Rafaela Santos Costa*
Geraldo Antônio Alves de Sousa**
UEMG, Brasil
leitoralves@gmail.com
RESUMO  - Este artigo trata da leitura como instrumento de transformação, buscando estratégias  para a inclusão desta, principalmente, na educação infantil. O tema se  justifica tanto no que tange ao aprofundamento e à constatação de como acontece  a inclusão da leitura nos anos iniciais da educação infantil. Acerca dos  objetivos, pretende-se analisar como é feita a inserção da leitura na educação  infantil, quais são os métodos e formas utilizadas pelos profissionais da  educação. Como os agentes de ensino, educadores e escola estão preparados para  trabalhar a leitura de forma efetiva e transformadora. Esta pesquisa é de cunho  bibliográfico. Fundamentam este estudo, dentre outros autores, Alves (2004),  Freire (1995), Barthes (2004), Filho (2009), quando se trata da temática, e  Aguiar (2001) e Soares (2001) sobre a escolarização da leitura. Percebeu-se que  a literatura é importante ferramenta para a formação do pensamento crítico do  leitor e para a construção da sua identidade.   
    Palavras-chave: leitura, leitura  literária, educação infantil 
    ABSTRACT  - The theme of this article deals with reading as an instrument of  transformation, seeking strategies for the insertion of reading mainly during  early childhood education. The theme is justified both with regard to the  deepening and verification of how the inclusion of reading in the early years  of early childhood education takes place. Among the objectives, we intend to  analyze how the insertion of the reading in the infantile education is made,  what are the methods and forms used by the professionals of the education.  Specifically, observe whether teaching agents, educators and school are  prepared to work effectively and transforming reading. The methods used are  bibliographic research. This study is based on authors such as Alves (2004),  Freire (2001), Barthes (1977), Filho (2009), when it comes to the theme and  Aguiar (2001), Soares (2001) on reading schooling. The study allows the contact  with the subject, the knowledge in the area.
  Keywords:  reading, literary reading, early childhood education
Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato: 
Rafaela Santos Costa y Geraldo Antônio Alves de Sousa (2019): “Identidade em construção: A literatura e o pensamento crítico na primeira infância”, Revista Atlante: Cuadernos de Educación y Desarrollo (noviembre 2019). En línea: 
https://www.eumed.net/rev/atlante/2019/11/identidade-construcao.html
//hdl.handle.net/20.500.11763/atlante1911identidade-construcao
1- INTRODUÇÃO
Muito se tem discutido  a respeito da importância da literatura para a formação humana e crítica do  indivíduo, em especial na primeira infância. Pensar nas crianças e na relação  com os livros é pensar em um futuro com mais espaço para o diálogo e menos  opressão às diferenças. 
            A proposta deste  trabalho é verificar a importância da literatura para a formação de crianças na  primeira infância, cuja identidade ainda está em construção. A intenção é  abrir um diálogo a respeito da literatura na  formação do sujeito crítico e propor uma reflexão acerca do envolvimento das crianças  com o mundo literário, sem perder de vista a função da escola neste processo.
            Ao definir a literatura  de forma simples, podemos dizer que ela consiste na arte de criar e compor textos, também pode-se  destacar os diversos tipos de produções literárias, como poesia, prosa,  literatura de ficção, literatura de romance, literatura infantil, literatura  infanto-juvenil, literatura popular, literatura de cordel, existem variadas  classificações. Nessa perspectiva conceitual é importante dizer que a função da  literatura não é apenas entreter ou informar, mas chamar a atenção para o seu  potencial de sensibilização do leitor, especialmente o pequeno leitor, levando-o  ao hábito da leitura e fazendo diferença na formação da sua identidade já  que a leitura literária é a própria construção da consciência que permite a  formação do sujeito no seu aspecto funcional e cultural.
            A leitura literária é importante em qualquer ambiente em  que se vive, visto que, com ela, novos saberes são buscados, como afirma Aguiar  (2001, p. 242) “[...] traz para o universo do leitor possibilidades novas de  sentido, que colocam em questão suas verdades desestabilizando-o e levando-o a  reestruturar-se”. E ainda: “[...] ler é ampliar horizontes e a literatura será  tanto melhor quanto mais provocar o seu leitor” (AGUIAR, 2001, p. 242). A leitura literária é um importante ingrediente  para a construção e formação do leitor crítico. Assim, a presença da leitura na  educação infantil é essencial para o crescimento  educacional da criança, pois, quando a criança é estimulada à leitura nos anos  iniciais isso irá refletir no seu desenvolvimento escolar ao longo da vida.
            A justificativa para este estudo deve-se particularmente,  ao papel fundamental que a literatura exerce sobre a na minha formação, não só  acadêmica, mas humana. Tenho como exemplo minha avó, que mesmo sendo semianalfabeta,  com toda sua simplicidade, sempre ensinou a todos os seus doze filhos a  importância da leitura para “ser alguém”, ainda que, por ironia, ela não  compreendesse o que lia. Ensinou assim minha mãe, a filha mais velha, a  codificar e decodificar as palavras, que, por sua vez, descobriu dentro das  palavras a literatura. Esse gosto pela literatura contagiou a mim, desde os  primeiros anos de vida, e por meio dela busco alcançar voos mais longos e, sobretudo,  contagiar meus alunos no sentido de se interessarem por esse universo literário. 
            De acordo com a 4° edição da pesquisa Retratos da Leitura  no Brasil, 2016, realizada pelo Instituto Pró-Livro, apresentados na revista  Nova Escola (2019) os leitores que tiveram  experiência com a leitura na infância, entre 5 a 10 anos, pela mediação de  outras pessoas, quando perguntados sobre quem mais os influenciou a leitura, responderam  que, em primeiro lugar, foram as suas mães. Isso nos leva à reflexão de como a  escola e os professores têm trabalhado a leitura literária na sala de aula. 
            A leitura literária deve iniciar na primeira infância e se  constrói durante toda a vida. A escola tem um papel importante nessa fase da vida,  podendo ser esse o primeiro contato da criança com a literatura, pois quando  esta é não incentivada a ler em casa, a escola se torna o principal agente no  incentivo à leitura. Se a criança é estimulada, constrói um vínculo que será  levado por toda a vida.
            A literatura pode contribuir para a construção da  personalidade da criança ao ajudá-la a criar suas próprias concepções sobre sua  realidade, refletindo sobre o seu papel social, formando cidadãos autônomos e críticos.  Pois trabalha a construção da formação cultural da criança em suas múltiplas  concepções, subsidiando-se como um suporte para a experimentação de mundo. 
            Metodologicamente, essa pesquisa se condiciona na forma  qualitativa, e tem como insumos para o estudo de dados a pesquisa bibliográfica  sobre a literatura, tendo em vista a sua contribuição para a construção do  sujeito crítico. Para este fim, recorreu-se a artigos científicos impressos e  eletrônicos, boletins, jornais, revistas, pesquisas acadêmicas e livros. Este  tipo de pesquisa, segundo Marconi e Lakatos (2019, p. 201) “não é mera  repetição do que já foi dito ou escrito sobre certo assunto, visto que propicia  o exame de um tema sob  novo enfoque ou  abordagem, chegando a conclusões inovadoras”. Dessa forma, cabe ao pesquisador  a análise cuidadosa dos dados obtidos a fim de assegurar a profundidade das  informações prestadas. 
  2. LEITURA: CAMINHOS QUE LEVAM  À LITERATURA 
            A leitura é fundamental para o ser humano viver em  sociedade, visto que grande parte das nossas relações está baseada na  construção de codificar e decodificar letras e palavras das quais agregamos  significados. Com isso, a leitura é um dos primeiros objetivos para se alcançar  na escola, a fim de inserir a criança ao seu meio social e à construção dos seus significados.
            Diante disso, após o aluno ser inserido ao universo da  decodificação das  palavras, é percebido  que a leitura não se restringe apenas a esse papel. Ela ganha campos muito mais  abrangentes e importantes na formação humana, como Coelho (2001, p. 235)  afirma, “[...] a leitura é mais que um simples divertimento, é um fecundo  instrumento de formação humana, ética, estética e política” e ainda diz que a  leitura oferece “[...] matéria extremamente fecunda para formar ou transformar  mentes” (COELHO, 2001, p. 235). 
            A aquisição da leitura perpassa por diferentes formas de  poder e domínio, como Barthes (2004, p. 5) afirma: “Esse objeto em que se  inscreve o poder, desde toda eternidade humana, é: a linguagem ou para ser mais  preciso, sua expressão obrigatória: a língua”. É por meio da linguagem, que  narramos vagorosamente ao longo dos anos nossos feitos e conquistas, também  repassamos ensiidntos e costumes ao longo de gerações. 
            A evolução da leitura acontece à medida que as práticas humanas  vão se transformando, e esse domínio sobre a linguagem passa a ser reconhecido  por meio de códigos, como Barthes (2004, p. 6) afirma: “[...] os signos de que  a língua é feita, os signos só existem à medida que são reconhecidos, isto é, à  medida que se repetem; o signo é seguidor, gregário [...]”. Com isso passamos a  transcrever esses signos em tábuas de barros, logo após surgiram os papiros e  pergaminhos até chegarmos ao papel. Apenas no século XV com o surgimento da  classe comercial que vai dar espaço à burguesia, ao desenvolvimento das  cidades, à organização de estados nacionais e à invenção da imprensa que  tornou possível a reprodução de livros em  maior escala, facilitando assim o acesso da população. 
            Entretanto a compressão dessa decodificação de signos por  si só não é, de forma alguma, objeto de transformação e libertação, pois como  Barthes (2004, p. 6) afirma: “[...] assim que enuncio, essas rubricas se juntam  em mim, sou ao mesmo tempo mestre e escravo [...]”. A literatura é capaz de  trapacear a língua, é resistindo sobre o poder que a controla, parafraseando  Barthes (2004, p.7): a literatura é esse logro magnífico que permite ouvir a  língua fora do poder, no esplendor de uma revolução permanente da  linguagem.  
            Durante a Idade Média, os textos que  eram caracterizados como literatura eram renegados, pois a literatura se constituía  em uma leitura subversiva. Por meio dela, as classes dominadas poderiam tomar  consciência da sua condição e se revoltarem, assim era considerado uma  literatura profana. No final do século XIX muda a percepção que se tem das  crianças e dos conteúdos destinados a elas, como Filho (2009, p. 38) aponta:  “[...] criança era vista como um adulto em miniatura, uma etapa a ser  rapidamente ultrapassada para que o indivíduo se tornasse um ser produtivo e  contribuísse efetivamente na e para a comunidade.” Com isso, mesmo que ainda  não houvesse uma concepção nítida sobre o universo infantil que temos hoje,  eles passam a adaptar os contos para atender o público infantil. 
            A leitura é uma prática social  indispensável para a vida do homem moderno. Realiza-se a leitura literária em  um processo contínuo. Como afirma Aguiar (2001, p. 249) “[...] a obra literária  é simbólica, ela permite leitura plurais, dando-se a interpretação sempre de  modo novo”. A respeito do leitor literário, a autora afirma que “[...] o certo  é que ele não continuará igual depois da leitura, uma vez que seus horizontes  estarão modificados pela interação com o texto”. (AGUIAR, 2003, p. 249). A  literatura contribui na construção da personalidade do leitor ao construir e  criar suas próprias concepções sobre sua realidade, refletindo sobre o seu  papel social, formando cidadãos autônomos e críticos.
            Como Filho (2009, p. 44) postula:  “quando se fala de literatura, os termos leitor e leitura aparecem relacionados  de maneira bastante estreita”. E continua: “deve-se entender a leitura num  sentido amplo, como a instância de recepção de diversos tipos de texto”. É  quase impossível falar da literatura sem falar sobre leitura, já que estão  imbricadas, ambas se correlacionam a todo o momento, a instância da leitura não  sendo passiva, o leitor no exercício da leitura, ativa sua memoria relacionando  fatos e experiências sempre dialogando com o que está sendo lido.  
            A literatura possui uma multiplicidade de conceitos que  impedem de defini-la de modo sistemático e particular. Sobre isso, Barthes (2004,  p. 8) afirma que “a literatura não diz que sabe alguma coisa, mais que sabe de alguma coisa; ou melhor, que ela sabe  algo das coisas”. A literatura contesta a ciência das letras, ela encena a linguagem  em vez de apenas utilizá-la. Parafraseando Barthes (2004), a literatura põe  frente a frente, o real da fantasia, a objetividade e subjetividade, o  verdadeiro e o belo. 
            Nesse sentido, é perceptível que a  literatura trabalha a construção do ser em suas múltiplas concepções subsidiando-se como um suporte para a  experimentação do mundo. Histórias contemporâneas, ao apresentarem as dúvidas  em relação ao mundo em que se vive, abrem espaço  para o questioidnto e a reflexão, provenientes da leitura, por outro lado, os  contos clássicos não impedem o raciocínio lógico, porque não embotam a  inteligência. Envolve o aguçar de sua sensibilidade artística e o equilibrar do  irreal com o real.
A importância do ato de ler é um assunto sobre o qual é falado de forma exaustiva e a todo o momento. Entretanto,  o hábito da leitura se torna cada vez mais escasso com o passar dos anos. As  tecnologias nos bombardeiam com diversas informações rápidas e rasas que  minimizam o contato do sujeito com o autor e sua veracidade, culminando com  empobrecimento da experiência, e com isso, o descaso  pela literatura. 
            Em suas  considerações a respeito do homem ‘moderno e tecnológico’ Roaunet (1990) citado  por Pacheco (s/d) 1 afirma “sempre alerta, sempre à espera do novo, sempre pronto para reagir aos  choques da vida moderna, o homem passa a viver para o imediato, para o útil e o  urgente”. Onde, nesse cenário, se encontra a literatura? Com sua arte de tecer  histórias vagorosamente. Estaria então a literatura em decadência? Será o fim  da literatura?  A linguagem se torna  pouco a pouco fragmentada, a sabedoria passa a dar lugar à informação, o  conteúdo em massa à narrativa no fim do dia. 
            Como consequência desse cenário, Pacheco (s/d) afirma que:  “[...] a experiência se degradava, os valores tradicionais não tinham mais  espaço, a solidão e o individualismo passavam a figurar surpreendentemente”. E  com isso perdemos parte da nossa essência, passamos a ter espaço apenas para o  que é ‘útil’, para nossas tarefas diárias, ler apenas o necessário para os  deveres escolares, pois, o tempo não pode ser desperdiçado com o que vem do  imaginário e fantasias.
            Nas escolas, percebemos que não é diferente. Sempre  preocupados com prazos, provas, conceitos e resultados, a leitura perde cada  dia mais espaço, como afirma Pacheco (s/d): “parar para ler, só se for  informações úteis. Frequentar bibliotecas, só se for para pesquisar conteúdos  escolares. Ler obras literárias, só se for para receber nota e conceito na  escola.” Esse pensamento reforça a compreensão de que a leitura literária está  presente nas escolas apenas pelo seu papel funcional de introduzir a criança no  mundo das letras, de ensinar com trechos literários regras e normas gramaticais.  O tempo gasto com a leitura por prazer é um tempo ‘desperdiçado’ diante dos  prazos e conteúdos a serem trabalhados ao longo do ano escolar. 
            O que esquecemos é que a literatura é capaz de transformar  nossa mente, construir caminhos meio ao abstrato, como cita Pacheco (s/d) “a  leitura literária permite preencher vazios do texto ao mesmo tempo em que  preenche os vazios da própria subjetividade”. Possibilita assim parar o fluxo  de informações e ações cotidianas, muitas vezes automatizadas, assim ser capaz  de refletir a fim de redirecioná-las.
  3- A CONSTRUÇÃO DA LITERATURA:  DESAFIOS DA ESCOLA
            Na medida em  que a população brasileira ganha um incentivo para sair do analfabetismo, encontra-se  em um momento perigoso, quando se treina a população,  em especial as crianças, em apenas codificadores e decodificadores de palavras.  Conforme Aguiar (2001), em muitas situações o uso da escrita pode servir como  controle social, em que os programas de  alfabetização estão a serviço do preparo de mão de obra qualificada,  disciplinadas para atender aos interesses de lucro das classes dirigentes. Nessa  perspectiva não há nenhum vislumbre para o uso da leitura em detrimento do bem  estar pessoal.
            É imposta às crianças e jovens a  leitura que deve ser feita, como deve ser feita, e quando deve ser feita, deixando  de perceber que a leitura advém de um momento de prazer que transcende os  capítulos e atividades apresentadas em sala de aula, como Freire (1995, p. 17)  afirma “[...] a leitura de um texto, tomado como pura descrição de um objeto é  feita no sentido de memorizá-la, nem é real leitura, nem dela resulta, portanto  conhecimento do objeto de que o texto fala”.
            É sabido que a formação de uma nação  leitora é um processo a ser construído de forma contínua e sistemática, o que  só pode ocorrer com politicas públicas voltadas para esse fim. Enfatizar a  importância que a escola representa nesse processo, buscando iniciativas para  desencadear e fomentar uma cultura voltada para a leitura, sobretudo  desenvolvendo nos alunos o gosto e a vontade de ler. Antes mesmo de “aprender a  ler” os alunos podem e devem aprender a gostar de ler. Por meio de ouvir histórias,  apreciando livros com imagens em que se vai  criando uma narrativa imaginária, considerando que o prazer no ato de ler  costuma ser o início promissor para a formação leitora na escola. No entanto, muitas vezes, o processo de leitura na escola se  torna indigesto e forçado, quando o aluno é obrigado a ler determinado livro. Com  essa atitude, o professor retira dele o prazer e o encantamento da leitura.  Como pontua Alves (1999, p. 96):
            [...]  ao ver as listas de livros indigestos e sem sabor que os  professores obrigam seus alunos a ler. [...] os  alunos são obrigados a comer digerir e assimilar é outra coisa. Via de regra a  refeição acadêmica termina em vômito ou diarreia. O engolido é esquecido (  ALVES, 1999, p. 96).
            A leitura escolar tornou-se pretexto para uma série de cobranças por parte das professoras e  professores sobre gramática, pontuação, separação silábicas e diversos outros  aspectos normativos da Língua Portuguesa. Com isso, a criança não encontra  espaço e deleite com a leitura, visto que o ato de ler se resume apenas no  decodificar e codificar as palavras e o texto vira uma espécie de reboque para  cobranças de natureza linguística. 
            O ler não é apenas a capacidade de  atribuir significados aos símbolos. O prazer pela leitura precede antes mesmo  do saber ler, quando a criança se encanta pelas maravilhas que ouve dos livros,  das histórias fascinantes que encontram entre suas páginas. Quando alguém lê, a  criança escuta com prazer, ela para e começa a observar aqueles sinais gráficos  misteriosos e começam a perceber como as letras são o caminho para as  deliciosas histórias. Esse é o primeiro passo para o gosto pela leitura. 
            Assim,  quem ensina a ler, isto é, aquele que lê para que os seus alunos tenham prazer  no texto, tem de ser um artista. Só deveria ler aquele que está possuído pelo  texto que lê. Por isso eu acho que deveria ser estabelecida nas nossas escolas  a prática dos "concertos de leitura". Se há concertos de música erudita,  jazz – por que não concertos de leitura? Ouvindo, os alunos experimentarão o  prazer de ler (ALVES, 2004, p. 19). 
            O professor tem um importante papel nessa construção.  Quando este é um leitor, ele transmite aos seus alunos a importância e o prazer  da leitura. Mas não é apenas a leitura propriamente, a professora ou professor  precisa ser um artista, um encantador de palavras, precisa transmitir por meio da sua fala todo o sabor e prazer da história, cujos  alunos, ao ouvirem, despertam a vontade de dominar aquelas palavras e a desvendar  o mundo misterioso da escrita. 
            O professor, como um agente  disseminador da leitura, deve assumir o compromisso com a criança de proporcionar textos de qualidade, que  intervenham na formação do pensamento e seduzam para o exercício da reflexão.
            Acho  que as escolas só terão realizado a sua missão se forem capazes de desenvolver  nos alunos o prazer da leitura. O prazer da leitura é o pressuposto de tudo o  mais. Quem gosta de ler tem nas mãos as chaves do mundo. Mas o que vejo a  acontecer é o contrário. São raríssimos os casos de amor à leitura desenvolvido  nas aulas de estudo formal da língua (ALVES, 2004, p. 22).
            Assim, a escola tem um valor  fundamental na construção do prazer da leitura nos alunos; mas isso não quer  dizer que ela deva ter uma receita pronta para ser seguida por todos. A leitura  se apresenta como um caminho surpreendente e único para cada indivíduo. Cada  qual em seu momento deve ser despertado e levado nesse caminho da leitura. O  que se pode afirmar é que a leitura como é desenvolvida hoje nas escolas não  consegue atingir seu objetivo e função social. Apenas se torna uma  representação e mecanização do codificar e decodificar os símbolos, tornando-se  extremamente desestimulante. 
            Como Rubem Alves aborda no vídeo  “Saber e Sabor” produzido pela TV Escola (1997) ele usa uma metáfora ao dizer  que a memória é como uma grande panela de macarrão com água, após o cozimento a  água é jogada fora e só sobra o que é útil, o que dá prazer, que é o macarrão,  as coisas que não são úteis e que não dão prazer são jogadas fora. O que fica  na memória são as coisas que são integradas à vida. As regras gramaticais,  textos decorados, dígrafos que são aprendidos apenas para provas ou testes escolares,  são rapidamente esquecidos, pois não dão prazer. De acordo com Rubem Alves  sobre “Saber e Sabor” saber é ter conhecimento da técnica de como as coisas  funcionam, a teoria, já sabor é quando a gente degusta, aprecia e se delicia  com o que é aprendido. 
            O foco do professor deve estar sempre  no aluno, o conteúdo deve acontecer de forma acidental e indireta, não serão os  currículos ou as leis que podem mudar a educação, mas os professores. Temos que  ensinar os alunos a arte de apreciarem um texto literário, aprender o prazer  contido nas páginas dos livros, para que assim aconteça um ensino significativo  que vai além de conteúdo e regras. Ainda de acordo com Rubens Alves, a educação  se divide em duas partes, uma delas é ensinar as ferramentas, os meios de vida,  já a outra  é ensinar a degustação da  vida. 
            Assim, a leitura literária só será  transformadora e prazerosa, quando o aluno saborear as palavras, e for  instigado a saborear as letras por si só e em seu momento, e não por meio de leituras  e textos forçados para o aprendizado das normas da língua formal.
  3.1-      Literatura e a escola
            Durante décadas, percebemos uma mudança na forma de ensinar,  como afirma Soares (2001, p. 20): “(...) a partir do século XVI, foi uma  revolução do espaço de ensino (...)”. O ensino que acontecia dentro de um espaço  individual com professores isolados, passou a ser unificado em apenas um local,  como várias salas de aula, abrigando alunos de diferentes idades. Surgindo assim  o local e tempo de ensino. Com isso se organizou os modos de ensinar  coletivamente, bem como as matérias, disciplinas e metodologias escolares. 
            Com essa formalização do espaço  escolar, advém a organização das escolas em classes, com alunos divididos por  idade, grau, série e cada qual é determinante para o tratamento escolar específico;  horário, trabalhos, conteúdos, modos de ensinar e aprender, tarefas,  avaliações. Como aponta Soares (2001, p. 21) “(...) esse processo que se chama  escolarização, processo inevitável, porque é da mesma essência da escola, é o  processo que a institui e que a constitui”. Nesse contexto não se pode negar,  contudo que a literatura, se torne um “saber escolar”. 
            De acordo com Soares (2001, p. 22) “(...) o que se deve  negar não é a escolarização da literatura, mas a inadequada, a errônea, imprópria  escolarização da literatura”. E continua “(...) se traduz em sua deturpação,  falsificação, distorção, como resultado de uma pedagogização ou uma didatização  mal compreendidas que, ao transformar o literário em escolar, desfigura-o,  desvirtua-o, falseia-o”. Retira sua conotação artística, desfigura sua  verdadeira finalidade, se tornando para a escola, apenas um instrumento para ministrar  conteúdos. 
            A escola deve, ao trabalhar a literatura, respeitar sua  especificidade de linguagem. Trabalhando de diferentes formas e abordagens que  não anule o seu caráter libertador e crítico, não o torne apenas um veículo ou  enfeite, transformando em uma forma facilitadora, para outros fins que não o  seu teor literário, o desfigurando e transformando em um instrumento maçante e  desagradável. Como Filho (2009) aponta: 
            [...]  Isto é, a literatura para a criança de ser oferecida como arte e prazer, arte  porque é o resultado de um fazer estético do(s) autor(es) e prazer por que o  contato com a arte pode ser encarado desde a mais tenra idade como uma experiência  ricamente prazerosa, capaz de nos envolver e trazer novas dimensões ao  cotidiano (FILHO, 2009, p. 63). 
            Percebe-se que a escola precisa criar atividades de  leitura literária que diminuam a distância entre os leitores dos livros,  decorrente dos constantes processos de escolarização da literatura, associando  apenas a um caráter obrigatório a fim de cumprir tarefas escolares. Sobre essa  escolarização da leitura literária Soares (2001, p. 47) afirma: 
            Distinguimos  entre uma escolarização adequada e uma escolarização inadequada da literatura:  adequada seria aquela escolarização que conduzisse eficazmente às práticas de  leitura literária que ocorrem no contexto social e às atitudes e valores  próprios do ideal de leitor que se quer formar; inadequada é aquela  escolarização que deturpa, falsifica, distorce a literatura, afastando, e não  aproximando, o aluno das práticas de leitura literária, desenvolvendo nele  resistência ou aversão ao livro e ao ler (SOARES, 2001, p. 47). 
            É importante que no processo de  ensino-aprendizagem exista uma simetria entre aluno e professor, abrindo espaço  para a interdisciplinaridade e sensibilização dos alunos, criando uma forma  criativa e prazerosa da organização do ensino. Costa e Ferreira (2006, p. 49)  apontam que: “parte-se do pressuposto que para ensinar a gostar de ler é  preciso que professores sejam leitores”. É importante que professores contagiem  seus alunos em sala de aula, mas para isso é necessário que eles leiam com  paixão, gostem de ler e demonstrem aos alunos que ler é uma atividade prazerosa,  é importante explicar aos alunos não há problema em não gostar de algum livro,  mas eles devem fazer variadas leituras para encontrarem o tipo de livro que os  agrade.  
            Em entrevista à revista Nova Escola  (2001) a escritora Ana Maria Machado, referência nacional em literatura  infantil, comenta sobre como duas professoras foram fundamentais no seu amor  pela literatura, sobre o que elas tinham de especial ela declara: 
            Elas  faziam o que todo profissional deveria fazer: gostava muito de ler.  Mostraram-me a beleza da língua e reafirmaram a noção de que o livro é uma  coisa boa, um amigo que está do nosso lado, a quem podemos recorrer a qualquer  hora. (NOVA ESCOLA, 2001, p. 7)
            Precisamos ir além da alfabetização  criando oportunidades para que as crianças conheçam a leitura e tudo que a literatura  e os livros podem proporcionar para elas. Criança alfabetizada que toma gosto  pela leitura, descobre um mundo de oportunidades e conhecimentos e tem sua  aprendizagem potencializada. Como Costa e Ferreira (2006, p. 49) afirmam:
            Sabemos  que os prazeres da leitura são muitos ou múltiplos, pois lemos para saber, para  compreender e para refletir. Lemos, ainda, pela beleza da linguagem, para a  nossa emoção e até para nossa perturbação. Ao lermos estamos compartilhando,  sonhando e aprender a sonhar. (COSTA E FERREIRA, 2006, p. 49). 
            A literatura é capaz de nos  transportar para caminhos e lugares novos, meios novos para encarar e entender  o mundo. Ela vem carregada de emoção e prazer, um momento único para apreciação  da arte. Vai muito além das questões didáticas e gramaticais, além de apenas o  conhecimento e trabalho da língua, por meio dela podemos trabalhar nas escolas  os mais diversos temas e assuntos, ajudando a criança a entender o mundo em que  se vive nos mais diferentes aspectos. 
            O livro deve ser apresentado ao  aluno de forma chamativa, interessante e prazerosa que cause nele o despertar e  criando uma simpatia com o mundo literário. Segundo Costa e Ferreira (2006, p.  48): “o prazer do texto é uma coleção de aforismos e fragmentados que oferece  uma leitura distraída, que o leitor pode escolher múltiplas portas para entrar”.  Ainda sobre a leitura literária, as autoras afirmam: “se trata de um  conhecimento que se busca e não um saber já constituído”. O ler para ler, sem  qualquer cobrança ou tarefa relacionada, uma atividade prazerosa com um fim em  si mesma, em que não é preciso provar para alguém se leu e como se deu a  leitura, mas apreciar o momento e a vontade espontânea de “saborear” os livros. 
            É importante nesse processo a  necessidade de dar ênfase à formação de educadores capazes de trabalhar a  literatura de forma adequada, principalmente quando falamos deste novo contexto  educacional, cuja literatura será construída em  um mundo que se molda diariamente e derruba valores na velocidade de um  computador. Como Filho (2009, p. 36) afirma: 
            Fala-se  de um momento em construção, mas o que se pretende é ressaltar a mudança dos  objetivos de mecanismos de edificação de um tipo de texto que tem como  destinatário a criança e que procura se firmar como arte, sem que se descarte a  sua presença demasiadamente importante no processo educativo, entendendo que o  processo também se constrói hoje tentando levar em consideração a formação  plural do povo brasileiro (FILHO, 2009, p. 36). 
            Com a preocupação de regulamentar o sistema  educacional brasileiro, em 1996 foi criada a Lei de Diretrizes e Bases da  Educação Nacional (LDB) (Lei n° 9.394, de 20/12/1996). Já em 1998, com objetivo  de instrumentalizar o trabalho a ser desenvolvido nas escolas no que se refere  aos elementos curriculares e às atividades de ensino, foram lançados os  Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). Que têm como proposta dar um norte de  como os conteúdos devem ser trabalhados nas escolas, correlacionando com  questões que envolvem a pluralidade do povo brasileiro. Com base nesses  documentos oficiais, cada estado e prefeituras deveria desenvolver seu  currículo e, seguindo esse currículo, as escolas deveriam criar o seu Projeto  Político Pedagógico (PPP).
            De acordo com a Nova Escola (2010)  podemos definir o Plano Político Pedagógico como um instrumento que apresenta:  “a identidade da escola e indica caminhos para ensinar com qualidade”. Trata-se  de um conjunto de metas e objetivos que a escola pretende alcançar, e como elas  devem ser cumpridas. Sendo assim, a Nova Escola (2010) caracteriza o Projeto  Político Pedagógico como:
            É projeto porque reúne propostas de ação concreta a  executar durante determinado período de tempo. É político por considerar a escola como um espaço de  formação de cidadãos conscientes, responsáveis e críticos, que atuarão  individual e coletivamente na sociedade, modificando os rumos que ela vai  seguir.É pedagógico porque define e organiza as atividades  e os projetos educativos necessários ao processo de ensino e aprendizagem (NOVA  ESCOLA, 2010, p. 11).
            
            Pautada nesses documentos a  literatura infantil ganhou um espaço para trabalhar diversos temas dentro das  escolas, capazes de agregar discussões nas salas de aula, sendo eles  importantes no diálogo de questões que fazem parte da formação étnica e social  do povo brasileiro. Para Filho (2009, p. 41): “a literatura para crianças,  hoje, guarda características primordiais da arte, ou seja, olhar a sociedade e  desenvolver a ela uma matéria passível de discussão e mudança”. Sendo o  trabalho da literatura fundamental para desenvolver essas discussões em sala de  aula. 
            Entretanto a literatura ainda não  está sendo bem trabalhada nas escolas como afirma Ana Machado à revista Nova  Escola (2001, p. 12): “Não só a literatura. A arte em geral, toda cultura  criadora e questionadora”. E ainda postula que o trabalho com a literatura nas  escolas “esbarram na burocracia, no currículo, no horário que não reserva um  espaço para que as crianças leiam”. Sendo a leitura trabalhada nas escolas  apenas aquelas que são usadas para trabalhos escolares. 
            Como uma demanda definida pela Lei  de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) (Lei n° 9.394, de 20/12/1996),  era preciso estabelecer uma Base Nacional Comum Curricular (BNCC), tendo um  caráter normativo de regulamentar todos os conteúdos e níveis de  desenvolvimento em cada fase escolar de todas as escolas públicas e  particulares no Brasil. 
            Em dezembro de 2017, após uma série  de debates, foi aprovada e homologada pelo Ministério da Educação, a Base  Nacional Comum Curricular (BNCC), que é um documento que visa nortear o que  deve ser ensinado em todas as escolas do Brasil. O documento trata de todas as  etapas da educação básica e busca unificar conteúdos básicos, que devem constar  nos currículos e no Plano Politico Pedagógico (PPP) das escolas. Estas devem se  adequar até o final de 2019.
            Uma nova proposta presente na Base  Nacional Comum Curricular (2017) é a respeito das competências, que são  definidas como: 
            Mobilização  de conhecimentos (conceitos e procedimentos), habilidades (práticas, cognitivas  e socioemocionais), atitudes e valores para resolver demandas complexas da vida  cotidiana, do pleno exercício da cidadania e do mundo do trabalho. (BRASIL, 2017.  p. 12).
              As competências preveem a  formação de alunos críticos, reflexivos, criativos, autônomos, participativos e  responsáveis. De acordo com a Guimarães (2017), ex-secretária Executiva do  Ministério da Educação, a escola deve, por meio da BNCC, formar cidadãos que  busquem: “um novo olhar a questões centrais da educação, em especial: o que aprender,  para que aprender, como ensinar e como avaliar o aprendizado”. Isso mostra um  novo perfil de ensino e aprendizado no Brasil, onde os alunos sejam preparados  de forma autônoma nas escolas. 
            Dentro da Base Nacional Comum  Curricular (BNCC) é abordado o campo de experiência: “Escuta, fala, pensamento  e imaginação”. Esse campo é direcionado aos alunos da primeira fase de  escolarização, a Educação Infantil, que trabalha com alunos de zero a seis  anos. Nesse campo de experiência é abordada a necessidade da criança falar e  ouvir, para potencializar a apropriação cultural da sua língua materna. 
            [...]  é na escuta de histórias, na participação em conversas, nas descrições, nas  narrativas elaboradas, individualmente ou em grupo e nas implicações com as  múltiplas linguagens que a criança se constitui ativamente como sujeito  singular e pertencente ao um grupo social (BRASIL, 2017, p. 38).
            Percebemos assim a importância de se  trabalhar com a literatura na educação infantil. Ainda que a criança não possa  ler, ela é capaz de ouvir as histórias e compreendê-las, potencializando a  aprendizagem, enriquecendo seu vocabulário e criando uma concepção da língua  escrita. 
            O papel do educador nessa fase é de  extrema importância para a aproximação e mediação da criança com a leitura  literária. Trabalhar livros, contos, recontos, teatro, rimas, poemas são  caminhos propostos para o educador para trabalhar a literatura, como cita o  documento da Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017, p. 38): “(...) as  experiências com a literatura infantil, propostas pelo educador, contribuem  para o desenvolvimento do gosto pela leitura, do estimulo à imaginação e da  ampliação do conhecimento de mundo”. Assim, destaca a importância de se  trabalhar a literatura ainda na educação infantil, aproximando as crianças do  mundo literário. 
            Nesse campo de experiência, “Escuta,  fala, pensamento e imaginação”, a Base Nacional Comum Curricular, aborda de  forma clara e objetiva pontos que devem ser alcançados com as crianças da  educação infantil, pontuando como deve ser trabalhado a introdução da língua  oral e escrita. Ao final desse ciclo, entende-se que a criança deve ser capaz  de “ouvir, compreender, contar, recontar e criar narrativas”. E ainda: “compreensão  da função social da escrita e reconhecendo a leitura como fonte de prazer e  informação”. 
            Analisando a proposta da Base Nacional Comum Curricular  (BNCC) e o objetivo a ser alcançado no final do ciclo, percebemos que nesse  caminho perde a importância da função da literatura na construção do individuo  autônomo e passa a focar apenas na instrumentalização da língua, no aprendizado  da leitura como parte de uma construção de um saber escolar. Podemos assim  levantar questioidntos acerca de como é trabalhada a literatura nas escolas,  e quais são os caminhos que ela está sendo conduzida. Trabalhar a leitura pela  leitura, não é capaz de transformar. 
  CONSIDERAÇÕES FINAIS
            Percebe-se, com essa  reflexão, a importância da leitura literária para a formação de crianças em  sujeitos críticos, sendo que é na primeira infância que acontece a aproximação  destas com o universo literário, cuja  identidade, ainda em processo de construção, torna-se um fator ímpar para o  desenvolvimento crítico e autônomo. Além disso, abriu-se um diálogo a respeito de como essa literatura vem sendo trabalhada  dentro das escolas e como, neste momento, o professor torna-se importante agente  de disseminação da literatura, sobretudo pelo  ato de leitura por prazer. 
            Por meio da leitura de diversos  autores que confirmam a nossa proposição quando se afirma que o ensino da  literatura ainda se encontra muito deficitário dentro das instituições de  ensino, percebe-se que há uma crescente instrumentalização da literatura como  apenas um recurso de alfabetização retirando dela todo o seu caráter artístico  e crítico. A leitura passa a ser trabalhada como um artefato didático e se  mostra ao leitor em apenas fragmentos contidos nos livros didáticos para o uso  de aprendizagem do estudo da língua formal. 
            Essa escolarização da  literatura feita de forma errônea serve apenas para afastar os alunos do  universo literário, transforma o ato de ler em uma atividade maçante e  enfadonha, não produz qualquer tipo de prazer e entretenimento, servindo apenas  para fazer provas, responder questões em atividades, e trabalhos acadêmicos que  nada acrescentam na construção de um sujeito autônomo e crítico. Nesse sentido,  precisamos resgatar aspectos lúdicos da aprendizagem, organizando o ensino de  forma diferente e criativa, garantindo o espaço para questioidntos, reflexões  e interações entre os alunos e as obras literárias. 
            Nesse contexto, o papel  do educador é fundamental nessa construção da leitura como arte, para  desenvolver no aluno a sensibilidade com o universo literário, cabendo ao professor  o papel de criar mecanismos para o ensino e mediação da leitura. Sendo o  professor leitor o responsável por  recriar o texto, podendo ser reescrevendo ou  recontando o livro trabalhado. É fundamental que o professor seja um leitor  ativo para que consiga contagiar os alunos por meio da leitura. Quando a  leitura é feita com gosto fica fácil de envolver a turma e descobrir a melhor  forma de trabalhar a literatura. 
            É preciso oferecer ao  aluno espaço dentro das escolas que sejam propícios para essa interação com diversos  tipos de literatura. Que eles sejam convidados a conhecer os livros, descobrir  o prazer presente nas páginas dos livros e ter a sensibilidade para perceber o  que ela deseja ler e ver, e saber ouvir a criança a respeito da leitura que foi  oferecida. Conclui-se que a prática pedagógica, ligada ao prazer, contribui  efetivamente para promover a formação de novos leitores. 
            Nesse sentido, o  professor e os profissionais de ensino, como bibliotecários coordenadores  pedagógicos, são os principais agentes nesse processo de formação dos leitores,  criando diversos mecanismos para contagiar e envolver os alunos nessa relação  com o mundo literário, desenvolvendo e criando projetos capazes de explorar nos  alunos a curiosidade natural das crianças, socializando alunos e professores com  o mundo literário. 
            Precisamos ir além de  alfabetizar, de ensinar as crianças a codificar e decodificar palavras, mas de criar  oportunidades para que nossas crianças possam conhecer tudo que a leitura literária  pode proporcionar a elas. Criança alfabetizada com gosto pela leitura descobre  um mundo de oportunidades e conhecimentos. Ao mergulhar na literatura,  transporta-se para um mundo imaginário criado, e  aí está a função mágica da literatura, por meio dela vivemos outra realidade,  com suas emoções e perigos, sem sofrermos as consequências do que fazemos e  sentimos enquanto lemos, essa experimentação da arte nos leva ao prazer de  entrar nesse jogo literário. 
            É nesse movimento,  nessa busca que não se esgota, porque inesgotável por si mesmo é o próprio  texto, com seus múltiplos olhares e reflexões, que devemos abraçar o desafio de  formar alunos leitores. Como educadores, exercendo papel fundamental de  mediação e construção desse vínculo do aluno com a leitura literária. O mais importante  é que não se dirija à criança com receitas e métodos prontos de como ler e  sobre o que ler, não é apenas colocar um livro na mão da criança e ordenar a  leitura que, consequentemente, ela acontecerá. É fazer com que a criança  descubra de forma lúdica e prazerosa o quanto é gostoso ler um livro. 
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*Graduada em Pedagogia, na Universidade Estadual de Minas Gerais- UEMG/Cláudio-MG.