Joanna Isis Chaves Carvalho*
Horígenes Fontes Soares Neto**
Lessí Inês Farias Pinheiro***
Universidade Estadual de Santa Cruz, Brasil
jichaves@hotmail.com
RESUMO  
O presente ensaio visa analisar o quadro do  turismo rural na Costa do Cacau, no sul da Bahia, como uma via econômica para  os produtores agrícolas das fazendas cacaueiras da região após a crise que se  instalou com a vassoura-de-bruxa. A reconversão dos meios econômicos para a  manutenção da dinâmica da região fez com que muitas das fazendas abrissem suas  portas para a visitação de turistas. O denominado turismo rural ainda não  possui um investimento marcante do poder público, tanto a nível nacional quanto  municipal. Todavia, corresponde a um setor que merece um tratamento especial,  tendo em vista que as fazendas expressam a dinâmica cultural, histórica e  ambiental que permeiam a saga cacaueira, possibilitando ao turista a vivência e  o contato com a base histórica da região, história esta que encanta os mais  diversos públicos e é imortalizada nas obras de Jorge Amado.
Palavras-chave: Costa do Cacau. Turismo Rural. Fazendas de cacau.
ABSTRACT
  The present essay aims  to analyses the rural tourism framework in the Costa do cacao  as an economic pathway for rural producers of  cocoa farms in the region after the crisis that was installed with the witch's  broom, for this reason, it uses the methodology of research of predominantly  bibliographical and statistical. The conversion of the economic means for the  maintenance of the dynamics of the region caused many of the farms to open  their doors for the visitation of tourists. The so-called rural tourism does  not yet have a striking investment of public power, both at national and  municipal level. However, it corresponds to a sector that deserves special  treatment, once the farms express the cultural, historical and environmental  dynamics that permeate the saga of cocoa, allowing the tourist the experience and  the contact with the historical base of the region, history that enchants the  most diverse audiences and is immortalized in the books of Jorge Amado.
Keywords: Cocoa Coast. Rural Tourism. Cocoa Farms.
Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato: 
Joanna Isis Chaves Carvalho, Horígenes Fontes Soares Neto y Lessí Inês Farias Pinheiro (2018): “Fazendas de cacau: um ensaio sobre o turismo rural na região cacaueira do sul da Bahia”, Revista Turydes: Turismo y Desarrollo, n. 25 (diciembre / dezembro 2018). En línea:
https://www.eumed.net/rev/turydes/25/fazendas-cacau.html
http://hdl.handle.net/20.500.11763/turydes25fazendas-cacau
INTRODUÇÃO
            Indiscutivelmente  o cacau marca a história e a realidade do sul da Bahia. Fruto cuja exploração  rendeu por muitos anos riqueza ao eixo Ilhéus-Itabuna, sofre desde os anos de  1990 grandes infortúnios quanto a sua relevância para a economia local. A  vassoura-de-bruxa, praga destruidora das lavouras do “fruto de ouro”, a duras  penas exigiu daqueles que sobreviviam à base do plantio em forma de monocultura  certa reinvenção para sustentarem-se, já que os impactos causados pelo fungo  assolaram toda a região, do grande produtora ao trabalhador da roça.
   As  saídas à crise emergiram gradualmente. As exportações de matéria-prima do cacau  tornaram-se exportações de derivados dela, implementou-se a clonagem nos  cacauais sul baianos, a agroindústria do cacau e, de igual sorte, o setor  terciário, tomaram forma e lugar na economia local. Os serviços, neste passo,  ganharam seu espaço e sustentam a economia.
   Por  assim ser, as velhas fazendas produtoras da fruta que dá base ao chocolate,  inspiradas na biodiversidade da Mata Atlântica, na história e na saga do chão  de cacau, alicerçam o que atualmente se convenciona chamar de turismo rural ou  rústico nas fazendas de cacau do sul da Bahia.
   O  presente ensaio, justificado pela necessidade de estudo a respeito da reconversão  da base econômica pela qual tem passado a Microrregião Ilhéus-Itabuna e discutindo  a atividade turística rústica enfatizada nas fazendas de cacau como  contribuição para a economia regional, visa analisar o quadro do turismo rural  locorregionalmente, como uma via alternativa aos produtores rurais das fazendas  de cacau que sofreram com a crise perpetrada pela vassoura-de-bruxa. 
   Para  isto, por meio de revisão bibliográfica sobre o tema e observação estatística  de dados fornecidos pelo Ministério do Turismo e pelas Secretarias de Turismo e  Comunicação da Bahia, verificar-se-á a significância do turismo rural na  economia, na asseveração da identidade e cultura locais e na preservação da  floresta atlântica remanescente da região de Ilhéus-Itabuna, bem assim  discutir-se-á a atuação do poder público para o fomento deste setor, com o fito  de demonstrar que tal atividade gera benefícios incontestáveis sob a ótica da  economia e da reafirmação histórica, já que ainda se conhece esta região como a  “Terra do Cacau”.
1 DA AMÊNDOA AO TURISMO
Desde o início do  século XIX, o eixo Itabuna-Ilhéus é conhecido nacional e internacionalmente pelo  cacau, o “fruto de ouro” representado nas obras de Jorge Amado e Adonias Filho.  Inseridos timidamente na Bahia em 1746, em terras do agora município de  Canavieiras, os cacauais protagonizaram na arquitetura econômica local e  estadual até boa parte do século XX (MIRA, 2013).
   A  história aponta que antes da inserção do plantio do cacau, a então capitania de  São Jorge dos Ilhéus (futuramente cidade de Ilhéus)e todo o seu entorno,  inclusive as vilas a ela pertencentes, como Tabocas (futuramente cidade de  Itabuna), viviam às expensas das lavouras de cana-de-açúcar, mandioca, milho,  feijão e diversos outros gêneros alimentícios que esteavam a produção  locorregional (ROCHA, 2008). Com a entrada dos cacaueiros, no entanto, a  policultura de subsistência reinante perde força e cede seu lugar à monocultura,  centralizando uma economia que se demonstrava esparsa; a sociedade, daí em  diante, sustenta-se de produção única,com extração contínua e desgarrada de  técnicas, o que, tempos à frente, representaria a bancarrota da lavoura.
   Indiscutivelmente,a  literatura registra que após o ingresso da atividade cacaueira no sul baiano  houve uma mudança de paradigmas sociais, econômicos e culturais. Com intensa  exploração da terra e da mão-de-obra, as figuras do coronel, capataz e trabalhador  rural, moldaram o cenário e marcaram a Microrregião Ilhéus-Itabuna, também transformada  em solo fértil para casas de comércio de amêndoa brasileiras e estrangeiras,  bem assim para migrantes e imigrantes que fugiam da escassez de recursos e da  falta de trabalho em seus locais de origem (ROCHA, 2008).
   Segundo  Mira (2013), a contínua retirada de recursos naturais das fazendas de cacau,  atrelada à mão-de-obra barata – e em excesso –, à facilidade do plantio (que  exigia pouca ou nenhuma técnica, mormente em razão das características  edafoclimáticas desta parte do país, propensas ao cultivo da fruta) e à  importância que o fruto ganhou no panorama nacional e internacional, com  destaque à exportação da amêndoa, tornaram Ilhéus a “Capital do Cacau” e, por  assim ser, chão onde a concentração de renda e riqueza nas mãos de alguns se  deu em decorrência do processo evolutivo socioeconômico – os grandes  fazendeiros em contraponto aos pequenos e super explorados lavradores das roças.
   A  sociedade, por longo período, extraiu de maneira desenfreada dos cacaueiros e  pouco investimento realizou no trato da lavoura; a renda deles advinda destinava-se  ao sustento de luxos ou seguia para fora da região. 
A alta renda oriunda do cacau gerou grande opulência. Com a falsa impressão de que seriam eternas, seus produtores nunca se preocuparam em poupar. Seus filhos dedicavam-se ao usufruto da riqueza, sem qualquer preocupação empresarial e, ou profissional relacionada ao cacau. Freitas (1979, p. 57) define como comum, por parte dos coronéis do cacau, “o gosto pelo supérfluo, a divulgação dos dados da riqueza pessoal, a transferência da renda regional para investimentos urbanos, culminando com o abandono da região por parte de sua elite social e política”, o que se daria, inicialmente “[...] através dos descendentes mais jovens [dos coronéis], e, posteriormente, se constituindo como atitude comum à própria burguesia cacaueira” (p. 87). Ou seja, uma alta propensão marginal a consumir, inclusive em bens duráveis, fora do sistema econômico “cacau”, ocasionando evasão de divisas (MIRA ,2013, p. 58).
            A  crença na inesgotabilidade do “alimento dos deuses” pouco a pouco se converteu  em falácia com o aparecimento das crises econômicas que assolaram direta ou  indiretamente a região cacaueira. Rocha (2008) indica o aparecimento dos  primeiros colapsos logo nos anos 1914 e 1919, ocasionados por alterações  climáticas que geraram chuvas em demasia e enchentes responsáveis pelo  perecimento de parte da safra e da lavoura despreparadas para tais incidentes, e,  poucos anos empós, quebra” da bolsa de Nova York, em 1929, com reflexos na  diminuição nos preços e exportações de cacau.
   A  partir da década de 1930 as crises passaram a ser cíclicas, superando-se o  coronelismo, já tardia e precariamente, frise-se. Este foi o momento da atuação  positiva estatal, desembocada na criação de órgãos para incentivo e fomento à  produção do cacau, além do relevante fornecimento de subsídios para os  produtores. As gêneses do Instituto do Cacau da Bahia (ICB), em 1931, da Comissão  Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (CEPLAC), em 1957, e do Conselho  Nacional dos Produtores de Cacau (CNPC), em 1963, assinalaram os primeiros  passos ao desenvolvimento efetivo da região diante das crises, com o emprego de  técnicas no cultivo, conquanto tenham tido esses órgãos desvirtuadas suas  finalidades anos depois (MIRA, 2013).
   Inobstante  o empenho na superação dos colapsos, já fragilizada por mais de um século de exploração  desmedida, com o aparecimento da crinipellis  perniciosa (“vassoura-de-bruxa”)nos cacauais,em 1989, desde a década de  1990 a cacauicultura sofre a maior das crises já vista até então e que não  conseguiu ser contornada pelos instrumentos governamentais existentes.Organismos  como a CEPLAC não foram aptos nem a desenvolver técnicas suficientes e nem a  acalentar financeiramente os extratores, como outrora o havia feito.
   Órfão,  o proprietário da fazenda, que se reerguia dos impactos sofridos na produção e  na dinâmica econômica, afunda-se ainda mais em dívidas, arriscando até mesmo  perder sua propriedade por elas; o trabalhador rural, cuja força de trabalho se  empregava na monocultura do cacau, tem retirada sua fonte de renda e migra para  os centros urbanos em busca de emprego, fatos geradores do inchaço das cidades,  suburbanização e mais desemprego; os comércios de cacau fecham, e o cultivo que  se dava em grande escala nas exportações de amêndoas reverte-se em um mapa com premente  necessidade de importar o referido insumo para atender à demanda existente. 
[...] o Brasil, que no ano de 1990 era o segundo maior produtor de cacau do mundo, ocupa hoje o sexto lugar e, pela primeira vez, de exportador, passou a importador de cacau (ZUGAIB, 2005). Pelos dados da CEPLAC, a produção de cacau era, em média, de 350 mil toneladas por ano; passou a importar cerca de 70 mil toneladas para completar a produção atual (ROCHA, 2008, p. 107).
Frente ao alarmante quadro decorrido do surgimento do fungo da “vassoura-de-bruxa” e, por conseguinte, a queda nos indicadores econômicos, houve uma reconversão produtiva no sul da Bahia. O cacau, destinado às exportações por meio de amêndoas, passa a ser exportado na forma de líquor, torta, manteiga e pó, investem-se em técnicas de cultivo, como a cabruca e a clonagem. A economia, até então baseada no setor primário – tatuado ainda hodiernamente no imaginário econômico dos sobreviventes da época de ouro do cacau –, transfigurou-se para o setor terciário. O desenvolvimento regional da Microrregião Ilhéus-Itabuna decorre, na atualidade, dos serviços, com relevo para o turismo (MIRA, 2014).
2 O TURISMO RURAL NO BRASIL
            Preliminarmente,  para analisar o turismo rural na região cacaueira, sua importância e como sua  prática tem impactado algumas fazendas que outrora vivenciaram a era áurea do  ouro “marrom”, é necessário apresentar algumas conceituações de como o turismo  é concebido e praticado no Brasil. 
   A paisagem rural, antes  preterida pela urbana, tem adquirido valor estratégico para o desenvolvimento  regional. As novas funções sociais, econômicas e culturais que o turismo rural  tem proporcionado colaboram com a valorização do modo de vida bucólico e trazem  uma nova perspectiva para os produtores rurais que encontram no turismo uma  maneira de garantir sua permanência nas áreas campestres. Para o agricultor, tal  processo significa um avanço na forma de encarar a dinâmica rural, não apenas  enfocando seus esforços na produção, mas também no crescimento da atividade  turística, com seu aspecto transversal e dinâmico, possuído rdo poder de  impactar diferentes setores do desenvolvimento territorial. (MINISTÉRIO DO  TURISMO, 2010)
   Segundo  Paiva (1995, apud SILVA; MOURA, 2010) a expansão urbana e os problemas  decorrentes da ausência da ocupação territorial citadina seriam os principais  motivadores para que os indivíduos se interessassem na mudança de cenário e  ambiente, migrando temporariamente de um meio neurótico e estressante, que  ocasionaria seu isolamento, para outro contrastante, que lhe proporcionaria paz  e tranquilidade.
   Em pesquisa mais  recente encontrada e realizada pelo Ministério do Turismo em 2009, em parceria  com a Vox Populi, constata-se que a procura por destinos campestres tem sido  bastante expressiva, figurando em segundo lugar nas preferências dos  entrevistados.
            O  homem procura o turismo como forma de relaxamento e fuga da correria, da opressão  e da pressão que a vida cotidiana no meio urbano exerce sobre ele. A escolha  pelo turismo rural apresenta uma dinâmica interessante no momento em que o  homem que busca, inicialmente, a agitação das cidades e de seus atrativos,  passa em um dado momento a se interessar pelo meio rural como forma de se conectar  com parte da dinâmica condutora de sua existência: a natureza. 
   Percebe-se que o homem  não apenas tem a necessidade de modificar a natureza à sua volta ou até mesmo transformá-la  em recurso econômico, como também necessita dela para adquirir o equilíbrio natural  de suas ansiedades cotidianas. Esta mesma reflexão pode ser percebida no entendimento  de Balderramas (apud SILVA; MOURA, 2010), segundo o qual “o turismo rural  aproveita a propriedade como atrativo turístico, indo de encontro ao desejo do  turista em estar em contato com o ambiente natural, ou mesmo o de resgatar  raízes culturais, ou ainda de contemplar o cotidiano daqueles que trabalham no  sistema de produção agropecuária”.
   O turismo rural é um  seguimento econômico considerado ainda moderno e em expansão no mundo. No  contexto mundial, surge em meados do século XX na Europa e nos Estados Unidos,  difundindo-se nos anos 1980 para América Latina, mais precisamente Brasil,  Argentina e Uruguai. 
   O intuito da concepção  do turismo rural é bastante interessante e sustenta a valorização das  atividades do homem do campo, bem como a necessidade de quebrar com as  diferenças estruturais ainda existentes na sociedade entre o meio rural e  urbano, tendo surgido como uma prática que visava a promoção da sociabilidade e  para amenizar a pobreza no campo, preservando os contornos e aspectos naturais  da paisagem nativa e sua base cultural. (MINISTÉRIO DO TURISMO, 2010)
   Em  que pese ter se difundido no país ainda no início dos anos 1980, apenas no  final do ano de 1990 é que seus aspectos positivos foram anunciados e disseminados  pelo país, o que colaborou para o interesse da categoria rural em sua prática.  Entretanto, por constituir um investimento novo, não havia muito embasamento  técnico, o que claramente comprometeu a expansão de forma eficiente desse ramo  do turismo. 
   Em verdade, grande  parte do entrave ao desenvolvimento turístico advém da precariedade na  definição e na delimitação do espaço rural e do urbano. No Brasil, esta  “fronteira” espacial possui um caráter administrativo, sendo o poder público  municipal o definidor das regiões rurais e urbanas. Soma-se a isso a definição  bastante vaga trazida pelo Ministério do Turismo de que “todas as atividades  praticadas no meio não urbano, que consiste de atividades de lazer no meio  rural em várias modalidades [...]” (MINISTÉRIO DO TURISMO, 2010).  
   Conforme Roque (2017)tal  ramo do turismo que tende a valorizar o ambiente rural iniciou seu  desenvolvimento há aproximadamente 20 anos e ainda há uma confusão nas  definições dos conceitos, sendo denominada sinonimamente como turismo de campo,  interior, alternativo, endógeno ou verde. Os princípios que delimitam e regem  este tipo de atividade devem atentar-se para a preservação das raízes, o  atendimento familiar, a harmonia, sustentabilidade ambiental, autenticidade de  identidade, qualidade do produto e envolvimento da comunidade local. 
Assim, pode-se dizer que para ser Turismo Rural, deve-se oferecer ao turista a oportunidade de desfrutar das particularidades das propriedades rurais e das peculiaridades da região, especialmente aquelas relacionadas às atividades agropecuárias. O atendimento precisa ser personalizado, para transmitir a hospitalidade do campesino ao visitante. O centro de interesse do turista que se desloca para áreas rurais está no conjunto constituído pela atividade produtiva, pela natureza e pelo modo de vida, que diferem da paisagem e do ritmo urbano (Ministério do Turismo, 2010).
            Apesar das classificações e  subdivisões que a prática do turismo impõe para uma melhor compreensão a nível  didático, o turismo rural abarca uma gama de benefícios que vão além do simples  caráter econômico. 
   A importância dos valores,  principalmente culturais e de sustentabilidade, é uma maneira de manter viva as  raízes que impulsionaram a criação local e a dinâmica da modalidade rústica de  turismo.  O turismo rural, em um contexto  de globalização crescente, é uma forma de resistência às tendências urbanas e  estrangeiras que, por vezes, padronizam o modus  vivendi das comunidades em nome do paradigma do desenvolvimento econômico global  de caráter urbano, negando as origens e consumindo indiscriminadamente os  recursos naturais sob a lógica imposta de um crescimento econômico que expressa  uma receita pronta norte-americana e eurocêntrica, não se atentando para as peculiaridades  de cada comunidade, mormente as pequenas glebas rurais e as áreas indígenas. 
3 O TURISMO RURAL NA COSTA DO CACAU
            A Região Nordeste é reconhecida  nacional e internacionalmente como um destino turístico muito atrativo. Segundo  pesquisa realizada pela Fundação Getúlio Vargas em novembro de 2017, foi  constatado que 82,6% dos entrevistados preferem o roteiro nacional para  viagens. Destes, mais da metade, 43,4%, escolhem a região Nordeste como destino  principal. A figura 2 apresenta preferências dos destinos turísticos regionais  no país. 
   Os turistas que optam  pela Bahia como destino de turismo, tem um amplo leque de opções. Dentre elas,  a Costa do Cacau, localizada entre dois outros destinos turísticos: a Costa do  Dendê, ao norte, e a do Descobrimento, ao sul. A região do cacau é composta por  Canavieiras, Una, Uruçuca, Ilhéus, Itabuna, Itacaré, Santa Luzia, sendo  Itabuna-Ilhéus suas cidades mais expressivas. Aqui, é importante notar que  essas duas áreas foram os pólos estratégicos para o desenvolvimento da economia  cacaueira nas épocas áureas, direta ou indiretamente: Ilhéus com a base econômica  na agricultura primária e Itabuna com enfoque na prestação de serviços. Além  disso, a proximidade com a Mata Atlântica favoreceu o plantio do cacau, como  também a presença de um importante órgão estratégico à época: a CEPLAC, a qual se  localiza exatamente no eixo Ilhéus- Itabuna. 
   Com  a queda do cacau, conforme já explicitado no tópico 1, principalmente as  fazendas de cacau situadas neste eixo, as quais se destacavam na produção e  exportação cacaueira, viram-se obrigadas a sobreviverem por outros meios. Um  destes meios foi justamente a abertura de suas áreas rurais para o turismo  receptivo de cunho campestre e endógeno. 
   Segundo a Secretaria do  Turismo da Bahia (2015), o turismo na Costa do Cacau tem sido bastante significativo  para a economia da região, demonstrando que em 2014 a região foi destino de aproximadamente  828.501 viajantes, o que correspondeu à geração de aproximadamente R$  894.018.859,001  para  a região cacaueira. Embora a maior parcela destes turistas apresente interesse em  praias, sendo o turismo rural ainda um segmento pouco expressivo na Costa do  Cacau (Figura 1), não se pode ignorar a sua importância no crescimento  regional.
   Dentre as fazendas que  mais se destacam neste segmento, temos a Fazenda Provisão e Fazenda Yrerê,  ambas em Ilhéus. Conforme afirma Mira (2013), o turismo rural nestas áreas  ainda é embrionário e denota uma contradição com o não desenvolvimento de tal  ramo turístico na região Ilhéus-Itabuna, já que há elevada potencialidade local  para sua promoção, um contrassenso que, portanto, merece atenção.
   Neste  ponto, é possível fazer uma reflexão de que essas fazendas de cacau representam  a expressividade de uma cultura existente ainda hodiernamentee que foi base  para a estruturação e desenvolvimento das cidades de Ilhéus e Itabuna, como conhecidas  atualmente. Demais disto, a história cacaueira conjetura a preservação  ambiental da Mata Atlântica da região, devido à técnica que o cultivo do cacau  demanda. 
   A promoção deste tipo  de turismo constitui uma forma de não apenas introduzir aos visitantes os  produtos fabricados, muitas vezes in  natura, mas também de contar a história da região, o que os aproxima de um  turismo cultural, com notórios traços do ecoturismo e sustentabilidade, ligando-os  a áreas de plantio e cultivo de cacau, e, por consequência, das diversidades da  Mata Atlântica do sul da Bahia. 
   Na visão de  pesquisadores da região este setor, que poderia ser uma via econômica mais  expressiva para a região, não avança  devido a fatores culturais e à falta de apoio  público.
Quando este “caminho” é relativamente longo, há certa passividade. Elaborar um produto turístico rural, por exemplo, mesmo com tamanha disponibilidade de terras nas quais a produção ainda continua e com toda a cultura cacaueira arraigada, inclui-se neste caso. E, pior, demandaria o suporte de organizações públicas que adotassem tais produtos de infraestrutura, como estradas vicinais (MIRA, 2013, p.).
É importante destacar  que em que pese as dificuldades da prática do turismo rural na região,  principalmente por encontrar-se ainda nos estágios iniciais da sua implantação  e disseminação entre os visitantes, as fazendas de cacau tais como a Yrerê e Provisão,  encontraram na tecnologia a saída para a divulgação das suas instalações e  roteiros turísticos. É possível, atualmente, encontrar informações em páginas  pessoais na internet sobre as duas  fazendas. Ambas oferecem serviços variados para os visitantes, tais como passeios  nas roças produtivas, venda de produtos fabricados, passeios em trilhas na mata  atlântica, bem como visitas ao conjunto arquitetônico que refletem a estrutura  e modelo da época pomposa do cacau.
   A acessibilidade,  principalmente por meio virtual, vem sendo uma arma na promoção deste ramo de  turismo e principalmente no instigar da curiosidade comunitária acerca das  características que permearam e ainda permeiam o cultivo de uma das frutas mais  preciosas da região, bem como para a atração de novos investidores. 
   Consoante dados  publicados pela Secretaria de Turismo da Bahia (2015), as duas fazendas citadas  são classificadas como pontos turísticos da região de Ilhéus, possuindo como  topologia dos atrativos turísticos a natureza e a cultura, estando classificadas  no segmento de turismo cultural com notas de acesso de quatro pontos, em uma  escala de zero a cinco pontos. 
   Além do quesito  cultural, o turismo desta espécie consiste na manutenção das estruturas  tradicionais, principalmente no tocante aos valores e ao modo de vida das  comunidades rurais, bem como dos elementos históricos do cotidiano da região e  das famílias (MINISTÉRIO DO TURISMO, 2010).
   Outro quesito que deve  ser destacado, e principalmente analisado, é a importância da conscientização  da preservação e educação ambiental que o turismo rural na terra dos cacauais proporciona  aos visitantes. A cultura do cacau através da utilização do sistema das  cabrucas 2 permitiu que parte significativa das árvores de grande porte da Mata Atlânticafossem  preservadas, a qual contava em 2013 com apenas 12,5% de sua formação original  segundo dados do SOS Mata Atlântica. 
   Neste sentido, por seus  encantos culturais, históricos e preservacionistas, atrelados a um contexto de  reconversão econômica cacaueira,não é à toa que mesmo de maneira incipiente e  deveras precária, o poder público tem pensado em alternativas ao fomento da  atividade turística fundada no cacau no sul da Bahia.
              Um dos  projetos municipais que vem tentando colaborar com a importância histórica e  cultural das fazendas de cacau é a construção da Estrada de Chocolate (figura  3). A obra, que teve seu roteiro iniciado em agosto de 2017, é uma parceria  entre o Governo da Bahia e a Prefeitura de Ilhéus,prevendo 42 quilômetros da  BA-262 que ligam Ilhéus à Uruçuca e percorrem em seu trajeto as formosas  fazendas de cacau (SECOM ILHÉUS, 2017). 
   Sem dúvida, o investimento,  a princípio indireto, tendo em vista que não possui o objetivo primordial de  fomentar diretamente o turismo rural dentro das fazendas e sim do trajeto como  um todo, incluindo fábricas de chocolate, proporciona uma significativa  elevação neste ramo turístico, uma vez que a estrada, por ser temática, envolve  os visitantes e aguça suas atenções em para como a saga do cacau foi travada na  região, bem assim como os produtos são criados e a economia das fazendas  encontram-se atualmente no pós-crise, alavancando e contribuindo também para a  atração de receita à região percorrida pela estrada, uma vez que  “as pessoas que visitarem o sul da Bahia  poderão conhecer todo o processo, de cultivo, colheita, preparação das amêndoas  e produção do chocolate, adquirindo marcas de qualidade” (SECOM BA, 2017)
Para o Governo da Bahia  o objetivo é a retomada do desenvolvimento regional, e “a Estrada do Chocolate  é estratégica porque atua como pólo difusor da produção verticalizada, além do  forte atrativo turístico", destacando o casamento entre as belezas  naturais da região e o sabor do chocolate premium” (SECOM BA, 2017) .
   Como já observado  anteriormente, o turismo na Costa do Cacau chegou em 2014 a arrecadar uma  receita de aproximadamente R$ 894.018.859,001, o que é bastante expressivo se  tomados os impactos locorregionais da crise de 1989, principalmente em Ilhéus,  que era destacadamente uma das maiores produtoras de cacau. Deste montante, não  cabe esquecer, parte advém da atividade turística campestre endógena, ocupante  do segundo lugar na preferência dos excursionistas. 
   A conversão da  utilidade das fazendas de apenas produtoras para promotoras de eventos  turísticos significa um atrativo de receita, mas, acima de tudo, de  investimentos públicos para o fomento do turismo rural na região cacaueira de  forma acentuada, apesar de a realidade nacional no tocante ao turismo rural  ainda não expressar todo o seu potencial.
   Por se tratar de uma  iniciativa recente não foram encontrados dados do quanto esta estrada impacta na  economia da região, entretanto, espera-se que em relação ao turismo rural este  segmento seja mais destacado e que possa receber investimentos mais diretos de  forma melhor estruturada para o desenvolvimento deste setor ainda pouco  explorado e promovido na Costa do Cacau.
CONCLUSÃO
            Apesar de todos os benefícios e  potencial que o turismo rural possui na Microrregião Ilhéus-Itabuna, este ainda  não recebe atenção expressiva. 
   Inegavelmente, percebe-se que a  escolha dos viajantes por áreas como o campo, ocupando o segundo lugar nas  preferências de destino na região brasileira mais atrativa aos turistas, a  Nordeste, conduz à ideia de que o turismo rural, se devidamente investido e  divulgado, tem o condão de proporcionar uma participação expressiva na economia  da região cacaueira, desenvolvendo-a em largos passos. Somado a isto, o eixo  Itabuna-Ilhéus é estratégico em tal fim, tendo em vista ser cortado por uma  estrada asfaltada e possuir atrativos extras como Universidades e aeroporto, os  quais contribuem para o acesso e chamariz aos visitantes. 
   Neste caminho de raciocínio, as  possibilidades de desenvolvimento do turismo rústico em fazendas de cacau seriam  não apenas desejáveis, mas também necessárias, uma vez que a exploração desta  parcela da economia adquire claros contornos de mercado, bem como de fomento à  diversidade cultural, à história regional e à sustentabilidade e preservação da  Mata Atlântica, atendendo-se às riquezas naturais, e, como não mencionar, ao  valor arquitetônico e cultural de uma região que inspirou um dos maiores  escritores do mundo: Jorge Amado.
   Para tanto, seria fundamental a  reunião de esforços no sentido de promover uma maior expansão deste segmento,  que perpassa não apenas pela questão financeira, mas também pela pesquisa e  controle por órgãos estatais em busca de contornar a informalidade que ainda  circunda este segmento, o qual compromete o levantamento de dados que possibilitem  estudos mais aprofundados sobre a expansão ou até mesmo o melhoramento deste  ramo que tende a servir de mais uma alternativa ao desenvolvimento local. 
   De fato, pesquisar dados sobre o  turismo rural é um desafio. Poucos são os materiais que tratam do assunto e  raros os artigos que se propõem a discutir o tema. O leque de informações  torna-se ainda menor quando se associa a abordagem ao turismo rural da região cacaueira. 
   O cenário local deste segmento acompanhaos  contornos nacionais, nos quais a não combinação de fatores técnicos,  principalmente provenientes dos municípios e do Estado, não permite que o  potencial econômico da atividade possa aflorar de forma significativa.  Representa, portanto, uma contradição, tendo em vista que se trata de uma região  que conforma diversos fatores graciosos.
   A história do cacau merece ser falada,  e, ademais, vivenciada, não apenas em contos, romances ou na paisagem urbana,  mas em sua origem, extraídadas nuances e das dinâmicas que ainda subsistem nas  fazendas de cacau, daí porque a Estrada do Chocolate pode representar um  significativo passo no caminho da reconversão e crescimento econômicos.
REFERÊNCIAS
BLINDER, Daniella. Análise da fragmentação da Mata Atlântica na região sul da Bahia: uma contribuição da geotecnologia para o estudo da dinâmica da paisagem. Anais do X Encontro de Geógrafos da América Latina. Universidade de São Paulo. 2015. Disponível em:<http://www.observatoriogeograficoamericalatina.org.mx/egal10/Geografiasocioeconomica/Geografiaespacial/04.pdf>. Acesso em: 20 jun. 2018.
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