada época ou determinada região as necessidades económicas são função da estrutura da sociedade em que o homem vive. Diferem consoante o modo de produção, o meio ambiente, multiplicam-se em função do processo de trabalho, com o aperfeiçoamento dos meios de trabalho, a evolução dos meios técnicos e científicos.
Próximo da necessidade encontra-se o
interesse que pode assumir um carácter individual, de grupo ou de classe.
O interesse manifesta-se na ânsia de alcançar um determinado objectivo ou
meta e nas acções tendentes à sua consecução.
Tanto as necessidades como os interesses intervêm como fonte de actividade
e estimulam a actuar duma determinada maneira e dum determinado sentido.
Este estímulos denominam-se motivações.
Como aptidão técnica para satisfazer uma necessidade, a utilidade possui um carácter objectivo. Para o economista possui ainda um carácter subjectivo, pois a utilidade varia conforme a maior ou menor intensidade da necessidade. Como úteis, sob o ponto de vista económico, são qualificados todos os bens ou serviços que correspondem a necessidades ou desejos independentemente de serem naturais, fictícios, imaginários, viciosos ou prejudiciais, desde que exista produção, distribuição e consumo, em suma, desde que exista trabalho.
No sistema comunitário a produção baseia-se no trabalho individual ou de grupo e realiza-se para seu próprio consumo ou troca acidental. Destina-se à satisfação directa das carências biológicas, culturais ou sociais O mesmo acontece ainda nas formas de produção para auto consumo individual ou dum grupo humano fechado.
No sistema pré-capitalista, em que o produto se transforma também em mercadoria, dá-se uma rotura entre a actividade produtiva e o processo de satisfação das necessidades. A produção adquire uma nova finalidade, como meio de pagamento dum tributo, duma renda em espécie ou em dinheiro, ou como meio de troca.
No sistema capitalista, a lógica da produção não consiste apenas na obtenção de bens económicos destinados a satisfazer necessidades, mas também a forçar o consumo com o objectivo único da maximização do lucro. A motivação do lucro e da valorização do capital leva os produtores e comerciantes a suscitar desejos individuais ou colectivos prescindíveis. Inventam-se necessidades para estimular o consumo. Cria-se a chamada sociedade de consumo que contraria a noção ética de utilidade. A lógica da actividade económica altera-se, passando a produção e a obtenção do lucro a comandar o consumo e não o inverso. A actividade económica decompõe-se assim em duas espécies distintas conforme se destina a satisfazer as necessidades efectivas ou se destina à criação artificial de outras necessidades para provocar uma procura geradora de lucros e riqueza.
Pode inferir-se que a actividade produtiva não é apenas dominada pela satisfação das necessidades, mas também pela acumulação de excedentes e por interesses da sociedade como um todo, das classes ou grupos sociais, definidos pela sua posição dentro de relações económicas e sociais determinadas.