Revista: Atlante. Cuadernos de Educación y Desarrollo
ISSN: 1989-4155


O OLHAR DOS DISCENTES SOBRE FORMAÇÃO PROFISSIONAL EM SERVIÇO SOCIAL NO INTERIOR DO AMAZONAS

Autores e infomación del artículo

Ana Paula Dias Corrêa*

Roberta Ferreira Coelho de Andrade**

Universidade Federal do Amazonas, Brasil

diaspaula844@gmail.com


RESUMO

Este artigo é resultado de um projeto de iniciação científica cujo objetivo foi avaliar a qualidade da formação conduzida nos cursos de graduação em Serviço Social ofertados no interior do estado do Amazonas, estado da região norte do Brasil, a partir do olhar de seus discentes. Para a coleta de dados, aplicamos questionários a grupos amostrais de alunos de instituições públicas e privadas, os quais já haviam cumprido 50% da matriz curricular do curso, nos municípios de Parintins, Coari e Itacoatiara. O método de investigação empregado foi o dialético, que se aplicou melhor ao caso por nos propiciar uma visão mais ampla do tema. Nestes termos, foi possível observar as principais fortalezas da formação em Serviço Social conduzida no interior do Amazonas, como a qualidade da fundamentação teórica fornecida aos estudantes e a qualificação dos professores, bem como identificar algumas fragilidades da formação, de modo que a mais evidente delas é a maneira como são ofertados os cursos de graduação na modalidade EaD. Ademais, verificamos como a relação entre teoria e prática nos cursos acontece predominantemente de forma dicotômica.

PALAVRAS-CHAVE: Formação Profissional, Serviço Social, Amazonas; Avaliação; ensino teórico-prático.

RESUMEN
Este artículo es el resultado de un proyecto de investigación cuyo objetivo fue evaluar la calidad de la formación en los programas de pregrado en Servicio Social en el estado de Amazonas, en la región norte de Brasil, de la mirada de su estudiantes. Para la recolección de datos, se aplicaron cuestionarios a grupos muestra de alumnos de instituciones públicas y privadas, que ya habían completado el 50% de la matriz curricular de curso, en los municipios de Parintins, Itacoatiara y Coari. El método de investigación empleado fue la dialéctica, que aplica el caso para dar una visión más amplia del tema. En estos términos, era posible observar las principales fortalezas de la formación de Servicio Social llevado a cabo dentro de la Amazonía, como la calidad de la fundamentación teórica que proporciona a los alumnos y la calificación de los docentes, así como identificar algunas debilidades de la formación, por lo que la más evidente de estos es la forma en que se ofrecen cursos de postgrado en modo a distancia. Además, pudimos comprobar que la relación entre la teoría y la práctica en los cursos ocurre predominantemente dicottomiamente.
PALABRAS CLAVE: Formación Profesional, Trabajo Social, Amazonas; Evaluación; enseñanza teórico-práctico.


Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Ana Paula Dias Corrêa y Roberta Ferreira Coelho de Andrade (2019): “O olhar dos discentes sobre formação profissional em serviço social no interior do Amazonas”, Revista Atlante: Cuadernos de Educación y Desarrollo (mayo 2019). En línea:
https://www.eumed.net/rev/atlante/2019/05/olhar-discentes-formacao.html
//hdl.handle.net/20.500.11763/atlante1905olhar-discentes-formacao


1. INTRODUÇÃO

O presente artigo é oriundo de uma pesquisa de iniciação científica que teve como objetivo avaliar a qualidade da formação conduzida nos cursos de graduação em Serviço Social, ofertados no interior do estado do Amazonas, estado da região norte do Brasil, a partir do olhar de seus discentes. Esta pesquisa foi inspirada por outro projeto de estudo da formação profissional dos assistentes sociais, o qual abrange todo o estado do Amazonas, contando com a participação não somente dos discentes, mas também dos egressos, professores, tutores e coordenadores de curso. Este projeto-inspiração foi financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Seu objetivo foi preencher o espaço vazio de investigações sobre o processo acadêmico dos profissionais em Serviço Social no Amazonas, uma vez que as pesquisas já realizadas só contemplam a capital do estado.
Ao longo de sua história, o Serviço Social foi orientado e influenciado por diferentes correntes teóricas, como a doutrina católica, o funcionalismo, o positivismo e o marxismo. Por ser uma profissão que teve origem a partir de profundas mudanças econômicas e sociais – instituição do sistema capitalista – ocorridas na sociedade, o Serviço Social também é bastante influenciado pelo contexto histórico em que se situa e, da mesma forma, deve renovar-se constantemente para atender às demandas sociais que se recriam ao longo dos tempos.
Além da atuação profissional, a formação dos assistentes sociais também é diretamente influída pelo seu contexto histórico e econômico, uma vez que os valores, técnicas e modelos educacionais se renovam com os passar dos anos. Atualmente, por exemplo, vive-se um momento de crescente mercantilização e flexibilização do ensino, em especial do ensino superior, que é contaminado pela racionalidade capitalista. Por isso, é de suma importância que se incentivem os estudos acerca da formação profissional que atualmente está sendo conduzida nos cursos de graduação em Serviço Social. Esta análise se torna mais necessária e urgente em regiões que foram esquecidas pelos estudos já realizados, como é o caso do interior do Amazonas. As poucas pesquisas empreendidas na região são antigas e contemplam somente a capital do estado.
A relevância deste projeto de iniciação científica justificou-se pelo fato de que analisar o processo de formação sob uma perspectiva local e atual, mas sempre considerando os conhecimentos gerais do curso, é de extrema importância para a garantia de um trabalho profissional comprometido com sua realidade social. Assim, esta pesquisa inovou por ter como campo de estudo os interiores amazonenses, uma vez que as raras pesquisas existentes abordaram este tema apenas no contexto manauara.
Para delimitar o número de alunos participantes da pesquisa e obter a melhor coleta de dados possível, foram selecionados grupos amostrais de alunos que estivessem cursando a partir do quinto período do curso de Serviço Social, por se considerar que estes já cursaram mais de 50% do curso de graduação. Ao estabelecer este critério, houve uma maior possibilidade de ter acesso a estudantes já em cumprimento de estágio curricular obrigatório, o qual geralmente se inicia no quinto ou no sexto período, a depender da matriz curricular de cada instituição. No total, 77 discentes responderam aos questionários, distribuídos em três municípios do interior do Amazonas: 43% deles em Itacoatiara, 40% em Parintins e 17% em Coari.
Do total de participantes da pesquisa, 86% são mulheres, enquanto 10% são homens e 4% não responderam a esta questão. Este dado apenas confirma a tendência da profissão em ser predominantemente feminina, pois é vítima ainda dos preconceitos e da má compreensão de sua essência por parte da sociedade em geral, que remontam à época de sua origem. Com influência da doutrina católica, o Serviço Social surgiu diretamente ligado à caridade e às ações sociais, tendo como agentes, predominantemente, mulheres de classe média, as quais dispunham de tempo e recursos materiais para se dedicar a esta causa.
Atualmente, apesar dos diversos avanços teóricos e metodológicos que a categoria profissional alcançou ao longo das últimas décadas, ainda permanece encravado no Serviço Social o estereótipo de ser uma profissão mais adequada a mulheres, pois estas supostamente carregam consigo qualidades maternais e solidárias. Esta preconcepção é um reflexo da noção de senso comum que abrange a profissão e que, por sua vez, é marcada pelo machismo, o qual ultrapassa os muros do Serviço Social e ainda está nitidamente arraigado na sociedade brasileira.
Os estudantes que responderam aos questionários eram, na época, alunos de instituições de ensino superior públicas e privadas, as quais fornecem cursos de graduação presenciais, semipresenciais e a distância. No Amazonas, de acordo com dados oficiais do Ministério da Educação do início do ano de 2019 – disponíveis no E-mec – são oferecidos cursos de graduação em Serviço Social por mais de três dezenas de instituições em vários municípios. Em 2014, quando foi feito o recorte para a coleta de dados, esse número estava em 4 instituições, dentre as quais a investigação obteve autorização de 2, situadas em três municípios: Parintins, Coari e Itacoatiara.
Os dados sobre a proveniência dos alunos mostram um reflexo do aumento do número de cursos de graduação em Serviço Social ofertados no estado do Amazonas. Do total de alunos participantes da pesquisa,77% deles estudam em instituições privadas, de modo que todas elas oferecem o curso na modalidade semipresencial/EaD.
Esta significativa presença do Ensino a Distância no interior é um reflexo do movimento de mercantilização do ensino, o qual vem se intensificando nos últimos anos e ocupando cada vez mais espaços, principalmente os interiores, onde é comum que não se encontre a estrutura física necessária para receber instituições públicas e privadas de ensino superior. Além disso, o EaD oferece outros atrativos, como o valor mais acessível, a flexibilidade e a promessa de um diploma idêntico ao oferecido pelos cursos presenciais.
O método de investigação empregado foi o dialético, o qual se aplica melhor ao caso por nos propiciar uma visão mais ampla do tema. A pesquisa realizada foi de nível exploratório, sendo composta pelas seguintes fases: pesquisa bibliográfica, com a consulta a livros e artigos científicos; revisão dos instrumentais de coletas de dados utilizados no projeto que deu origem a esta investigação; estudo de campo, compreendendo questionários e termos de livre consentimento; elaboração de relatório parcial; tabulação e análise dos resultados; elaboração de relatório final a ser apresentado ao CNPq e apresentação oral em Congresso de Iniciação Científica (CONIC).

2. BREVE AVALIAÇÃO DA FORMAÇÃO CONDUZIDA NO INTERIOR DO ESTADO DO AMAZONAS

Iamamoto (2006) afirma que a década de oitenta foi um divisor de águas para o
Serviço Social brasileiro. Impulsionados externamente pelas alterações sociais, políticas e econômicas recém sucedidas na sociedade (como, por exemplo, a luta pela democracia, a defesa do Estado de direito e as mudanças ocorridas no mundo do trabalho), e internamente pela influência da teoria social crítica (inspirada na tradição marxista), os profissionais organizaram-se para realizar debates, de modo a manter a profissão atualizada e oferecer novas respostas profissionais correspondentes aos atuais processos de trabalho.
Em um artigo mais recente, Iamamoto (2014), aborda a formação acadêmico-profissional no Serviço Social brasileiro e faz um panorama histórico sobre a trajetória do projeto acadêmico da profissão, desde a década de 1970. No ano de 1979, a então Associação Brasileira de Ensino de Serviço Social (ABESS) propôs um novo currículo mínimo para o curso de Serviço Social. Este currículo foi inovador, pois levou em conta aspectos do movimento de reconceituação profissional latino-americano e refutou algumas características do Serviço Social tradicional. A proposta foi aprovada pelo MEC em 1982 e constituiu um importante ponto de referência para as atuais diretrizes curriculares, propostas e revisadas pela ABESS na década de 1990.
Tudo isso culminou num fortalecimento do projeto acadêmico-profissional do
Serviço Social, caracterizado por mudanças na legislação que rege a profissão, no ano de1993; pela aprovação do código de ética do Serviço Social, também no ano de 1993 e pela proposta e revisão de novas diretrizes curriculares nacionais, nos anos de 1996 e 1999,respectivamente. Essas últimas, sendo produto de um rico conjunto de debates locais,regionais e nacionais.
Porém, este processo de renovação e atualização do currículo mínimo e das diretrizes curriculares precisou e ainda precisa superar alguns obstáculos. Em relação ao currículo, este foi enfraquecido pelos novos modelos de educação superior, os quais priorizam a flexibilidade, trabalhando com muitas disciplinas não obrigatórias e as habilidades técnico-operativas. Foi necessária uma união imperativa da categoria, utilizando-se dos parâmetros legais regulamentadores da profissão, para que este modelo não fosse enraizado na formação acadêmica em Serviço Social àquela época.
Em relação às diretrizes curriculares, vários conteúdos foram cortados de seus textos,sendo substituídos por tópicos mais genéricos, o que causou grande dificuldade em se estabelecer uma base comum para o ensino da profissão no Brasil. Basicamente, ficava a critério das instituições de ensino decidir o que seria e o que não seria abordado durante a formação profissional, dependendo das exigências do mercado (IAMAMOTO, 2014).
Segundo a autora, uma característica contemporânea da profissão é o constante crescimento do número de assistentes sociais, impulsionados pela propagação do ensino superior privado. Neste aspecto, o problema não é o número de profissionais aptos a atuar, mas sim a qualidade da formação que eles receberam, pois, como já mencionado, o interesse do setor privado de educação é acumular lucro, sem se preocupar em oferecer uma graduação de base sólida e unificada. Isto contribui para uma fragilização da profissão que, com uma formação precária, torna-se mais suscetível a atender os interesses do mercado, em detrimento da população subalterna, seu verdadeiro objetivo.
Obviamente, a autora não está falando especificamente do estado do Amazonas, mas nossa pesquisa dialoga com várias das reflexões suscitadas pela autora. No estado, houve uma visível reformatação do cenário educacional, visto que, até meados da década de 1990, a Universidade Federal do Amazonas era a única a oferecer o curso de Serviço Social no estado. Essa configuração mudará drasticamente nos anos 2000, com a atuação de várias instituições de ensino superior no mercado educacional tanto na modalidade presencial quanto a distância. No caso desta última modalidade, será a partir do ano de 2006 que a Universidade do Tocantins (UNITINS) passa a ofertar o curso na modalidade semipresencial e a distância em várias partes do país, inclusive no interior do estado do Amazonas.
Por isso, indagamos aos discentes quanto às potencialidades e fragilidades da formação recebida. Ao serem perguntados, por meio de uma questão de caráter subjetivo, sobre os aspectos mais positivos em relação à formação profissional que estavam recebendo, 15,6% dos alunos não responderam a esta questão. Dentre os alunos que apontaram fortalezas na formação, 44,6% apontou o conhecimento adquirido como maior fortaleza da formação que estava recebendo. Segundo os discentes, os conhecimentos assimilados fornecem uma boa base para a atuação profissional, pois proporcionam os saberes necessários sobre história e formação social, econômica e política do país, a essência do que é o Serviço Social, em suas diversas áreas sócio-ocupacionais, os direitos e políticas sociais, conhecimentos estes facilitados por excelentes docentes, como apontado na segunda categoria mais apontada como aspecto positivo, a qualificação dos docentes, com 13,8% de menções.
Outra categoria abordada nas respostas da primeira questão remete à matriz curricular dos cursos de Serviço Social, ao expressar que 12,3% dos alunos sentem-se satisfeitos com os conteúdos selecionados para compor as disciplinas e com a bibliografia utilizada para tanto, a qual foi apontada como atual. Além disto, há um empate entre duas categorias, com 10,8% de menções a cada uma. A primeira delas trata sobre a leitura da realidade social. Conforme relatado pelos participantes da pesquisa, a formação que estavam recebendo os propiciou a desenvolver um senso crítico, tendo em vista o caráter político da profissão, o que possibilitará uma visão mais apurada da sociedade, e uma intervenção profissional qualificada. A segunda categoria do empate contempla os discentes que afirmaram estar satisfeitos com todo o conjunto de elementos que compõem a formação, de maneira geral: instituições de ensino superior, matrizes curriculares, docentes, material bibliográfico, dentre outros.
A sexta categoria mais apontada pelos estudantes demonstrou que 9,2% deles sentem-se ansiosos para sua inserção no mercado de trabalho como assistente social, pois a formação desperta boas expectativas quanto à atuação profissional, relacionadas ao reconhecimento da profissão e ocupação das diversas áreas sócio-ocupacionais pelos assistentes sociais. A próxima categoria diz respeito à infraestrutura das IES, que no âmbito deste estudo compreende instalações dos prédios, salas de aula e dos professores, cantinas, banheiros e bibliotecas. Apenas 7,7% dos alunos mencionaram esta categoria como aspecto positivo da formação.
Alguns alunos (4,6%) também apontaram como aspectos positivos da formação questões mais pessoais, como a realização do desejo de estar cursando ensino superior, tendo a oportunidade de conquistar sua qualificação profissional. Por fim, também foram mencionados o atendimento e orientação individual dos professores e tutores para com os alunos (3,1%) e o estágio supervisionado (1,5%).
Levando em conta os dados obtidos, depreende-se que a base teórica fornecida aos alunos e as condições em que os conhecimentos são transmitidos são boas. As categorias melhores avaliadas contemplam a qualidade dos conteúdos selecionados e o olhar crítico que eles proporcionam, essencial à atividade profissional, facilitados por docentes qualificados e empenhados em exercer sua profissão, destacando inclusive sua disposição em fornecer atendimento e orientações aos alunos fora dos horários normais das aulas.
No entanto, o fato de apenas 1,5% dos discentes ter apontado o estágio supervisionado como aspecto positivo pode ser alarmante. Segundo Iamamoto (2006), o estágio supervisionado é uma atividade curricular indispensável e obrigatória para a formação em Serviço Social, cujo objetivo é preparar o discente para a atuação profissional, através de sua inserção em campos sócio-ocupacionais da profissão. Ainda de acordo com a referida autora, esta atividade justifica-se pela dimensão teórico-prática da profissão, e representa a possibilidade de contato direto dos alunos com a dinâmica das instituições e intervenções cotidianas realizadas pelos assistentes sociais.
Desta forma, a fragilidade no âmbito do estágio supervisionado pode causar consequências negativas na formação dos futuros assistentes sociais, pois, conforme Bravo e Matos (2004), a experiência do estágio supervisionado deve proporcionar ao estudante um olhar crítico sobre a realidade, acompanhado de uma intervenção comprometida com o projeto ético-político da profissão. Neste sentido, a má condução deste elemento curricular pode fazer com que se formem profissionais tecnicistas e pragmáticos, em descompasso com o viés histórico-dialético do Serviço Social.
Tendo em vista quais são as fortalezas identificadas nos cursos de graduação do interior do Amazonas, tem-se neste momento quais são as fragilidades apontadas pelos estudantes. Neste quesito, foi possível perceber que os pontos frágeis mais apontados foram diferentes entre os alunos que estão se graduando na modalidade presencial e aqueles que cursam a modalidade semipresencial/EaD. Por este motivo, estes dados serão apresentados de maneira separada.
Em relação aos alunos da modalidade presencial – 23,4% do total de participantes – 33,3% deles não responderam a esta questão. Entre aqueles que responderam, 41,7% apontaram o escasso arquivo da biblioteca e a falta de recursos didático-pedagógicos como aspecto frágil da profissão. Como a única instituição que oferece o curso de Serviço Social na modalidade presencial no interior do Amazonas é de caráter público, entende-se que esta fragilidade é fruto do desmonte que as políticas educacionais vêm sofrendo no Brasil.
Ademais, 25% apontaram as dificuldades pessoais como leitura, interpretação e absorção de conhecimentos como maior impasse para a formação. Tal fato pode apontar para falhas tanto no ensino da graduação, por conta da metodologia utilizada, quanto no ensino fundamental e médio, de modo que os alunos eventualmente podem chegar ao curso de graduação já tendo que enfrentar estes obstáculos.
Empatados com 8,3% de respostas cada, também foram apontados: o estágio supervisionado; a pouca oferta de disciplinas optativas sobre espaços sócio-ocupacionais específicos como saúde, educação e assistência social; a não-realização de atividades práticas em campo; a falta de oportunidades para iniciação científica, e a qualificação dos professores.

2.1. Limites da formação na modalidade a distância no interior do Amazonas

Segundo Pimenta (2009), o ensino a distância, no Brasil, foi possibilitado a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) – Lei n° 9.394/96. O Decreto 5.622, de 19 de dezembro de 2005, que regulamenta o Art. 80 da LDB, assim define o EaD:

A educação a distância é a modalidade educacional na qual a mediação didático-pedagógica nos processos de ensino e aprendizagem ocorre com a utilização de meios e tecnologias de informação e comunicação, com estudantes e professores desenvolvendo atividades educativas em lugares ou tempos diversos.

Ainda de acordo com a referida autora, o EaD brasileiro passou a ser efetivado a partir dos anos 2000, inicialmente pelas IES públicas, as quais o utilizavam como ferramenta complementar à educação presencial. No entanto, a partir de 2002, esta modalidade de ensino tornou-se uma estratégia de acumulação de lucro do mercado educacional, com o avanço massivo do setor privado no ensino a distância. Desde então, a cada ano, observa-se um significativo aumento do número de cursos na modalidade EaD ofertados no ensino superior (PIMENTA, 2009).
A autora supramencionada aponta que a educação superior no Brasil está mergulhada em um profundo processo de mercantilização, mascarado pelo próprio governo neoliberal que comanda o país como uma estratégia de ampliação da educação e da democracia, escondendo seu objetivo de utilizar a educação a serviço do capitalismo.
No caso específico do Serviço Social, a expansão do ensino superior privado tomou força a partir da segunda metade da década de 1990, tendo como fator instigante para este processo o fato de o curso ser considerado barato, por não obrigar o investimento em laboratórios e equipamentos, por exemplo (PIMENTA, 2009).
Atualmente, conforme apontado pela referida autora, os cursos de graduação em Serviço Social no Brasil estão concentrados na esfera privada, especialmente em IES não universitárias, as quais não são obrigadas pela legislação vigente a assumir o compromisso de estimular o tripé ensino, pesquisa e extensão. Com o agravante de que muitas destas instituições oferecem os cursos na modalidade a EaD, tem-se o comprometimento da característica ético-política da profissão, construída pela categoria de assistentes sociais a partir da década de 1980, causando consequências negativas para a formação profissional em Serviço Social, como veremos a seguir.
A primeira categoria mais citada como fragilidade da formação pelos participantes da pesquisa refere-se à carga horária das disciplinas e o tempo de duração do curso em si, visto que 26,1% dos estudantes demonstraram-se bastante insatisfeitos com a quantidade de aulas presenciais determinadas pela matriz curricular dos cursos em que estavam se graduando, demonstrando seu desejo de que houvesse mais aulas presenciais, e o que a formação em geral pudesse durar mais tempo.
Com um empate, a outra categoria mais apontada diz respeito ao mercado de trabalho. Os participantes da pesquisa destacaram suas preocupações quanto ao trabalho profissional, no que diz respeito, principalmente, à valorização e remuneração da profissão, e ao descaso governamental para com as políticas e instituições públicas que são o principal objeto e campo de trabalho dos assistentes sociais.
Na terceira categoria, 10,9% dos acadêmicos da graduação apontaram que se sentem “largados à própria sorte” (sic) dentro de sua instituição de ensino a distância. Eles afirmaram que têm dificuldades para estabelecer contato direto com os tutores eletrônicos e que, quando precisam de suporte administrativo, não o encontram. Já na quarta categoria estão contabilizados os 8,7% que, ao serem questionados sobre as principais fragilidades da formação, apontaram o fato de ela ser semipresencial como maior impasse, o que impossibilita o esclarecimento de dúvidas e o contato direto com os professores, que ficam em outras unidades da federação.
Também houve um empate entre os que apontaram a infraestrutura do polo, especificamente quanto à qualidade de internet e o difícil acesso às aulas, e o estágio supervisionado como principais pontos frágeis, com 6,5% de menções a cada um. Quanto a esta última categoria, os alunos apontaram que têm dificuldades para adentrar ao campo de estágio e, quando conseguem, não encontram muitas opções, ficando limitados a apenas uma área.
Neste contexto, retomamos as considerações de Pimenta (2009), a qual dá ênfase ao fato de que a modalidade EaD não proporciona um convívio social, nem a realização de debates ou a troca de diálogos e experiências. Com isso, os relatos dos discentes evidenciam que há muitos limites para a condução da formação nesta modalidade.

3. O TRATO DA RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA NA FORMAÇÃO RECEBIDA

Iamamoto (2006) e Guerra (2007) apontam que a preocupação com o ensino da prática no Serviço Social se deu apenas a partir da década de 1980. Antes disso, a dimensão teórico-metodológica era o principal foco de discussões e debates quanto à formação profissional. Isto porque, antes de recorrer às bases marxistas, o Serviço Social brasileiro foi influenciado por teorias de cunho funcionalista e positivista. Estes fundamentos, com seu teor mecânico e utilitarista, reduziam a relação entre teoria e prática à:

aplicação indiscriminada de modelos na análise e diagnóstico da realidade; a utilização de técnicas e instrumentos retirados de manuais; o estabelecimento de princípios, normas, e regulamentos das ações e aceitação acrítica dos já instituídos, prevalecendo uma relação de exterioridade entre sujeito e objeto e de neutralidade entre os sujeitos envolvidos nesse processo (GUERRA, 2007, p. 172).

No entanto, a partir dos anos 1980, a profissão passa a ter como base a teoria marxista, tendo como objetivo uma ruptura com o tradicionalismo e conservadorismo, defendendo como princípio de trabalho um olhar voltado para a totalidade, por meio da reflexão e de uma leitura crítica da realidade. Esta forma de pensar é oposta ao mecanicismo que caracterizou o período anterior. Neste sentido, após a revisão curricular que aconteceu em 1982, o ensino da prática começou a ganhar destaque nas discussões da categoria de assistentes sociais.
No decorrer da década seguinte, especialmente entre os anos 1994 e 1996, novamente o currículo de Serviço Social foi objeto de debates, desta vez em um intenso esforço conjunto da categoria, que resultou na elaboração do documento intitulado “Proposta Básica para o Projeto de Formação Profissional: Novos Subsídios para o Debate”, em 1996. Ainda neste ano, foi promulgada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, tornando propício o cenário para que a então ABESS propusesse ao Conselho Nacional de Educação o documento “Diretrizes Gerais para o Curso de Serviço Social” (ABEPSS, 1996).
Neste documento, foram tratados os núcleos de fundamentação da formação em Serviço Social, sendo eles: núcleo de fundamentos teórico-metodológicos da vida social; núcleo de fundamentos da particularidade da formação sócio-histórica da sociedade brasileira e núcleo de fundamentos do trabalho profissional. O primeiro núcleo é responsável por estimular nos alunos um olhar para o ser social enquanto totalidade histórica, fornecendo os elementos fundamentais que serão tratados em suas particularidades pelos demais núcleos. No segundo núcleo, tem-se como objetivo o estudo da história nacional, em sua dimensão econômica, social, política e cultural. Por fim, o terceiro núcleo deve propiciar a visualização do Serviço Social como uma profissão inserida na divisão sociotécnica do trabalho, articulando seus elementos fundamentais: objeto sobre o qual incide o trabalho profissional, neste caso as expressões da Questão Social; a instrumentalidade do trabalho, constituída pelas técnicas, instrumentos e recursos materiais e intelectuais utilizados; e a atividade do profissional em si, norteada por uma necessidade, uma finalidade (ABEPSS, 1996).
Desta forma, ainda de acordo com o documento, estes três núcleos configuram-se como eixos da formação profissional, subdividindo-se em áreas de conhecimento que são representadas nos componentes curriculares. Esta articulação é que permite o estabelecimento da relação entre teoria e prática, através de mediações entre os assuntos abordados durante toda a formação, de modo que o ensino esteja sempre associado à pesquisa e à extensão. Segundo Boschetti (2004, p. 29):

o ensino da prática ocorre nos três eixos, os conteúdos devem ter a preocupação de mostrar a vinculação entre teoria, realidade e as possibilidades de intervenção profissional em diferentes contextos e momentos históricos.

Tendo em vista estes aspectos, aos participantes da pesquisa foi perguntado em qual momento da formação que estavam recebendo havia a reflexão sobre a relação entre teoria e prática profissional. Nestes termos, 57% assinalaram o estágio curricular, 36% apontaram as disciplinas trabalhadas no currículo, 4% indicaram a opção “Outros” e 3% não responderam a esta questão.
Dentre os participantes que escolheram a opção “No estágio curricular”, 84% justificaram sua resposta apontando que a reflexão acontece no campo de estágio, pois é quando eles têm a oportunidade de atuar tendo como base os conhecimentos teóricos adquiridos no decorrer da formação. Dito de outro modo, é no campo de estágio que eles podem “aplicar a teoria na prática” (sic), pensamento comum que expressa a ideia de que existe uma dicotomia entre teoria e prática. Em relação aos demais que apontaram esta alternativa, 4,5% explicaram que a reflexão acontece a partir da experiência adquirida no campo de estágio e o restante não justificou sua resposta.
Neste sentido, é possível identificar uma significativa fragilidade no trato da relação teórico-prática que estes estudantes estão vivenciando durante a formação. Segundo Santos e Pini (2013), toda a formação profissional deve ser teórico-prática, visto que os conteúdos teóricos se constituem em uma interpretação da realidade com a qual os assistentes sociais irão atuar. Portanto, o estágio supervisionado, longe de ser o único espaço favorável ao estabelecimento da relação entre teoria e prática, é o elemento privilegiado de mediação entre o “conhecimento teórico” e o “conhecimento procedimental” (SANTOS & PINI, 2013).
Já em relação aos que responderam que a reflexão acontece no decurso de todas as disciplinas curriculares, 53,6% justificaram que as disciplinas proporcionam esta reflexão e fornecem a fundamentação teórica necessária para o trabalho em campo. Mais uma vez, nota-se a noção de que a relação teórico-prática se resume na apreensão de conteúdos conceituais que devem ser executados no trabalho profissional. Ademais, 3,6% apontaram as atividades de pesquisa e extensão como espaço onde esta reflexão acontece. Este dado é relevante, pois reafirma as considerações feitas acima sobre a fragilidade no estabelecimento da relação teórico-prática. Conforme Iamamoto (2006), a prática acadêmica deve ser dirigida pela articulação entre ensino teórico e prático, pesquisa e extensão. A porcentagem de alunos que mencionou estes dois últimos aspectos demonstra que eles não estão sendo incentivados da maneira desejada nos cursos de graduação em Serviço Social do interior do Amazonas.
Quanto aos 4% que assinalaram a opção “Outros”, 66,7% julgaram importante frisar que esta reflexão acontece em algumas disciplinas, mas não em todas. Neste ponto, verifica-se a não articulação entre os núcleos de fundamentação da formação discutidos anteriormente. Os outros 33,7% apontaram que esta reflexão se dá através do contato com a comunidade local. Mais uma vez, nota-se a necessidade de que haja algum tipo de trabalho de campo para que os alunos identifiquem a relação teórico-prática.
Ao serem questionados se as disciplinas cursadas favoreciam o estabelecimento da relação entre teoria e prática no Serviço Social, 92% dos participantes responderam que sim, 1% apontou que não, e 7% não responderam a esta questão.
Foi pedido para que os participantes justificassem sua resposta a este item. Deste modo, 28,6% deixaram a questão em branco. Dentre os que responderam, todos haviam assinalado a resposta “Sim” e, segundo 53,6% deles, os textos e discussões trabalhados em sala de aula favorecem esta relação. Dentre os demais, 21,4% responderam que o estabelecimento se dá durante as disciplinas de estágio curricular ou demais componentes curriculares que possibilitem atividades práticas e 17,9% afirmaram que as disciplinas fornecem os conhecimentos necessários para que se possa ir a campo e ter a relação estabelecida. Outros 3,6% apontaram que as disciplinas estimulam a reflexão e o pensamento crítico, e consequentemente propiciam o estabelecimento da relação entre teoria e prática.
Nesta questão, é interessante o fato de que a maior parte dos alunos aponta que os conteúdos trabalhados durante as aulas favorecem esta relação. Este dado pode ser positivo, se o trato da articulação teórico-prática for baseado na associação dos três núcleos de fundamentação da formação já abordados. No entanto, baseado nas respostas obtidas na primeira questão, isto não é o que acontece. As demais respostas seguem o padrão da questão anterior, permitindo o entendimento de que a associação entre teoria e prática depende do trabalho de campo para acontecer. Apenas os 3,6% que apontaram a reflexão e o pensamento crítico como sinônimo de articulação teórico-prática aproximam-se do conceito desta relação fornecido pela ABEPSS.
Por fim, ao ser requisitado que os estudantes avaliassem a compreensão sobre a articulação entre teoria e prática oferecida pelo curso em que estudavam, 56% avaliaram este quesito como Bom, 34% como Ótimo e 8% como Regular e 2% não responderam a esta questão. Neste sentido, apesar de a avaliação ter sido positiva, ela pode também ser enganosa, visto que, conforme identificado nas respostas dos alunos às demais questões, para boa parte deles a relação entre teoria e prática consiste na transmissão de conhecimentos que serão aplicados no momento do trabalho profissional. Como a transmissão de conhecimentos na graduação foi avaliada por eles de forma positiva, entende-se que eles tenham avaliado positivamente também a articulação entre teoria e prática, mesmo que ela não seja conduzida conforme recomendado pela ABEPSS.

3.1. Um olhar para o estágio supervisionado

Como já discutido, o estágio é uma atividade curricular obrigatória, responsável pela inserção do acadêmico no campo de trabalho dos assistentes sociais, constituindo-se em um espaço privilegiado de contato dos alunos com o cotidiano profissional e experiências de trabalho da categoria e também dos demais profissionais afins (IAMAMOTO, 2006).
O estágio supervisionado no Brasil é previsto pela LDB, ainda que de maneira geral, atribuindo às IES a tarefa de regulamentação da atividade, e esclarecendo que esta não deve caracterizar vínculo empregatício. Ademais, em 2008 foi promulgada a Lei Federal 11.788, conhecida como Lei do Estágio, instituída como instrumento de regulamentação do estágio nas instituições de educação nos níveis superior, profissional, médio, especial e dos anos finais do ensino fundamental, além da modalidade profissional da educação de jovens e adultos, conforme estabelecido em seu artigo 1º (CFESS, Gestão 2011-2014).
A Lei do Estágio estabelece, como obrigações das unidades de ensino, a formalização do compromisso entre instituição de ensino, espaço ocupacional e aluno por meio de instrumento próprio, análise das condições de instalações da instituição, definição do processo de avaliação, escolha de supervisor acadêmico que seja da mesma área de formação do/a estagiário/a, construção de planos de atividades e elaboração de normas complementares (BRASIL, 2008).
Quanto ao estágio na formação profissional em Serviço Social, este é abordado nas Diretrizes Curriculares da ABEPSS, segundo as quais esta atividade é obrigatória e caracteriza-se pela inserção do acadêmico em um espaço sócio-ocupacional da profissão, com o objetivo de capacitá-lo para o trabalho profissional, devendo o estagiário ser acompanhado por supervisão acadêmica e profissional, tendo como referência a Lei de Regulamentação da Profissão (Lei 8662/93) e o Código de Ética Profissional (1993) (ABEPSS, 1996).
A ABEPSS elaborou também, em 2009, um documento-base para a Política Nacional de Estágio, o qual deu início a uma série de reflexões e debates no sentido de compor esta política que, embora não tenha força de lei, “tem a legitimidade do debate coletivo no âmbito da ABEPSS como entidade acadêmica, e fornece parâmetros nacionais para a construção das políticas de estágio em cada unidade acadêmica” (CFESS, Gestão 2011-2014). Dentre estes parâmetros, estão: indissociabilidade entre as dimensões teórico-metodológicas, ético-políticas e técnico-operativas; articulação entre formação e exercício profissional; indissociabilidade entre estágio, supervisão acadêmica e de campo; articulação entre universidade e sociedade; unidade entre teoria e prática; articulação entre ensino, pesquisa e extensão (PNE, 2010, p.12-14).
Considerando-se as informações expostas, tem-se neste momento os resultados obtidos com as questões que tratavam do estágio supervisionado no questionário aplicado aos participantes da pesquisa. A primeira delas teve como objetivo fornecer um panorama dos campos de estágio ocupados pelos acadêmicos no interior do Amazonas.
Os dados referentes à distribuição dos campos de estágio entre os alunos mostram que existe uma concentração de estagiários nas áreas da Saúde (33%) e da Assistência Social (26%). Estes dados são alarmantes, pois revelam fragilidades não somente em relação à formação, mas também quanto ao exercício profissional do Assistente Social em cada um destes municípios, uma vez que podem indicar a pouca disponibilidade de serviços em outros espaços sócio-ocupacionais nestas localidades. Além disso, duas das áreas de estágio listadas no questionário a que os discentes responderam não foram assinaladas nenhuma vez, sendo elas: Sistema Penitenciário e Previdência Social.
Após serem questionados sobre sua área de estágio, aos estudantes foi indagado se a formação recebida por eles fornecia os subsídios para atuar nesta área. As opções de resposta eram “Sim, totalmente”, “Sim, parcialmente” e “Não”. Neste sentido, 64% dos estudantes escolheram a primeira opção, 26% marcaram a segunda opção e o restante não respondeu a esta questão.
Em contrapartida, a próxima questão – que continha as mesmas opções de resposta da questão anterior – perguntava se, a partir da formação que estavam recebendo, os alunos sentiam-se habilitados para atuar em qualquer instituição, de qualquer campo sócio-ocupacional. Assim sendo, apenas 36% dos participantes afirmaram que “Sim, totalmente”. Aqueles que responderam “Sim, parcialmente” representam 58% da amostra de participantes, mais que o dobro do número de alunos que marcou a mesma opção na questão anterior.
Ademais, 3% dos acadêmicos informaram que não se sentem habilitados para atuar em qualquer campo sócio-ocupacional, e os 3% restantes não responderam a esta questão.
Estes dados levam à discussão sobre formação generalista e especialista no Serviço Social. Para iniciar este debate, Prates et al. (2012) apontam o fato de os assistentes sociais serem profissionais que se inserem na divisão sociotécnica do trabalho, e são diretamente atingidos por todas as problemáticas intrínsecas ao mercado de trabalho sob uma lógica capitalista. No Brasil, o exercício legal da profissão tem como requisito a conclusão do nível superior em um curso de graduação certificado e é regido por uma lei de regulamentação e por um código de ética, como já exposto.
A lei de regulamentação da profissão prevê as atribuições específicas do assistente social e também as competências socialmente reconhecidas da profissão, as quais devem ser desenvolvidas de modo a não desfigurar o trabalho profissional. Este trabalho tem um objeto específico, as expressões da questão social que, apesar de serem bastante diferenciadas entre si, têm uma origem comum: o desenvolvimento do capitalismo urbano-industrial. Deste modo, tem-se também a finalidade da profissão, ou seja, o enfrentamento a estas expressões. Por sua vez, estas expressões podem ser trabalhadas através de diversos espaços sócio-ocupacionais (saúde, assistência social, previdência social, educação, habitação, sociojurídico, sistema penitenciário, questões agrárias e/ou ambientais, entre outros). Neste sentido, tem-se a importância de uma formação generalista, que prepare os acadêmicos e futuros profissionais para estabelecer a devida relação entre universalidade e particularidade em cada espaço de trabalho (PRATES et al., 2012).
Ainda segundo Prates et al. (2012), na graduação em Serviço Social não se deve formar especialistas em saúde ou assistência social – neste ponto percebe-se que as considerações dos autores coincidem com os resultados discutidos acima –, deve-se formar profissionais habilitados a atuar em qualquer campo sócio-ocupacional, pois o que particulariza a profissão é o enfrentamento às expressões da questão social.
Por fim, cabe ressaltar que as particularidades de cada um desses espaços não serão negadas, mas serão visualizadas como fruto de um contexto social, econômico, político e cultural, local ou regional, cujos elementos originais das problemáticas serão comuns a todas elas. Desta forma, ao conduzir uma formação profissional fragmentada, as IES estão destituindo a profissão de seu potencial transformador, deixando de articular os eixos teórico-metodológico, ético-político e técnico-operativo (PRATES et al., 2012).

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Serviço Social brasileiro teve origem com as profundas mudanças econômicas e sociais ocorridas na sociedade a partir da instituição do sistema capitalista no país. Esta profissão é fruto de um determinado meio, que se transforma e transforma os sujeitos que estão envoltos neste contexto. Neste sentido, o Serviço Social também é bastante influenciado pelo contexto histórico em que se situa e, da mesma maneira, deve renovar-se constantemente para reafirmar sua finalidade social.
Para garantir a renovação da profissão e alinhamento de seus objetivos com os interesses da classe trabalhadora, a formação dos assistentes sociais também deve ser frequentemente repensada, pois é diretamente influenciada pelo seu contexto histórico e econômico, uma vez que os valores, técnicas e modelos educacionais se renovam com os passar dos anos. Ademais, é necessário considerar que o Serviço Social se insere de modo particular em cada território, região ou localidade, por isso, uma análise da formação sempre deve levar em conta as particularidades de cada lócus de estudo.
Uma pesquisa sobre a formação profissional em Serviço Social no interior do estado do Amazonas permite que seja apresentado um panorama ao mesmo tempo geral e específico sobre o tema, proporcionando a identificação de fortalezas e fragilidades que o mesmo possui. Possibilita que se caracterize o rumo que a formação profissional está tomando nesta região, se está de acordo com o previsto pelas diretrizes e regulamentações que norteiam a profissão.
O intuito desta investigação foi analisar a formação profissional conduzida por cursos de Serviço Social no interior do Amazonas, tendo como fonte os próprios alunos que estavam em formação durante a realização da pesquisa.
Um dos objetivos específicos era identificar as potencialidades e limites da formação em Serviço Social no interior do Amazonas. Este propósito foi alcançado através da análise das respostas dos alunos, colhidas por meio de um questionário composto por questões subjetivas e objetivas, pensadas de modo a fornecer a melhor visão possível da formação que os participantes da pesquisa estavam recebendo.
Como fortalezas da formação, foram identificadas a qualidade da fundamentação teórica fornecida aos estudantes, a qualificação dos professores, o desenvolvimento de um olhar crítico para a realidade social, dentre outras. Em relação às fragilidades, foram apontados, por exemplo, o escasso acervo bibliográfico das instituições e a falta de recursos didático-pedagógicos que auxiliassem na condução das aulas, dificuldades pessoais dos alunos como leitura, interpretação de textos e absorção de conhecimentos, o estágio supervisionado e a falta de oportunidades para participação em projetos de extensão e iniciação científica.
Ainda no que diz respeito às vulnerabilidades da formação, foram indicados pelos alunos muitos aspectos relacionados ao EaD, visto que 76,6% dos participantes faziam o curso de Serviço Social nesta modalidade. Dentre os tópicos apontados por eles, estão: insuficiente carga horária de algumas disciplinas, dificuldade de contato com os tutores e setor administrativo da instituição, infraestrutura do polo, não realização de atividades de campo, dificuldades no acesso ao estágio supervisionado, qualidade das aulas e qualificação dos tutores.
Por fim, outro objetivo específico constituía-se em verificar como estava acontecendo a relação entre teoria e prática nos cursos de Serviço Social cujos estudantes participaram da pesquisa. Nesse sentido, foi possível identificar uma grave debilidade neste aspecto, visto que o que está sendo aprendido não é o estabelecimento de uma relação teórico-prática, mas sim a noção de que existe uma dicotomia entre estes dois aspectos. Para a maioria dos alunos participantes, a associação entre estes aspectos consiste na aplicação dos conceitos teóricos durante as atividades práticas, havendo, inclusive, a afirmação de 57% deles de que esta relação acontece no campo de estágio curricular.

5. REFERÊNCIAS

ABEPSS. Formação do assistente social no Brasil e a consolidação do projeto ético-político. Revista Serviço Social e Sociedade, Editora Cortez. São Paulo, nº 79, ano XXV,
Setembro/2004.

______. Política Nacional de Estágio. 2010. Disponível em . Acesso em: 14 jul. 2018.

BRASIL. Decreto nº 5773, de 09 de maio de 2006. Dispões sobre o exercício das funções de regulação, supervisão e avaliação de instituições de educação superior e cursos superiores de graduação e sequenciais no sistema federal de ensino. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/decreto/d5773.htm>. Acesso em: 31 jul. 2018.

______. Decreto nº 5622, de 19 de dezembro de 2005. Regulamenta o Art. 80 da Lei 9394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-
2006/2005/decreto/d5622.htm>. Acesso em: 31 jul. 2018.

BRAVO, Maria Inês Souza; MATOS, Maurílio Castro de. As Dimensões Ético-Políticas na Formação Acadêmica do Assistente Social: a Articulação Ensino-Pesquisa-Extensão. In: Anais do 2º Congresso Brasileiro de Extensão Universitária, 2004.

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CFESS. Código de Ética do/a Assistente Social. Lei 8.662/93 de Regulamentação da
Profissão. 10 ed. rev. e atual. Brasília: Conselho Federal de Serviço Social, 2012.

______. Código de Ética profissional do Assistente Social. Brasília: CFESS, 1993.

______. Lei de Regulamentação da Profissão de Assistente Social. Brasília: CFESS, 1993.

GUERRA, Yolanda. A instrumentalidade do Serviço Social. 6 ed. São Paulo: Cortez, 2007.

IAMAMOTO. A formação acadêmico-profissional no Serviço Social brasileiro. Serviço
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______. O Serviço Social na Contemporaneidade: trabalho e formação profissional. 10 ed. São Paulo: Cortez, 2006.

SANTOS, Cláudia Mônica dos; PINI, Francisca. A transversalidade do ensino da prática na formação profissional do assistente social e o projeto ABEPSS Itinerante. Temporalis, Brasília, ano 13, n. 25, p. 133-153, jan./jun. 2013.

PIMENTA, Ana Cristina Borges. Serviço Social e Ensino a Distância (EaD): análise da
expansão. Dissertação (Mestrado em Serviço Social) – PUC. São Paulo, 2009.

PRATES, Jane Cruz. et al. O Objeto de Trabalho e a Formação Generalista em Serviço Social: em debate atribuições e competências profissionais. Revista de Trabajo Social, Tandil, v. 4, n. 7, p. 184-195, jul. 2012.

*Discente do Curso de Serviço Social da Universidade Federal do Amazonas.
** Professora Adjunta do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal do Amazonas, líder do Grupo de Pesquisa Estudos de Sustentabilidade, Trabalho e Direitos na Amazônia – ESTRADAS, doutora em Sociedade e Cultura na Amazônia.

Recibido: 24/04/2019 Aceptado: 07/05/2019 Publicado: Mayo de 2019

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