ANTECEDENTES DO CAPITALISMO

ANTECEDENTES DO CAPITALISMO

Carlos Gomes

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8.2 – MOBILIDADE DEMOGRÁFICA

O termo migração refere-se a toda a deslocação, suficientemente importante, de um grande número de pessoas. As movimentações de trabalhadores podem ser definitivas, periódicas ou temporárias; podem traduzir-se num movimento contínuo ou descontínuo, voluntário ou involuntário, organizado ou forçado. As incursões e invasões de diversos povos provocaram grandes movimentos de populações com consequências catastróficas, ficando algumas regiões despovoadas e empobrecidas, civilizações e cidades destruídas. Da grande mobilidade das comunidades nómadas resultou a migração de tribos inteiras que chegaram a abandonar o seu território de origem, levando consigo a língua e as tradições culturais. O tráfico de escravos desencadeou uma gigantesca movimentação de seres humanos que foram forçados a deslocar-se violentamente para outros territórios. O rápido crescimento urbano requeria uma migração intensa. O crescimento da população urbana está ligado a uma mudança estrutural no progresso comercial e industrial. Este crescimento levantou muitos problemas relacionados com a urbanização e o abastecimento de víveres ou água. O crescimento geral da população resultante de inovações tecnológicas que melhoraram o rendimento agrícola e a produção de artefactos fornecia a base para uma tal migração. Esta vaga foi também impulsionada pela maior facilidade dos transportes e pelas transformações ocorridas nos primórdios da formação do modo de produção capitalista.

As populações humanas começaram a fazer parte duma rede vasta e interactiva, pois as diferentes regiões dificilmente permanecem isoladas por muito tempo, salvo quando grandes obstáculos geográficos o impedem ou se mantêm grandes diferenças de níveis de desenvolvimento histórico. A influência recíproca dos diferentes povos teve as origens mais diversas, como: as guerras e as conquistas, o comércio, o intercâmbio cultural, a religião ou a comunicação verbal. As tribos das estepes, que adoptaram formas migratórias de criação de gado, puseram em contacto diversos grupos culturais, conferindo vitalidade e amplitude territorial aos processos de interacção. Nas extensas áreas de produção de excedentes de géneros alimentícios estabelecem-se relações simbióticas entre pastores e agricultores. Mesmo dos contactos hostis, como a guerra, podiam produzir-se trocas de culturas.

Na Ásia, os mongóis procuraram estender-se por toda a parte do continente euro-asiático, chegando a instalar-se em certas zonas da Europa oriental. Os otomanos encontraram uma pátria permanente na Ásia Menor e nos Balcãs; sob o seu domínio produziu-se a transferência sistemática de diferentes populações.

A China, nos séculos XVI e XVII, sofreu uma queda brusca na população correspondente aos anos de guerra. A anexação de terras, as catástrofes naturais e as guerras forçaram as populações a abandonar as suas casas e a estabelecerem-se noutras regiões. Os camponeses que tinham perdido as suas terras vinham para as cidades, tornando-se aí artesãos ou trabalhadores assalariados, deslocavam-se para regiões menos povoadas, onde exploravam terras não cultivadas. Entre a população migrante, a autoridade do clã era menos forte, as diferenças sociais menos acentuadas e a noção de origem geográfica menos dominante do que na sociedade rural tradicional.

Na Europa Ocidental, século XIV, a expansão colonial não acarretou perdas consideráveis ao nível demográfico. No século seguinte, verificou-se uma verdadeira explosão demográfica. A recuperação dos níveis de densidade populacional deu origem ao retomar do cultivo intenso das terras aráveis por parte das novas gerações e o aumento do preço dos produtos agrícolas. As forças produtivas revelaram-se capazes de aumentar a oferta a níveis suficientemente elevados para satisfazer as necessidades duma população em crescimento permanente. Um dos objectivos da política demográfica consistiu na fixação das populações com o fim de aproveitar terras incultas para a agricultura. Nos meios urbanos, o aumento demográfico funcionou como um factor de estímulo do crescimento económico.

Na América Central e do Sul, em consequência da colonização, muitas populações entraram em declínio morrendo vitimadas de genocídio ou de doenças trazidas pelos europeus, pois não estavam imunes contra a varíola, o sarampo e a gripe. O declínio da população ameríndia foi catastrófico.

Nas Caraíbas, século XVI, com a chegada dos espanhóis, chegaram emigrantes das mais diversas profissões: carpinteiros, ferreiros, pedreiros, assentadores de tijolos, telheiros, carpinteiros navais, curtidores e sapateiros. Outros, vinham de terras rurais, onde a dureza da vida os levou a alcançar uma melhoria. Chegavam, ainda, fidalgos arruinados, sem a riqueza correspondente ao seu estatuto, ou gente do povo que desejava ascender à fidalguia. No século XVIII, ao mesmo tempo que decorriam frequentes revoltas, houve um processo de adaptação entre culturas africanas acompanhado dum forte declínio de distinções étnicas entre os africanos, pela criação de línguas crioulas e uma crescente consciência de negritude.

Na América do Sul, a população continuou a ser preponderantemente ameríndia. Além disso continha mais negros e mestiços que brancos. Os escravos foram concentrados nas herdades ao longo da costa e nas cidades mais próximas. Muitos emigrantes africanos acompanhavam os seus senhores na deslocação para outras terras, mas eram insuficientes para substituir a população autóctone.

No Brasil, século XVI, desde o início que os portugueses, ao contrário dos povos doutros países colonizadores, se miscigenaram com as populações nativas, cruzamento que prosseguiu com a chegada de escravos negros de África. Daqui resultou a formação dum grupo populacional próprio que se identificou com a vida quotidiana da colónia e com as relações que nela se formavam.

Na América do Norte, século XVII, com as novas populações de origem africana e europeia, os ingleses tentaram separar-se dos ameríndios que tendiam a retirar-se cada vez mais para o interior à medida que a resistência parecia ineficaz face aos avanços da ocupação inglesa.

Na África Subsariana, século XVI, os grandes movimentos populacionais, originados pelas guerras, expansão do comércio e migrações de escravos, motivaram um aumento no cruzamento dos grupos étnicos e puseram em contacto grupos socioculturais que até então eram desconhecidos entre si e vivendo em regiões distantes.