Observatorio Economía Latinoamericana. ISSN: 1696-8352


OS POTENCIAIS DOS SHOPPINGS CENTERS NO PROCESSO DE TERRRITORIALIZAÇÃO NA CIDADE DE FORTALEZA

Autores e infomación del artículo

Frederico Augusto Nunes de Macêdo Costa*

Centro Universitário Uniateneu em Fortaleza - Ceará, Brasil

Email: fredmacedo8@gmail.com


RESUMO: A década de 1970 foi caracterizada pela crescente descentralização comercial do Centro de Fortaleza, ocasionada por uma expansão urbana, com a geração de centros secundários por toda a cidade e pelo deslocamento dos grandes magazines, para uma nova modalidade de empreendimento comercial que se popularizava pelo mundo todo: O Shopping Center. O Centro de Fortaleza perdia assim uma de suas centralidades mais importantes que era aglutinar as atividades comerciais da sociedade, além de permitir o desenvolvimento de inúmeras formas de territorialização. Os shoppings centers no decorrer dos anos, por sua vez, expandiram seu campo de atuação sobre a sociedade, além da relação comercial, de tal forma que hoje seu “ideário de espaço perfeito”, se apropria de usos, funções e processos de territorialização, notadamente de espaços públicos como as praças, ao mesmo tempo em que influencia a estética cada vez mais minimalista e sem atrativos dos espaços públicos
PALAVRAS-CHAVE: Territorialização na Praça do Ferreira. Shopping Centers em Fortaleza. Espaços Públicos em Fortaleza.
RESUMEN: La década de 1970 se caracterizó por la creciente descentralización comercial del Centro de Fortaleza, causada por una expansión urbana, con la generación de centros secundarios en toda la ciudad y el desplazamiento de las principales revistas, para un nuevo tipo de empresa comercial que se hizo popular en todo el mundo. todo: el centro comercial. El Centro de Fortaleza perdió así una de sus centralidades más importantes que era aglutinar las actividades comerciales de la sociedad, además de permitir el desarrollo de innumerables formas de territorialización. A lo largo de los años, los centros comerciales, a su vez, han ampliado su campo de acción sobre la sociedad, más allá de la relación comercial, de modo que hoy en día su "ideal de espacio perfecto", se apropia de los usos, funciones y procesos de territorialización, notablemente espacios públicos como las plazas, al tiempo que influye en la estética cada vez más minimalista y poco atractiva de los espacios públicos
PALABRAS-CLAVE: Territorialización en la plaza Ferreira. Centros comerciales en Fortaleza. Espacios públicos en Fortaleza.

ABSTRACT: The 1970s were characterized by the growing commercial decentralization of the Center of Fortaleza, caused by an urban expansion, with the generation of secondary centers throughout the city and the displacement of major magazines, for a new type of commercial enterprise that became popular around the world. todo: The Shopping Center. The Center of Fortaleza thus lost one of its most important centralities that was to agglutinate the commercial activities of society, besides allowing the development of innumerable forms of territorialization. Malls over the years, in turn, have expanded their field of action over society, beyond the commercial relationship, so that today their “ideal of perfect space”, appropriates the uses, functions and processes of territorialization, notably public spaces such as squares, while influencing the increasingly minimalist and unattractive aesthetics of public spaces.
KEYWORDS: Territorialization in Ferreira Square. Shopping Centers in Fortaleza. Public Spaces in Fortaleza.

Para citar este artículo puede uitlizar el siguiente formato:

Frederico Augusto Nunes de Macêdo Costa (2019): "Os potenciais dos shoppings centers no processo de terrritorialização na cidade de Fortaleza", Revista Observatorio de la Economía Latinoamericana, (diciembre 2019). En línea:
https://www.eumed.net/rev/oel/2019/12/potenciais-shoppings-centers.html
//hdl.handle.net/20.500.11763/oel1912potenciais-shoppings-centers


- INTRODUÇÃO:

  • – A praça: Espaço polivocacional

Para entendermos a importância e relevância dos espaços públicos, mais notadamente a praça pública, consideramos pertinente nos remeter, inicialmente, ao conceito de Ágora como uma das primeiras formas de organização do espaço público.
Nas Cidades Gregas a Ágora era um espaço normalmente centralizado, exclusivo para pedestres, equitativo e paritário em sua natureza onde o cidadão, através de sua frequência quase diária a esse lugar, via despertar as ideias de igualdade, fraternidade e liberdade e que mais tarde iriam originar, através da prática destes valores, a democracia. Nesses espaços públicos sem dimensões e/ou configurações físicas determinadas, margeados pelas edificações mais importantes da cidade, era onde ocorriam todas as atividades citadinas pertinentes à integração e a sociabilização de seus cidadãos nos mais variados graus, bem como a prática forense, debates filosóficos e intelectualizados e, ainda, onde eram desenvolvidas atividades secundárias como pequenas práticas comerciais. Mais precisamente, sobre essas funções da Ágora, Mumford (1982) comenta que:
Se, na economia do século V, a ágora pode ser apropriadamente chamado uma praça de mercado, sua função mais antiga e mais persistente foi a de ponto de encontro comunal. Como de hábito, o mercado era subproduto do ajuntamento de consumidores, que tinham outras razões para se reunirem além de fazerem negócios. (MUMFORD, 1982, p. 166).
Tal configuração espacial das cidades gregas acabou por influenciar outras civilizações como a Romana e posteriormente a Bizantina, entre outras que adotaram espaços análogos as Ágoras em suas cidades a exemplo dos Fóruns. Com o declínio do Império Romano, o crescimento da Igreja Católica influenciando e solicitando uma conduta social mais direcionada à reflexão e ao insulamento e os inúmeros embates entre os nobres europeus por definições territoriais fizeram a vida social ocorrer intramuros dos Castelos Feudais e, por conseguinte, o inevitável recrudescimento dos espaços públicos.
Até o início do século XVIII, na Europa, o projeto de praças restringia-se ao entorno dos palácios que nem sempre estavam inseridos em contexto urbano. Normalmente os espaços abertos, arborizados e floridos eram características da arquitetura dos palácios de veraneios ou campestres, sendo que só na metade do século XVIII, com a arquitetura estilo Rococó, é que os grandes jardins precursores dos espaços públicos e praças começaram a ganhar espaço nas cidades. Os espaços livres existentes e marcados pelas aglomerações humanas estavam, em geral, relacionados à existência de mercados populares (comércio) ou no entorno de igrejas e  catedrais.  No século XIX, com a transformação de Paris decorrente da intervenção feita por
Haussmann, influenciado pelos ideais iluministas e positivistas a Cidade Luz despontou como uma cidade burguesa por excelência. As alterações urbanas efetivadas no Centro de Paris influenciadas pela arquitetura neoclássica que mais uma vez resgatava a lógica espacial grega, se caracterizava por grandes e largas avenidas partindo em radiais concêntricas e tendo o Arco do Triunfo como centro. Outras características eram os grandes jardins, alamedas arborizadas e espaços abertos para convivência e interação. É aí que o desenho e configuração espacial das praças entram em cena, preconizado pelo trabalho de profissionais como Frederick Law Olmsted que projetou o Central Park de Nova Iorque.
O conceito de Ágora ultrapassa, de certo modo, o período grego – romano, demonstrando que as cidades, principalmente as latinas, com seus espaços abertos e suas variantes como cafés avarandados e quiosques descendem e se referenciam ao conceito de Ágora.
Lynch (2014) seguindo essa acerção afirma que os espaços públicos são pontos nodais, porquê :

São lugares estratégicos de uma cidade através dos quais um observador pode entrar, são focos intensivos para os quais ou a partir dos quais ele se locomove. Podem ser basicamente junções, locais de interrupção do transporte, um cruzamento ou uma convergência de vias, momento de passagem de uma estrutura a outra. Ou podem ser meras concentrações que adquirem importância por ser a condensação de algum uso ou de alguma característica física, como um ponto de encontro numa esquina ou uma praça. Alguns desses pontos nodais de concentração são o foco e a síntese do bairro, sobre o qual sua influência se irradia e do qual são um símbolo (LYNCH, 2014, p. 53).

Segundo os arquitetos e urbanistas, Macedo e Robba (2002), as praças, enquanto espaços públicos, são espaços abertos e urbanos destinados ao lazer e ao convívio da população, e sua função primordial é a de aproximar e reunir as pessoas, seja por motivo cultural, econômico (comércio), político ou social. A praça é, também, um espaço dotado de símbolos, que carrega o imaginário e o real, marco arquitetônico e local de ação, palco de transformações históricas e socioculturais, sendo fundamental para a cidade e seus cidadãos. Constitui-se em local de convívio social por excelência (DIZERÓ, 2006). É um espaço de reunião, construído para e pela sociedade, imbuída de significados, marcos centrais da constituição de trajetos, ponto de chegada e partida, concentração e dispersão. Consiste em espaço para pedestres e é palco representativo da dimensão cultural e histórica da cidade, além de abrigar, frequentemente, o comércio formal e o informal, como as  feiras populares, coloniais, de artesanato, entre outras (FONT, 2003). Espacialmente, a praça é definida pela vegetação e outros elementos construídos. Assim, de acordo com cada sentido que a palavra praça pode assumir, estes espaços podem ser classificados de acordo com Macedo e Robba (2002), em:
îPraça Jardim: espaços nos quais a contemplação das espécies vegetais, o contato com a natureza e a circulação são priorizados. Estes podem ser fechados por grades ou cercas, como o passeio público do Rio de Janeiro e de Curitiba, ou ainda podem ser abertos e rodeados de imóveis (comerciais e residenciais). No Brasil, o conceito de praça está, normalmente, associado a ideia de verde e de ajardinamento urbano, por este motivo, os espaços públicos formados a partir do pátio das igrejas e dos mercados públicos é comumente chamado de adros ou largos;
îPraça Seca: largos históricos ou espaços que suportam intensa circulação de pedestres. Em algumas destas praças inexiste qualquer tipo de árvores ou jardins e nelas o importante é o espaço gerado pela arquitetura e são relações entre volumes do construído e do vazio que dão ao conjunto a escala humana. Nestes locais destacam-se símbolos arquitetônicos como a Praça de São Marcos em Veneza (Itália), a Praça de São Pedro em Roma (Itália) ressaltando a Basílica, a praça dos três Poderes em Brasília e o Memorial da América Latina em São Paulo;
îPraça Azul: praças na qual a água possui papel de destaque. Alguns belvederes e jardins de várzea possuem esta característica;
îPraça Amarela: as praias em geral são consideradas praças amarelas;
Conforme ainda Macedo e Robba (2002), os benefícios trazidos pelas praças públicas decorrem tanto da vegetação que pode ser abrigada por elas, quanto de aspectos subjetivos relacionados à sua existência, como a influência positiva na psiquê coletiva da população, proporcionada pelo contato com a área verde e/ou pelo uso do espaço para o convívio social. A vegetação urbana atua ainda, de forma direta, no conforto ambiental.
Macedo e Robba (2002) classificam os valores atribuídos às praças em três categorias: Valores ambientais, valores funcionais e valores estéticos e simbólicos.
îValores Ambientais: Os valores ambientais dizem respeito ao espaço livre ocupado pelas praças que permite: melhoria na ventilação e aeração urbana; melhoria da insolação de áreas mais adensadas; as árvores promovem o sombreamento das ruas e seus canteiros não irradiam tanto calor como o asfalto ou piso de concreto, propiciando o controle da temperatura; a cobertura vegetal permite a melhoria na drenagem das águas pluviais e a proteção do solo contra a erosão (MACEDO e ROBBA, 2002, p. 32).
îValores Funcionais: Os valores funcionais correspondem à importância que muitas praças têm como as principais, senão únicas, opções de lazer urbano. Estas áreas servem como ponto de encontro, local aberto para apreciação da paisagem, além de disporem, muitas vezes, de outros atrativos destinados ao lazer da população, como: coretos para apresentações culturais, fontes que jorram água, bancos para descanso, quiosques com vendas de lanches, barras de ginástica, pistas de caminhada e ciclovias, parquinhos para crianças, entre outros (MACEDO e ROBBA, 2002, p. 32).

îValores Estéticos e Simbólicos: Os valores estéticos e simbólicos representam a função das praças, enquanto espaços públicos, objetos referenciais e cênicos da paisagem urbana, além de exercerem importante papel na identidade de um município, bairro ou rua. Geralmente relacionado à carga histórico-cultural, as praças são vistas e atuam como espaço de diálogo, local acolhedor para o passeio e lazer de toda sociedade. Do ponto de vista estético, as praças contribuem através das qualidades plásticas – cor, forma, textura – de cada uma das partes visíveis que as integram (MACEDO e ROBBA, 2002, p. 33).
O geógrafo Angelo Serpa, em seu livro “O espaço público na cidade contemporânea” (2014), afirma que:
O espaço público deve ser compreendido, sobretudo, como o espaço da ação política, ou, ao menos, da possibilidade da ação política na contemporaneidade (...) Ele também é analisado sob a perspectiva crítica de sua incorporação como mercadoria para o consumo de poucos, dentro da lógica de produção e reprodução do sistema capitalista na escala mundial. Ou seja, ainda que seja público, poucos se beneficiam desse espaço teoricamente comuns a todos (SERPA, 2014, p. 09).
De um modo geral, o autor associa os espaços públicos ao espaço das ações políticas, mas também à lógica do consumo, uma vez que o centro comercial, o mercado que são lugares privados, mas que são abertos ao público em geral, caracterizando-os, portanto como espaços públicos.
Caminhando de certo modo na mesma direção de Serpa, o filósofo urbano Thierry Paquot (2009), assim considera o espaço público.
[...] o espaço público evoca não somente o lugar do debate político, da confrontação das opiniões privadas e a publicidade se esforça de tornar púbicos, mas também uma prática democrática, uma forma de comunicação, de circulação dos diversos pontos de vista; Os espaços públicos, em si, designam, os lugares acessíveis ao(s) público(s) percorridos pelos habitantes, quer eles residam ou não nas proximidades. Estas são as ruas e as praças [...]
Portanto os espaços públicos são aqueles espaços frequentados pelas pessoas de modo que mesmo que o espaço seja privado, como um Shopping Center, mas aberto ao público, ele se caracteriza como espaços livres que em geral se inserem na lógica urbana.
Continuando tratando dos espaços públicos, Serpa (2014), complementa que este é visto também [...] simbólico, da reprodução de diferentes ideias de cultura, da intersubjetividade que relaciona sujeitos e percepções na produção e reprodução dos espaços banais e cotidianos [...]
Serpa (2014) ainda faz uma correlação entre o espaço público, seu consumo cultural e a cidade, afirmando que:

No período contemporâneo, o “consumo cultural” parece ser o novo paradigma para o desenvolvimento urbano. As cidades são reinventadas a partir da reutilização das formas do passado, gerando uma urbanidade que se baseia, sobretudo, no consumo e na proliferação (desigual) de equipamentos culturais. Nasce a cidade da “festa- mercadoria”. Essa nova (velha) cidade folcloriza e industrializa a história e a tradição dos lugares, roubando-lhes a alma. É a cidade das requalificações e revitalizações urbanas, a cidade que busca vantagens comparativas no mercado globalizado das imagens turísticas e dos lugares espetáculos (SERPA, 2014, p. 107).

Entender os usos de um espaço público de uma cidade contemporânea é acima de tudo compreender sua capacidade caleidoscópica, volátil e de mobilidade contínua enquanto gera relações e enquanto é gerada a partir de suas dinâmicas sócias-espaciais, toda sorte de digressões: violência, segregação, imigração, cidadania e participação. É apreender sua natureza de “colcha de retalhos” (SERPA, 2014, p. 181), e analisar a atuação da esfera pública enquanto representantes da sociedade.
Outro fator de relevância seria a valorização imobiliária, instrumento econômico que direciona os usos do solo urbano e os dimensiona em termos pecuniários. Atualmente os parques e praças públicas são considerados pontos nodais das ações dos gestores públicos e da iniciativa privada como elementos dinâmicos de inúmeros programas de renovação urbana. O que destaca um aspecto contraditório, visto que [...] como elementos de dinamização da economia urbana, os parques e praças públicos parecem acentuar a segregação social, funcionando como – álibis – de determinadas políticas de intervenção urbana (SERPA, 2014, p. 10). Álibis, porque [...] os parques públicos sempre representam e expressam valores éticos e estéticos que ultrapassam largamente seus limites espaciais (SERPA, 2014, p. 42). Tais representações dos parques públicos e praças parecem ser atemporais, visto que se cristalizaram em todo e qualquer discurso oficial e nas políticas públicas aplicadas às cidades como higienismo, estética, funcionalidade, progressismo, entre outros “motivos”, mas que normalmente acabam por gerar uma relação antagônica e de descontinuidade entre os parques e praças públicas e suas áreas lindeiras.
Expandindo o debate sobre a praça, enquanto espaço público, faz-se necessário tecermos antes, alguns comentários sobre a ideia de centro urbano. Para tanto torna-se necessário definir e distinguir os conceitos de centro e centralidade.

  • – Centro e centralidade

O debate sobre centralidade teve seu início com maior poder de sistematização a partir da publicação da tese de doutorado de Walter Christaller, 1933, intitulada “Die Zentralen Orte in Suddeutschland”. Neste trabalho foi desenvolvida a Teoria dos Lugares Centrais, que proporciona ricas possibilidades de investigação de padrões de distribuição espacial de bens e serviços a partir de parâmetros de variabilidade funcional, critérios de importância e da metodologia de compreensão do alcance espacial mínimo e máximo dos bens centrais.
As redes de localidades centrais passaram então a serem analisadas em diversos estudos, constituindo importantes ferramentas metodológicas e elaborações conceituais, como o destaque feito por Corrêa (1989), sobre os arranjos estruturais e espaciais.
Cabe destacar entretanto que a nossa abordagem tem como foco a centralidade enquanto ferramenta de redefinição de usos, na produção do espaço urbano da cidade.
Para Corrêa (1989, p. 37), Centralização e Área Central, constituem processos espaciais e conforme destaca,
A partir do começo do século XX o processo de centralização e a sua correspondente forma espacial, a Área Central passaram a ser sistematicamente considerados pelos estudiosos do fenómeno urbano. […] De fato, a Área Central constitui-se no foco principal não apenas da cidade, mas de sua hinterlândia. Nela concentram-se as principais atividades comerciais, de serviços, da gestão pública e privada, e os terminais de transportes inter-regionais e intra-urbanos. Ela se destaca na paisagem da cidade pela sua verticalização (CORRÊA, 1989, p. 37).

Preocupado em aprofundar o conceito em destaque, Corrêa analisa a gênese da área central considerando a intensidade dos processos de fluxos de capital, mercadoria, pessoas e ideias no dinamismo da circulação que se ampliou exponencialmente em termos de qualidade e quantidade dos transportes inter-regionais através dos terminais ferroviários, a partir da segunda metade do séc. XIX. Isto incluía os terminais marítimos e acabava minimizando os custos de transbordo e concentrando a localização nascente de atividades como comércio atacadista, indústria, escritórios.
Em sua formação, o centro pode ser entendido como um ponto de convergência de uma grande parcela da população que diariamente circula na cidade. Pode ser entendido também como área de concentração de um grande número de estabelecimentos de comércios e serviços, ou ainda pela presença de instituições de administração pública (Centro administrativo). A  concentração dos comércios e do serviços e de outras funções desencadeou novas formas de acessibilidade dentro da cidade, conforme assinala Corrêa (1989, p. 39):
A acessibilidade, por sua vez, atraiu as nascentes lojas de departamentos e de outros gêneros do comercio varejista, bem como numerosas atividades instaladas em escritórios. O mercado de trabalho foi ampliado mais ainda e os transportes intra - urbanos passaram a servir a este setor da nascente Área Central (CORRÊA, 1989, p. 39).
Assim, a área central insurgiu como resultado do processo de centralização, onde acessibilidade e demais fatores abordados tornaram-se preponderantes na construção e definição deste conceito. Como aponta mais uma vez Corrêa (1989, p. 39): [...]Verifica-se certa sincronia entre o emergir do capitalismo em sua fase plenamente industrial e o aparecimento da Área Central. Processo, forma e também as funções estão assim conectados” (CORRÊA, 1989, p. 40). Desse modo defini-se:

  • Área Central da cidade com uso intensivo do solo, com maior concentração de atividades econômicas, sobretudo do setor terciário [...] b) Ampla escala vertical [...] c) Limitada escala horizontal [...] d) Limitado crescimento horizontal [...]

e) Concentração diurna, durante as horas de trabalho, da população, sobretudo pedestres [...] f) Foco de transportes intra-urbanos [...] g) Áreas de decisão [...] (CORRÊA, 1989, p. 40)
Já na análise de Villaça (1998), a definição de centro e centralidade nem sempre remetem ao contexto de ponto geográfico, definido anteriormente, posto que considera que o centro pode ser fruto das primeiras delimitações, ou seja, do sítio histórico onde a cidade se originou, enquanto a centralidade (dialogando com as concepções de Corrêa) é explicada pelo fator deslocamento.
O centro se distingue pela multifuncionalidade de elementos e obras que o compõe, afirmando seu valor como centralidade também pelo aglomerado de várias funções distintas que ai se encontra, contudo, as temporalidades diferentes não ofuscam a importância competida ao comércio por varejo que sustenta a dinâmica do centro formando uma teia urbana. O fenômeno da centralidade, associado à estagnação do centro tradicional das cidades, atingiu as cidades europeias depois das operações de reconstrução da Segunda Guerra Mundial (Fernandes, 1995). Os grandes centros comerciais europeus foram construídos sobretudo na década de 1980 e inícios da década de 1990. Este período comercial só chegou aos países do sul da Europa, e Portugal em particular, durante os anos 1990 (BALSAS, 1999). Porém, suas consequências foram gravemente sentidas pelos estabelecimentos comerciais mais antigos localizados nos centros urbanos, no continente Sul Americano.
Estas tendências de suburbanização também foram sentidas durante as duas últimas décadas em quase todas as cidades brasileiras, inclusive Fortaleza. Vargas (2000, p. 20-30) descreve o impacto do comércio no ambiente urbano de São Paulo como sendo um fenômeno relativamente recente. Essa percepção demonstra a universalidade do desenvolvimento comercial e de centralidades periféricas e a necessidade de encontrar respostas adequadas para o fato. Sobre esse fenômeno, Fernandes (1995, p.106) explica.

Vários factores se combinaram para fazer com que aquele que foi o único centro da cidade, comece a ser visto apenas como um dos centros da cidade. Por um lado, porque em alguns casos o centro comercial se definiu no exterior de um outro centro, o histórico, por outro, porque se difundiram conceitos, termos e concretizações associados à especialização de espaços e construções, como os de centro cultural e desportivo ou centro comercial, por outro ainda, porque um vasto conjunto de factores permitiu que aquele que era, pelo menos economicamente, “o” centro, passasse à condição de “centro tradicional”, em vista do aparecimento de “novas centralidades” no interior ou na envolvência das maiores cidades FERNANDES, 1995, p. 106).

Isto posto, podemos afirmar que ao se analisar o desenvolvimento das dinâmicas sócias – espaciais e das configurações físico – espaciais das praças de Fortaleza, enquanto partícipes do próprio processo de expansão urbana da cidade, faz-se necessário compreendermos a relação entre a forma espacial do objeto de estudo e as suas conexões com a estrutura social, os processos e suas funções urbanas para a Cidade e levarmos em consideração três aspectos relevantes para essa compreensão que são: 1 - a produção do capital como fato gerador da expansão urbana de Fortaleza e, por conseguinte das alterações na configuração sócio – espacial da Praça, gerando no decorrer de sua história variados níveis de centralidade; 2 - as intervenções urbanas ocorridas como causa das alterações física – espaciais efetivadas nas praças e como consequência das necessidades das Gestões Públicas, que em tese, se legitimarem enquanto poder local e pretensa ferramenta de equidade social dentro do contexto histórico da época; 3 - por fim as diversas representações sociais que as praças possuiram no decorrer da sua história para a sociedade da urbe fortalezense. Vale ressaltar que estes três aspectos embora imbricados, concomitantes, intrínsecos e não excludentes, em alguns momentos assumiram posicionamento ora concordantes, ora dicotômicos e até antagônicos entre si em relacionamentos de consensualidade e de conflitos observados na origem da cidade até a contemporaneidade. Nos apoiamos em Corrêa (1989), que discute o tema dos agentes sociais produtores do espaço urbano. Para ele os agentes sociais que “fazem e refazem o espaço urbano” são: os proprietários fundiários, os promotores imobiliários, os proprietários dos meios de produção (os produtores do capital), o Estado (os gestores públicos) e os grupos sociais excluídos (também eles enquanto representantes da sociedade).


Retornando a análise das Ágoras, Podemos observar que as relações mercantis ocupavam caráter secundário nesse período por que as cidades possuíam viés político, a ponto de Henri Lefebvre em seu livro Revolução Urbana (1999), conceituar a evolução urbana das cidades como cidades políticas seguidas das cidades comerciais quando da expansão urbana impulsionada pelo surgimento ainda insipiente das relações comerciais, além- fronteiras das nações, seguida das cidades industriais onde o espaço urbano já se definia e se configurava pelas relações mercantis que valorizavam ou depreciavam o uso e ocupação do solo, enquanto mercadoria e produto de uma sociedade industrial, até a cidade contemporânea, enquanto sociedade urbana que representa agora, mais que um espaço ocupado por atividades específicas interrelacionadas, um conceito que [...] designa, mais que um fato consumado, a tendência, a orientação, a virtualidade. Isso, por conseguinte, não tira o valor de outra caracterização crítica da realidade contemporânea como, por exemplo, a análise da “sociedade burocrática de consumo dirigido” (LEFEBVRE, 1999, p. 16). É exatamente o consumo dirigido, explicitado por Lefebvre, que determina as práticas comerciais atuais que têm como objetivo atrair cada vez mais sua clientela com a promessa e proposta de atender suas vontades, desejos, expectativas e anseios. Seja com a idéia de vincular e agregar simulacros de realidade perfeita através do consumo, seja através de propagandas subliminares que estimulam e ditam o consumo. Salgueiro e Cachinhos (2006), em artigo intitulado “As relações Cidade – Comércio: Dinâmicas de Evolução e Modelos Interpretativos”, afirmam que na sociedade urbana [...] ocorreu uma setorização do comércio que tenta fidelizar sua clientela de maior poder aquisitivo ao tentar associar seu produto a um estilo de vida (2006, p.22). Apesar de suas análises serem referenteres a evolução urbana de Lisboa, esta muito se asemelha a outras evoluções uurbanas ocorridas em outras cidades do mundo como em outras cidades do Brasil, inclusive Fortaleza.
Tal afirmação se exemplifica quando observamos a existência de uma temporalidade diferenciada em relação à do entorno e do interior do shopping. Até os materiais construtivos utilizados são determinantes na permanência e vinculação do usuário com o espaço, como por exemplo o piso que é escorregadio, obrigando o frequentador a andar com certa lentidão e morosidade, fazendo com que este vivencie e se influencie com atmosfera lúdica dos shoppings, caso o contrário, estes apenas transitariam em seu interior. Observando seu interior, vemos que tudo brilha e reluz, os odores são agradáveis, as fachadas coloridas das lojas prometem alegria, felicidade e bem estar como se estas condições de existência pudessem ser valoradas e vendidas. As paredes do shopping encerram surpresas e garantem segurança. Se anteriormente as vitrines das lojas eram externas e exteriorizadas, atualmente estas se voltam para o interior do shopping como se afirmando ser apenas para poucos “olhos” seletos e merecedores de tal “benção”.
Nesta “cidade cenográfica”, os espaços comerciais, enquanto realidade material funcionam apenas como uma pré-condição de existência. Fornecem o palco, os cenários e os espaços de melhor visualização. É no plano simbólico, no diálogo que conseguem construir com os consumidores o espetáculo, as representações e as narrativas que acontecem e são construídas, para que tal cidade se torne real e faça parte do imaginário de cada um, e assim possam  ser concebidos, percebidos e vividos (trialética de Lefebvre). A fronteira entre a cena e a realidade se torna imprecisa, sobretudo na consciência dos “atores”, como incerta se torna também a separação entre atores e público, a cena e a entrecena. Os indivíduos que a usufruem vivem passando de uma representação para outra, sem se aperceberem disso e sem que se saiba afinal onde termina a ficção e começa a realidade. Num contexto de pura simulação e disfarce, onde a representação social imita não a coisa real, mas o imaginário, necessariamente o mundo tem que ser real porque é este e não outro que é desejado. Concomitante a construção deste “universo”, associa-se uma gama de atividades há bem pouco tempo díspares daquelas fornecidas usualmente por centros comerciais de prestação de serviços públicos como: Detran e Policia Federal; educacionais, a exemplos de Faculdades e outros cursos; de atividades de lazer como: academias de ginástica, além daquelas mais conhecidas como cinema, praça de alimentação e parques temáticos. Tudo  isso para incrementar sua atividade basilar que é a venda e o consumo e mais ainda agora com a permissão de poder entrar como seu animal de estimação.
Em suma, do ponto de vista do ambiente físico e material, a “cidade” construída pelos espaços comerciais só se efetiva através das práticas primordiais de consumo que transcendem a materialidade e no espaço é que  se efetiva a relação comércio e cidade.

– Considerações finais:

Podemos concluir, ante o exposto, que a diversidade de atividades que os Shopings Centers possuem de caráter diversional, além da profusão de serviços e ofertas mercantis, associada a uma estética e uma atmosfera irreal, construto e simulacro meticulosamente construídos com o intuito de atrair o cliente e fazer com que este permaneça o maior tempo possível dentro de seu espaço, fazem com que aumente cada vez mais seus frequentadores. Por sua vez os atuais espaços publicos estão possuindo elementos estéticos e construtivos, bem como equipamentos e mobiliários urbanos que fogem ao padrão usual de um espaço público mais se assemelhando a um espaço privado, mas sem os elementos de atração destes que em efeito contrário causam certo estranhamento e distanciamento em função de um conflito direto com as representações simbólicas atávicas herdadas da coletividade do que deveria ou poderia ser um espaço público, nos levando a fazer um questionamento sobre a apropriação das funções da praça, enquanto espaço público e detentor da primazia dos locais de encontro e interação da sociedade, pelos espaços privados em sua proposta de “ideário de espaço perfeito”, mais também da influência reversa dos espaços privados sobre a proposta cada vez mais minimalista e aparentemente sem atrativos, para a população, dos espaços públicos. E desses questionamentos nasce uma pergunta: Os espaços públicos continuam detentores do título de “Ágora Contemporânea”, ou outros espaços, agora de natureza privada, se apropriaram de forma definitiva dessa titularidade?

- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

BALSAS, Carlos José Lopes. Urbanismo comercial em Portugal e a revitalização do centro das cidades. Lisboa: Ministério da Economia, 1999.
BENÉVOLO, Leonardo. A história da cidade. Editora Perspectiva. São Paulo 2010.CORREA, Roberto Lobato. O espaço urbano. Série Princípios. Editora Ática. São Paulo 1989.
______________. Rede urbana e formação espacial – uma reflexão considerando o Brasil. In: Revista Território, Rio de Janeiro, nº. 8 jan./jun. 2000.
DIZERÓ, Joselle Davanço. Praça do interior paulista: estudos de caso nas cidades de Ribeirão Preto e Monte Alto/SP. Dissertação (Mestrado em Urbanismo) – Pontifícia Universidade Católica de Campinas - PUC, Campinas, 2006.
FERNANDES, José Alberto Rios. Urbanismo Comercial – A Experiência Portuguesa. Revista da Faculdade de Letras, X/XI, 1994-95. (105-125).
FONT, Mauro. A praça em movimento: processos de transformações morfológicas e funcionais no Brasil do século XX. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2003.
LEFEBVRE. Henri. A revolução urbana. Belo Horizonte: Ed.UFMG, 1999. MACEDO, S. S.; ROBBA, F. Praças brasileiras. São Paulo: Edusp, 2002 MUMFORD, Lewis. A cidade na história. Suas origens, transformações e perspectivas. Editora Martins Fontes. São Paulo 1982.
PAQUOT, T. L’espace public. Collection : Repères. Éditeur La Découverte. Paris, 2015.
SALGUEIRO, Theresa Baratta, CACHINHOS, Herculano.  As  relações cidade – comércio: Dinâmicas               de     evolução          e          modelos interpretativos.         Site: https://www.researchgate.net/publication/304751977. Acessado dia 16/09/2017.
SERPA, Angelo. Lugar e centralidade em um contexto metropolitano. A produção do Espaço Urbano. Editora Contexto. São Paulo 2014.
_______________O espaço Público na Cidade Contemporânea: São Paulo; Editora Contexto.2007.
SOUZA, M. L. ABC do Desenvolvimento Urbano. Editora Bertrand Brasil, Rio de Janeiro 2010.
VILLAÇA, Flávio. Espaço intra-urbano no Brasil. São Paulo: Stúdio Nobel. FADESP, 1998.

*Professor e Coordenador do Curso de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário Uniateneu em Fortaleza - Ceará, Brasil fredmacedo8@gmail.com

Recibido: 21/11/2019 Aceptado: 06/12/2019 Publicado: Diciembre de 2019

Nota Importante a Leer:
Los comentarios al artículo son responsabilidad exclusiva del remitente.
Si necesita algún tipo de información referente al articulo póngase en contacto con el email suministrado por el autor del articulo al principio del mismo.
Un comentario no es mas que un simple medio para comunicar su opinion a futuros lectores.
El autor del articulo no esta obligado a responder o leer comentarios referentes al articulo.
Al escribir un comentario, debe tener en cuenta que recibirá notificaciones cada vez que alguien escriba un nuevo comentario en este articulo.
Eumed.net se reserva el derecho de eliminar aquellos comentarios que tengan lenguaje inadecuado o agresivo.
Si usted considera que algún comentario de esta página es inadecuado o agresivo, por favor, escriba a lisette@eumed.net.

URL: https://www.eumed.net/rev/oel/index.html
Sitio editado y mantenido por Servicios Académicos Intercontinentales S.L. B-93417426.
Dirección de contacto lisette@eumed.net