ANTECEDENTES DO CAPITALISMO

ANTECEDENTES DO CAPITALISMO

Carlos Gomes

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3.9 – INFRA-ESTRUTURAS URBANAS

Os núcleos habitacionais constituem a expressão duma forma de organização social que antecipa a da infra-estrutura urbana. Em geral estas unidades populacionais, onde mais tarde aparecem as primeiras cidades, surgiram em regiões influenciadas pelas múltiplas mudanças que afectaram a vida agrícola, artesanal e comercial.

A vida urbana tinha de responder a três necessidades fundamentais: a administração, o artesanato e o comércio. No traçado urbano torna-se visível uma concepção racional em resposta a uma necessidade de ordenar o espaço e obter uma nova forma de organização estrutural na qual as várias funções, públicas, sagradas e privadas, fossem definidas e integradas. Em princípio, tudo devia estar previsto para a boa circulação das mercadorias, como garantia duma certa expansão económica. As cidades organizavam-se para o comércio e nesse sentido foram reservadas construções especiais destinadas aos mercados, ao depósito de mercadorias, e ao alojamento dos negociantes.

A urbanização acompanha a concentração das populações e representa uma fase importante no desenvolvimento científico e cultural. Com o aumento da população, a migração dos povos em direcção aos centros urbanos, acompanhada da expansão do comércio, verificou-se um crescimento urbano e a ascensão de grandes cidades. Em alguns países, que viveram épocas de grande expansão, desenvolveu-se a construção de cidades monumentais, que apresentavam traços relevantes duma arquitectura religiosa e civil.

O sistema de planeamento regular, nascido na época da grande colonização grega, incluía a articulação do território da cidade em vários bairros com funções distintas: centro público, parte habitacional, zonas comerciais, industriais e portuárias. O planeamento urbano reflectia-se na estandardização dos diversos tipos de materiais e artes representativas. A planificação da cidade grega radicava-se mais numa base geométrica, normalmente ortogonal, do que numa técnica de planeamento urbanístico. O seu espaço definia-se por hierarquias sociais ou socioprofissionais.

Muitas cidades orientavam-se em volta do centro de culto e do mercado, por vezes muito próximos. Uma via principal e múltiplas ruelas ligavam as casas agrupadas em quarteirões delimitados por ruas mais largas. Nas ruas sucedem-se as lojas e oficinas artesanais a oferecerem um espectáculo de intensa actividade, com áreas demarcadas para ofícios especializados. Os espaços urbanos começaram a distinguir-se pela zona habitacional para um lado e a zona de oficinas e lojas para outro. Algumas destas zonas eram delimitadas por portas que impediam a comunicação livre, sobretudo depois da noite cair. A estrutura urbana assenta sobre uma plataforma na qual se encontram os edifícios principais, a residência do governante, um celeiro e um edifício público onde se realizam as assembleias.

Algumas cidades eram rodeadas de fossos e muralhas formadas de terra batida e pedras. A sua construção incluía também uma área radiante onde se podiam distinguir outras obras públicas, tais como: estruturas religiosas, caminhos artificiais, canais, valas, reservatórios, lagos artificiais, etc. À roda das cidades agrupavam-se habitações temporárias, acantonamentos militares, acampamentos de sinistrados. Em cidades construídas em territórios fluviais ou marítimos, eram construídos numerosos canais e molhes onde se juntavam barcos para abastecimento ou transporte de passageiros. Emergiam cidades portuárias com os seus estaleiros navais e arsenais. As pontes eram em madeira ou em pedra, embora estas fossem mais raras devido à difícil construção e ao seu custo.

A evolução das construções tende a considerar a função destinada ao edifício. A casa tende a estandardizar-se, mantendo embora uma estrutura rectangular englobando vários compartimentos. Multiplicam-se, porém, as casas com andares e altera-se o aspecto exterior. A construção de edifícios públicos, em geral ostentadora, distingue claramente o sistema urbano do das aldeias. O palácio, associado aos governantes e à autoridade, comporta numerosas dependências e desempenha um papel de beleza e fausto. Os grandes palácios albergavam não só a família dos governantes, os dignatários e a multidão de servidores, mas também as repartições administrativas, as oficinas e os armazéns. O tipo fundamental de edifício monumental continuava a ser o templo.

A técnica de construção de cúpulas permitiu aumentar consideravelmente as dimensões dos edifícios. O surgimento do arco, da abóbada e da cúpula, representou uma profunda alteração nas estruturas monumentais ou públicas, mas também na construção de mercados e das habitantes das classes dominantes. A dimensão destas obras, o transporte e o tratamento dos materiais utilizados, a qualidade da mão-de-obra artesanal utilizada, a divisão de tarefas, pressupunham um elevado grau de experiência e conhecimento técnico.

A manutenção dos serviços urbanos exigia uma rigorosa organização administrativa que deu lugar a novas funções e profissões, que até então ainda não eram necessárias. A limpeza tinha de ser assegurada e tinham de existir equipamentos sanitários à disposição dos habitantes. O fogo era uma grande preocupação das autoridades urbanas. Aos pequenos divertimentos juntam-se outros espectáculos, jogos numerosos e variados. O abastecimento de água, só possível com o desenvolvimento da engenharia hidráulica e a construção de aquedutos, abrangia os aglomerados habitacionais, sendo a água também distribuída por fontes onde qualquer pessoa se podia abastecer. Algumas cidades beneficiavam de depósitos para assegurar uma provisão de água potável e de sistemas de esgotos bem construídos, dos quais alguns ainda são hoje utilizados. Noutras, nem sempre o saneamento básico correspondia às necessidades dos habitantes.

Para construir e reparar as muralhas, fortificações e castelos, que não requeriam uma mão-de-obra auxiliar especializada, eram forçadas massas de trabalhadores composta por habitantes sujeitos a um regime de corveia. Na construção de monumentos de prestígio, como palácios, templos e certos tipos de sepulturas, além das massas rurais, era necessária a participação de outros tipos de trabalhadores especializados para as diferentes fases de construção.

A utilização da pedra na construção deu lugar à formação de um corpo de pedreiros dedicados a trabalhar a pedra na edificação das grandes moles de catedrais, conventos ou igrejas, dos solares senhoriais ou casas de habitação mais importantes, de pontes, de fontanários. Nestas actividades os pedreiros não dispunham de oficinas fixas, deslocando-se com os seus utensílios de trabalho para os locais onde as necessidades se impunham.

Com as dimensões dos monumentos evoluíram naturalmente as dimensões dos estaleiros e impôs-se um crescimento da especialização, começando a destacar-se o ofício de arquitecto. Além disso, a capacidade de criar e acompanhar estes grandes projectos requeria uma organização persistente e enérgica por longos períodos.

Com os descobrimentos marítimos e a expansão de portugueses e espanhóis para outros continentes, foram levadas a outras paragens as concepções da cidade, de arquitectura religiosa e de fortificação. Estas trasladações muitas vezes ignoravam os valores civilizacionais dos outros povos com quem contactavam.