Revista: Caribeña de Ciencias Sociales
ISSN: 2254-7630


REDE DE VIZINHOS PROTEGIDOS: POSSIBILIDADES DA PARTICIPAÇÃO SOCIAL NA REDUÇÃO DE CRIMES

Autores e infomación del artículo

ALVARES, Letícia Maria
UFV-Universidade Federal de Viçosa
leticia_alvares@yahoo.com.br
Psicóloga, Professora Universitária, Especialista em Políticas de Segurança Pública e Mestranda do Programa de Pós-Graduação stricto sensu em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local pelo Centro Universitário UNA.

NASCIMENTO, Alexandra
Centro Universitário Uma
alexandranascimento@uou.com.br
Arquiteta e Urbanista, Historiadora, Mestre e Doutora em Ciências Sociais, Professora do Programa de Pós-Graduação stricto sensu em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local do Centro Universitário UNA.


Resumo
O Presente artigo é um estudo de caso fruto da dissertação do Programa de Mestrado interdisciplinar em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local do Centro Universitário Una e tem como objetivo avaliar a contribuição da participação social na redução da criminalidade e no desenvolvimento local, tomando como referência o projeto Rede de Vizinhos Protegidos considerando dois bairros da cidade de Viçosa-MG. Pretende-se destacar a importância das associações comunitárias no novo cenário globalizado para o estabelecimento de vínculos e do dialogo junto ao poder público e órgãos de segurança sobre questões que envolvem os interesses da população e os resultados inovadores que este tipo de gestão participativa trás na redução de crimes e apontar, alguns limites observados neste tipo de gestão que podem refletir na mobilização do grupo e dificultar o alcance de maiores resultados não apenas relativos à segurança, mas acerca de questões abrangentes relacionadas à própria associação de moradores.
Palavras-chave: Criminalidade - Participação Social - Rede de Vizinhos - Gestão Social

Abstract
The present article is a case study fruit of the dissertation of the Interdisciplinary Master Program in Social Management, Education and Local Development of the University Center Una and aims to evaluate the contribution of social participation in crime reduction and local development, taking as a reference the project Protected Neighbors Network considering two neighborhoods of the city of Viçosa-MG. The aim is to highlight the importance of community associations in the new globalized scenario for the establishment of links and dialogue with public authorities and security agencies on issues involving the interests of the population and the innovative results that this type of participatory management brings in the reduction and to point out some of the limits observed in this type of management that may reflect on the mobilization of the group and hinder the achievement of greater results, not only regarding safety, but also about comprehensive issues related to the residents association itself.
Keywords: Crime - Social Participation - Neighbors Network - Social Management

Resumen
El presente artículo es un estudio de caso fruto de la disertación del Programa de Maestría interdisciplinaria en Gestión Social, Educación y Desarrollo Local del Centro Universitario Una y tiene como objetivo evaluar la contribución de la participación social en la reducción de la criminalidad y en el desarrollo local, tomando como referencia el proyecto Red de Vecinos Protegidos considerando dos barrios de la ciudad de Viçosa-MG. Se pretende destacar la importancia de las asociaciones comunitarias en el nuevo escenario globalizado para el establecimiento de vínculos y del diálogo junto al poder público y órganos de seguridad sobre cuestiones que involucran los intereses de la población y los resultados innovadores que este tipo de gestión participativa tras la reducción de los crímenes y señalar algunos límites observados en este tipo de gestión que pueden reflejar en la movilización del grupo y dificultar el logro de mayores resultados no sólo relativos a la seguridad sino sobre cuestiones amplias relacionadas con la propia asociación de vecinos.
Palabras clave: Criminalidad - Participación Social - Red de Vecinos - Gestión Social

Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

ALVARES, Letícia Maria y NASCIMENTO, Alexandra (2018): “Rede De Vizinhos Protegidos: possibilidades da participação social na redução de crimes”, Revista Caribeña de Ciencias Sociales (diciembre 2018). En línea:
https://www.eumed.net/rev/caribe/2018/12/vizinhos-protegidos.html
http://hdl.handle.net/20.500.11763/caribe1812vizinhos-protegidos


1. Introdução

A violência urbana é uma questão que preocupa todas as pessoas que vivem nas cidades, sejam elas de pequeno, médio ou grande porte (SANTOS, 2009).
Nas últimas décadas, com a crescente criminalidade e as dificuldades vivenciadas pela polícia na repressão do crime, abriu-se a possibilidade para inserção de um novo paradigma na área da Segurança Publica que culminou com a implantação de projetos cujos objetivos centravam-se na aproximação deste tipo de controle estatal junto à população na construção de parcerias.
Destaca-se neste cenário, a Rede de Vizinhos Protegidos que tem por intenção fazer frente à violência por meio de ações preventivas (LOPES e BATELLA, 2010).
Felix (2007) acredita que a união de diversos atores sociais torna possível o controle do crime, mas principalmente tem papel para interromper o desencadeamento de uma cadeia de eventos, interferindo nos mecanismos que levam ao agravo.
O entendimento de que o elo com a comunidade, representado pela Rede de Vizinhos Protegidos resulta em alguma diminuição da criminalidade sugere que, no combate a violência é essencial à participação popular na gestão da Segurança Pública.
Nesse sentido, mais do que um papel meramente passivo, à sociedade civil cabe a participação ativa na elaboração de uma nova agenda política no âmbito da segurança publica.

2. Rede de Vizinhos Protegidos: Uma alternativa na prevenção de crimes

            A partir da Constituição Federal de 1988, o Sistema de Segurança Pública brasileiro, assumiu um compromisso legal com a segurança individual e coletiva. Para tanto, a atuação dos órgãos de segurança ganhou conotação de interação, sinergia de ações combinadas a medidas de participação e inclusão social e comunitária, cabendo ao Estado o papel de garantir o pleno funcionamento dessas instituições.
De acordo com Carvalho e Silva (2011) o primeiro movimento no sentido de um trabalho articulado entre os diversos órgãos da área de segurança publica se deu em 1995 com a criação, no âmbito do Ministério da Justiça, da Secretaria de Planejamento de Ações Nacionais de Segurança Pública (Seplanseg), transformando-se, no ano de 1998, em Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp). Nesse Sentido, 

A instituição da Senasp, como órgão executivo, significou a estruturação de mecanismos de gestão capazes de modificar o arranjo institucional da organização administrativa da segurança pública no âmbito governamental federal (CARVALHO E SILVA, 2011, pág 62).

Dessa forma, no ano 2000 é criado o Plano Nacional de Segurança Pública (PNSP), e no ano de 2007, o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), inovando a forma de abordar essas questões.  No âmbito do Pronasci, surge o conceito de segurança cidadã, que, segundo Freire(2009) abrange,

[...] parte da natureza multicausal da violência e, nesse sentido, defende a atuação tanto no espectro do controle como na esfera da prevenção, por meio de políticas públicas integradas no âmbito local. Dessa forma, uma política pública de Segurança Cidadã envolve várias dimensões, reconhecendo a multicausalidade da violência e a heterogeneidade de suas manifestações (FREIRE, 2009, p. 105-106).

Criado em 2004, no Estado de Minas Gerais, pelo Major Idzel Mafra Fagundes, o Projeto Rede de Vizinhos Protegidos tem como objetivo principal, antes do controle do crime, obter mais confiança da população na polícia, através da cooperação das comunidades, bem como garantir direitos democráticos dos cidadãos e reduzir a sensação de insegurança.
Com base nas ideias de polícia comunitária surgidas nos EUA e na Europa em meados da década de 1970 e no Brasil nos anos 1980, o Projeto envolve a participação do público no planejamento e supervisão das operações policiais, na crença de que uma resposta ideal à questão da segurança pública depende do conjunto de soluções locais e de que a sociedade pode ser coprodutora da segurança e da ordem juntamente com a polícia (BAYLEY; SKOLNICK, apud HENRIQUES, 2007).
Essa organização envolve a vinculação a uma base territorial, na maioria das vezes o bairro, e na retomada do texto da Constituição Federal Brasileira (1988), em seu artigo 144, o qual diz que “a Segurança Pública é dever do Estado e responsabilidade de todos. devendo ser exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio”. (BRASIL, 1988).
Na cidade de Viçosa-MG, o Projeto Rede de Vizinhos Protegidos foi implantando no ano de 2012 nos bairros de Ramos e Clélia Bernardes e encontra-se em funcionamento na atualidade.
A escolha por estes bairros deve-se a sua posição no “desenho” da cidade enquanto ponto estratégico na rota de ligação entre as porções leste-oeste e o centro da cidade, tendo intenso fluxo de veículos e pessoas. Além disto, tratam-se de bairros tipicamente residenciais, com grande número de casas e prédios de apartamento que estavam sendo alvo constantes roubos e furtos.

3. Materiais e Método
 
Trata-se de uma pesquisa qualitativa-descritiva que buscou analisar a importância da participação social e seus benefícios para o desenvolvimento local, à partir do estudo de uma associação de bairro e seus mecanismos de articulação junto ao poder publico na redução de crimes.
Com relação aos instrumentos ou materiais investigativos, além do levantamento bibliográfico para o embasamento teórico, foi realizada uma pesquisa documental junto à 10ª Cia PM, com sede em Viçosa, para obtenção de dados qualitativos e quantitativos contidos em boletins de ocorrência policiais referentes a furto simples/qualificado em residência urbana nos bairros selecionados, entre os anos de 2012 e 2016, bem como de documentos oriundos da prefeitura sobre a elaboração, implantação e regulamentação da Rede de Vizinhos Protegidos, além das atas das assembleias.
A fim de ampliar a avaliação sobre a participação social no Projeto Rede de Vizinhos Protegidos, a partir da visão dos sujeitos da pesquisa, foram realizadas  entrevistas semiestruturadas, com moradores dos bairros, membros da diretoria e com o representante da Polícia Militar.
Posteriormente as ideias centrais foram agrupadas e com base na análise do conteúdo dos discursos com o intuito de analisar os níveis de participação presentes em diferentes etapas da formação e consolidação da Rede bem como seu funcionamento em termos de diminuição de crimes. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário Una, sob parecer nº 2.621.951.

4. Resultados e Discussão

            A Rede de Vizinhos Protegidos surgiu em Viçosa no ano de 2012, a partir de uma mobilização em sociedade para fazer frente às questões de violência e criminalidade que incomodavam os moradores dos bairros de Ramos e Clélia Bernardes, principalmente os chamados crimes contra o patrimônio.
As ações para implementação do Projeto tiveram como inspiração um modelo já implantado na cidade de Uberlândia, localizada na região do Triangulo Mineiro e, obrigatoriamente passa por três fases:

  1. Fase 1- observação: Levantamento das potencialidades e fatores de risco do bairro, realizado pela Policia Militar e acompanhado pelos moradores;
  1. Fase 2 – Autoproteção: Instrução sobre autoproteção e instalação de cercas elétricas e grades nas residências;
  1. Fase 3 – Rede: Colocação de placas nas ruas; Colocação de placas nas residências; Colocação de alarmes sonoros e luminoso nas residências; Simulação.

            Para incrementar a primeira ação, é realizada uma enquete que aborda o levantamento de cuidados diários na prevenção ao crime e a presença de sentimentos de pertença e solidariedade entre vizinhos. A partir de então, reuniões periódicas são realizadas para aprofundar o conhecimento mútuo, principalmente dos hábitos dos moradores.  Por último, há a organização dos participantes em redes preventivas. 
Em relação à solução encontrada pelos moradores, para fazer frente à violência, Dowbor (2008) afirma que toda mudança deve realmente ter início por meio da união e da vontade dos próprios cidadãos, que, com base em redes locais de cooperação, acordo e competição, podem criar soluções para seus problemas, sem ficar passivamente esperando atitudes governamentais ou que alguma entidade representativa qualquer o faça.
Santos (1996) complementa dizendo que a dimensão subjetiva que permite ao cidadão interagir, associar-se, confiar e desenvolver ações conjuntas tem parâmetros de ordem social, cultural e histórica, que pode ser  identificada na relação entre as pessoas e o seu entorno (ambiente, empresas, instituições). Além disso, pauta-se na interdependência, no senso de cooperação, na vizinhança e na intimidade, mas também, e principalmente, no cotidiano conflitante e solidário vivido em comum.
Nesse momento inicial, é importante destacar que além de compartilharem os problemas, todas as ações de ordem prática, como, por exemplo, colocação de placas nas ruas e casas, partiu da iniciativa própria dos moradores, que inclusive custearam todo o material.
Segundo Souza (2009), entre os principais aspectos de participação e gestão social estão a organização da comunidade e a sua própria articulação frente a problemas vivenciados.
No momento da implantação da Rede, nos bairros supracitados, duas simulações ocorreram em ruas diferentes para verificação da eficiência dos dispositivos de segurança implantados. Todas as residências que participam do projeto, um total de 65, entre casas e prédios, tiveram instalados, a partir de então, um alarme sonoro e luminoso que, em caso de urgência, é acionado. Além disso, os vizinhos comunicam-se via aplicativo de celular entre si e com os órgãos de Segurança Pública.
As simulações, no entendimento de participação social pelos setores públicos, podem ser descritas na garantia e abertura para a população participar no planejamento da gestão urbana, trazendo ideias e experiências para efetivação do trabalho de prevenção e na definição de prioridades.
Na opinião da população, essa participação encontra-se mais relacionada ao sentido de força do trabalho coletivo. Esses elementos parecem capazes de contribuir para o alcance de resultados ou, pelo menos, para aumentar a sensação de integração entre os membros.
Entre todos os entrevistados: 11 moradores dos bairros de Ramos e Clélia Bernardes participantes do Projeto Rede de Vizinhos protegidos, o representante da Polícia Militar – coordenador operacional do Projeto – e o atual diretor da Rede, as declarações sugerem satisfação com a implantação do projeto, com percepção na diminuição dos crimes nos bairros e aumento da sensação de segurança local.
Tal informação é reforçada nas estatísticas obtidas junto a Policia Militar que especificam que, no que tange ao cumprimento dos objetivos propostos, nesses anos de funcionamento, a Rede de Vizinhos Protegidos cumpre seu papel enquanto instrumento capaz de reduzir o número de ocorrências criminais nos bairros, fazendo jus aos preceitos de prevenção, conforme demonstrado no Gráfico 1.
Em relação aos objetivos principais da Rede de Vizinhos, que era a redução dos crimes contra o patrimônio, também observamos o cumprimento dessa premissa.  
Esses resultados iniciais e o engajamento dos participantes em ações práticas conferiu à Rede grande visibilidade no contexto da cidade de Viçosa produzindo conotação de espaço participativo às reuniões que contaram, muitas vezes, com a presença de representantes dos diversos segmentos da sociedade – universidades, representantes de órgãos municipais, estaduais e federais com atuação local, Ministério Público, Casa do Empresário, entre outros interessados – o que possibilitou diferentes desdobramentos de ações como a destinação de verbas para revitalização de praças e outros espaços públicos dos bairros, que se encontravam degradados e/ou em uso para atividades ilícitas.
Um exemplo é o projeto de revitalização da Praça Alice Vaz de Melo que antes era palco de assaltos e pela má iluminação, pouco frequentada pelos moradores. 
A praça encontra-se em reforma, com a construção de mesas e espaços de convivência sendo beneficiada ainda com a poda de arvores que podem ser vistos nas fotografias abaixo.
Alguns aspectos acima mencionados sobre a interligação do trabalho entre os órgãos públicos e a comunidade, como por exemplo, a abertura para que a população possa opinar e participar do planejamento das ações sociais, assim como compartilhar valores e visões semelhantes de mundo, conferem identidade e maturidade coletiva, o que sugere que a participação é de natureza essencialmente relacional, de integração e alianças afetivas que podem ser percebidas para além das questões de prevenção ao crime indo ao encontro com aspectos de cidadania e parceria esperados em ações de cunho social com vistas ao desenvolvimento local. (CASADO, 2002).
O que chama atenção, contudo, são as atitudes das pessoas em relação à prática comunitária na Rede de Vizinhos Protegidos não serem uniformes. Pode-se perceber que para muitos, comparecer às reuniões já significava “participar”, o que não condiz com o sentido real do movimento que se espera da sociedade que busca por mudanças.
Ao contrário do que pôde ser comprovado nos momentos iniciais da formação da Rede, as reuniões não cumpriram os requisitos básicos no que tange à participação social ocupando, segundo Pateman (1992), um nível de concessão mínima de poder do cidadão. Para Arstein(2002), o nível de concessão mínima de poder do cidadão pode ser entendido como:

Uma participação que pode permanecer apenas no nível de fachada [...], torna-se apenas abstrações estatísticas, medida pelo numero de pessoas presentes nas reuniões, pelo numero de folhetos distribuídos ou pela quantidade de entrevistados. (ARNSTEIN, 2002, p. 89).

No âmbito da gestão social, esse entendimento de coletividade e de trabalho igualitário, que cada membro é um elo importante da corrente, é o que faz diferença na superação de um modelo de gestão voltado para atendimento de demandas imediatistas que não visam o desenvolvimento local e que traria, segundo Pinho (2005), possibilidades de cidadania e emancipação.
Uma hipótese para tal acontecido nas reuniões deve-se ao desconhecimento do conceito, bem como da pratica da gestão social. A maioria dos participantes, ao que parece, guiados pelo adjetivo social classificou este tipo de gestão como aquela que “trata de investimentos na sociedade”, ou “de ações que aconteciam com a participação do povo” e somente um entrevistado demostrou aproximar-se da ideia de Gestão Social ao dizer que “se tratava de uma parceria entre a prefeitura (administração) e a população que levasse em consideração os interesses e as necessidades destes últimos”.
Segundo Tenório (2005, p.102), “o adjetivo social qualificando o substantivo gestão (deverá) ser entendido como espaço privilegiado de relações sociais em que todos têm o direito à fala, sem nenhum tipo de coação.”Como consequência do desconhecimento da gestão compartilhada, e uma acomodação frente a chefias e recebimento de ordens, observa-se implicitamente um deslocamento do poder de decisão e a centralidade de ações em um único membro da Rede. 
Diante do exposto, cabe ressaltar o limite desse processo no que diz respeito às premissas da gestão social, que deve se pautar pela tomada de decisão coletiva, livre de coerção e baseada no entendimento. Transparência nas ações, relações igualitárias de poder e emancipação.
Sobre esta última, Freire (2009, p.22-23) destaca,

A emancipação como o próprio resultado da gestão social enquanto processo baseado na cidadania deliberativa. A participação efetiva no processo de tomada de decisão traz crescimento e amadurecimento para os atores, que ampliam sua visão de mundo enquanto seres humanos dotados de razão cidadãos participantes de uma esfera pública.

Percebe-se, que no caso da Rede, houve uma centralização na pessoa do diretor, e, que ninguém do grupo conseguiu assumir as responsabilidades deste após sua saída em 2016 (por motivo de mudança para outro município).
As atividades da Rede de Vizinhos Protegidos sofreram uma queda no ultimo ano, informação que pode ser  observada no Gráfico 1 e reforçada no relato de alguns moradores entrevistados que dizem sentir-se “um pouco sem rumo” com a saída do diretor e percebem a partir deste momento, uma diminuição da frequência das reuniões e das ações da rede restando hoje, de acordo com suas próprias palavras, apenas  “as plaquinhas nas casas como sinalizador de que a rede existe”.
Um aporte teórico de sustentação e que ameniza, até certo ponto os problemas apontados é trazido por Pinho(2010) que mostra que a sociedade civil organizada seria incapaz de assumir o papel de "[...] demiurgo do aprofundamento democrático", e ainda que a alguma estrutura de liderança mantém um "desenho autoritário e largamente intocado e resistente aos impulsos participativos" (DAGNINO, 2002, p.279 apud PINHO, 2010, p.35).
Em relação a experiências práticas, Pinho (2010) cita os problemas de funcionamento de grupos e associações comunitárias, concluindo que seria praticamente impossível que eles funcionassem como se deseja nas atuais condições ou mesmo em situações ótimas:

[...] seria muito difícil, mesmo para o mais bem-intencionado ou para a mais participativa das comunidades, fazer-se representar de forma qualificada nos inúmeros cenários hoje em funcionamento. (TATAGIBA, p. 68, 2002, apud PINHO, 2010, p. 39).

Bordernave (2002) considera, todavia, que há um aspecto positivo em todo processo participativo, se considerar que esta experiência vivenciada pelos participantes, mesmo concedida, traz em si um potencial para o desenvolvimento da consciência critica, ampliando assim a capacidade de tomada de decisão e de adquirir poder, o que pode ser comprovado nos desdobramentos da Rede percebidos para além das questões relativas à Segurança indo ao encontro de aspectos de cidadania e parceria esperados em ações de cunho social, com vistas ao desenvolvimento local, ou seja, no comprometimento das lideranças em sua capacidade de articular e coordenar os esforços e interesses coletivos.

5. Considerações Finais

A partir deste trabalho podemos  concluir que a participação social, na prática, pode se dar por meio da organização responsável de múltiplos atores sociais na solução de problemas comuns do local.
E, que as associações, principalmente as associações de bairros, são os espaços públicos que estimulam essa participação mediante a abertura de canais de comunicação entre o poder público e os cidadãos, inclusive aqueles que são usuários dos sistemas/equipamentos específicos dos bairros em questão.
No âmbito da Segurança Publica, as Redes de Vizinhos Protegidos, na atualidade, apresentam potencial para tornarem-se espaços possíveis de promoção da solidariedade, articulação e mobilização de pessoas, especialmente no tocante ao agir nas raízes de problemas crônicos que normalmente deságuam em crimes, e na busca pelos direitos constitucionais que fundamentam a vida em sociedade.
No entanto, faz-se necessário ainda que os atores sociais envolvidos, sobremaneira a comunidade, compreenda a gênese da participação, deixando de ser meros participantes para tornarem-se sujeitos ativos no processo de gestão, planejamento, acompanhamento, monitoramento, avaliação e fiscalização das políticas públicas municipais de seus interesses.
A emergência e o desenvolvimento de instituições na sociedade é que favorecem a recuperação da cidadania e, portanto, a verdadeira vida democrática. Dessa forma, torna-se real a possibilidade de canalização das demandas e a identificação das necessidades reais, assim como a cobrança de melhor desempenho dos serviços públicos.

6. Referências

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Recibido: 11/12/2018 Aceptado: 19/12/2018 Publicado: 19/12/2018


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