ANTECEDENTES DO CAPITALISMO

ANTECEDENTES DO CAPITALISMO

Carlos Gomes

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4.10 – ACUMULAÇÃO DE RIQUEZA

A acumulação encontra-se ligada ao aparecimento do excedente económico. Está condicionada à quantidade do excedente de produção para além da renovação dos meios de produção e da força de trabalho. Para que surja a acumulação é necessário que o rendimento produzido pela sociedade, num determina do período, não se destine todo ao consumo ou à reprodução. O processo de acumulação não diz respeito apenas às mudanças dos meios de produção, à força de trabalho e ao volume da produção, mas também às mudanças na organização e nas relações sociais.

Se considerarmos como natural tudo quanto é indispensável à sobrevivência, embora não quantificável ou qualificável com exactidão, a riqueza deve ser procurada no âmbito do artificial produzido pela sociedade humana. A noção de riqueza envolve, a ponto de com ela se identificar, o sobreproduto produzido ou em circulação, em suma tudo quanto ultrapassa a área das necessidades fundamentais à reprodução. Toda a espécie de riqueza provem necessariamente do trabalho. A exploração do trabalho alheio permite acumular riquezas nas mãos de uns poucos e utilizá-las para adquirir poderio económico e poder sobre os outros membros da sociedade.

Na economia tributária, o excedente era dissipado na acumulação da riqueza. Os governantes, os altos sacerdotes e a nobreza, para aumentar o seu prestígio e exibir a sua riqueza e poder, construíam templos e palácios monumentais com todo o luxo e conforto e decorados com materiais raros e preciosos; eles próprios, suas famílias e cortesãos, ostentavam jóias de materiais valiosos. A riqueza não era um fim em si mesmo, nem sequer um meio de entesouramento ou de desenvolvimento económico. O objectivo das classes senhoriais consistia em alargar o círculo de aliados e vassalos no meio dos quais mantinha a sua influência social. A hierarquia de valores era confirmada pelos consumos de bens de luxo, pelo esbanjamento e a dimensão do séquito, demonstrando assim a dimensão da riqueza como fonte de poder.

A riqueza das classes dominantes não se baseava apenas na apropriação dos excedentes ou na intensificação das técnicas de exploração, mas também no alargamento da base territorial aonde ia buscar novos meios de produção, o que deu origem a sucessivos conflitos e guerras de conquista, de roubos noutras povoações, à instituição dum comércio desigual com os povos vizinhos ou à captura de prisioneiros de guerra transformados em escravos. A riqueza obtida através da guerra tinha um significado de distinção social.

Para as sociedades de pastores, os rebanhos e manadas eram o autêntico capital dos grupos nómadas. A apropriação do gado fez nascer no seio das próprias comunidades conflitos de interesses que aceleraram a tendência para uma acumulação de riqueza, antes ignorada. A posse de grandes rebanhos introduziu novas formas de engrandecimento, que encontrou expressão na aquisição de bens decorativos, de luxo e de prestígio. A riqueza não era medida pela quantidade de terra mas sim pelo gado e pelo número de mãos à disposição para o cultivo das terras. A dimensão e o controlo da força de trabalho eram os factores decisivos para a prosperidade. Os privilegiados começaram a proteger os seus interesses, manter e reforçar o poder, e a utilizar símbolos e cerimónias para demonstrar e legitimar o poder que detinham sobre os recursos. O crescimento económico atingiu escalões que se podem caracterizar como sociedades em que os chefes tribais atingiram um luxo sumptuoso.

O Estado favorecia a formação de grandes fortunas que beneficiavam os soberanos e elevavam ao poder novas gentes que, por vezes, se aliavam aos chefes militares. No século VII, as transacções de terras tornaram-se um elemento comum, largamente difundido em todas as regiões rurais. A acumulação de riqueza deu origem à formação de grandes propriedades privadas, à consolidação de fortunas de algumas famílias da nobreza e dos funcionários públicos provinciais, que reuniam lotes comprados ou anexados.

O prosseguimento da agricultura, acompanhado do desenvolvimento da indústria e do comércio, levaram a um grande aumento da riqueza social, o que motivou grandes desentendimentos relativos à sua aquisição e distribuição, originando agitações políticas entre as classes, que já mantinham posições elevadas e influência e pretendiam adquirir mais riqueza, e os senhores rurais que beneficiando bastante dos contínuos desenvolvimentos agrícolas acumulavam grandes riquezas e adquiriam poder político. As instituições religiosas transformaram-se igualmente em grandes detentoras de imensas riquezas e de domínios agrícolas muito vastos.

Com a metalurgia, os chefes das aldeias, tal como os chefes das tribos e os sacerdotes, conseguiram obter para si a posse das minas de cobre, prata e ouro, aumentando assim a sua riqueza, prestígio e poderes pessoais, favorecido pelo uso intensivo da escravatura, do avanço de novas tecnologias e do comércio. Para acumular as riquezas os homens procuravam ouro e prata, pois estes metais preciosos estão ao abrigo das variações de outras mercadorias, mantendo-se assim na base dos ganhos, das riquezas e dos tesouros.

Nas sociedades mercantis, a riqueza aparece sob a forma elementar de acumulação de mercadorias. Com a extensão da circulação de mercadorias cresce o poder do dinheiro sob a forma de riqueza monetária. Aí a figura do mercador desempenha um papel fundamental como mediador quase exclusivo de bens em mercados internos ou externos. O dinheiro é ele próprio uma mercadoria, uma coisa exterior que se pode tornar propriedade privada de cada um. É o representante universal da riqueza material. O impulso para o entesouramento é desmedido. Para deter o ouro como elemento de entesouramento tem de se impedir que circule ou se dissolva como meio de fruição.