Revista: Caribeña de Ciencias Sociales
ISSN: 2254-7630


DENDEICULTURA EM TOMÉ-AÇU (PA): METAMORFOSES NO TRABALHO E NO ESPAÇO NA VILA FORQUILHA

Autores e infomación del artículo

Ana Cláudia Alves de Carvalho*

Universidade Federal do Pará, Brasil

carvalho_anaclaudia@yahoo.com.br

Resumo: Com a chegada da dendeicultura nos diversos municípios paraenses, mais precisamente na microrregião de Tomé-açu, temos o emergir de um evento que vem reconfigurar a dinâmica existente no lugar, desencadeando metamorfoses no trabalho agrário em Tomé-açu, enfatizaremos aqui a Vila Forquilha, pois antes da instalação da empresa produtora de óleo de palma Biopalma, o trabalho possuía uma dinâmica diferente da existente hoje. Como metodologia construímos a partir de bibliografia e entrevistas com os moradores locais uma caracterização de como era o trabalho antes da instalação da dendeicultura, e outra após este evento. As metamorfoses ocorridas na vila com relação ao papel do trabalho, ecoaram de maneira tão significativa, que recaem no espaço habitado e no modo de vida de seus moradores.

Palavras-chave: Dendeicultura, Estado, Trabalho, Tomé-açu e Forquilha.

Resumen: Con la llegada de la cultura de palma en los distintos municipios de Pará, en concreto la micro-región de Tomé-Açu, tenemos la aparición de un evento que viene reconfigurar la dinámica en su lugar, lo que provocó metamorfosis en el trabajo agrícola en Tomé-Açu, que destacar aquí el pueblo Forquilha, porque antes de la instalación del aceite de palma empresa productora Biopalma, el trabajo tuvo existe una dinámica diferente en la actualidad. La metodología construida a partir de la literatura y entrevistas con los residentes locales una caracterización de cómo el trabajo era antes de la instalación de la cultura de palma, y otro después de este evento. Metamorfosis se produjo en el pueblo con el papel de la mano de obra, se hizo eco de manera tan significativa que caen en el espacio de vida y modo de vida de sus residentes.

Palabras-clave: Cultura de palma; Estado; Trabajo, Tomé-açu y Forquilha.



Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Ana Cláudia Alves de Carvalho (2016): “Dendeicultura em Tomé-açu (PA): metamorfoses no trabalho e no espaço na Vila Forquilha”, Revista Caribeña de Ciencias Sociales (diciembre 2016). En línea:
https://www.eumed.net/rev/caribe/2016/12/dendeicultura.html
http://hdl.handle.net/20.500.11763/caribe1612dendeicultura


INTRODUÇÃO

De acordo com a ideia de período geográfico de Santos (2006), constatamos o surgimento de um período no Estado do Pará. Iniciando-se ainda na década de 1950, com os primeiros plantios de dendê em fase experimental, o qual chamamos de “Período do dendê” (CARVALHO, 2013). Período este que se desenvolveu tendo como base a produção da monocultura do dendê no Estado, incentivado pelo uso de técnicas avançadas de melhoramento genético de sementes pela Embrapa, amplos Zoneamentos agroecológicos que permitiram a delimitação de diversas áreas aptas ao plantio; assim como inúmeras políticas públicas que mais do que incentivar, foram o fio condutor dos investimentos.
Dentre elas destacamos o Programa Nacional de Uso e Produção do Biodiesel (PNPB), que foi um verdadeiro divisor de águas no desenvolvimento da dendeicultura no Estado. A criação dos “Polos de Produção de Biodiesel”, criados pela Secretaria de Agricultura Familiar do Ministério do Desenvolvimento Agrário também foi um grande impulsionador da expansão da produção de óleo de palma, com a intenção de favorecer a inclusão dos agricultores familiares na cadeia produtiva do dendê.
Atuam no Estado atualmente desde empresas produtoras de dendê nacionais a internacionais, algumas tendo sua produção voltada ao biodiesel e outras ao ramo alimentício e/ou de cosméticos. Os novos atores ao instalarem-se na região, trazem consigo novos investimentos, criam uma nova configuração territorial aos lugares onde aportam, fazendo nascer diferentes relações que transformam as dinâmicas existentes, fazendo com que a dendeicultura se tornasse um evento (NAHUM; MALCHER, 2012) no Estado.
A vila Forquilha localizada no município de Tomé-açu, nordeste paraense, sofreu metamorfoses com relação ao papel do trabalho, que ecoaram de maneira tão significativa no espaço, extrapolando as relações de trabalho, sobre caindo no modo de vida de seus moradores. Portanto, temos como objetivo geral, analisar as metamorfoses no trabalho agrário na vila Forquilha a partir da chegada da dendeicultura. Para isso, vamos inicialmente caracterizar alguns traços do trabalho rural na vila antes e a partir da vinda da dendeicultura; analisaremos a dendeicultura enquanto um evento em Tomé-açu.
Como metodologia operacional, realizamos revisão bibliográfica acerca da dendecultura no Pará, sobre a natureza do trabalho no município de Tomé-açu e na vila, para assim construirmos a base de dados necessária ao entendimento da dinâmica espacial do lugar. Levantamento fotográfico, cartográfico com o auxílio de GPS e de imagens de satélite afim de demonstrar a espacialização composta pela vila Forquilha, e os plantios de dendeicultura ao seu redor.
Pesquisa de campo, utilizando perguntas abertas ou semiestruturadas, aplicação de questionários, entrevistamos representantes da empresa Biopalma, do sindicato dos trabalhadores rurais do município, e os moradores da vila Forquilha, dentre eles os assalariados das empresas de dendeicultura, agricultores familiares que possuem parceria com as empresas na produção do dendê, e comerciantes locais. As pesquisas de campo foram fundamentais na obtenção de informações junto aos atores sociais envolvidos nesta dinâmica.
Temos assim a empresa Biopalma, que chega ao espaço rural do município de Tomé-açu por meio de políticas de incentivo a instalação e produção de biodiesel no Estado do Pará, além delas temos toda a herança problemática da questão agraria paraense. (não se pode elencar tais relações, pois estas são em sua totalidade diversamente dinâmicas, estão em constante metamorfoses). Estamos falando de determinações sociais, um conjunto delas, que moldam e criam uma situação geográfica, antes mesmo que seja percebida pelo homem. Trata-se de intencionalidades que juntas compõem essa tal situação geográfica.
Ao se instalar em Tomé-açu a Biopalma chega trazendo consigo uma nova lógica para o lugar, a vila Forquilha ao receber tal evento irá metamorfosear-se, destacaremos aqui as mudanças relacionadas ao trabalho. Já que a empresa, a partir de sua instalação passa a absorver mão-de-obra local, oriunda da vila Forquilha e de demais comunidades ao seu em torno, para desenvolver sua produção de dendeicultura, transformando a dinâmica do lugar através das metamorfoses no trabalho.

DESENVOLVIMENTO

A natureza do trabalho antes da dendeicultura.

A vila Forquilha surge a partir da chegada de pessoas que vieram em busca de emprego nessas atividades, que eram um atrativo em Tomé-açu, uma vila que se forma tendo ao seu entorno vários tipos de usos do território, pois o ato de caçar, cultivar e extrair faziam parte de suas rotinas em busca da sobrevivência. Sua paisagem tinha como característica ser uma pequena vila, formada por poucas residências, cercadas por fazendas de gado e por plantações de pimenta do reino, dentre eles estão os descendentes dos imigrantes japoneses que contribuíram na construção do município, porém, quanto aos moradores da vila estão as famílias e camponeses que se empregaram em tais fazendas, além dos moradores locais, que já viviam naquela área e foram passando suas terras de geração em geração.
Nesse momento a vila era composta de poucas casas localizadas na rua principal, avenida Francisco Luís (pois só havia essa rua), era habitada por pessoas que trabalhavam nessas fazendas de gado, ou na extração de madeira, ou na pimenta. A vila possuía pequenos comércios que não davam conta de atender a demanda da população. Muitas coisas tinham que ser compradas em Quatro Bocas, ou na sede em Tomé-açu.
Observemos que nesse momento, o trabalho se dava respondendo as necessidades do lugar, onde o lugar reproduz suas próprias características, as fazendas de pimenta e gado empregavam poucas pessoas, a população da vila era pequena, seu comércio refletia isso, devido ao baixo poder de compra da população, aos poucos serviços que eram oferecidos lá, as famílias possuíam seus roçados, o que garantia a eles a alimentação básica.
O território era usado para a reprodução de sua vida, possuíam autonomia por parte de suas atividades econômicas, no que se refere ao que plantar, como e onde vender ou trocar seus excedentes. Aqui o uso da natureza se dava em prol da reprodução da existência, e não para a acumulação. O dinheiro mesmo fazendo parte da vida dos moradores, ainda não era o principal mediador das relações sociais na vila, as relações eram sustentadas através das relações de vizinhança e de parentesco, além da influência das associações e da igreja que já se estabeleciam no lugar.
O trabalho neste momento se dava em torno da agricultura familiar, assim as famílias conseguiam se manter, dentro de um limitado regime alimentar, cultivavam: arroz, feijão, milho, açaí, mandioca, algumas famílias possuíam pequenas criações de aves, tudo para o consumo próprio. Para obter os demais produtos necessários no dia a dia, a família trocava seu excedente ou vendia na feira local para conseguir dinheiro, e assim comprar os artigos de que necessitavam.
As relações tinham como centro a cooperação entre as famílias, trocas de dias de trabalho, acontecendo de um dia o membro de uma família contribuir na limpeza do roçado de um vizinho, na semana seguinte este lhe retribuir a ajuda, colaborando com o trabalho em seu roçado. Além dos mutirões, costume repassado entre as famílias de reunirem-se em prol de uma atividade quase sempre pesada, que não poderia ser realizada apenas por uma pessoa, onde todos concordam em ajudar no trabalho e ao fim confraternizam em um almoço coletivo. As trocas de produtos, de favores, mediadas pelas relações fraternais geradas entre as famílias que viviam próximas umas das outras, é uma forte característica camponesa.
Na vila Forquilha predominava o trabalho como um meio para se obter o dinheiro para a compra das demais mercadorias necessárias à sua existência. A produção era socialmente determinada, isto é, não se produzia por vontade própria, mas sim pela falta de opção e necessidade de se conseguir dinheiro, e a terra como sendo o único meio de produção era utilizada pela família para produzir.
A relação se dava caracterizada ainda por uma relação social de produção camponesa, pois a mercadoria era proveniente da extração, criação, cultivo e produção, da unidade familiar, assim, o excedente era vendido como mercadoria, este se tornando um meio para obtenção de dinheiro para a reprodução do seu modo de vida. Ou seja, observemos nesse momento como o trabalho influência na construção e manutenção desse modo de vida familiar. As famílias têm seu trabalho na esfera familiar onde a dedicação e objetivo é apenas um, suprir suas necessidades básicas, comer, beber, vestir, morar, dormir, etc..
Existindo relações de proximidade entre as famílias, no âmbito da vizinhança na utilização dos espaços comuns para atividades como os mutirões, nas caçadas, na pescaria, nos girais de lavar roupa na beira do rio, e nas festividades da comunidade. A vila Forquilha se compreendia em um bom lugar para morar, onde todos se conheciam, já que eram poucos os moradores, todos sabiam quem era filho de quem, onde morava, o que faziam. E assim eles viviam de maneira tranquila, a violência não fazia parte da realidade, eram raros e quase nulos os atos de furto e brigas.
As pequenas tabernas que existiam na vila vendiam artigos básicos e onde o crédito se dava através da confiança que se tinha entre as partes, tudo acontecia tendo por base nos laços de amizade presente entre os envolvidos na relação. Podia-se comprar lá querosene, charque, café, açúcar, arroz, sabão em barra, tudo em pequenas quantidades, a retalho, pois assim custariam pouco.
A produção excedente dos agricultores era levada para a feira, em Tomé-açu ou Quatro Bocas, hoje conhecida como a feira do agricultor, o transporte era feito de barco, ou de canoa, geralmente eles iam em grupos, lá as famílias trocavam suas frutas, farinha, arroz, pimenta do reino, por produtos que não produziam, além de vender parte dessa produção a dinheiro, esse dinheiro seria usado na compra de itens que só podiam ser comprados na cidade.
Quase sempre eram reféns dos preços impostos pelos compradores, e tinham que aceitar, pois não podiam voltar com seus produtos para casa. A circulação do dinheiro na vila era mínimo, já que o dinheiro que eles recebiam pela mercadoria vendida, já ficava no centro, em Tomé-açu, pouco ou nada voltava com eles para a vila.

(...) nós trabalhava com pimenta e cacau e cupuaçu, e roça de mandioca e milho. Trabalhava eu, meu pai e mais dois irmãos, era muito difícil essa época, nessa época meu pai trabalhava todo dia, e a condição eu achava que era menos, eu lembro demais, pra comprar uma bicicleta eu lembro que foi uma luta medonha (...) naquele tempo pra comprar uma bicicleta nós fizemos mais de 20 sacos de farinha pra poder comprar uma bicicleta e hoje se você fizer 10 sacos de farinha você compra uma bicicleta (...) (Entrevistado1).

O entrevistado acima é morador antigo da vila Forquilha e relata as dificuldades vividas por ele e sua família, a quantidade de trabalho que precisava ser realizado para se conseguir adquirir algum bem, isso antes da instalação das empresas de dendeicultura no lugar. O que eles ganhavam ao vender seus produtos era pouco, e só lhes garantia o necessário a sobrevivência. O agricultor só possuía a terra, trabalhava em sua unidade familiar com a ajuda de seus filhos e esposa, trabalhando todos os dias, em um regime pesado para alimentar sua família e suprir suas necessidades mais básicas. Essa era a única forma de se manter lá.
As terras eram aparentemente livres, “sem dono”, qualquer pessoa poderia se apossar, construir sua casa e viver ali, como os demais moradores da vila, não havendo nenhum tipo de documento que lhes concedesse a titulação da terra, portanto não havia mercado de terras. Assim que chegavam na vila Forquilha, (assim também aconteceu nas demais vilas) o agricultor imediatamente já começava a plantar suas frutas, preparar a terra para o seu roçado, já que este seria a garantia da sobrevivência de sua família. Não se tinha a posse da terra, a posse se dava pelo uso.
A unidade familiar era administrada pelo chefe da família, quase sempre o patriarca, para contribuir com a alimentação e diversificação do cardápio alimentar a caça e a coleta de frutos era uma prática comum, já que as comunidades eram cercadas por mata. A unicidade entre a terra, o trabalho e a família é uma forte característica onde desde criança os filhos contribuíam no trabalho, seja na roça, no cuidado com os animais, nos afazeres domésticos.
As paisagens vegetais do lugar eram pouco alteradas pois o tipo de agricultura produzida era em pequena escala, o que causava pouco ou nenhum desgaste ambiental, e quando a terra estava cansada eles faziam uma nova roça em outro lugar em quanto o solo usado se recuperava naturalmente, e aquele local pudesse ser utilizado para o cultivo novamente, uma espécie de rodízio no regulamento de tarefas no campo. As propriedades eram pequenas, não existindo cercas, cada um usava a quantidade de terra que era necessária à sua reprodução.
O habitat dos moradores se dava em casas quase sempre de madeira, algumas de barro, com poucos móveis e objetos. Com poucas estradas de acesso ao centro de Tomé-açu, as notícias demoravam a chegar na vila, a comunicação se deu por anos através de bilhetes e recados, dados por um ou outro morador. A expansão e crescimento da Cooperativa Agrícola Mista de Tomé-açu (CAMTA), assim como das culturas produzidas em Tomé-açu, garantiu um processo de crescimento do município, o que lhe possibilitou melhores estradas, a chegada da energia elétrica, do telefone, passando a vila Forquilha a também a usufruir desses benefícios.
Assim como surgiu a vila Forquilha nesse momento, também surgiram outras comunidades como a São Raimundo, Binteua, Vila Socorro, Nova Betel, Castanhalzinho, como sendo as mais antigas, entendemos que tais comunidades se reproduziam se relacionando umas com as outras, onde suas relações de trabalho tinham por base a produção da mandioca, frutas tropicais, pimenta-do-reino, viviam o tempo da natureza, pois não possuíam nenhum tipo de aparato tecnológico para produzir.

Metamorfoses na Vila Forquilha.

A reorganização espacial da vila se deu devido uma série de fatores que se sobrepuseram a partir da instalação das empresas produtoras de dendeicultura na microrregião de Tomé-açu, a gama de políticas públicas que foram criadas a fim de possibilitar a expansão da cultura, bem como o fluxo migratório em direção a vila. Esse processo se deu envolto em tensões, disputas de terra e de mão-de-obra, acentuando processos que ainda eram embrionários, metamorfoses no espaço e no trabalho que ressignificaram a vila, e assim a vida dos seus moradores.
Atualmente a vila expandiu-se e transformou-se em um distrito, composta por inúmeras outras vilas, o que nos ajuda a ter a dimensão do seu tamanho. Ao chegar lá nos deparamos com a avenida principal chamada Francisco Luís, onde encontramos uma variedade de lojas roupa, calçado, papelaria, material de construção, supermercados, borracharias, restaurantes, lanchonetes, padarias, salão de beleza, farmácia, casa lotérica, cybers, assistência técnica de eletrônicos, que segundo os moradores foi fortemente expandido após a implantação dos projetos de dendeicultura na região. Nos chama atenção à paisagem encontrada lá, pois se difere de outra comunidade rural, ou vila que tenhamos em nossas mentes como referência de uma vila rural, devida a variedade de serviços que podem ser atendidos.
Podemos visualizar na imagem 1, a proximidade existente entre as fazendas com plantios de dendeicultura pertencentes a Biopalma, e a vila Forquilha, tal proximidade se dá também com os agricultores familiares que realizam a parceria com a empresa. A presença da empresa aos arredores da vila transforma a paisagem, o cultivo de uma monocultura como podemos observar aumentou a concentração de terras, acarretando mudanças na dinâmica espacial do lugar.

Quando entramos na vila nos deparamos com um espaço rural, cujos objetos geográficos e serviços se estabelecem à medida em que as demandas aparecem, construídos informalmente, com posto de gasolina, hotéis, motéis, oficinas mecânicas, restaurantes, residências não padronizadas, saneamento básico precário, ruas não asfaltadas.
Em relação ao comércio local identificamos três lojas de material de construção, três de móveis e eletrodomésticos, cinco lojas de roupa e calçados, três restaurantes, seguidas de duas oficinas mecânicas, duas lojas de informática, duas farmácias, casa lotérica, salão de beleza e posto de gasolina, estes são alguns dos estabelecimentos dispostos na avenida principal, isso demonstra o grande boom vivido pelo lugar.
A chegada de mão-de-obra passa a ser incorporada ao trabalho, aquecendo o setor de compra e venda de imóveis, assim como o de alugueis, uma grande demanda de kitnets vem sido construída a fim de receber essa mão-de-obra que chega na vila Forquilha. Isso se reflete na abertura de tais lojas de material de construção, que irão atender a essa demanda local.
Assim surge a necessidade de se comprar eletrodomésticos, moveis a fim de mobilhar as novas residências, da mesma maneira esse movimento impacta o consumo, estimulando a abertura de mais lojas de roupa, calçado, acessórios, bem como franquias de venda de motos, celulares. Vemos que agora a vila passa a oferecer serviços que antes só eram possíveis ser acessados em Quatro Bocas ou no centro de Tomé-açu.
Essa expansão no setor de comércio e serviços fez com que o fluxo ao distrito de Quatro Bocas diminuísse, o que também influencia e resulta no fato de que o dinheiro pertencente a população da vila Forquilha, grande parte fica agora na vila mesmo, é injetado no comércio local. O que gera cada vez mais um crescimento, ocasionando pela oferta e especialização dos serviços. Além de trazer maior comodidade aos moradores do lugar que não precisam mais se deslocar.
Observamos que o trabalho na dendeicultura tem um papel importante na economia local, bem como a dependência que o lugar tem da empresa é um fato preocupante, o que nos leva a questionar se a vila manteria tal dinâmica caso a empresa fechasse? O comércio conseguiria absorver a mão-de-obra que atualmente é sustentada pelas empresas? O que aconteceria com esses trabalhadores? O setor de comércio e serviços conseguiria manter sua clientela consumindo a ponto de manter seus estabelecimentos funcionando?
Como podemos observar na imagem 2, a baixo, a rua Francisco Luís, onde se localiza a avenida principal de comércio na vila Forquilha, com vários estabelecimentos comerciais, entre eles o supermercado chamado “Meio Preço”, o de maior referência na vila, e o “Giro Motos”, que oferece serviços de manutenção de motos e a venda de acessórios. Além disso, temos a presença de um ônibus da empresa Biopalma, que faz o transporte dos trabalhadores, das áreas de plantio da empresa até as vilas ao redor. Na vila Forquilha não há um sistema de transporte público que transite pelas ruas, há apenas duas linhas, uma da empresa Calimã e outra da Boa Esperança que passam pela vila uma ou duas vezes por dia. Contudo o transporte alternativo se faz presente, mesmo não sendo legalizado transporta os moradores até Quatro Bocas e o centro de Tomé-açu.

Os três supermercados na mesma avenida indicam a quantidade de pessoas que moram na vila e consomem os seus produtos, pois em um primeiro momento não se compreende como todos eles conseguem se manter em atividade, devido à concorrência, mas ao caminhar entre ruas da vila, nos deparamos com a quantidade de ruas que foram se desenhando na vila, e assim podemos ter a dimensão da quantidade de pessoas que vivem lá.
Porém, alguns elementos da paisagem permanecem intactos e ajudam a compor o aspecto rural da vila, como podemos ver na imagem 3, a praça central, elemento comumente presente em comunidades rurais, próxima a ela a igreja católica, quase sempre esses são os primeiros elementos construídos que dão o sentido de comunidade, com uma área comum, onde as pessoas se reúnem, e a igreja, que funda o sentido de comunidade, ao lugar. A igreja quase sempre tem como nome a padroeira que é homenageada anualmente nas festividades, neste caso, Nossa Senhora da Conceição. A vila Forquilha conta atualmente com a presença de igrejas evangélicas, assembleia de Deus, Universal, que compõem a sua configuração espacial, exercendo seu papel de elo entre as pessoas.
Observamos ainda que algumas moradias preservam plantios e tem nos quintais arvores de médio porte, que esboçam a resistência do lugar as transformações. Algumas propriedades mais afastadas da área comercial da vila Forquilha que possuem seus roçados, aderiram ao sistema de parceria e cultivam dendê. A presença dos postes de energia elétrica, como iluminação pública, casas com sistemas de água encanada, caixas d’agua. As áreas de mata virgem que cada agricultor preserva ainda dão um “ar verde” a paisagem da Vila Forquilha.

Ao entrevistarmos moradores da vila, aplicamos questionários buscando conhecer um pouco sobre seu perfil socioeconômico, além de suas opiniões a respeito da dinâmica social construída em torno da dendeicultura no lugar, eles elencaram algumas mudanças ocorridas a partir da instalação das empresas, transformações que mais foram visíveis. O gráfico 1 demonstra os aspectos destacados por eles, que vão desde positivas, negativas, às questões ambientais e sociais.
Como podemos observar os itens mais citados entre os entrevistados foi a geração de emprego ocasionado pela instalação da Biopalma e da Belém Bioenergia aos arredores da vila, dando oportunidade aos moradores de se “ficharem”, termo utilizado por eles ao conseguirem um emprego de carteira assinada. Esse foi o ponto que mais chamou a atenção dos moradores entrevistados, e mais se destacou como sendo uma mudança ocasionada pela instalação das empresas. O trabalho assalariado passando a predominar na lógica espacial do lugar, uma lógica nova que como veremos a seguir irá fomentar diversas transformações.

Outros aspectos destacados foram o aumento da população, da violência, da circulação de dinheiro e a expansão do lugar ocasionando algumas melhorias na infraestrutura. Esse movimento na dinâmica social e na configuração espacial foi observado pelos moradores, entretanto, alguns aspectos negativos também foram evidenciados como o aumento no tráfico de drogas, no número de assassinatos, de gravidez precoce, e na prostituição, fatos que se originam a partir do crescimento desordenado, pode ser constatado pelos moradores da vila.
Os policiais responsáveis por fazer diariamente a ronda na vila Forquilha nos relatam que hoje, vive-se uma situação um pouco mais tranquila, com relação há alguns anos atrás. Assassinatos eram constantes na área, decorrentes de acertos de contas, roubos seguidos de morte, hoje o que mais se vê por lá é o tráfico de drogas, roubo de celulares, furtos, e brigas aos fins de semana em festas que acontecem nos bares.
Segundo eles, o que ocorre é que os indivíduos ao serem demitidos da Biopalma ou abandonarem seus empregos lá, gastam suas indenizações sem planejamento, e ao ficarem sem dinheiro partem para o mundo do crime, praticando o roubo, e às vezes até o tráfico de drogas. A vila Forquilha não possui um posto policial, tem apenas um ponto que serve de descanso aos policiais que fazem ronda, sem ter um posto fixo, a delegacia está localizada em Quatro bocas, a 14º Companhia, lá são feitas as ocorrências.
Há aqueles que acreditam que nada mudou, e os que percebem um aumento salarial dos trabalhadores, aumento também nas dívidas adquiridas por eles, pois houve aumento no poder de compra destes, que não se planejam financeiramente e acabam se endividando. Assim como uma relevante valorização das terras, que foram vendidas as empresas de dendeicultura, que antes não eram tão valorizadas. Outros moradores destacaram a presença de pragas de animais peçonhentos em suas casas, insetos, que antes não eram vistos por lá. Além disso, foi visto como mudança positiva o fato dos trabalhadores das empresas possuírem como direito um plano de saúde, realidade nunca vivida por eles antes.

CONCLUSÕES

As considerações feitas aqui são parte de uma pesquisa maior, vinculada ao grupo de pesquisa “Dinâmicas Territoriais do Espaço Agrário na Amazônia” – (GDEA), e de uma dissertação intitulada “As metamorfoses do trabalho e no espaço a partir da dendeicultura em Tomé-açu (PA): estudo de caso na Vila Forquilha”.
Antes da instalação da dendeicultura os moradores da Vila Forquilha viviam de acordo com a dinâmica social do lugar, em suas pequenas propriedades, contendo uma forte ligação com a terra, pois ela era o único meio que possuíam para a reprodução de sua vida. Em suas unidades familiares viviam a partir da agricultura, extração, criação de animais, essas atividades eram um meio, que objetivava suprir suas necessidades, eles sempre se dedicaram também, dadas as devidas proporções a atividades paralelas como o comércio, artesanato e ao trabalho em outras propriedades, no cultivo da pimenta do reino, cacau, arroz.
Após garantir a alimentação de sua família, alguns produtos eram comercializados na cidade, neste caso em Tomé-açu ou em Quatro Bocas, e o dinheiro adquirido era também usado em favor da reprodução do seu modo de vida, neste caso, da unidade familiar inteira. O dinheiro naquele momento, ainda não era o principal mediador das relações sociais, pois a maioria das coisas necessárias a sua sobrevivência não vinham dele, e sim da terra em que viviam, de suas próprias mãos.
Do trabalho na unidade produtiva familiar resultava um circuito da produção e circulação da qual produzia. Isso muda com a chegada das empresas de dendeicultura na vila Forquilha. A diversidade de culturas cultivadas, era um fator chave para se obter êxito na unidade familiar, pois os cultivos se intercalavam, construindo assim um calendário agrícola que lhes garantia a produção o ano inteiro. Além de sempre poder contar com a coleta de frutos e com a criação de animais. Essa multiplicidade de ações se transforma em virtude do trabalho rural individual, o que propicia que o camponês possa adentrar novos campos de trabalho, conforme suas necessidades, e determinações sociais que se apresentam ao seu lugar.
Esse movimento desencadeia uma série de transformações positivas e negativas a vila, que antes tinha seu modo de vida girando em torno da forma de trabalho que possuíam, na maneira com que se utilizavam da terra na unidade familiar. A produção acontecia respondendo as necessidades locais, de uma agricultura voltada a sua reprodução e ao comércio local, as regras locais, as necessidades das famílias que ali moravam. Isso também se transforma com a chegada da dendeicultura. O trabalho passa a atender demandas de fora da vila Forquilha, pois o óleo de palma não é uma necessidade dos moradores da vila, e talvez não seja nem do município ou do Estado. Já que maior parte da sua produção é voltada à exportação para fora do país.
Falar das metamorfoses ocorridas no trabalho rural nos leva a pensar que estas fazem parte de um conjunto maior de mudanças, que acontecem nos eixos econômicos, políticos, sociais e culturais, e que estão inseridos no cotidiano dos moradores da vila e constituem seu modo de vida, moldando suas práticas existenciais, através do habitat, consumo, habitação e deslocamentos diários.
Temos assim, o dendê como um agente de destaque na economia, pois possibilitou o emergir de uma nova fonte de renda, apresentando aos moradores da vila oportunidade de emprego, metamorfoseando o trabalho no lugar, entretanto, isso trouxe mudanças que se desencadeiam e recaem sobre a vida dos indivíduos que lá habitam.

REFERÊNCIAS

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MULLER, A. A. (Ed.) A cultura do dendezeiro na Amazônia brasileira. Belém: Embrapa Amazônia Oriental/Manaus: Embrapa Amazônia Ocidental, 2000.
NAHUM, J. S.; BASTOS, C. S. - Dendeicultura e descampesinização na Amazônia paraense. CAMPO-TERRITÓRIO: revista eletrônica de geografia agrária, v. 9, n. 17, p. 469-485, abr., 2014.
NAHUM, J. S.; MALCHER, A. T. C. - Dinâmicas territoriais do espaço agrário na Amazônia: a dendeicultura na micro-região de Tomé Açu (PA) -< http://confins.revues.org/7947>. Acessado em: 8 de jul. de 2013.
NAHUM, João Santos (Org). Dendeicultura e dinâmicas territoriais do espaço agrário na Amazônia paraense / - Belém: GAPTA/UFPA, 2014.
SANTOS, Milton, 1926-2001. A Natureza do Espaço: Técnica e Tempo, Razão e Emoção / - 4. ed. 2. reimpr. - São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2006. - (Coleção Milton Santos; 1).

* Graduada em licenciatura e bacharelado em Geografia pela Universidade Federal do Pará - UFPA, Faculdade de Geografia e Cartografia. Concluiu Mestrado em Geografia pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia – PPGEO na UFPA, e faz parte do grupo de pesquisa “Dinâmicas Territoriais do Espaço Agrário na Amazônia” – GDEA.

Recibido: 03/12/2016 Aceptado: 28/12/2016 Publicado: Diciembre de 2016

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