Revista: TURYDES
Turismo y Desarrollo local sostenible / ISSN: 1988-5261


HISTÓRIA, CULTURA E GASTRONOMIA DAS MISSÕES JESUÍTICAS DO RIO GRANDE DO SUL

Autores e infomación del artículo

Aline Prestes Roque*
Instituto Federal Farroupilha
aline.roque@iffarroupilha.edu.br

Camila Nemitz de Oliveira Saraiva**
Instituto Federal Farroupilha
camila.oliveira@iffarroupilha.edu.br

Lurdes Marlene Seide Formming***
Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul
lurdesf@unijui.edu.br

Daniel Knebel Baggio****
Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul
danibaggio@gmail.com


RESUMO
Esta pesquisa propõe-se a investigar a configuração da cultura gastronômica presente em três municípios missioneiros, São Borja, Santo Ângelo e São Miguel das Missões. O objetivo foi de resgatar suas origens, identificar possíveis reflexos da alimentação jesuítica na gastronomia e cultura local e propor alternativas de desenvolvimento turístico dos lugares com base na gastronomia local. Metodologicamente foram utilizados dados primários coletados através de entrevistas realizadas com entidades públicas, privadas e historiadores identificados como sujeitos ligados à cultura missioneira histórica e gastronômica. Os dados secundários foram coletados através de livros, sites da internet, artigos, dissertações relacionadas à área. A partir dos resultados concluiu-se que a gastronomia aliada ao turismo se constitui em um produto que pode ser fonte de desenvolvimento econômico, cultural, social e ambiental nos municípios pesquisados.

Palavras-chave: Gastronomia, Turismo, Missões Jesuíticas, Desenvolvimento, Cultura.

HISTORY, CULTURE AND GASTRONOMY OF JESUIT'S MISSIONS OF RIO GRANDE DO SUL

ABSTRACT

This research intends to investigate the configuration of gastronomic culture present in three municipalities missionaries, São Borja, Santo Ângelo and São Miguel das Missões. The objective was to rescue its origins, identify possible reflections of the Jesuit food in the local gastronomy and culture and propose alternatives of development of the places based on the local gastronomy. Methodologically, we used primary data collected through interviews with public and private entities and historians identified as subjects linked to the historical and gastronomic missionary culture. Secondary data were collected through books, internet sites, articles, dissertations related to the area. From the results it was concluded that the gastronomy allied to tourism constitutes a product that can be a source of economic, cultural, social and environmental development in the cities surveyed.

Keywords: Gastronomy, Tourism, Jesuit Missions, Development, Culture.

HISTORIA, CULTURA Y GASTRONOMÍA DE LAS MISIONES JESUÍTICAS DEL RIO GRANDE DO SUL

RESUMEN

Esta investigación se propone investigar la configuración de la cultura gastronómica presente en tres municipios misioneros, San Borja, Santo Angelo y San Miguel de las Misiones. El objetivo fue de rescatar sus orígenes, identificar posibles reflejos de la alimentación jesuítica en la gastronomía e cultura local y proponer alternativas de desarrollo de los lugares con base en la gastronomía local. Metodológicamente se utilizaron datos primarios recogidos a través de entrevistas realizadas con entidades públicas, privadas e historiadores identificados como sujetos ligados a la cultura misionera histórica y gastronómica. Los datos secundarios fueron recolectados a través de libros, sitios web, artículos, disertaciones relacionadas con el área. A partir de los resultados se concluyó que la gastronomía aliada al turismo se constituye en un producto que puede ser fuente de desarrollo económico, cultural, social y ambiental en los municipios investigados.

Palabras clave: Gastronomía, Turismo, Misiones Jesuíticas, Desarrollo, Cultura.

Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Aline Prestes Roque, Camila Nemitz de Oliveira Saraiva, Lurdes Marlene Seide Formming y Daniel Knebel Baggio (2018): “História, cultura e gastronomia das missões jesuíticas do Rio Grande do Sul”, Revista Turydes: Turismo y Desarrollo, n. 25 (diciembre / dezembro 2018). En línea:
https://www.eumed.net/rev/turydes/25/gastronomia.html
http://hdl.handle.net/20.500.11763/turydes25gastronomia


1. INTRODUÇÃO

No Sul da América Latina iniciou-se, no século XVII, um processo inovador de grande desenvolvimento, organizado em sistema de reduções Jesuíticas Guaranis, os chamados Sete Povos das Missões. A vida comunitária nesta época era desenvolvida em função da Praça Missioneira e tendo como centro a Igreja, que seguia os padrões estéticos do barroco, vigente no período. Desenvolveu-se, por volta de 150 anos, uma cultura cujos remanescentes reportam a seus bens tangíveis, sendo desenvolvidos, principalmente, na área da arquitetura e das artes, bem como na organização social e na política das comunidades, as quais se tornaram heranças patrimoniais (Pinto, 2012).
No século XXI se tem como entendimento de desenvolvimento as heranças patrimoniais, visualizadas não apenas pelos museus e prédios históricos, quais se inserem no desenvolvimento econômico-social, introduzidos nas relações cotidianas da sociedade, também os patrimônios intangíveis, como é o caso da gastronomia. A divulgação deste patrimônio aumenta as possibilidades do turismo cultural de um local, fato que indica a gastronomia como mais que arte culinária, mas como um importante viés da cultura popular e da forma de viver em cada região em determinada época (Arizpe & Nalda, 2003).
Essa cultura diferenciada é entendida através de conceitos dinâmicos, cumulativos, de transformação, identificação, adaptação e recriação do cotidiano vivenciado pelos atores presentes na comunidade. Ainda, compreende as manifestações e relações comunicativas da língua, dos hábitos e costumes alimentares, das tradições preservadas, da arte espiritual e festiva, enfim, dos processos criados pela coletividade local (Saraiva, 2015).
A dimensão social e cultural da gastronomia pode ser prescrita ao complexo emaranhado das políticas de patrimônio cultural. Assim, a forma que o turismo se utiliza desse patrimônio vem determinando para a gastronomia elementos que adquiram cada vez maior relevância para divulgar um lugar (Schlüter, 2003). Nesta visão, o desenvolvimento patrimonial intangível a gastronomia tem como objetivo fazer com que as comunidades que residem em regiões históricas percebam a significante importância do bem patrimonial que possuem.
Desta forma, a herança cultural deixada pelas Reduções Jesuíticas, remetem à definição da própria identidade cultural do lugar, implica em distinguir os princípios e valores que marcam a identidade e as características da região missioneira, situada no noroeste e oeste do Estado do Rio Grande do Sul. Hall (1994) refere-se à herança como algo que pode ser conservado, aumentado e até mesmo usado. Neste sentido, é um recurso que pode ser administrado e compartilhado por determinada sociedade gerando o seu desenvolvimento.
Na região das Missões nos últimos anos, frente às mudanças nos hábitos, já se percebe ações voltadas para o desenvolvimento do turismo e a valorização dos bens intangíveis, tais como festas e manifestações artísticas. Sendo assim, tem se valorizado as relações e o modo de fazer enraizados no cotidiano da comunidade missioneira. Foram criados diversos produtos turísticos que visam potencializar a região através dos seus monumentos históricos, o artesanato e a gastronomia como atrativos ao desenvolvimento do turismo na região (Pinto, 2012).
Na concepção de Filho e Santos (2012) se não fosse o gargalo gerado pela insuficiente infraestrutura, pela burocracia estatal, pela falta de planejamento no território missioneiro, o contingente de turistas que visita as Missões Jesuítas poderia ser aumentado. Os mesmos autores ressaltam que o noroeste e o oeste do estado do Rio Grande do Sul são considerados regiões periféricas em relação aos grandes centros. Neste sentido, o melhoramento, a valorização e a preservação do patrimônio cultural, são fontes de fomento e de alternativa de desenvolvimento local (Filho & Santos, 2012).
Como as diversas áreas de estudo que proporcionam o desenvolvimento patrimonial, a gastronomia apresentada como cultura e ciência vem contribuir de forma a fomentar o desenvolvimento da região das Missões.
Diante disso, o artigo propõe-se identificar o papel da gastronomia como propulsora de desenvolvimento turístico de lugares em três municípios Missioneiros do Rio Grande do Sul, São Borja, Santo Ângelo e São Miguel das Missões. Para se chegar a tal objetivo foi necessário investigar a configuração da cultura gastronômica presente nestes municípios e resgatar suas origens, identificando possíveis reflexos da alimentação jesuítica na gastronomia local.

2. APORTE TEÓRICO
 
2.1. Gastronomia, cultura e identidade como agentes do desenvolvimento local e de lugares

A alimentação é um fator que acompanha o homem desde sua existência, e é responsável por importantes modificações na vida do ser humano. Com o avanço do conhecimento científico, o alimento, que antes era relacionado à subsistência e manutenção da espécie, passou a ser reconhecido como de importância nutricional. Por meio dos alimentos, são adquiridos todos os nutrientes necessários, para a manutenção das funções vitais do corpo (Franco, 2006).
Assim, o ritual da comida é praticado todos os dias e em todos os lugares, tornando-se muito comum e parte do dia-a-dia do ser humano. Além disto, é um fator de diferenciação de grupos sociais e práticas culturais com base no que se come, na forma de preparo, na ingestão da comida, nos processos de convivialidade atrelados nos ciclos de alimentação diária (Schlüter, 2003).
A alimentação está ligada aos vários setores de produção, abastecimento e consumo, ou seja, agricultura, pecuária, indústria alimentícia, mercados, feiras, entre outros. Quando se analisa a alimentação sob o aspecto das tradições culturais sociais, religiosas e das preferências de paladares ligados ao alimento de determinada população, menciona-se a gastronomia.
Na visão de Brillat-Savarin (1995), a gastronomia pode ser identificada, através de toda a relação do homem na medida em que ele se alimenta, como uma fonte de prazer que é sentida através dos sentidos, ressaltado pelo paladar ou gosto. O mesmo autor remete-nos à mesma ideia de Schlüter (2003), de que a alimentação pode ser um fator de diferenciação de grupos, comunidades, regiões ou países. Ainda, sobre este mesmo aspecto Da Motta (1987, p. 22) acrescenta que “a comida é um meio de expressão e afirmação de uma identidade nacional, regional, ou local, o ato de comer materializa os estados emocionais e as identidades sociais”.
Os elementos intangíveis subjacentes como a gastronomia realocam a cultura e podem cooperar de múltiplas formas. A cultura deve ser avaliada como um processo de compreensão e transformação de lugares, no qual se estabelecem relações inerentes entre diferentes aspectos da vida humana e ao qual se incorporam normas econômicas, sociais, intelectuais, entre outros (Oliveira & Marinho, 2006).
A cultura é o âmbito básico, onde uma sociedade gera valores e os transmite de geração em geração (Kliksberg, 2001). A sociedade baseada na cultura do consumo enfrenta uma crise de identidade e está voltando-se para o consumo como ponto de referência para sua identificação (Hall, 2006). Os sujeitos estão buscando, através do consumo de bens e produtos, o sentimento de pertencimento a um lugar, a um local, a um grupo social e cultural.
Estão surgindo tendências que se baseiam em um consumo diferenciado, para contrapor os padrões de consumo global que estão baseados na praticidade, na rapidez e na obsolescência. Estas tendências buscam uma valorização de estilos de vida mais ligados a aproximação com a natureza, ao cultivo dos costumes e práticas, das sociedades ditas tradicionais, que resgatam os saberes fazeres e modos de vida ‘antigos’, habituais, da mesma maneira que com os laços de solidariedade, aspectos até então desconsiderados à dinâmica da sociedade global (Vendruscolo, 2009, p. 25).
Sendo assim, Vendruscolo (2009) reitera que o consumo de bens materiais e imateriais ligados a sensações do simbólico, do pertencimento a um grupo cultural local ou a uma etnia, apresenta-se como tendência atual. “Pode-se dizer que, ao consumir um produto ou serviço, o indivíduo busca consumir uma identidade, um sentimento de pertencimento expresso nas narrativas incorporadas aos produtos e serviços” (Vendruscolo, 2009, p. 25).
Quando a sociedade se identificar como pertencente a um determinado grupo social e se comprometer com a valorização da sua cultura, na percepção de Oliveira; Marinho (2006), passa-se a reconhecer a sua história coletiva e identitária como um instrumento para resolução de problemas e percalços compartilhados. Sendo assim, para os mesmos autores, a cultura é uma das alternativas chave para a busca de aspectos que promovem o desenvolvimento local. A identidade coletiva de um povo propicia novas possibilidades de desenvolvimento socioeconômico e cultural, principalmente nos casos de comunidade tradicional (Oliveira & Marinho, 2006).
Lévi-Strauss (como citado em Matte, 2004, p. 62) refere-se que para a preservação das diversidades culturais de conteúdos e formas de expressões sociais é importante prever, compreender e promover as suas contribuições de maneira que cada uma destas se manifeste e seja mais generosa que a outra. Não basta apenas acalentar tradições locais do passado, para mantê-las, “o que deve ser salvo não é o conteúdo histórico que cada época lhe deu e que nenhuma sociedade seria capaz de perpetuar para além de si mesma.”
Sendo assim, a apresentação deste patrimônio intangível deve ser compreendida como necessidade de partir do conceito de instrumento de valorização e proteção de uma prática cultural, de forma que a gastronomia não pode ser vista como um conhecimento que se encerra no preparo de um prato, mas sim como algo que agrega, por trás daquele produto final, um universo simbólico que envolve conhecimentos, práticas e tradições, resgatando o legado das mais diversas culturas (Schlüter, 2003).
A gastronomia também é identificada como um dos setores de hospitalidade que influenciam o consumo, pois o alimento atende às tradições, identidades e costumes sociais de um povo. A localização, o clima, os recursos naturais e a infraestrutura são fatores importantíssimos para identificar o potencial de um lugar, mas para que haja o desenvolvimento deste local devem ser observadas e valorizadas as competências humanas. O sucesso do desenvolvimento de lugares, segundo Kotler, Haider e Rein (1993), parte da identificação de um conjunto de aspectos que se inter-relacionam, como a interpretação do meio em que se está inserido, a percepção das necessidades e dos comportamentos dos intervenientes que o rodeiam, a construção de um plano e de uma visão futura e realista de como o lugar poderá ser e o que poderá oferecer, além da concretização de uma organização efetiva que avalie e coloque em prática todas as etapas deste processo.
Froemming (2012) menciona que ao relacionar localidades como produtos que precisam atrair adotantes numa relação de oferta e demanda, as estratégias de marketing de lugares se oferecem como potentes agentes de planejamento para o desenvolvimento. Sendo assim, os municípios de São Borja, Santo Ângelo, São Miguel das Missões e região têm uma oferta diversificada em nível histórico, monumental e gastronômico que poderá ser desenvolvida, preservada e promovida para propulsionar o desenvolvimento dos locais implicados.
Nas Américas, a cultura alimentar associa-se fortemente aos povos dos colonizadores e imigrantes que trouxeram diferentes hábitos, uma diversidade de alimentos e temperos, de costumes e necessidades (Schlüter, 2003), além dos nativos que aqui já viviam. Na concepção de Martins (2003), a cozinha brasileira é o resultado das influências portuguesas, negra e indígena, mas também de outros imigrantes que aqui se instalam: italianos, alemães, japoneses, espanhóis, árabes, suíços e outros. A região das Missões Fronteira - oeste e Noroeste do Rio Grande do Sul fazem parte desta miscelânea de sabores e miscigenação de costumes.

2.2. Turismo e cultura local

O turismo é um setor prestador de serviços, e tem o papel relevante na economia de lugares que o utilizam como ferramentas de desenvolvimento. Masina (2002) argumenta que os impactos econômicos positivos do turismo provocam um aumento da renda na economia do país receptivo, estimulando novos investimentos, gerando empregos diretos e indiretos.
O autor considera que além dos ganhos econômicos, o turismo bem planejado realça outros importantes aspectos socioculturais, como: melhor nível de escolaridade, qualificação da mão de obra e desenvolvimento de uma consciência da preservação ambiental e cultural.
É importante mencionar a ligação do turismo com os outros setores da sociedade, bem como a importância do fomento da atividade pelas políticas públicas, não apenas como fonte de divisas, mas ainda como uma prática saudável de lazer. Como suporte Barreto (2000) infere que o fenômeno ou atividade turística, apresenta um aspecto social tão importante quanto o desenvolvimento econômico. Ou seja, o autor, expõe a possibilidade de expansão do ser humano através do divertimento ou pela oportunidade de conhecer novas culturas e enriquecer seus conhecimentos por meio de viagens.
A mesmo autor explica que o turismo possui um aspecto social tão importante quanto o econômico, pois dá possibilidades de o ser humano se expandir, se divertir e conhecer novas culturas. A autora afirma ser uma atividade que merece atenção por parte do poder público por trazer divisas e lazer tanto para quem pratica como para quem recebe. O turismo pode ser considerado como o fenômeno social que consiste no deslocamento voluntário e temporário de indivíduos ou grupos de pessoas que, fundamentalmente por motivos de recreação, descanso, cultura ou saúde, saem do seu local de residência habitual para outro (Barreto, 2000).
Boullón (1991) explica que a melhor forma de determinar um espaço turístico é analisando empiricamente a distribuição territorial dos atrativos, definindo agrupamentos e concentrações proeminentes. Neste sentido, o turismo cultural no contexto gastronômico possibilita aos turistas conhecer os costumes, tradições culinárias e a história do lugar visitado, através da exploração de suas tradições, muitas populações locais usam seus costumes como um atrativo turístico, propendendo atrair os turistas para suas localidades. 
O turismo como atividade cultural além de ser um importante instrumento de promoção social e de dinamização econômica, é também principalmente, uma atividade cultural. “Conhecer lugares, assistir à apresentação de manifestações artísticas, degustar pratos peculiares de cada região, compartilhar com nativos a experiência de uma feira local, é conhecer elementos que dizem respeito a pessoas e suas sensibilidades, suas normas e valores, suas emoções”. É considerado como um exercício de se empatia, de se colocar “por alguns momentos na condição do outro, que experimenta aquilo que, aos turistas, é proporcionado fortuitamente” (Martins, 2003, p. 59).
O turismo gastronômico cultural, também contribui para o desenvolvimento das comunidades locais. Neste contexto, Figueiredo (2006) assevera que a concepção de desenvolvimento aí presente não se resume ao desenvolvimento econômico, abarcando também a melhoria de qualidade de vida dos atores sociais envolvidos.
Há múltiplos aspectos na cultura de cada povo que pode favorecer seu desenvolvimento econômico e social, bem explicados por Inglesias (como citado em Kliksberg, 2001, p. 107) “é preciso descobri-lo, potencializá-los, e apoiar-se neles, e fazer isto com seriedade significativa, rever a agenda do desenvolvimento de um modo que resulte, posteriormente, mais eficaz, porque tomará em conta potencialidades da realidade que são de sua essência e que, até agora, foram geralmente ignoradas”.
O turismo cultural corresponde a valores criados pelo homem como cultura, tradição e história. A identidade dos povos e, também, por consequência e até em razão do princípio de alteridade que lhe é inerente, a diversidade cultural. No turismo cultural, a motivação central corresponde à busca do conhecimento, busca essa que envolve satisfação da curiosidade, inclusive em relação ao patrimônio humano (Irving & Azevedo, 2002).
O sistema social e cultural desenvolve uma hierarquia de valores para adaptarem-se as condições da sociedade, assim Beni (1998, p. 58) aloca que “como alternativa de lazer e tempo livre, o turismo deixa de ser atividade meramente utilitária, com todas as distorções provocadas por tal enfoque, passa a ser um espaço qualitativamente e superior, a partir do qual pode injetar renovada energia e informação aos sistemas social e cultural, para efeito de promover novas atitudes e realizações humanas”.
O autor refere-se ao turismo como uma atividade complexa, vinculada ao movimento de pessoas. Caracteriza o turismo como gerador de um modelo denominado SISTUR que significa o sistema de gerenciamento do turismo, que é formado pelos ambientes econômico, social, ambiental e cultural. Isso significa que o turismo é uma atividade que ao ser desenvolvida interfere em determinado local, ou seja, o turismo é uma atividade que causa impacto em seu ambiente (Beni, 1998).
No entanto, para a atividade econômica acontecer, de fato, é importante que exista uma estrutura. Desta forma, ao planificar atividade turística é possível observar se existe planejamento, interferência de políticas públicas, atrativos turísticos, equipamentos turísticos e serviços turísticos (Beni, 1998). Assim, o desenvolvimento local não está necessariamente ligado apenas ao crescimento econômico, mas também se relaciona com o contexto social, a melhoria da qualidade de vida das pessoas e com o resgate cultural e a conservação do meio onde vivem.
Por fim, a cultura, a cultura gastronômica, o turismo e o desenvolvimento vêm juntos, ganhando o pertencimento das pessoas quanto ao local em que residem, permitindo o percurso do tempo e do espaço turístico, consentindo o acesso ao passado e o reconhecimento dos bens culturais no presente.

2.3. História, Gastronomia e Cultura: período jesuítico até os dias atuais

As diferentes culturas existentes no Rio Grande do Sul são frutos das etapas de sua colonização e de diferentes agentes colonizadores, os quais determinaram atributos como atividades econômicas, densidade demográfica, tamanho das propriedades, e sistemas produtivos (Wagner, Giasson, Andrade & Machado, 2010).
Os jesuítas, a partir de 1609 atravessaram o Atlântico para vivenciar e participar das atividades dos índios guaranis, dentro dos princípios da fé cristã. Na margem esquerda do rio Uruguai, os padres Jesuítas foram os primeiros desbravadores da região das Missões e do Rio Grande do Sul. Com uma missa rezada no dia 03 de maio de 1626, o padre Roque Gonzáles fundava em solo gaúcho a primeira Redução Jesuítica, com o nome de “São Nicolau do Piratini’’, hoje reconhecida como “Primeira Querência do Rio Grande” (Schimidt, 2015).   
Os Sete Povos das Missões tornaram-se um importante centro econômico na época, tendo na produção de erva-mate, na extração de couro e na pecuária e suas principais atividades (até hoje consumida em massa pelas populações da região), produtos agrícolas como a mandioca e o milho e as reduções interagiam no comércio destes produtos, destinando os resultados à melhoria da infraestrutura das reduções (Rubert, 1994).
Na primeira fase missioneira fundaram 18 reduções, e ocuparam mais de 70% do atual território gaúcho. Introduziram o gado em 1634, modelo econômico e cultural que foi responsável pela criação das estancias, de tropeiros e das charqueadas (Schimidt, 2015).    
No lado brasileiro a presença dos jesuítas ocorreu em dois momentos distintos. A primeira fase (1626/1639) e a segunda fase em (1682/1768). Neste período na região das Missões, e as Reduções deste ciclo foram arrasadas pelos bandeirantes, entre 1636 e 1638, quais saqueavam os povoados em busca de gado e de índios, para serem vendidos como escravos nas lavouras açucareiras (Schimidt, 2015).
Da primeira fase não sobrou nenhuma ruina, mas o gado ficou espalhado pelo amplo território, se transformando em milhões de cabeças de gado e numa grande fonte de renda para o povo missioneiro. A segunda fase da presença jesuítica inicia 43 anos depois, em 1682, quando as invasões dos bandeirantes deixaram de ser ameaças. A partir daí os jesuítas começaram a retornar trazendo um novo modelo construtivo e de produção. Foi no início da formação dos Sete Povos das Missões, conduzidos pelos jesuítas até 1768, quando foram expulsos pelas forças conjuntas dos exércitos de Portugal e Espanha. São Miguel Arcanjo, o mais populoso dos Sete Povos, foi refundado em 1687 com 4.195 índios guaranis. O último dos povos foi a Redução de Ângelo Custodio consolidada em 1707 (Schimidt, 2015).
De um povo pouco afeito ao trabalho e à disciplina, Wagner et al. (2010) citam que os índios por meio de ensinamentos jesuítas, formaram cidades quase perfeitas, conseguiram preparar artesões, tecedores, tropeiros, artistas fundidores de sinos, escultores, pintores, e construtores de grande valia. Produzia-se algodão para vestir os índios, havia roças, horta e pomares para lhes complementar a alimentação. Tudo era fadado ao maior progresso e desenvolvimento.                       
Os Sete Povos das Missões eram formados pelas Reduções de São Nicolau do Piratini, São Francisco de Borja, São Luiz Gonzaga, São Miguel Arcanjo, São Lourenço Mártir, São João Batista e Santo Ângelo Custodio e da indústria missioneira, pois em cada Redução se encontrava de 40 a 50 oficinas com fundições de aço e ferro, erva mate e muitos outros. Toda esta produção era vendida para Europa e nos países da América.
No Brasil permanecem remanescentes quatro ruínas: São Nicolau (no município de São Nicolau), São Lourenço Mártir (no município de São Luiz Gonzaga), São Miguel Arcanjo (no município de São Miguel das Missões) e São João Batista (no município de Entre - Ijuís). As reduções de Santo Ângelo, São Luiz Gonzaga e São Borja estão nos municípios de mesmo nome, e os restos arqueológicos estão sob as cidades modernas que ali se construiu.
São inúmeros documentos e artefatos que restaram desta época, no dia 06 de dezembro de 1983, as ruinas da redução de São Miguel Arcanjo foram declaradas pela UNESCO como Patrimônio Histórico e Cultural da Humanidade, único localizado na região Sul do Brasil e que, em conjunto com as ruinas da Argentina, Paraguai, formam o conjunto dos Sete Patrimônios Mundiais Missioneiros.
Após o término da civilização implantada pelas Reduções Jesuítas, teve início o novo modelo de sociedade e desenvolvimento econômico da região das Missões. Este padrão começou a ser formado com a abertura de muitas fontes pioneiras de colonizações. Com a chegada dos imigrantes europeus de diferentes etnias, especialmente alemães, italianos, russos e poloneses, que passaram a ocupar as terras públicas ainda não colonizadas, a partir do fim do século XIX (Oliveira, 2011). A presença dos jesuítas foi fundamental para impulsionar uma nova etapa de crescimento para a região das Missões. Os padres jesuítas da Ordem voltaram ao Sul do Brasil em 1842, a partir de 1849, passaram a atuar nas novas colônias se tornando imprescindível na organização dos povoados, inclusive os missioneiros.          
Atualmente a economia da região das Missões está consolidada na agricultura familiar, na pecuária de médio e grande porte, com marcante expansão e mecanização das lavouras, além do fortalecimento das atividades industriais.
A região conta com a Associação dos Municípios das Missões (AMM), onde são associados vinte e seis municípios, que têm em comum a história e disposição de luta pelo crescimento econômico e social da região missioneira. Criada em 28 de maio de 1967, está entidade continua mantendo os mesmos princípios de seus idealizadores: atuar como alicerce na viabilização das reivindicações locais e regionais. Esse legado de luta vem dos fundadores dos municípios missioneiros que, com a ajuda dos padres Jesuítas, implantaram um modelo de desenvolvimento embasado na educação e na promoção da valorização humana (Schimidt, 2015).
Observa-se que os resquícios do período das reduções, juntamente com os elementos culturais do ‘Velho Mundo’ são fatores que contribuíram para a construção de uma identidade da região noroeste e fronteira - oeste do Rio Grande do Sul. São Borja, Santo Ângelo, e São Miguel das Missões são municípios, do Estado, que se destacam e são representados através de elementos incorporados e simbolizados do Patrimônio Histórico e Cultural das Missões (Pinto, 2012).
Conforme Arizpe e Nalda (2003), o patrimônio está arraigado dos produtos e das expressões dos sentimentos, dos pensamentos e das ações dos humanos, fatores estes que instigam a recordação de momentos históricos através da memória. Portanto, pode ser entendido como aquilo que representa um sentimento de pertencimento à população nativa da região (Pinto, 2012).
No caso missioneiro, comprova-se que os símbolos da região estão sendo reproduzidos em lugares específicos e estratégicos continuamente. Na busca de efetivar uma maior difusão da ideologia missioneira, esta materialização dos componentes culturais apresenta-se como ações políticas (Pinto, 2012).
Neste sentido, a motivação do turismo atrelado ao patrimônio cultural de um local, tem relação com o turismo histórico-cultural qual geralmente se constitui por roteiros especialmente planejados para pessoas que procuram um conhecimento mais amplo sobre as nossas origens ou um contato com as manifestações culturais, que para elas, são diferentes e emocionantes (Martins, 2003).
Nos últimos anos, em virtude do desenvolvimento do turismo cultural, o patrimônio converteu-se progressivamente em importantes recursos econômicos. Os museus, e o patrimônio cultura intangível como é o caso da gastronomia, transformaram-se em protagonistas da vida cultural dos países, conservando os bens patrimoniais e contribuindo para a economia (Schlüter, 2003).
Nas Missões, percebe-se a geração de uma mescla cultural, através da estratégia de integração regional, voltada para consolidação da identidade missioneira (Pinto, 2012). O mesmo autor defende que a esta identidade vem modificando-se com o passar do tempo, fazendo com que as suas narrativas se coadunem-se com outros tipos identitários regionais, da mesma forma como o que ocorre no turismo e na gastronomia.
Pode se afirmar que a cultura missioneira está encoberta ou escondida, considerando-se a esfera mundial, mesmo que haja ruínas eleitas, como Patrimônio da Humanidade, pela UNESCO. Como cultura escondida refere-se aos diversos aspectos da gastronomia missioneira que estão arraigados e recheados de ingredientes diferentes, curiosos, pouco divulgados e que merecem reconhecimento (Rech, 2016).
Nas palavras do sociólogo Carlos Alberto Dória, o padre Franz Muller fez uma descrição da alimentação dos guaranis que habitavam a bacia do Alto Paraná, no final do século XIX. Estes escritos constituem-se como uma fonte riquíssima para se conhecer o que este povo usualmente comia. Segundo estes relatos, o fogo se encontrava sempre aceso no centro da casa, em torno do qual reunia a família, para aquecer a água do mate a qualquer hora do dia. Outro fogo era mantido fora da casa onde as índias preparam as comidas, que eram assadas ou cozidas (Dória, 2016).
Os indígenas tinham uma dieta bastante diversificada, pescavam nos rios e no mar, caçavam nos campos, matas e banhados e tinham variadas frutas como, por exemplo: a pitanga, o butiá, a guabiroba, o araçá e o guabiju. As mulheres eram as responsáveis pelo cultivo das plantas, como a pimenta cumari, a abóbora, a mandioca e o milho, bem como, auxiliavam na alimentação diária. Utilizavam uma trempe de madeira ou de pedra para cozinhar os alimentos ou era feito uma espécie de forno, com um buraco no chão forrado com folhas de bananeira, onde a comida era enterrada e o fogo era feito logo acima (Saraiva, 2015).
Os fogos sobre os quais trabalhavam era a parrilha, o assador, a brasa do carvão, as cinzas e os gomos grandes de taquara (tacuapi). Faziam cozidos no tacuapi e, em geral, carnes e peixes sobre os outros fogos, além de legumes, como o milho verde, mandioca e batatas, e preparados de milho envoltos em folhas, cozidos sobre cinzas (Dória, 2016). Das tribos indígenas que habitavam o estado, a mais conhecida e estudada são os guaranis que foram os precursores do hábito do chimarrão (Lessa, 1999). Esta tribo não dispensava uma cuia com água quente e um canudo de taquara, que era sevada a erva, chamada de caa-i, que posteriormente, ficou conhecida como erva-mate.
O chimarrão, que leva a erva-mate como produto principal no seu feitio, passou a ser considerado pelos gaúchos como um importante hábito e se faz presente de forma marcante na identidade cultural deste povo. O mate ou chimarrão também traz intrinsecamente na cultura as questões de convivialidade, de encontro, da comunhão, da integração e da reunião e aproximação entre as pessoas.
Na culinária se veem expressos processos históricos, materiais e imateriais, que se revelam nos saberes e na memória coletiva e individual. A cozinha de uma determinada população traz uma característica de rara sensibilidade para avaliar a cultura desta, e é composta de um conjunto de signos e símbolos que, ao serem interpretados, colaboram no entendimento da história civilizatória de um povo (Froemming, 2016).
Atualmente nas cidades dos Sete Povos das Missões o turismo apresenta-se na contemplação de paisagens naturais, arquiteturas milenares e culturais, festivais musicais, competições, gastronomia, entre outros. Relacionando a gastronomia com o desenvolvimento local, político e social, aproximados na cultura das missões jesuíticas, apresentados pelas heranças alimentares deixadas por índios colonizadores e imigrantes da região.

3. APORTE METODOLÓGICO

O estudo foi desenvolvido aportado no paradigma interpretativo. A perspectiva interpretativista, segundo Saccol (2009), tem como foco a importância dos significados subjetivos e sociopolíticos, assim como ações simbólicas na forma como os atores constroem e reconstroem sua própria realidade que é reproduzida por meio de interações sociais.
A pesquisa caracteriza-se por ser de cunho exploratório, aplicado e descritivo. A pesquisa exploratória tem por finalidade desenvolver ideias para formulação de novas teorias para serem pesquisadas em estudo posterior. Já a pesquisa aplicada caracteriza-se por ter sua finalidade na obtenção de resultados práticos que possam ser aplicados para amenizar problemas reais. O estudo descritivo tem suas características pautadas na descrição de um fenômeno ou situação, mediante um estudo realizado em determinado local ou tempo (Gil, 1995).
A pesquisa apresentou abordagem através de aspectos qualitativos. A pesquisa qualitativa, conforme destacam Minayo (2000), trabalha no âmbito dos significados, dos motivos, das aspirações, das crenças, dos valores e das atitudes. Além de que não se preocupa com o quantitativo numérico, mas, sim, com o aprofundamento do entendimento de um grupo social, de uma determinada sociedade, de uma organização, entre outros (Minayo; 2000).
O conjunto de dados que fazem parte do universo da pesquisa foi selecionado a partir de uma parcela da população da região missioneira, que possuem relação com a história Jesuítica, o turismo e cultura gastronômica local. Esse universo foi estudado pela delimitação dos municípios de São Borja, Santo Ângelo e São Miguel das Missões, considerando que os sujeitos da pesquisa detêm de informações necessárias para alcançar os objetivos propostos.
Vergara (2004) ressalva que os sujeitos da pesquisa são as pessoas que fornecem os dados de que o pesquisador necessita. A autora considera as pessoas em si, os atores locais que reportam as informações referentes à história, tradições, práticas, conhecimentos, hábitos, comportamentos e atitudes que conduzirão estas representações, constituindo-se estas em importantes mananciais para se alcançar um conjunto de elementos para a pesquisa.
Define-se que os sujeitos (atores locais) pesquisados foram os historiadores e estudiosos da região Missioneira, representantes do poder público, empresários ou gestores de empresas privadas, instituições públicas, privados e de ensino ligadas a região missioneira e cultura gastronômica dos municípios de São Borja, Santo Ângelo e São Miguel das Missões.
A pesquisa primeiramente se deu através de entrevistas e contato direto com os sujeitos da pesquisa, as entrevistas seguiram um roteiro estruturado e os dados foram gravados. Os secretários de desenvolvimento e turismo, representantes do setor público (Prefeituras Municipais) foram as primeiras fontes a serem entrevistadas. No segundo momento da pesquisa foram realizadas entrevistas semiestruturadas com historiadores da região Missioneira e da Gastronomia, estas entrevistas também foram gravadas.
As entrevistas foram semiestruturadas, seguiu-se o roteiro de perguntas, que necessitavam ser respondidas com a finalidade de chegar aos dados primários pretendidos para responder aos objetivos geral e específicos da pesquisa. Durante a entrevista procurou-se deixar o entrevistado livre para abordar outros assuntos relativos ao tema da pesquisa. Para Triviños (1987, p. 152), a entrevista semiestruturada “favorece não só a descrição dos fenômenos sociais, mas também sua explicação e a compreensão de sua totalidade”, e ainda mantém o pesquisador atuante no processo de coleta de informações. A pesquisa de campo deu-se através do contato direto com as fontes da pesquisa. Segundo Triviños (1987) podem ser chamados de “anotações de campo”, entrevistas que se constituem na descrição e apontamentos que o pesquisador realiza a respeito das amostras observadas, assim como as reflexões referentes aos fenômenos pesquisados.
Após a coleta de dados, foi realizado o tratamento de análise e interpretação dos dados, objetivando chegar aos resultados do estudo. A descrição das entrevistas foi realizada de acordo com a visão individual e com a perspectiva dos municípios, para posteriormente, agrupar as informações obtidas através desses sujeitos e inter-relacioná-las. Foram retirados os trechos considerados mais significativos sobre o tema dos depoimentos e descritos os aspectos mais relevantes de cada atividade realizada nos municípios.

 

4. RESULTADOS E DISCUSSÕES

4.1. A gastronomia e o desenvolvimento de lugares

A região missioneira é um espaço turístico onde inicialmente teve sua configuração de forma homogênea. Segundo Boullón (1991), a melhor forma de determinar um espaço turístico é analisando empiricamente a distribuição territorial dos atrativos, definindo agrupamentos e concentrações proeminentes. A região também pode assumir outras configurações, como um corredor, que engloba espaços em um mesmo país ou em países vizinhos, como o caso da região em estudo. Nesta pesquisa são destacados três municípios missioneiros: São Borja, Santo Ângelo e São Miguel das Missões.
Neste contexto das reduções Jesuíticas, entende-se que o desenvolvimento local não está necessariamente ligado apenas ao crescimento econômico, mas também se relaciona com a melhoria da qualidade de vida das pessoas e com a conservação do meio ambiente em que estão inseridas (Buarque, 1999). Sendo assim, cada região ou local apresenta características culturais diferentes e individuais, que interferem diretamente nas relações dos atores sociais com o meio ambiente e que regem o direcionamento dos seus processos de desenvolvimento, diferenciando-o dos demais locais.

4.2. Histórico e contexto atual de São Borja e iniciativas para alavancar a gastronomia e o turismo

Primeiro dos Sete Povos das Missões e “Terra dos Presidentes, São Borja possui em torno de 61.671 habitantes, e uma das cidades mais importantes da história política brasileira, por ser terra onde nasceram os ex-presidentes da República, Getúlio Vargas e João Goulart, e está sepultado o ex-governador do Estado do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro, Leonel Brizola. Fundado em 1682 pelos padres Jesuítas, o município faz fronteira com a cidade de Santo Tomé, na província de Corrientes, Argentina.
São Borja sedia a ponte internacional, ligando Brasil e Argentina, fundamental no escoamento de produtos do Mercosul. A origem do seu nome é uma homenagem ao Padre Francisco de Borja, que foi o terceiro general da ordem dos jesuítas. Por esse motivo, o brasão da cidade ostenta, em campo vermelho (evocativo da terra vermelha das Missões e do sangue guarani) e uma cruz.
A pecuária faz parte da história do município, e, após a tomada do território em 1801, foram distribuídas sesmarias para a instalação de estâncias. A agricultura tem no arroz e na soja, seus principais produtos de exportação, assim com a fruticultura, com ênfase na produção de uvas viníferas.
Além disso, a comunidade educacional de ensino superior está em crescente potencialidade com pesquisas e estudos realizados nos cursos Técnicos em Cozinha, Tecnólogo em Gastronomia e Tecnólogo em Gestão do Turismo do Instituto Federal Farroupilha (IFFar).
Em entrevista com a Secretária de Turismo de São Borja, a entrevistada destacou que a gastronomia é uma das maiores vertentes do turismo e que deveria ser investido nas escolas e na propagação de festivais. A entrevistada afirmou que “São Borja possui um local de lazer que é o “Porto”, que poderia ser muito mais explorado, pois já se tem a Piava, peixe do rio Uruguai, o que precisa é transformar o prato como um atrativo gastronômico”. O Cais do Porto que fica ao lado do Rio Uruguai em São Borja, oferece excelentes alternativas de lazer, diversão e esportes. No local a gastronomia é típica e de alta qualidade, oferece diversas opções à la carte, buffet e pratos à base de peixe.
Um exemplo de iniciativas para promover a cultura local, segundo a secretária “são as feiras que acontecem na praça XV de Novembro toda sexta-feira, onde os feirantes vendem artesanato e pratos remetentes a cultura local”. Porém, afirmou que os comerciantes da Feira são muito dependentes da Prefeitura Municipal. O mesmo caso acontece com a Colônia dos Pescadores, “sempre estão esperando mais do setor público, a comunidade também poderia assumir”.
São Borja também participa da Associação dos Municípios das Missões (AMM), que realiza reuniões e discutem alternativas para a região missioneira. Contudo, no entendimento da secretária “precisa-se de mais entrosamento entre os municípios participantes, destaca que São Borja muitas vezes fica fora, devido à distância e por ter comunicação também com a região Pampa”.
Em nível regional na opinião da secretária não estão sendo realizados muitos projetos e trabalhos envolvendo os municípios missioneiros, ressaltou a Rota Missões, e as dificuldades de alavancar o turismo missioneiro.
A secretária afirmou que “São Borja é mais distante, não tem patrimônio, como as ruínas, mas têm museus muito mais completos, o que se precisa unir o que se tem de bom e de melhor. Temos os cursos de Turismo e Gastronomia do IFFar, e uma população voltada a cultura local”.
Uma das alternativas propostas pela secretária é de realizar festivais de gastronomia, itinerantes “chamar o setor público, privado e o acadêmico”, destacou que já tiveram o exemplo com o Festival Internacional da Cozinha Missioneira, promovido pelo IFFar, Prefeitura Municipal e empresas locais nos anos de 2014 e de 2016.
Um exemplo que está acontecendo na cidade, e que partiu do Grupo Amador de Artes Angueras, é a abertura do Museu da Estâncias, com apresentação cultural, na qual chama-se “Museu Vivo”. Os representantes do grupo montam um café com produtos da colonização, e relatam a história das missões. A secretária destacou que “tem turista que vem de São Paulo, que nunca viu uma carroça”. São iniciativas como esta que fazem a diferença na propagação da cultura.

4.3. Histórico e contexto atual de Santo Ângelo e iniciativas para alavancar a gastronomia e o turismo

Conhecida como a “Capital das Missões”, por ser o município mais populoso da região, o nome Santo Ângelo tem origem na Missão Jesuítica de Santo Ângelo Custodio, ou como consta em alguns documentos espanhóis da época, Sant’Angel da La Guardiã e Sant’Angel Custodio. A Redução de Santo Ângelo foi consagrada ao Anjo Custodio das Missões, protetor de todos os povos missioneiros.
o município foi fundado no dia 12 de agosto de 1706, pelo Jesuíta Diogo de Haze, Padre Belga, e foi emancipado no dia 22 de março de 1873. Com população total de 76.178 habitantes, formada por uma grande diversidade étnica. A Catedral Angelopolitana está situada no município de Santo Ângelo.
A base econômica do município é o comércio, prestação de serviço, pequenas indústrias agropastoris, com forte potencial industrial nas mais diversas áreas. O turismo cultural e religioso também são componentes da economia, e das raízes históricas de Santo Ângelo.
Segundo a Secretaria do Turismo do Município de Santo Ângelo, a cidade já foi bem representativa no turismo, mas que são 20 anos de batalha com retrocesso, pois os projetos voltados ao turismo têm pouca visualização e aceitação. “O município não consegue recursos nem para placas de sinalizações para visualização da cidade”.
Com o aeroporto a Secretaria espera que se consiga através do fácil acesso e a comodidade, conquistar mais turistas. O secretário explicou que “a região deveria ter participado das Olimpíadas, porém devido ao difícil acesso que se dá por estradas precárias, sem suporte adequado, a comissão das olimpíadas decidiram não colocar a região missioneira e polonesa na rota turística do evento”.
O secretário destacou que a gastronomia pode ser um vetor de desenvolvimento cultural para o município. Já foram implantados pratos típicos na Feira que acontece de dois em dois anos a Fena Milho, que caracteriza-se por ser o principal evento cultural e de negócio do município e da região, no Festival das Tortas, evento que divulga e apresenta os doces da região e ocorre na praça central da cidade, no Carnaval de Rua que faz incentivo também à alimentação, às atividades natalinas que duram 26 dias e o incentivo à agricultura familiar. No entanto, asseguram que o setor privado não colabora, não dão continuidade ao trabalho e não mudam seus estabelecimentos. Afirma o secretário “o turista vem buscar comida típica, e o que se apresenta são os fast food”.    
“A gastronomia no setor público e privado precisa ter um elo, porém o privado não participa”. Ao comparar cidades turísticas como Gramado, o empresário coloca a responsabilidade somente no setor público.
O secretário destacou a participação da Associação dos Municípios Das Missões (AMM), quais estão promovendo estratégias para consolidar o turismo nas missões, afirmou “que é um trabalho lento”.

4.4. Histórico e contexto atual de São Miguel das Missões e iniciativas para alavancar a gastronomia e o turismo

São Miguel das Missões prestigia o único Patrimônio Histórico da Humanidade localizada na região Sul do Brasil. A cidade consolida-se no cenário nacional como destino turístico histórico, cultural, religioso e de eventos. Sua história começa a ser contada em 1632, quando foi fundada a Redução de São Miguel Arcanjo, instalada definitivamente no ano 1687 (Oliveira, 2011). Sua maior representação é a Cruz Missioneira e as Ruínas das Reduções Jesuíticas.
Em 1745 foi construído o antigo templo, que guarda ainda a grandiosidade arquitetônica, simbolismo material da epopeia missioneira. As Ruínas de São Miguel Arcanjo foram reconhecidas em 1938, como Patrimônio Nacional, e em 1983, declaradas pela UNESCO como Patrimônio Histórico e Cultural da Humanidade. O espetáculo Som e Luz, Museu das Missões, o Sino e a Cruz Missioneira, completam a paisagem do Sitio Histórico São Miguel Arcanjo (Oliveira, 2011).
O nome do município é uma homenagem ao anjo Arcanjo Miguel. A população é de cerca de 7.434 habitantes, e a economia baseia-se na agricultura e pecuária. São Miguel das Missões ainda abriga povos indígenas e em entrevista com a Secretaria de Turismo do município, identificou-se pouco incentivo dos setores público e privados na questão indígena e jesuítica.
Segundo a Secretária a gastronomia é importante para o desenvolvimento turístico do município, afirma que “quando se vai viajar a curiosidade é de como vivem e comem naquele lugar”. Destaca que no município se têm muito cordeiro e ovelha, porém este produto não é explorado como atrativo turístico, qual representa o indígena ou o povo gaúcho.
A secretária ressalta a preocupação de os comerciantes da cidade não darem valor ao que se produz, de não agregarem valor à matéria prima, como exemplo ovelha e a mandioca. “Se remete como identidade, quando se consomem o que se têm lugar, consegue agregar valor ao que se produz”.
A Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER) em São Miguel das Missões promove ações com mulheres do clube de mães, onde procura-se resgatar pratos típicos da região. A secretária colocou esta iniciativa como “interessante e fantástica, contudo destaca que não é possível crescimento, pois falta muito incentivo para a região e há muita resistência da comunidade, moradores e empresários. Afirma, que os restaurantes possuem cardápios iguais, com valores elevados, que ficam pouco atrativos e inviáveis para os turistas”.
No momento o município não possui estratégias de investimentos em atrativos para o turismo. A secretária assegura que “falta conversa entre os municípios, no trabalho de investimento do setor privado, público e educacional”.
Foi realizada entrevista, também, com a gerência do Hotel Tenondé, localizado em São Miguel das Missões. O hotel Tenondé é um lugar de visita fundamental a quem pretende entender as raízes do sul do Brasil e da América Latina e apresenta aos seus visitantes diversos patrimônios culturais da humanidade, segundo a gerente do hotel “é sentir a energia presente que emana de cada um desses atrativos”.
Atualmente o hotel não possui um cardápio missioneiro, trabalha muito com frutos do mar e com produtos que vem de fora do município. Há uma perspectiva de melhoria, através de contatos com a agricultura familiar, na busca por produtos locais, foi citado o queijo colonial, geleias de uva e butiá.
Segundo a gerente, os maiores públicos do hotel são turistas de São Paulo e Santa Catarina, que procuram a gastronomia local, valorizando o que se possui no lugar.
Os eventos realizados no hotel, sempre acompanham o cardápio escolhido pelo hospede, porém segundo a gerência “falta a administração do hotel oferecer mais produtos que remetam à cultura local”.
Segundo a entrevistada, estão implantando uma forma de transmissão da cultura através do fogão à lenha, remetendo ao interior e ao aconchego que proporciona. “O hotel procura ser receptivo em todos os sentidos, explora a cultura local, através de monumentos que remetem à cultura indígena, e querem buscar ser receptivos através também do degustativo, acredita que este seja um diferencial que faz com que o público volte”.
Uma forma de divulgação de São Miguel das Missões encontrada pelo hotel foi de no hall de entrada apresentar a história das missões em uma televisão. “Além, da história, o turista pode identificar os pontos turísticos e horários, tem auxiliado os turistas no que pode-se visitar na região”.
A gerente ressalta que o hotel pretende adotar dias com produtos típicos, na busca de chamar o público regional e valorizar a matéria-prima local, através da agricultura familiar e do incentivo à saúde, utilizando-se produtos orgânicos.

4.5. A gastronomia da Região Missioneira no ponto de vista dos historiadores

É muito comum tomar-se como sinônimo Gastronomia e Culinária quando, na verdade, a distinção entre os termos revela-se mais útil em termos metodológicos, pois a culinária se refere ao conjunto de ingredientes, práticas e valores ligados à transformação material que se processa na cozinha e a Gastronomia à pratica comparativa cujo objetivo é destacar a excelência de um prato, de um modo de fazer, que é superior aos similares. Já a Gastronomia só existe no espaço público, urbano, supondo uma atividade mais ou menos intensa, relacionada a certos consumos alimentares, ajudando a fixar o gosto de determinada época ou classe social. A culinária é o conjunto do que se faz e se come, seja no âmbito privado ou público. A gastronomia tem maior interesse para o turismo, a culinária para as ciências humanas em geral (Dória, 2016).
Baseado em Dória, foram realizadas entrevistas com historiadores da região missioneira, com apelo à Gastronomia e a Culinária local como agente propulsor do desenvolvimento do turismo na região missioneira e a influência da cultura indígena.

4.5.1. Historiador I

O historiador em relação às origens do povo missioneiro, relatou que com o trabalho coletivo dos índios e sob coordenação dos catequizadores até a metade do século XVIII foram-se desenvolvidos os 30 povos das Missões, em áreas que hoje fazem parte do Brasil, Argentina e Paraguai.
Junto às reduções, os padres instalavam currais de gado, exportavam couro e as plantações de erva-mate forneciam um produto que conquistou um bom preço no mercado. Cultivavam diversos tipos de vegetais, como: feijão preto, amendoim, abóbora mandioca, erva-mate, milho, batata doce, algodão, fumo, abacaxi (ananás). Pescavam diversos peixes como: cascudo, traíra, lambari, pintado, dourado. E consumiam caças como: aves e marreca, além do gado. Os artefatos jesuíticos guaranis eram feitos de barro. “O que essas gentes comiam exatamente, uma alimentação de base europeia, carne, no espeto de pau”.
Para o historiador, uma gastronomia missioneira, é um vetor de desenvolvimento social, o volume do turista na região é um fator muito importante, ressalta que “o turista vai buscar o charque, e que são as pessoas mais antigas que são os guardadores dessa riqueza histórica”.
Segundo o historiador uma grande limitação para a questão missioneira, “é o fato de que ninguém assume”, os prefeitos dos municípios que fazem parte da Associação AMM, dão pouca importância, “é uma crise de conhecimento sobre a cultura missioneira”.
Comentou das vinícolas da região missioneira “que ali sim, tem gastronomia missioneira”. Pois, os proprietários estão buscando seus clientes, apropriando-se do poder da história das heranças Jesuíticas e missioneiras.
O historiador participou como palestrante no 1º encontro Trinacional, em La Cruz na província de Corrientes - Argentina, onde AMM integrou debate sobre roteiro turístico unificado entre Brasil, Argentina e Paraguai. O entrevistado afirmou que os prefeitos e secretários não dão a devida importância para as missões. Destacou que o setor público, a universidade e o setor privado, precisam trabalhar juntos, e sobressaiu que setor privado é o que menos contribui.
O historiador possui uma página no facebook, que utiliza como meio de comunicação das missões Jesuíticas (sua página tem mais de 14 mil participantes). Todas as sextas-feiras ele realiza um programa de rádio no município de Santo Ângelo, falando sobre desenvolvimento. Finalizou dizendo que ações estão sendo feitas, porém precisa-se de mais participação de todos os setores.

4.5.2. Historiador II

O pesquisador e responsável pelo centro Cultural da Estação Férrea de São Borja ressaltou que o viés da gastronomia está sendo muito importante para manter as raízes e a identidade missioneira, principalmente no município de São Borja. Pois, os demais municípios pesquisados (Santo Ângelo e São Miguel das Missões) já são identificados como missioneiros.
O entrevistado relatou que há 30 anos, não se falava em São Borja missioneira, e que fazem 10 anos mais ou menos, que esta realidade está sendo modificada “Muito se deve à chegada dos cursos superiores do IFFar e da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA)”. Através destes cursos pode-se perceber a qualificação dos estabelecimentos da área da alimentação estão sendo melhorados, e o visitante, o turista percebem este avanço.
“Os turistas vêm à procura do peixe, que remetendo à alimentação indígena, procura o churrasco da alimentação Gaúcha, procura também outros alimentos, como mandioca, quais facilmente nos dias atuais está sendo oferecido por São Borja”. Segundo o historiador isto se deve às Universidades.
Conforme os estudos do pesquisador, “o atual Papa Francisco, missioneiro e Jesuítico é um dos motivos pelos quais o país vizinho, a Argentina está impulsionando a questão missioneira, para o pesquisador as cidades missioneiras podem ter um grande salto de desenvolvimento, e o turismo e gastronomia, atrelados a rica história das missões Jesuíticas serão os responsáveis por isso”.
Por fim, o entrevistado destacou que São Borja por possuir a ponte de transição dos países missioneiros “é o elo de ligação para o desenvolvimento da culinária missioneira”. Ressaltou ainda que, “as pesquisas que estão sendo realizadas podem ser porta de desenvolvimento da culinária missioneira e pode ser o nosso carro chef”. Destacou o Festival Internacional da Cozinha Missioneira como um bom exemplo de iniciativa para a propagação da região das Missões.

4.5.3. Historiador III

Como pesquisadora da culinária do Rio Grande do Sul, a curadora do 1º e do 2º Festival Internacional da Cozinha Missioneira, em entrevista ressaltou “que a questão missioneira é algo ainda a ser explorado” que as Universidades poderiam contribuir, através de pesquisas documentais, como exemplo destacou o trabalho realizado pelo GT Gastronomia do Governo do Rio Grande do Sul, de 2011 a 2014.A Universidade “tem o dever social, entendendo o lugar de tudo, o papel da empresa (pequeno produtor), setor público, conversando no contexto cultural e histórico”.
Sobressaiu que alguns produtos remetentes às heranças indígenas são pouco cultivados. Como exemplo o butiá que é um fruto nativo e que só se houve falar no município de Giruá. Ressaltou que a mandioca, o milho, e o peixe do rio são heranças pouco exploradas como produtos gastronômicos.
A pesquisadora acha que as universidades que podem fazer acontecer “os cursos de gastronomia devem ter esse papel de pesquisador, a cozinha missioneira e guarani é um caso ainda em aberto”.
A gastronomia tem muita importância, principalmente na alimentação fora do lar, ressalta “que estamos cada vez mais, comendo mais iguais, e que gastronomia tem muita saturação, os buffets, os bistrôs em qualquer lugar, servem os mesmos pratos, precisa-se de pesquisa e conhecimento. A civilização fez com que a gente perdesse as raízes alimentares”.
Para a entrevistada, a gastronomia necessita buscar suas raízes, desde os moradores do interior, o setor público, o pequeno produtor, o estabelecimento mais antigo, para dialogar e explorar a culinária de raiz, num novo contexto com olhar social.      Para ela, o Festival Internacional da Cozinha Missioneira é um grande marco para o crescimento da culinária, do turismo e das pesquisas universitárias em prol de um desenvolvimento das raízes da região Missioneira.

 

5. CONCLUSÃO

A alimentação, é muito mais do que simples necessidade básica para a sobrevivência humana, adquire cada vez mais uma série de simbolismos que estão estritamente interligados com várias vertentes, a cultura patrimonial de localidades é uma delas. Nessa perspectiva, a alimentação deixa de ser apenas uma necessidade básica de sobrevivência para se tornar também uma importante marca de distinção social de povos.       
Esta pesquisa teve como finalidade conhecer a cultura gastronômica da região missioneira nos municípios de São Borja, Santo Ângelo e São Miguel das Missões elencando as possibilidades de desenvolvimento do turismo local. O Turismo Cultural é um segmento que está crescendo consideravelmente e pode ser considerado um dos responsáveis pela preservação e revitalização dos locais históricos e culturais. A região missioneira é uma fonte de Patrimônio Cultural material e imaterial que se consolida no cenário nacional como destino turístico, cultural, religioso e de eventos, contudo, ainda pouco explorado.
Os discursos explicitam a existência de muitas barreiras que impedem ou dificultam o trabalho em prol de desenvolvimento do turismo e da cultura gastronômica local. Não existe o conjunto por parte das instituições parceiras nos municípios de São Borja, Santo Ângelo e em São Miguel das Missões.
Destaca-se a falta de pessoas capacitadas e com pretensão de assumir o turismo missioneiro, a falta de recursos financeiros e a ausência de infraestrutura, além da falta de incentivo aos projetos elaborados, falta de atitude de alguma das instituições (setor público, privado e comunidade em geral) que possam se responsabilizar pela organização e continuidade dos trabalhos.
Após a realização da pesquisa, conclui-se que seus objetivos foram alcançados. Percebe-se que a cultura não é mais pura, ela vai miscigenando e parte para a modernização. A cultura com a alimentação propicia à sociedade o aconchego de sua história calcada no valor da gastronomia como um elo para o resgate e releitura cultural, identificado nesta pesquisa.
A região missioneira comporta uma comunidade de pequenos e médios agricultores e agroindústrias quais necessitam de alternativas sustentáveis para sua sobrevivência. Sua importância reveste-se pela demanda por qualidade organizacional e empresarial de forma a atender as necessidades socioeconômicas, mercadológicas e políticas relacionadas aos alimentos que produzem. Além disso, os comerciantes da cidade devem ter um olhar diferenciado ao que se produz agregarem valor a matéria-prima.
Diante da pesquisa que procurou relacionar diferentes dimensões da cultura, a extensão da Gastronomia como patrimônio aumenta as possibilidades do turismo cultural da região, cabe dizer, que ações estão sendo realizadas, porém, faltam incentivos dos setores públicos e privados. O desenvolvimento patrimonial intangível como a gastronomia influencia as comunidades que residem na região das Missões buscando no sentido de pertencimento local a importância do bem patrimonial que possuem.
Por fim, salienta-se, que nenhum dos três municípios em questão é reconhecido gastronomicamente e apesar de fazer parte da alimentação diária das comunidades da região missioneira há pouco conhecimento sobre os costumes Jesuíticos. Porém, destaca-se o trabalho das Universidades e da Associação (AMM), que geram ações voltadas para o desenvolvimento e valorização dos bens intangíveis, como festas e manifestações artísticas, buscando na cultura uma das alternativas que promovam o desenvolvimento local.

 

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* Bacharela em Gastronomia pela UNIVALI. Mestra em Desenvolvimento pelo Programa de Pós-graduação Strictu Sensu em Desenvolvimento da UNIJUÍ. Docente do Instituto Federal Farroupilha – Campus São Borja.
** Bacharela em Turismo pela UNIFRA. Tecnóloga em Gastronomia pela UNIVALI. Mestra em Desenvolvimento pelo Programa de Pós-graduação Strictu Sensu em Desenvolvimento da UNIJUÍ. Docente do Instituto Federal Farroupilha – Campus São Borja.
*** Professora Orientadora Dra. do Programa de Pós-graduação Strictu Sensu em Desenvolvimento da UNIJUÍ.
**** Professor Dr. do Programa de Pós-graduação Strictu Sensu em Desenvolvimento da UNIJUÍ.


Recibido: Agosto 2018 Aceptado: Diciembre 2018 Publicado: Diciembre 2018

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