Revista: Caribeña de Ciencias Sociales
ISSN: 2254-7630


CARACTERIZAÇÃO DA PRODUÇÃO DA AGRICULTURA FAMILIAR NO PROJETO DE ASSENTAMENTO PANELÃO NO MUNICIPIO DE CAREIRO CASTANHO-AM

Autores e infomación del artículo

Lindomar de Jesus Sousa Silva

Gilmar Antonio Meneghetti

Ariane Angélica Moreno

Embrapa Amazônia Ocidental, Brasil

lindomar.j.silva@embrapa.br

Resumo
O contexto vivenciado com a criação de assentamentos traz novas reflexões sobre a realidade econômica, social e política da agricultura familiar no Brasil, que pode representar bases para impulsionar a construção de uma nova realidade rural no país. O referido trabalho, através da caracterização da produção da agricultura familiar no Assentamento Panelão, no município de Careiro Castanho, no Estado do Amazonas, procura contribuir na construção de parâmetros que sirvam de base para a introdução de tecnologias adequadas em comunidades rurais amazônicas de acordo com seus perfis. O levantamento exploratório realizado com agricultores familiares no assentamento permitiu algumas reflexões: a necessidade de reformular o olhar sobre as comunidades, assim como a geração de tecnologias adequadas para o ambiente em estudo, fortalecendo a importância da produção de alimentos voltados à comercialização, ao autoconsumo, contribuindo assim, para  a manutenção das famílias no campo.

Palavras-chave: produção familiar, assentamento, desenvolvimento rural, agricultores familiares.



Para citar este artículo puede uitlizar el siguiente formato:

Lindomar de Jesus Sousa Silva, Gilmar Antonio Meneghetti y Ariane Angélica Moreno (2016): “Caracterização da produção da agricultura familiar no projeto de assentamento Panelão no municipio de Careiro Castanho-AM”, Revista Caribeña de Ciencias Sociales (mayo 2016). En línea: https://www.eumed.net/rev/caribe/2016/05/panelao.html
http://hdl.handle.net/20.500.11763/CARIBE-2016-06-panelao


1. Introdução

          Os anos de 1990, para (Leite, 2001) marcam um novo período nas políticas públicas, principalmente voltadas à agricultura familiar. Nesse período surge, entre outras, o Programa de Crédito Especial para a Reforma Agrária (PROCERA), a extensão da Previdência Social aos trabalhadores rurais e o surgimento do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) em 1995. Tal avanço tem como intuito atender as demandas dos movimentos sociais do campo, em plena efervescência. Segundo dados do INCRA, no Amazonas a ação do Estado promoveu o surgimento de 144 assentamentos rurais, tal ação significa uma grande oportunidade para o desenvolvimento da agricultura familiar, com geração de renda e sustentabilidade. Como forma de contribuir com esse debate, o presente trabalho apresenta um retrato da produção da agricultura familiar no Projeto de Assentamento Panelão, no município de Careiro Castanho - AM, criado em 1998, esse retrato busca expor os principais elementos relacionados à produção e a dinâmica agrícola vivenciada pelas famílias de agricultores assentados. Para atingir os objetivos, foi realizada uma pesquisa de caráter exploratório, com base numa amostragem de 20% dos assentados, definidas a partir de uma equação estatística e informações provenientes do órgão oficial de assistência do Estado do Amazonas: IDAM.
            Como conclusão, é possível relacionar o grande potencial do assentamento para geração de alimentos e produtos agrícolas, com ampla possibilidade de escoamento da produção, devido à localização próximo a BR e a proximidade ao centro urbano da cidade de Careiro Castanho. Por outro lado, a articulação de políticas voltada a fortalecer a agricultura familiar não se efetivou. A ausência de uma plena assistência técnica, a carência de infraestrutura e tecnologia, aliada a outras possibilidades de geração de renda fez com que os agricultores diminuíssem o ritmo de produção, ficando restritos a uma pontual relação com o mercado e uma produção para autoconsumo.

2. Agricultura familiar um debate recente
Na década de noventa uma pesquisa realizada pela FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação) e pelo INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), cujo foco principal era estabelecer diretrizes para um “modelo de desenvolvimento sustentável”, classificou os estabelecimentos agropecuários brasileiros em dois modelos: “patronal” e “familiar”. Essa separação diz que o patronal tem como principal característica: a separação entre gestão e trabalho, a organização descentralizada e ênfase na especialização. Já o familiar possui uma relação íntima entre trabalho e gestão, a direção do processo produtivo é conduzido pelos proprietários, à ênfase na diversificação produtiva, na durabilidade dos recursos, na qualidade de vida, sendo a utilização do trabalho assalariado em caráter complementar e a tomada de decisões imediatas, ligadas ao alto grau de imprevisibilidade do processo produtivo (FAO/INCRA, 1994:4). Com base nesta pesquisa o Estado estabeleceu o marco legal de agricultor familiar na lei 11.326, de 2006. Nesta lei o enquadramento do agricultor familiar pressupõe:

I – não deter área maior do que quatro módulos fiscais;1 II – utilizar predominantemente mão de obra da própria família nas atividades do seu estabelecimento ou empreendimento; III – a renda familiar ser predominantemente originada de atividades vinculadas ao próprio estabelecimento; e IV – o estabelecimento ser dirigido pelo(a) agricultor(a) com sua família (art.3).

O conceito de agricultor familiar que surgiu na produção teórica na década de noventa passou a substituir termos como agricultura de baixa renda, pequena propriedade e agricultura de subsistência. Segundo (Wanderley, 2001:21) a agricultura familiar não é uma categoria social recente, nem a ela corresponde uma categoria analítica nova na sociologia rural, no entanto, sua utilização, com o significado e abrangência que lhe tem sido atribuído nos últimos anos, no Brasil, assume ares de “novidade e renovação”. Ainda segundo a autora a agricultura familiar é uma categoria necessariamente “genérica, pois a combinação entre propriedade e trabalho assume, no tempo e no espaço, uma grande diversidade de formas sociais”.
               Para (Wanderley, 2004: 45) “esse caráter familiar se expressa nas práticas sociais que implicam uma associação entre patrimônio, trabalho e consumo, no interior da família e que orientam uma lógica de funcionamento especifica”. Ainda segundo a autora, a compreensão da agricultura familiar precisa ir além de “identificar as forma de obtenção do consumo, através do próprio trabalho, mas do reconhecimento da centralidade da unidade de produção para a reprodução da família, através das formas de colaboração dos seus membros coletivos – dentro e fora do estabelecimento familiar”.
            Em grande parte das abordagens o agricultor familiar tem em seu horizonte a produção para autoconsumo, o que não significa a desconsideração do mercado. Tal horizonte baliza as estratégias de autonomia relativa da família e a garantia de sua própria sobrevivência. (Sabourin, 2009) diz que o agricultor familiar está envolto de uma complexa relação de relações mercantis e de reciprocidade. (Wanderley, 1976:540) diz que o agricultor familiar “é forçado a se integrar no mercado: mercado de trabalho, de terras, de produtos e de insumos”. Ressaltando que “é importante observar que esta integração não significa de nenhuma maneira a negação do caráter de subsistência da economia camponesa”. O caráter de subsistência não pela maior ou menor parcela da produção que é autoconsumida, mas pela natureza mesma da produção. Mesmo que toda esta venha a ser comercializada, a lógica de sua organização permanece orientada para a satisfação das necessidades básicas da família (Wanderley, 1976: 540).
            A grande notabilidade da agricultura familiar está em articular família, terra e trabalho possibilitando a partir desses três elementos o surgimento de múltiplos arranjos que “se combinam socialmente estão na origem da grande diversidade de expressões da agricultura familiar nas situações concretas e que são objeto constante de nossas pesquisas” (Wanderley, 2007: 2).
            (Abramovay, 2007:29) diz que “é fundamentalmente sobre a base de unidades familiares de produção que se constituiu a imensa prosperidade que marca a produção de alimentos e fibras nas nações mais desenvolvidas”. É cada vez mais comum compreender que os empreendimentos familiares de um olhar economicamente viável, e como portador de funções relacionadas aos novos paradigmas de sustentabilidade, pluriatividade e de desenvolvimento territorial. Para (Wanderley ,2002), o meio rural que muitas vezes foi visto como fonte de problemas, hoje surge como portador de soluções relacionado ao emprego e a qualidade de vida. Segundo (Abramovay, 1992:122-127) a agricultura familiar pode ser facilmente “integrada ao mercado”, como ocorre em sociedades capitalistas desenvolvidas, ser “capaz de incorporar os principais avanços técnicos e de responder as políticas governamentais”, além de modificar-se, ou seja, “aquilo que era antes de tudo um modo de vida converteu-se numa profissão, numa forma de trabalho”.
            Uma política pública que pode ser considerada como incentivo à produção da agricultura familiar é a de assentamentos rurais, que na década de 1990, e com maior ênfase na década seguinte, passaram a serem cada vez mais implantados como resposta às reivindicações das organizações de trabalhadores rurais, movimentos sociais organizados. Tais políticas de assentamentos foram concebidas e conceituadas pela comunidade acadêmica tendo como referência os modelos produzidos por agências multilaterais, como a FAO, o IICA e o Banco Mundial1 .
               A formulação conceitual de projetos de assentamentos definida pela CONAMA pressupõe para o alcance dos objetivos propostos econômicos, sociais e cultural a integração e ~]significar somente o acesso a terra e sim a articulação de políticas de créditos, assistência técnica, infraestrutura, educação, saúde dentre outros. Esse conjunto de políticas para (Fernandes, 2001) são essenciais para garantir a permanência dos assentados, como também, condições dignas de sobrevivência e produção.
             (Bergamasco e Norder, 1996:07) compreendem os assentamentos rurais como “a criação de novas unidades de produção agrícola por meio de políticas governamentais visando o reordenamento do uso da terra, em beneficio de trabalhadores rurais sem-terra ou com pouca terra”. Tal criação, ainda segundo os autores precisam oferecer “condições adequadas para o uso da terra e o incentivo à organização social e a vida comunitária”.
            Segundo (Navarro, 1997) além dos fatores como distribuição de rendas e dinamização socioeconômica local, é preciso destacar o papel dos novos assentamentos no circuito econômico local e regional. Portanto, no contexto atual, os novos assentamentos precisam ser analisados como territórios capazes de dinamizar o local, gerar emprego e garantir a sustentabilidade ambiental.
            Com os assentamentos, é possível superar a marginalização de acesso a terra e a possibilidade de modernização do sistema de produção, já que “a agricultura familiar sempre ocupou um lugar secundário e subalterno na sociedade brasileira”. Quando comparado ao campesinato de outros países, foi historicamente um setor ‘bloqueado’, impossibilitado de desenvolver suas potencialidades enquanto forma social específica de produção (Wanderley, 2001: 36-37). Na expressão de (Caio Prado Jr., 2000:90) com a reforma agrária, no caso, com a criação de assentamentos os “trabalhadores rurais passam a ter o direito da utilização da terra em benefício próprio, resultando em melhores condições de vida para estes trabalhadores, aumento da produtividade e desenvolvimento da região”.
            O novo contexto vivenciado com a criação de assentamentos impõe uma nova realidade econômica, social e política em muitos municípios e territórios, o que pode significar as bases para impulsionar a construção de uma nova realidade rural no Brasil.
            Em relação à Amazônia existe um padrão histórico de incentivo ao estabelecimento de assentamentos. Iniciando no governo Vargas, intensificado no Governo Militar, principalmente sob o pretexto de “integrar para não entregar”, observamos uma política de assentamento na Amazônia organizada a partir da abertura de novas áreas de ocupação, a partir da colonização de terras públicas, o que não permite uma mudança na estrutura fundiária do país (Pasquis et al., 2005; Tourneau; Bursztyn, 2010).
            Tal característica de assentamento produziu uma demografia diversificada, decorrente dos fluxos migratórios para região amazônica. Essa diversificação gera uma população com peculiaridade socioeconômica e cultural. Segundo (Tourneau e Bursztyn, 2010 : 117) tendo 15% da população rural do Brasil, a Amazônia possui 55% dos lotes distribuídos pelo Instituto Nacional de Colo­nização e Reforma Agrária – INCRA.
            Segundo dados do (INCRA, 2015) no Amazonas, a área de assentamentos em hectares são de 27.381.804,28, tal área é dividida em 144 assentamentos, com aproximadamente 56.177 famílias beneficiadas.

3. Metodologia

          O presente trabalho utilizou a pesquisa exploratória utilizando como técnicas a coleta de informação, revisão bibliográfica, leitura de livros, artigos, documentos e dados secundários como base para compreensão do objeto em estudo.
            Através de entrevistas foi realizada a coleta de dados primários, com os produtores de mandioca, além da observação direta. O local de estudo foi o assentamento Panelão, no município de Careiro Castanho, no Amazonas. Esse assentamento foi escolhido devido a sua localização estar na área de abrangência do Projeto Estratégia de multiplicação rápida de variedades superiores de mandioca (Manihot esculenta Crantz) para o aumento da produção de farinha e fécula no Estado do Amazonas, desenvolvido pela Embrapa Amazônia Oriental e financiado pelo Programa de Apoio à Consolidação das Instituições Estaduais de Ensino e/ou Pesquisa – Pró–Estado. Considerando a população total do assentamento optou-se em trabalhar com amostragem, que frequentemente é usada nas pesquisas sociais. Ao optar pela amostragem foi selecionada de forma aleatória uma pequena parte dos elementos que compõem o universo. Para que a pequena parte selecionada fosse a mais representativa possível recorreu-se ao princípio probabilístico simples, onde o agricultor entrevistado é selecionado de forma casual.
            Em relação ao tamanho da amostragem, esta foi de 20% de um universo de 150 agricultores produtores de mandioca. A quantidade de produtores foi informada previamente pelo Instituto de desenvolvimento agropecuária e floresta do Amazonas (IDAM). É importante ressaltar que a presente pesquisa tem um viés qualitativo, com base na acepção de (Patton,1990), para o qual não há regras para o tamanho da amostra em pesquisa qualitativa. Segundo o autor essa perspectiva remeteu à estratégia de amostragem por variação máxima, onde a principal preocupação é buscar a tipicidade e a conveniência da amostra deve ser com a heterogeneidade entre os grupos de sujeitos. A representatividade dos casos não está relacionada ao tamanho da amostra, “mas à sua capacidade de proporcionar o entendimento de outros casos” (Vieira et al., 2002: 1). Sendo assim, qualquer padrão comum que nasça da ampla variabilidade amostral é valioso para que se possa chegar aos significados essenciais do fenômeno em evidência.
            Para as entrevistas foram selecionados, intencionalmente, uma amostra de 20% dos produtores de mandiocas. O total de produtores foi obtido a partir de informações preliminares fornecidas pela IDAM. Portanto, seguirmos uma amostra intencional de indivíduos, ou seja, “selecionados com base em certas características tidas como relevantes pelos pesquisadores e participantes, mostra-se mais adequada para a obtenção de dados de natureza qualitativa” (Gil, 2002: 145). Para a seleção dos entrevistados seguiu o procedimento probabilístico aleatório, onde todos os elementos da população têm a mesma probabilidade de pertencerem à amostra.
            A coleta dos dados foi obtida através de um roteiro com entrevistas semiestruturadas aplicadas aos produtores. O roteiro continha questões abertas e fechadas. Com base em (Gil, 2002: 147), este método foi aplicado na interação pesquisador entrevistados, com o propósito de descrever as características da atividade ou processos abordados na pesquisa. Essa técnica permitiu a melhor caracterização da infraestrutura, produção, organização, comercialização, acesso a programas e projetos governamentais, dentre outros. O tratamento dos dados coletados foi realizado por meio da técnica de sistematização e análise, que, com base nas características dos dados, tem por finalidade categorizar e sistematizar a percepção dos atores frente ao objeto de estudo (Vergara, 2009).

4. Resultados
          O projeto de assentamento Panelão, criado em 1998, com 260 lotes/famílias, possui 3% da população do município de Careiro Castanho, ocupando uma área de 3.633,25 hectares, e atualmente possui 251 famílias assentadas (INCRA, 2015). Está localizado na BR-319 (Manaus – Porto Velho), no Km 117, a 3 km do centro da sede da cidade. O PA possui 9 km de ramais e 6 vicinais.

Para 40% dos moradores o acesso é considerado bom; 35% consideram regular e 25% péssimo. A origem dos moradores do PA Panelão é diversificada, entretanto, o predomínio é do Estado do Amazonas sendo que 64%, no caso dos homens, e 69% em relação às mulheres, no caso dos outros 36% dos homens e 31% das mulheres estes advêm dos Estados do Ceará, Goiás, Pernambuco, Maranhão e Rio Grande do Norte. Os municípios do Estado do Amazonas de onde os assentados se originam com mais frequência são: Manacapuru, Careiro da Varzea, Tapuá, Beruri, Tefé, Eurunepé, Coari, Manaquiri, Manaus. Dos homens 56% tem origem em Manacapuru (22%) e Beruri (34%), já as mulheres 65% tem origem em quatro municípios: Manaquiri (22%), Careiro Castanho (15%) Tapuá (14%) Beruri (14%).
            O domicílio das unidades familiares de produção, 40% delas possuem 4 (quatro) pessoas; 20% 2 (duas), 15% 3 (três), 10% 5 (cinco), 5% 6 (seis), 5% possui 8 (oito) pessoas e 5% possuem apenas 1 pessoa por unidade. Sendo que em relação a composição de gênero 69% são homens e 31% são mulheres.         
Em relação à faixa etária, há um equilíbrio entre homens e mulheres na faixa de 30 a 50 e 51 a 60 anos, a porcentagem de mulheres é inferior entre os grupos de 5 e 14 e 15 e 29 anos, como também entre 0 a 4 e entre os mais de 60 anos. No caso da  escolaridade dos assentados existe uma predominância masculina nos primeiros anos escolares, já no ensino médio completo e incompleto é possível observar um equilíbrio.
A pesquisa procurou analisar quais culturas são desenvolvidas no assentamento e como resultado obteve uma diversidade de produtos, que se destinam para o consumo interno e para comercialização.
Pode se observar que os assentados também desenvolvem práticas de plantio e extrativismo. Para o cultivo no assentamento a área utilizada é de 48% do total, que estão ocupadas com as seguintes atividades: pomar, pecuária, hortaliças, pousio e benfeitoria. Os demais 52% são destinados à preservação como mostra figura 2 abaixo.

Em relação aos produtos que geram renda, as maiores participações são do açaí, cupuaçu e mandioca. É importante ressaltar que o açaí e o cupuaçu são nativos e não há relatos de plantios. A mandioca é a cultura que possui maior área plantada e é destinada ao consumo e a comercialização.
         A importância da mandioca pode ser ressaltada quando analisada a safra de 2013/2014, quando a renda gerada por esta cultura foi responsável pela maior parte da renda dos assentados conforme exposto na figura 3.
O estímulo à produção de farinha deveu-se ao alto preço da mesma na safra 2013/2014, por causa da baixa produtividade obtida em razão da enchente que inundou a várzea no ano anterior. Neste período o preço médio do saco de farinha chegou a R$ 223,00, preço muito superior ao praticado nos primeiros meses de 2015 2.
No caso dos rendimentos não agrícolas estes correspondem a 35% do total da renda gerada. Grande parte destes rendimentos provém das aposentadorias 77% os 23% restantes estão divididos entre auxílio doença 8%, bolsa família 14% e 1% de pensões. Cabe ressaltar que a renda não agrícola é estável, não sofre a variação como ocorre com a renda proveniente da produção agrícola, o que faz estes rendimentos serem o esteio para garantir a reprodução familiar.
               Há também um grande número de assentados que desenvolve atividade fora da propriedade como forma de garantir rendimento monetário. Esse grupo representava 20% dos assentados. Esse público se dividia em diaristas (61%), assalariados (23%), servidores públicos (8%) e serviços em gerais (8%), que são pedreiros, carpinteiros e outros. Na maioria das famílias o exercício da atividade fora da propriedade tem a função de complementar à renda familiar.
            Para o cultivo da mandioca, somente 15% relataram ter algum gasto com insumos. Esses gastos se concentram na aquisição de produtos químicos para combater a principal invasora, o capim prego, relatado por 55% dos assentados. Pragas e doença também foram citadas, entre elas o cupim (27%), a lagarta (9%) e a podridão da raiz (9%), sendo que não foi identificada nenhuma forma de controle pelos assentados.
            Em relação à contratação de mão de obra (diarista), 50% dos produtores de mandioca dizem contratar diaristas, 40% não e 10% não responderam à pergunta. As principais atividades onde os agricultores utilizam a mão de obra de diaristas são limpeza (39%), plantio (22%), colheita (22%), 12% no processo da farinhada e 5% na coivara.
            A mão de obra terceirizada serve para suprir as principais dificuldades da agricultura familiar, que são a limpeza da área (53%) e a produção de farinha (35%). Somente 6% indicaram a ausência de cultivares como problema e 6% disseram não existir dificuldade. Assim como em outras regiões do país, o P.A Panelão sofre com a diminuição da mão de obra familiar devido à migração e ao envelhecimento dos trabalhadores. Por outro lado, as tecnologias, a mecanização e os equipamentos agrícolas, que permitem o aumento da produtividade do trabalho, estão completamente ausentes da vida dos assentados. Mesmo a utilização de técnicas simples de cultivo como o consórcio, ainda é uma realidade distante dos agricultores familiares do assentamento Panelão. O plantio consorciado é utilizado por apenas 5% dos assentados. A grande maioria, 95%, faz o plantio solteiro.
Quando o assunto é assistência técnica, 65% dos assentados relatam receber assistência do IDAM, 25% disseram não  receber assistência, outros 5%  se referem a Embrapa como órgão de assistência e 5% o Sebrae. Dos que recebem assistência técnica, 55% dizem estar insastifeitos, 30% satifeitos e 15% não responderam.
Quando o assunto é acesso a informação técnica, 30% recorrem ao rádio e a TV, 22% a palestras, 19% a exposição agropecuária, 19% a leitura de livros, 5% participam de dias de campos e os mesmos 5% recorrem à Embrapa para obterem informação.
Em relaçao a participaçao em atividades coletivas, 55% dos entrevistados responderam não participar de organizações comunitárias e 45% disseram que participam. A maior participação se dá em mutirões (80%) e encontros comunitários (20%). Entre os motivos que levam os 55% não participarem estão a falta de interesse (60%), falta de união da comunidade (30%) e 10% não responderam a pergunta.
As principais organizações coletivas onde há participação dos assentados são a associação (25%), o sindicato (24%), religião (24%), a cooperativa (11%), os partidos políticos (9%) e grupos de lazer (7%). A filiação nas organizações para 50% dos entrevistaso está relacionada estritamente a motivação econômica, como o acesso a financiamento ou aposentadoria; 31% relataram motivação social, como a busca de melhoria para comunidade e 19% políticas em vista de acesso a benefício próprio ou comunitário.
Os diversos dados obtidos na pesquisa de campo do PA Panelão mostra que agricultura familiar tem uma importância estratégica para o desenvolvimento do meio rural no Amazonas. Essa importância está relacionada a produção de alimentos voltados a comercialização e ao autoconsumo, como também à manunteção das famílias no campo.
 Existe uma grande limitação dos assentados em aproveitar o potencial endógeno da área ocupada. Essa limitação pode ser vista, na pouca importância dada ao extrativismo e sistemas agroflorestais já estabelecidos. O aproveitamento de espécies como o cupuaçu e o açaí se dão sem o uso de práticas de manejo adequadas e mesmo adoção de qualquer tecnologia. O mesmo ocorre com o cultivo do principal produto do assentamento, a mandioca. Mesmo cultivada de forma solteira, não há potencialização da área utilizada. A ausência de políticas complementares impõe uma lógica anti-inovativa, limitando o crescimento da produção dos assentados.
Experimentos mostram que a adoção de práticas de manejo, como corte, espaçamento, seleção de maniva poderiam ampliar a produção em até 50%. Porém tal aspectos somente pode ser alcançado com uma efetiva assistência técnica e a introdução de tecnologias capazes de auxiliar na produção.
É importante relatar que a diversidade produtiva das unidades familiares de produção constitui-se em elemento estratégico das famílias para garantir sua reprodução, principalmente para enfrentar as ocilações do mercado. É sentido, porém, o baixo apoio das organizações sociais e políticas (cooperativa, sindicatos, adminstração pública) em vialibilizar maior acesso a formação e políticas capazes de melhorar a qualidade de vida no assentamento. Os assentados são carentes de acesso as simples práticas de planejamento e controle de gastos. Tal acesso poderia possibilitar uma outra lógica produtiva, superando a incerteza presente na maioria das unidades.
A ausência de políticas, organizações, formação faz com que os agricultores se restrinjam as atividades necessárias ao autoconsumo e à comercializaçao do excedente. Tal possibilidade somada a regularidade e a certeza das rendas não-agrícolas contribui para que os agricultores familiares façam a opção já defendida por Chayanov, de que a labuta estará limitada pelo equilíbrio entre a busca da satisfação em comparação com a “penosidade” do trabalho (Woortmann, 2001).

5. Conclusão

As informações levantadas mostraram as principais características socioeconômicas do assentamento Panelão, no município de Careiro Castanho – AM. O estudo mostrou que existem grandes dificuldades das famílias deste assentamento em adotar tecnologias capazes de melhorar a produtividade das culturas trabalhadas. O resultado desta situação é que os agricultores produzem para autoconsumo, comercializando somente um pequeno excedente. O assentamento está localizado próximo ao mercado consumidor, o que é uma vantagem comparativa, entretanto, não está sendo usufruída para gerar maior renda. Dada esta situação, as rendas não agrícolas ou transferências de programas públicos, têm um papel de estabilidade na reprodução social das famílias do assentamento.
É notória a falta de assistência técnica efetiva e de políticas públicas, tanto de infraestrutura como de apoio ao emprego de técnicas mais eficientes na produção, que resulte ao final, em melhoria nos níveis de renda das famílias e maior participação no mercado.
            Um aspecto interessante observado é o tamanho das famílias no assentamento. Ao contrário do que se imaginava o número de pessoas por domicílio não é elevado, 60% dos domicílios tem 3 a 4 pessoas, 15% tem 5 a 6, 5% 8 pessoas e, 5% dos domicílios tem apenas uma pessoa morando. A pesquisa mostrou que existe hoje nos estabelecimentos do assentamento a disponibilidade de pouco mais de uma unidade de trabalho/homem por família. Fica o questionamento: qual é o impacto da disponibilidade de mão de obra para o trabalho sobre as atividades agrícolas, como por exemplo, a produção de farinha?
O assentamento ainda é um museu vivo e atual do processo migratório nordestino para o Amazonas, iniciado no final do século XIX, no sentido de se identificar que 36% dos homens e 31% das mulheres tem origem nos estados do Ceará, Goiás, Pernambuco, Maranhão e Rio Grande do Norte. A maior parte dos homens e mulheres, cuja origem é do Amazonas, são oriundos majoritariamente de Manacapuru, Beruri, Tapuá, Manaquiri e Careiro Castanho (15%).
A pesquisa mostrou também, confirmando a tendência de outras regiões do Brasil, o processo de masculinização da população do assentamento. Há um forte predomínio do sexo masculino de zero até 29 anos de idade. Este pode ser mais um elemento que dificulta a permanência dos jovens no meio rural. A busca pela parceira, em muitos casos, somente pode ser efetivada no meio urbano. Na faixa de 29 a 60 anos há um equilíbrio entre homens e mulheres. Esta faixa pode ser considerada a faixa que desenvolve as atividades agrícolas. Enquanto ela estiver na ativa haverá perspectivas de agricultura e possibilidade de estruturação e reestruturação da produção. Acima de 60 anos também predomina o sexo masculino.
Na escola, nas séries iniciais até o ensino fundamental, os meninos predominam em relação às meninas. Há um equilíbrio nas séries de ensino médio. Considerando toda a população do assentamento 69% dela é do sexo masculino e 31% do sexo feminino. São mais de dois terços de homens para menos de um terço de mulheres. É muito alto este percentual. Cabem alguns questionamentos para se entender melhor esta situação: onde está a população feminina? Ela existe? Está na cidade junto com os filhos, estudando ou trabalhando? Haverá sucessão familiar nestes estabelecimentos? A pesquisa mostrou que há muitas perguntas a sem resposta em ralação ao assentamento e ao meio rural.    

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WOORTMANN, Klaas. (2001): O modo de produção doméstico em duas perspectivas: Chayanov e Sahlins. Brasília: UNB/ Departamento de Antropologia/Instituto de Ciências Sociais. Série Antropologia. N. 293.

1Segundo (Tourneau e Bursztyn, 2010:118) “A partir de 1995, o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC) propôs um novo programa de desapropriação e aquisição de terras, com a meta de assentar 280.000 famílias em quatro anos”. Os autores reforçam que “esse objetivo foi quase atingido. Durante o seu segundo mandato, uma meta semelhante foi fixada. Mais de 400.000 famílias acabaram sendo assentados durante os oito anos do governo FHC”. A mesma prioridade foi mantida pelo Governo Lula, assentamento 303.000 famílias. Segundo o autor o governo Lula “começou com um ritmo menor, mas foi aos poucos acelerando (de maneira paralela ao desenvolvimento de outros programas de benefícios sociais, como o Bolsa Família). De 2003 até o final de 2008, mais 303.000 famílias (segundo informações da base SIPRA) foram contempladas pela reforma agrária”.

2 Nos primeiros meses de 2015 a saca de farinha estava oscilando entre R$ 70,00  a 100,00 reais.


Recibido: 16/03/2016 Aceptado: 10/05/2016 Publicado: Mayo de 2016

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